Silvana Silveira de Farias1, Luzinete Chagas Nascimento2, Fabiana Torquato Braga3, Jaqueline Alcântara Lucas4.


RESUMO:
Esse artigo discute a aplicação da psicanálise a educação ou vice-versa, mostrando os pontos que favorecem essa conexão e os que desfavorecem, além mostrar as contribuições freudianas ao campo do desenvolvimento humano como um todo, procura elencar o interesse dos educadores em aproximar a educação da psicanálise e suas dificuldades frente à inquietude das respostas que a psicanálise almeja solucionar. Concluímos que apesar de todos os pós e contra para fazer uma relação mesmo que não-direcional entre ambas, isso se torna um pouco mais real quando elas assumem a função de uma complementar a outra de forma que possibilite um melhor desenvolvimento do ser humano no seu meio social.

PALAVRAS - CHAVE: psicanálise, educação, desenvolvimento humano

O presente artigo consiste numa abordagem sobre psicanálise e educação, com o objetivo de explicitar motivos que justifiquem as divergências entre elas e as razões que as aproximam. Para tanto, utilizaremos o método de análise bibliográfica, através de leitura de textos que versa sobre o assunto, conforme aparecerá na exposição do trabalho, que será desenvolvido a partir de quatro argumentos, a saber: 1) a composição da vida psíquica na concepção de Freud; 2) razões que justifiquem a impossibilidade desta relação; 3) motivos que contrariem a impossibilidade da referida relação e 4) as nossas conclusões sobre a temática em questão.
Nesse artigo não temos a pretensão de ligar intrinsecamente a educação com psicanálise, apesar de uma complementar a outra, visto que dentro da pesquisa bibliográfica feita percebemos que Freud pouco escreveu sobre esse tema, apesar de muito do que ele escreveu hoje se aplicar a educação, principalmente na inserção de crianças com esquizofrenias, autistas, entre outros.
No presente trabalho pretendemos mostrar as possíveis possibilidades de uso das análises psicanalíticas no campo da educação, tanto para a aprendizagem de alunos com necessidades especiais como para a melhor compreensão dos alunos no geral, por parte do professor, a fim de poder amenizar os problemas de sua práxis pedagógica.
Pensar na relação entre psicanálise e educação é antes de tudo, na nossa compreensão, analisar o sujeito que é objeto indispensável tanto para a existência da psicanálise como para a educação. Esse sujeito é o "eu", o homem que é consciente de si, do outro e do mundo e que Freud, em suas pesquisas, analisa a composição da vida psíquica deste homem a partir de três instâncias, duas delas de dimensões inconscientes, o Id e o Superego, e apenas uma de caráter consciente, o Ego.
A relação entre o Id, o Superego e o Ego forma a estrutura do mecanismo da vida psíquica, em que o Id é considerado por Freud como sendo o conjunto dos impulsos inconsciente da libido, ou seja, a liberação de energia relacionada com o desejo sexual do indivíduo; ele é a fonte da energia biológico-sexual; é o inconsciente que se encontra acima dos valores morais de qualquer cultura, ele é amoral, é a dimensão egoísta da pessoa. O Id, apesar de ser, as pulsões de natureza sexuais que são regidos por princípios de prazer e que exige satisfação imediata do mesmo, ele não se restringe ao ato sexual genital, mas aos desejos que podem ser satisfeitos em qualquer parte do nosso corpo. Como por exemplo: as três fases da sexualidade humana, descoberta por Freud, em que órgãos que sentem prazer e objetos que dão prazeres se modificam de acordo com a idade da pessoa. Assim, ao nascer, a criança vai descobrindo a boca como sendo primordialmente a sua fonte de prazer que é estimulado pela ingestão de alimentos como o seio materno, a mamadeira, a chupeta, etc. Essa fase é chamada de oral.
Aos dois anos de idade a criança atinge a fase anal em que o seu prazer se dá pelo ato de reter ou expulsar as fezes. Esse processo é conhecido como a maturação do controle muscular de base dos esfíncteres. Ao atingir os três ou quatro anos de idade, a criança transfere a sua fonte de prazer para os genitais, chamada de fase fálica ou edípica, nesta fase é comum a criança buscar meios de masturbação e a diferenciar sexualmente os meninos das meninas.
Essas fases, comandadas pelo Id, as mães se tornam o objeto de desejo e de prazer dos meninos e os pais para as meninas. Daí surge o complexo de Édipo, que é o desejo incestuoso pela mãe ou pelo pai, que é fundamental na organização da vida psíquica da pessoa e do sentido da vida de todos nós.
Ao contrário do Id, vem o Superego por volta dos cinco anos de idade que é o responsável pelas diferenças do homem em relação aos demais animais, que censura as pulsões liberadas pelo Id do indivíduo. O Superego é fruto da interiorização da autoridade familiar e tem o seu desdobramento na relação da pessoa com as demais instâncias da sociedade. Das relações estabelecidas com a sociedade, às pessoas passam por um processo educacional que contribui para a interiorização de ideais, valores e modos de comportamento propostos pela sociedade através da substituição da autoridade dos pais pela autoridade de educadores, professores, etc. Esse processo educacional é definido pela cultura de uma sociedade ou de uma civilização que impõem regras de conduta moral para os indivíduos, modelando um homem ideal que contribui para a destruição da liberação de energia relacionada com a realização do desejo sexual das pessoas.
Se de um lado temos o Id que leva a pessoa a realizar os seus prazeres de forma imediata sem se submeter a nenhuma censura e por outro lado temos o Superego como sendo a censura moral, a repressão das pulsões do Id, então, daí surge a terceira dimensão da vida psíquica do homem que é o Ego. Ele é responsável pelo equilíbrio entre os dois anteriores, ou seja, ele é o responsável pela os objetos que satisfaçam os desejos do Id sem transgredir as exigências do Superego, que é chamado por Freud de princípio da realidade.
O Ego, o eu consciente, obedecendo ao princípio da realidade, se desdobra em reunir num mesmo sujeito os elementos dos desejos insaciáveis, a repressão desses desejos e as exigências do mundo exterior. E a não observância de um desses elementos faz com que o Ego não cumpra o seu papel. Isso faz com que reste ao homem, o eu consciente, uma vida angustiada.
Daí nos perguntamos, como educar esse sujeito consciente para viver a sua angústia? Quais as contribuições que a psicanálise pode trazer para a educação deste homem?
Dentro desses questionamentos as razões que justificam a impossibilidade da relação Psicanálise e Educação permeiam diversas discussões no campo psicanalítico e educacional, conforme Castanho e Silva (2005, p.72) "Freud chegou a pensar que a educação fosse responsável pelas inibições sexuais, por incutir nas pessoas o medo, as noções de pecado". Entre os educadores o grande desafio é separar o que é próprio da clínica de psicanálise e o que corresponde de fato à educação.
Com o passar dos tempos as discussões a cerca desse tema vão aumentando e o que para muitos era impossível vai se tornando mais próximo, para Gaviolli (2008) embora Freud não tenha feito uma relação direta entre educação e psicanálise nas suas análises clínicas o tratar em psicanálise vai se construindo a partir do tratar em medicina e de uma articulação como educar.

Freud discute a educação a partir do interesse desse campo para a psicanálise, e é por isso que sua visão da educação é parcial. Cabe dizer também que Freud nunca se propôs a fazer um tratado sobre a educação, seu interesse sempre foi bastante específico. Aliás, na intersecção com outros campos, é próprio da psicanálise não se propor a construir um discurso, ou um tratado, ao contrário, seu propósito é desconstruir, questionar e subverter o instituído. (GAVIOLI, 2008, s/p)

O grande interesse dos educadores em aprofundar os estudos entre psicanálise e educação aos poucos vai diminuindo o abismo que havia entre ambas, possibilitando uma ação mais diretiva do educador, nesse intuito de direcionar a educação Castanho e Silva (2005) relatam que estudar as relações entre a psicanálise e a educação, nos torna mais sensíveis fazendo-nos repensar nossas práticas e nossas relações com os educandos, na direção de melhorá-las e buscar a realização de pessoas mais felizes, sem ingenuidade e sem aventureirismo.
A Psicanálise para Kupfer (1999, p.97) "pode transmitir ao educador e não a pedagogia uma ética, um modo de ver e entender sua prática educativa, ou seja, o uso da psicanálise pelo educador não é com o intuito de ele clinicar os alunos, mas sim com a intenção do mesmo compreender melhor o seu fazer educativo".
Freud (1913-1914) apud Ribeiro e Neves (2006) afirma que quando os educadores se familiarizarem com as descobertas da psicanálise, será mais fácil se reconciliarem com certas fases do desenvolvimento infantil e, não correrão o risco de superestimar a importância dos impulsos instintivos socialmente imprestáveis ou perversos que surgem nas crianças podendo, portanto, prestar melhor assistência às crianças no seu desenvolvimento psíquico e físico.
No decorrer de seus estudos Freud formulou três princípios que os educadores costumam direcionar com a educação, o primeiro desses foi o principio do prazer e lei do efeito, onde para nós educadores é visto da seguinte forma, o aluno busca aprender somente aquilo que lhe desperta desejo, lhe dar prazer; pela falta disso é que temos hoje em sala tantos alunos entediados com a aula, pela falta de desejo, o qual nos professores muitas vezes não instigamos em nossos educandos, com respeito à lei do efeito, vemos que no âmbito da educação a atenção dos alunos em tarefas escolares é bastante direcionada para uma nota ou uma punição, por meio da qual a aprendizagem acontece através da recompensa e da punição ( condicionamento), o que ocorreu muito durante o ensino tradicionalista no Brasil.
No segundo princípio da realidade e da aprendizagem por ensaio erro Freud vai além do princípio do prazer, onde o indivíduo busca o caminho indireto ao do prazer, na educação isso pode ser visto como o direcionamento para novas descobertas que o aluno vai fazendo ao longo de sua vida, deixando um pouco de lado às curiosidades sexuais e partindo para o desejo de sentir prazer no aprendizado escolar, nas amizades, no seu meio social, buscando o prazer também através do sucesso escolar, através da aprendizagem por ensaio e erro.
No terceiro princípio Freud relata a idéia de compulsão à repetição e as teorias da força do hábito, onde levando pra educação vemos que nosso aluno é acometido por esses vícios de memorização e de repetição, sem nem ao menos saber o porquê do que está fazendo, repetindo idéias fixas que muitas vezes atrapalham no seu aprendizado.
Embora esses princípios não tenham sido escritos pensados diretamente para a educação eles muito se aplicam a ela, portanto no decorrer dos estudos de Freud é que nos deparamos com semelhanças, discordâncias entre educação e psicanálise, são duas disciplinas que se opõem em estrutura, mas que uma pode contribuir com a outra numa relação de complementaridade, sem uma excluir a outra e sem ambas se misturarem completamente.
Diversas crianças com deficiências mentais são deixadas a parte do processo educativo, por causa da falta de profissionais ou de estudos especializados que direcionem essas crianças, a psicanálise como estuda o desenvolvimento humano desde a descoberta do inconsciente, consciente até a sexualidade, poderá dá suporte há muitos problemas de origem psíquica do sujeito aprendente.
Muito embora todas essas discordâncias a respeito da aplicação da psicanálise na educação ou vice-versa, chegamos às seguintes conclusões: Por mais que para muitos seja impossível fazer essa conexão mesmo que de forma longitudinal entre essas áreas, acreditamos que uma deve usar a outra como complemento em alguns momentos de sua prática, com respeito à aplicação da psicanálise na educação o maior receio dos mestres é saber separar o ponto em que é do clínico, do psicanalista, e o ponto em que ele enquanto professor pode atuar, não incorrendo o risco de transforma a escola numa clínica ou a clínica numa escola.
Em suma, apesar de todos os pós e contra a psicanálise pode ajudar a educação, dando um novo olhar ao educador sobre como é o comportamento dos alunos em suas faixas etárias e a forma como o mesmo possa contribuir para a formação da personalidade desse sujeito, ajudando-o a descobrir de forma responsável a sua sexualidade, o prazer em aprender novos conhecimentos e quem sabe idealizar uma educação especial para crianças que muitas vezes são excluídas do aprendizado como as esquizofrênicas, autistas, dentre outras, através de um aparato melhor da educação e psicanálise, promovendo uma formação mais humana aos que não são vistos dessa forma, ressaltamos que por mais que Freud não tenha feito essa ligação direcional entre psicanálise e educação é possível encontrar caminhos para melhorar a práxis de ambas, respeitando o sujeito e tentando mantê-lo em equilíbrio consigo e com a sociedade.





REFÊRENCIAS BIBLIOGRÁFICAS


CASTANHO, M. E., SILVA, D. R. Freud e a Educação: um olhar por cima do muro. In: Fórum Crítico da Educação ? Revista do ISEP v. 4, n. 1, out/2005.
Disponível em: <http://pepsic.bvs-psi.org.br/pdf/ptp/v8n2/v8n2a08.pdf> Acesso em: 07/out/09.


GAVIOLI, C. A. Articulações sobre o tratar e o educar na obra freudiana. In: FORMACAO DE PROFISSIONAIS E A CRIANCA-SUJEITO, 7., 2008, São Paulo. Disponível em: <http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=MSC0000000032008000100019&lng=en&nrm=abn>. Acesso em : 13/out/ 09.


KUPFER, M. C. Freud e a educação: o mestre do impossível. São Paulo: Scipione, 1989.


RIBEIRO, M. V. M., NEVES, M. M. B. J. A educação e a psicanálise: um encontro possível. Psicol. teor. prat., dez. 2006, vol.8, n.2, p.112-122. ISSN 1516-3687.