PSICOLOGIA CRIMINAL: UMA ABORDAGEM ACERCA DA POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO DO PSICOPATA

Moisés Bento Lacerda Neto

David José de Oliveira

Resumo

O Presente artigo pretende, a partir de uma abordagem dedutiva, produzir uma breve análise sobre a possibilidade de reabilitação do indivíduo acometido de desordem de personalidade, popularmente conhecido psicopata. Em vista da dificuldade encontrada pelo sistema penalista brasileiro, em conseguir adequar uma pena que condiz com a realidade diferenciada do delinquente infrator possuidor de transtorno mental, frente às barreiras da própria legislação penal e constitucional brasileira. Nosso trabalho pretende levar a público através desse artigo, o problema que está alastrado ocultamente nas entranhas da sociedade e na população carcerária, com objetivo de produzir uma solução, frente a dificuldade de uma política criminal mais adequada.

 

 

Palavras-chave:

psicopatia, transtorno mental, psicologia forense, reincidência

 

 

Abstract

The present article aims, from a deductive approach, producing a brief analysis on the possibility of rehabilitating the affected individual personality disorder, popularly known psychopath. In view of the difficulty encountered by the system punitive Brazilian getting fit a shame that befits differentiated delinquent offender possessed of mental disorder, facing the barriers of own criminal law and constitutional Brazilian. Our work aims to go public through this article, the problem is widespread secretly in the bowels of society and the prison population, in order to produce a solution, the difficulty facing a criminal policy more appropriate.

Keywords:

psychopath, mental disorder, forensic psychology, relapse.

 

 

 

 

SUMÁRIO:

1. Introdução – Psicologia Criminal. 2. Causas biológicas, psicológicas e sociais do crime3. A Psicopatia. 4. A psicopatia dentro do sistema penitenciário. 5. Considerações Finais. Referências.

 

  • Introdução – Psicologia Criminal


 

Antes de adentrar no tema principal do presente trabalho, mister se faz abordarmos as raízes da psicopatia, como também do crime, antes disso, no entanto, abordaremos ainda, acerca do Instituto da Psicologia Criminal, que nos subsidiará ao raciocínio que obteremos adiante, pois tal matéria se faz como sustentáculo de todo o trabalho.

Psicologia Criminal, conhecida também como psicologia forense, ou judiciária, consiste na relação entre dois institutos, a Psicologia e o Direito, que, entrelaçados, através da perspectiva subjetiva psicológica, buscará a proteção da sociedade e a defesa dos direitos do cidadão. Sendo assim, a Psicologia Criminal, estende-se aos casos presentes nos tribunais, ou seja, sempre que a conduta humana, causadora de dano, for tipificada em norma penal incriminadora. O objetivo é analisar o comportamento humano que gera dano a outrem, observar a conduta criminosa buscando identificar as suas motivações, as circunstâncias psico-sociais e o que levaram o indivíduo a praticar ato que contrarie a norma jurídica. Ou seja, o foco da psicologia forense gira em torno do crime e dos seus sujeitos.

Basta assim para nós, por quanto não abordaremos sobre o sujeito, conceituar o crime, conceito habitual para o criminoso psicopata, que na visão de Walter Coelho, o crime é o fato humano típico e ilícito, em que a culpabilidade é o pressuposto da pena, e a periculosidade, o pressuposto da medida de segurança. (FABRIS, 1991). Ainda na mesma obra, Mirabete afirma que "para a existência do crime é necessária uma conduta humana positiva (ação em sentido estrito) ou negativa (omissão)". Havendo também outros requisitos genéricos como a tipicidade, no qual a conduta humana provoca um resultado previsto como delito, e a "antijuridicidade", que é o fato que contraria o ordenamento jurídico, a culpabilidade, que é a reprovação que se faz a um indivíduo por ter podido atuar de modo diferente do que atuou, portanto contrário ao Direito.

 

Após essa conceituação de crime, Ferri (1931) nos traz uma classificação do homem criminoso, em 5 categorias: o delinqüente nato, tendo como sintomas da criminalidade a precocidade e a reincidência, tornando esses indivíduos de difícil correção e de elevado grau de periculosidade, já que cometem delitos desde tenra idade, e mesmo com a possibilidade punitiva, cometem novamente, pois adotam esse estilo de vida, ficando a margem da concepção ético social; quanto a delinquência habitual, que segundo Ferri, é a mais comum, além de o indivíduo ter fraca readaptabilidade  social e ser recidivista, é um sujeito que vive em estado  de miséria material e moral, apresenta carga hereditária e desde cedo comete faltas leves, recebendo influência negativas nas prisões e de más companhias, cristalizando-se na criminalidade. Esse indivíduo possui dificuldade em encontrar emprego regular.

Segundo Andrade (1997), a única diferença entre o criminoso e aquele que age conforme à lei consiste no fato. Apesar de semelhantes, os institutos da reincidência e dos antecedentes, se contrapõem, de forma que os antecedentes são todos os atos e condutas da vida do agente que praticou o delito, e que interessam na avaliação do crime e da personalidade do mesmo.

 

2. Causas biológicas, psicológicas e sociais do crime.

 

Necessário se faz o questionamento da origem do crime, e de seus agentes. Existem muitas teorias a respeito da investigação teórica das causas do crime, porém nenhuma capaz de gerar um padrão comportamental do delinqüente. Ou seja, cada teoria consegue se adequar a uma situação fática, porém impossível se faz a criação de uma teoria que explique o que gera a criminalidade de forma geral. Isso acontece pois o conceito de crime é muito amplo, não havendo uma teoria geral sobre a criminalidade, pois que não há uma criminalidade geral. O instituto do crime é muito pormenorizado. Cada delito envolve um universo de nuances e variáveis, circunstâncias inerentes ao indivíduo e a situação, que faz com que cada crime tenha origens próprias, muitas vezes nunca investigadas. Em outros dizeres, crimes diferentes tem causas diferentes. Por exemplo, o menor que rouba com o objetivo de alimentar sua dependência química por drogas tem uma motivação completamente diferente daquele que comete um assassinato por prazer, ou que frauda o sistema financeiro para locupletar-se. No entanto, todas essas condutas são configuradas com a mesma classificação: crime.

Uma das linhas de pesquisa é aquela em que se busca no indivíduo as causas do crime em que ele comete. Nesse caso há dois moldes teóricos, um é voltado para o ponto de vista biológico acerca do comportamento criminoso. Dessa forma, mesmo que tal teoria esteja descartada, não podemos deixar de citar o maior expoente desse limiar teórico, Cesare Lombroso. Para ele, a etiologia do crime é eminentemente individual e deve ser buscada no estudo do delinqüente. É dentro da própria natureza humana que se pode descobrir a causa dos delitos.  Lombroso vai extrair da autópsia de delinqüentes uma "grande série de anomalias atávicas, sobretudo uma enorme fosseta occipital média e uma hipertrofia do lóbulo cerebeloso mediano (vermis) análoga a que se encontra nos seres inferiores". Assim, surgiu a hipótese da aproximação do indivíduo criminoso a figura do animal irracional, e do homem primitivo, porquanto tal homem seja considerado diferente, fisicamente, psicologicamente do homem dos nossos tempos. Lombroso cria um modelo anatômico, pelo o qual o indivíduo por ele classificado como atávico, possuía uma série de predisposições físicas pelas quais o aproximavam do ser animalesco, o delinqüente nato. O criminoso nato seria caracterizado por uma cabeça sui generis, com pronunciada assimetria craniana, fronte baixa e fugidia, orelhas em forma de asa, zigomas, lóbulos occipitais e arcadas superciliares salientes, maxilares proeminentes (prognatismo), face longa e larga, apesar do crânio pequeno, cabelos abundantes, mas barba escassa, rosto pálido. Para ele também, existe o louco moral, que apesar de possuir, aparentemente, as condições físicas e intelectuais de um homem comum, na verdade ele tem baixa noção de senso moral. É um homem perigoso pelo seu terrível egoísmo. É capaz de praticar um morticínio pelo mais ínfimo dos motivos.

A outra linha de pesquisa é aquela que busca no psíquico do delinqüente, a causa do crime. Tal teoria, encabeçada por Sigmund Freud, o pai da psicanálise, a conduta criminal, o comportamento anti-social e violento é originária de um conflito entre as figuras do Id, ego e Super Ego. Se o indivíduo tem o super ego muito fraco, que é responsável pela sua noção de moral, relacionando-se com o barramento de condutas, ele não conseguirá conter o Id, responsável pelo afloramento de seus instintos e desejos ocultos. Dessa forma, o indivíduo transgredi a lei moral, com o objetivo de se fazer realizado o desejo do Id, passando por cima de qualquer coisas para ver o seu anseio realizado. O delinqüente não sente remorso de suas atitudes, simplesmente ele tem sua própria noção de certo e errado. O contrário pode resultar numa equação criminosa também, o indivíduo possuindo o Super Ego muito aflorado, se repreende muito de suas condutas, e se sente envergonhado a todo momento, busca o crime para atingir a punição, como uma forma de se penitenciar por sua conduta.

Outros teóricos, apesar de considerarem de suma importância o estudo biológico da origem da criminalidade, apontam que na verdade, a real raiz do crime está nas suas causas sociais. Quando o indivíduo comete um crime contra alguém, como por exemplo, um homicídio, ele não está causando dano não somente a outrem, mas a coletividade, por quanto legitimatária nos interesses dos bens jurídicos. A sociedade é a própria norma, formada de laços sociais, como bem predisse o sociólogo Emile Durkheim, sem as normas sociais, a sociedade encaminhar-se-ia para o Caos. O crime é uma transgressão social, só ocorre quando o indivíduo quebra uma norma, mesmo havendo o acordo de vontades entre as pessoas, sempre haverá aqueles indivíduos anômalos, oriundos de defeitos do próprio sistema, que agem de forma errada. Mas a culpa não recai sobre eles, pois para a sociologia, isso seria uma patologia social. O crime, portanto, é uma doença na sociedade, que deve ser medicada sob o ponto de vista da comunidade ao redor do delinqüente.

3. A psicopatia

No século XIX a expressão "psicopatia" (do grego: psyché = alma; pathos = paixão, sofrimento), era utilizada pela medicina de forma geral, com o objetivo de se designar uma doença mental qualquer, não havendo ainda uma ligação entre a psicopatia e o comportamento transgressor. Tal termo é claro passou por uma evolução até os dias de hoje, onde sempre que ouvimos a palavra psicopatia, vem à mente uma conduta criminosa, sorrateira. Recorda-se também dos grandes filmes de Hollywood e seus personagens ligados a psicopatia, como Hannibal Lecter de "O silêncio dos Inocentes", e até mesmo inúmeras figuras reais, que ilustraram a história do crime no Brasil, como por exemplo, o Francisco de Assis Pereira, mais conhecido como o Maníaco do Parque, ou o bandido da luz vermelha. Indivíduos que de modo geral, nos remetem características semelhantes, entre elas, a capacidade de conseguir esconder o seu comportamento anti-social, o que o permite aproximar-se da vítima com maior facilidade.

"Os psicopatas possuem a capacidade de tentar esconder o seu comportamento antissocial, aparentando serem homens civilizados e charmosos. Dessa forma conseguem manipular, ou seja, fragilizar a defesa de suas vítimas. Indivíduos considerados impulsivos, emocionais superficialmente, apresentando indiferenças a apegos pessoais, abraçando de maneira fugaz atitudes agressivas e indiferenças quanto ao acato às normas e obrigações, desencadeando a posturas antissociais "(CLECKLEY, 1941).

Apesar de muito evidenciada pela mídia, a figura do psicopata muitas vezes não se relaciona a uma doença mental. Este estudo iniciou-se no séc. XVIII, quando os cientistas começaram a relacionar o "livre arbítrio" com as "transgressões morais", questionando se esses indivíduos, objeto da pesquisa, eram capazes de noção do certo e errado e aplicá-la a sua conduta, se poderiam entender as conseqüências oriundas de sua conduta.

Segundo o Código Internacional de Doenças (CID10 – F60.2), o transtorno de personalidade dissocial, que é o que mais se aproxima do conceito de psicopatia possui as seguintes características:

 

"Transtorno de personalidade caracterizado por um desprezo das obrigações sociais, falta de empatia para com os outros. Há um desvio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabelecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experiências adversas, inclusive pelas punições. Existe uma tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalização plausível para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade."

A psicopatia pode ser diferenciada de outros transtornos de personalidade, baseado em suas características de sintomas interpessoais (egocêntricos, manipuladores, determinados e frios), afetivos (apresentam labilidade, superficialidade emocional, incapacidade de manter vínculos estáveis e falta de sentimento de remorso ou culpa) e comportamentais (criminalidade e uso de substâncias psicoativas).

Segundo o psicólogo Chrstian Costa:

 

"Após anos de evolução do conceito, hoje, pode-se resumir o conceito de Personalidade psicopática, atual Antissocial, caracterizada principalmente por ausência de sentimentos afetuosos, amoralidade, impulsividade, principalmente falta de adaptação social e incorrigibilidade (COSTA, 2008)."

Assim podemos perceber, que o psicopata, acima de tudo, é uma pessoa distante da lei, das pessoas em geral. Ele pode aparentar, uma pessoa comum, porém isso não condiz com seus desejos. O psicopata possui desejos, que na maioria das pessoas encontram-se ocultos, não manifestos, e quando não ocultos, nunca exteriorizados, pois as pessoas não acometidas de psicopatia possuem um código de conduta interno, que barrará as condutas consideradas anti-sociais. Para o psicopata não, nada é mais importante do que a realização do seu objetivo, sendo que quaisquer sentimentos, qualquer afetividade, não possuem influência sobre ele. Aqui, encontra-se a dificuldade do nosso estudo, de maneira a querer investigar a possibilidade de reabilitação de um psicopata. Se nenhuma punição tem efeito sobre ele, como trataremos desse indivíduo na sociedade? Abordaremos mais adiante.

Vale transcrever um trecho da obra Psicopatia – a máscara da sanidade:

 

Psicopatas não criminosos podem apresentar uma forma de violência tácita, intimidação e autopromoção, mentira e manipulação, através da qual eles podem tirar vantagem sem que seja necessário o confronto direto com a polícia ou com a justiça, tornando-se extremamente violentos somente quando seus planos e desejos são obstaculizados e quando vem à tona a sua baixa tolerância à frustração (Apud TRINDADE, 2009).

Psicopatia, então, é entendida pelos cientistas como um tipo de personalidade que tem como principal característica, a ausência completa de remorso e preocupação com o outro. Psicopatas possuem déficit emotivo, não se importando com o sofrimento alheio. Superficialmente, podem ser encantadores, manipuladores, egocêntricos e tem uma mania de grandeza exarcerbada. A impulsividade é inerente a eles, costumam assumir risco e não planejar o futuro. Cleckey foi um dos principais estudiosos a apresentar uma concepção definitiva da psicopatia, em seu livro "The Mask of Insanity", o autor foi capaz de identificar na década de 40, 16 características diferentes que definem ou compõem o perfil clínico do psicopata. Tais como:

a) Charme superficial e boa inteligência;

b) Ausência de delírios e outros sinais de pensamento irracional (por isso a psicopatia não deve ser considerada doença mental, mas sim um transtorno mental);

c) Ausência de nervosismo;

d) Não confiável;

e) Falsidade e falta de sinceridade

f) Ausência de remorso ou vergonha;

g) Comportamento antissocial inadequadamente motivado;

h) Julgamento deficitário e falha em aprender com a experiência;

i) Egocentrismo patológico e incapacidade de amar;

j) Deficiência geral nas reações afetivas principais;

k) Perda específica de insight;

l) Falta de resposta nas relações interpessoais gerais;

m) Comportamento fantástico e desagradável com, e às vezes em, bebida;

n) Suicídio raramente concretizado;

o) Vida sexual e interpessoal trivial e deficitariamente integrada

p) Fracasso em seguir um plano de vida.

Esse rol exemplificativo das características de um psicopata foi, durante muito tempo, fielmente seguido pela psicologia, servindo de parâmetro para identificação de indivíduos com transtornos anti-sociais. Como se pode observar pelos caracteres apresentados, o indivíduo psicopata é uma contradição: porquanto consegue atrair o olhar do outro, dar sinais de inteligência muitas vezes, conseguindo ser coerente e tranqüilo com suas respostas quando provocado, porém, quando deixado à própria sorte assume seu caráter eminentemente perverso, contrariando tudo que pode ter dito, e sem remorso algum, aplicando seu comportamento selvagem. Sem delírio, sem alucinações ele pratica sua conduta, fiel ao que está fazendo, com a pura consciência, porém, por mais horripilante que seja o ato praticado, nenhuma conseqüência posterior é trazida para sua consciência. Exemplificando, matar uma pessoa com a corda de um piano, ou com um simples cadarço de tênis é tão normal para um psicopata, como o ato de passar a manteiga no pão. O Julgamento que ele faz é praticamente o mesmo, na verdade, nem há. A única escolha é deixar se levar pelos impulsos.

4. A psicopatia dentro do sistema penitenciário

Agora que estamos familiarizados com os conceitos e características da psicopatia, essa parte do trabalho se faz de suma importância. Agora, inserimos a figura do psicopata no sistema penitenciário brasileiro, com o objetivo de investigar a possibilidade de reabilitação de um psicopata dentro de um presídio, ou se a punição restritiva de liberdade tem efeito negativo sob a personalidade anti-social.

Cabe ressaltar aqui que nem todo psicopata é, necessariamente criminoso. No entanto "devido à falta de empatia, característica inseparável dos psicopatas, [...] reside uma grande probabilidade de esses indivíduos adentrarem no mundo criminoso quando motivados pela ânsia da plena e única satisfação de seu ego" (OLIVEIRA, 2011).

Para verificar a situação penal do psicopata, deve-se primeiro que se decida acerca da possibilidade de responsabilização pelos crimes que cometem. A imputabilidade de alguém é considerada a partir da capacidade de conseguir entender a ilicitude de sua conduta, e se pratica de forma consciente.

O Código Penal brasileiro, em seu Art. 26, considera inimputável o cidadão que  "por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento". Logo, para configurar a inimputabilidade do cidadão é necessária que haja uma relação causal entre a doença mental e o crime praticado, pois que ao tempo do delito, o indivíduo fosse incapaz de entender a ilicitude de sua conduta.

O Código Penal também prevê a semi-inimputabilidade aos indivíduos que possui capacidade de auto-determinação limitada. Existe a capacidade de entendimento, mas é inibida por fatores mentais. A esses indivíduos pode ser aplicado a pena, porém de forma reduzida. Para os criminosos inimputáveis a sanção penal é diferenciada, não são aplicadas as penas privativas de liberdade, mas as medidas de segurança, cominadas em internamento hospitalar ou casa psiquiátrica.

A jurisprudência brasileira, frenquentemente, defende a semi-inimputabilidade dos psicopatas. Os que defendem tal posição, afirmam que apesar de tais indivíduos possuírem completo discernimento de sua conduta, tal é limitada por seus transtornos mentais, assim como sua capacidade de auto-determinação e sua vontade.

 

"Frente a esses elementos todos, qual a capacidade de imputação do examinado? Não será plena, por certo. Uma personalidade desarmônica, com graves desvios constitucionais de agressividade incontida e inconteste, reagindo frente a emoções primárias e tendo uma acentuada deficiência de crítica, não poderá ser completamente responsabilizada por seu ou seus delitos. Se a emoção sobrepuja a crítica – como já se fez sentir – se o impulso primário se efetiva sem a contenção dos valores éticos; se a impulsividade é evidente, como se falar em plena capacidade de imputação? (MARANHÃO, 1995 apud OLIVEIRA, 2011).

Com esse tipo de decisões judiciais, há um grande obstáculo na reabilitação do preso psicopata. Colocar tais indivíduos em mesmo tratamento que aplicado ao resto da população carcerária nos parece um grande erro. Primeiramente porque já foi provado que a punição não tem efeitos positivos sobre a personalidade do psicopata, pois ele não é acometido por sentimentos de culpa, afetividade, nem remorso, a pena não pode lhe causar a penitência. O psicopata ao praticar sua conduta delitiva, está a assumir o risco, porquanto não entende a gravidade de sua conduta ou no mínimo não se importa. O que há na verdade no psicológico anti-social é uma grade de prioridades, onde ele sempre vai escolher pelo ato que condiz com sua postura instintiva, de seus desejos aflorados. A prisão para um psicopata, não lhe altera nada, tão somente o ambiente de atuação. O maior encarceramento para um indivíduo com esse tipo de transtorno, não são os muros de um presídio, mas sua maior prisão são as fronteiras de sua mente. Pois o mais doloroso para ele é privar-se de executar seu desejo, frente a limitar-se fisicamente, já que nem pode entender a gravidade da situação.

Outro caso prejudicial do confinamento dos psicopatas nos presídios é o seu comportamento danoso em relação à população carcerária. Dentro de uma penitenciária existe uma comunidade criminosa, em que sua maioria, foi penalizada por cometido de delitos menores, como roubos, tráfico de drogas, etc. A mistura entre diversos tipos de indivíduos é extremamente prejudicial à reabilitação dos indivíduos influenciados pelos psicopatas, pois o encarceramento não cerra a atuação desse tipo de indivíduo. Resultado, o presídio tornará-se-á uma fábrica de reincidentes.

Dessa forma, abre-se o questionamento: o que fazer com os psicopatas, posto que a reabilitação dentro de um presídio é impossível ? E que provavelmente ao sair, cometerá os crimes da mesma forma, já que não alcançou a cura.

Grande parte dos estudiosos defendem a pena de morte ou prisão perpétua para esse tipo de indivíduo sofredor de transtorno mental. Além de ser terminantemente vedada pela constituição esses dois tipos de apenamento, é muito complicado identificar as pessoas que possuem tal transtorno. Podendo ocorrer em erros judiciais se tal hipótese fosse adotada.

Oliveira, por outro lado, acredita que o sistema penal brasileiro é carente no tocante à identificação dos criminosos psicopatas e ao acompanhamento destes (OLIVEIRA, 2011), principalmente por não haver "exames padronizados no Sistema Penitenciário Brasileiro para a avaliação da personalidade do preso e a consequente previsibilidade de reincidência criminal" (MORANA, 2003 apud OLIVEIRA, 2011). Para essa autora, seria interessante a separação entre os indivíduos que sofrem de psicopatia e os chamados criminosos, de modo que aqueles não prejudiquem a reabilitação destes. Isso se dá porque os psicopatas "apresentam resposta insuficiente nos programas de reabilitação e os mais elevados índices de reincidência criminal (OLIVEIRA, C. A.; MATTOS, 2010 apud OLIVEIRA, M. V., 2008). Esse é o sistema adotado pelo Canadá, por exemplo. Após serem identificados os criminosos psicopatas, "eles são postos em celas separadas, fora do contato com os presos recuperáveis, que tem algum grau de sentimento" (PIRES; LEITES, 2011).

5. Considerações Finais

Talvez a psicopatia possa ser encarada por alguns como a verdadeira manifestação do mal absoluto. Não obstante muitos acreditarem, que o homem é originariamente bom, a sociedade o corrompe, com a psicopatia é diferente, por isso prostramos na dificuldade de encerramento do tema. Como reabilitar o irreabilitável? Como ressocializar aquele, que, por natureza é eminentemente anti-social? Como atribuir um caráter punitivo da pena a quem é incapaz de se sentir culpado? O mal, sempre pode ser remediado, mas aquilo que é considerado incurável, que medidas devemos tomar?

O sistema penal brasileiro necessita urgente de mudanças na política criminal, necessariamente em relação aos psicopatas. Enfrentamos graves problemas que se chocam constantemente: muitos assassinos em série no Brasil, pela gravidade dos seus crimes, a eles foram aplicadas penas exorbitantes, muitas acima de 100 anos. A dificuldade aparece quando a pena chega ao seu limite constitucional de 30 anos, o condenado deveria entrar em liberdade, porém como ele continua demonstrando alto grau de periculosidade, ele é mantido isolado da sociedade de alguma forma. A própria sociedade não permite que ele saia, e é encontrada alguma brecha na lei para mantê-lo aprisionado, ou ele é encaminhado a hospital psiquiátrico com o objetivo de tratamento, e ali, corre o risco de permanecer a vida toda.

Há uma grave contraposição de princípios, um é o direito ao indivíduo de liberdade assim que encerra a pena aplicada pelo Estado, o outro é o direito da sociedade à segurança. Apesar do direito à liberdade, como garanti-la a um indivíduo que por sua natureza, irá cometer novos crimes?

Continuamos tratando a todos como se fossem iguais mesmo enquanto é evidente sua desigualdade. Não há tratamento reconhecidamente eficaz contra a psicopatia. Porém, uma coisa é certa: eles requerem uma atenção especial, diversa daquela dada aos outros presos, pois constituem um perigo constante para a sociedade.

Enquanto, crentes absolutos na inata bondade humana, continuamos a conviver com 46.000 homicídios anuais e com personagens que já estão tornando-se lendários: o "Pedrinho Matador", o "maníaco do parque", o "Chico picadinho", o "Champinha" e tantos outros, sem nomes, que continuam a cometer suas atrocidades, dentro e fora dos presídios, antes, durante e depois da prisão.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS


ANDRADE, V.R.P. A Ilusão de Segurança Jurídica do Controle de Violência à Violência do Controle Penal. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 1997;

CLECKLEY, H.M. The Mask of Sanity, 1941.

Versão digital acessada em 05 de novembro de 2013, de www.cassiopaea.org/cass/sanity_1.PdF;

COSTA, C., 2008. Palestra proferida em 30 e 31 de maio de 2008.

FABRIS, S.A. Teoria Geral do Crime. Porto Algre, 1991;

FERRI, H. Princípios do Direito Criminal. O Criminoso e o Crime. São Paulo, Acadêmica, 1931;

LOMBROSO, Cesare; L’uomo Delinquente. 1876;

 

OLIVEIRA, Mariana Vasconcelos. O tratamento dispensado ao criminoso psicopata pela legislação penal brasileira. Jus Navigandi,

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

MOISÉS BENTO LACERDA NETO

DAVID JOSÉ DE OLIVEIRA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


PSICOLOGIA CRIMINAL: UMA ABORDAGEM ACERCA DA POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO DO PSICOPATA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

MONTES CLAROS

2013