O Plano Nacional de Educação – PNE prevê que no máximo em dez anos metade das escolas públicas em todo Brasil ofertem ensino em tempo integral; trata-se de meta ambiciosa, generosa e necessária, porém esbarra em inúmeras dificuldades.

Já houve em nossa História algumas tentativas de implantar escola pública em tempo integral, a primeira delas de iniciativa do educador Anísio Teixeira na década de 1950; seguindo-se os chamados Ginásios Vocacionais, em São Paulo nos anos 1960; na década de 1980 o governo Leonel Brizola implantou no Rio de Janeiro os Centros Integrados de Educação Pública – CIEPs, por inspiração de Darcy Ribeiro. A primeira experiência de alcance nacional ocorreu no governo Collor, nos anos 1990, com os Centros de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente – CIACs, no modelo dos CIEPs. Afora isso, foram feitas diversas experiências em nível estadual e municipal, com maior ou menor sucesso.

Talvez o maior problema para a maturação e manutenção desses projetos seja o fato de serem programas de governo, geralmente associados a um político e seu grupo, quando deveriam ser políticas de Estado, de implantação permanente.

Ensino em tempo integral demanda elevados investimentos em qualificação de professores, instalações físicas, projetos pedagógicos e complementares, remunerações, alimentação, energia elétrica e outros; e nem sempre um novo governante se dispõe a arcar com os custos de manter o projeto de seu antecessor.

Outro fator a considerar é que uma escola ruim não melhorará apenas por ter seu período de funcionamento estendido, tendendo na verdade a ser pior pela dilação do tempo inútil para a formação. Aperfeiçoar o sistema educacional, adotar novas metodologias, valorizar o professor (e não apenas na questão salarial!), investir na infraestrutura das instituições, seja em salas de aula, áreas de lazer, bibliotecas e laboratórios, é essencial.

Desde Lev Vygotsky, pensador da área educacional que realizou suas pesquisas ao início do século XX, sabe-se que o conhecimento é produto de uma construção social e decorre das interações sociais, relações humanas constituem o cerne do processo cognitivo, permitindo a apropriação dos objetos culturais e a plena expansão da afetividade, e que tudo isso pode ser facilitado dentro de uma escola de tempo integral, trazendo experiências de sociabilidade, atividades esportivas, artísticas e culturais que não cabem em horários já totalmente preenchidos pelo currículo formal.

Mas uma escola não é um depósito de estudantes, tampouco um microcosmo que substitua completamente a vida em sociedade; apesar de ser parte muito importante do mundo real, não constitui sua totalidade. Os projetos pedagógicos das escolas integrais devem considerar que a vida em família, e em comunidade, não pode ser simplesmente substituída pela permanência do aluno aos cuidados de educadores, por melhores que sejam.

Ainda que o período hoje destinado à educação na escola seja considerado insuficiente, esse tempo é tornado mais exíguo por exigências curriculares vastas demais para o objetivo primeiro de uma instituição de ensino, que é educar, não ensinar a viver; o estudante bem preparado e inserido socialmente estará apto a fazer suas próprias escolhas existenciais.

São bem conhecidas, no entanto, as dificuldades e disfunções de parte das famílias e comunidades brasileiras, decorrentes de muitas décadas de abandono, pobreza e falta de oportunidade; tornando a escola o caminho, talvez único, de equilíbrio e redenção social. Neste cenário emerge a necessidade da implantação do ensino público em tempo integral, resta esperar que realizado com a seriedade, serenidade e sensatez que tema tão fundamental exige.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.