PROTEÇÃO AO SALÁRIO E AOS PRINCÍPIOS DA IRREDUTIBILIDADE, IMPENHORABILIDADE, INTANGIBILIDADE E IMODIFICABILIDADE.

 

Marcela Carrijo Marques

Rayssa Barcelos Cotrim

Samanta Alves Martins[1]

 

 

RESUMO: A sintetização do estudo sobre os princípios como base para a formulação das normas e sua influência na aplicação delas foi de extrema importância, visto cada norma possuir uma fundamentação que se guia por um princípio, seja ele específico ou geral. O trabalho como fonte salarial e direito fundamental do homem dispõe hoje da necessária proteção jurídica, tanto no âmbito constitucional como também na seara trabalhista. Para uma melhor compreensão do tema, a distinção imprescindível entre remuneração e salário fez-se necessária, uma vez que o assalariado se apossa destes institutos em uma relação empregatícia. Buscou-se com o artigo aprofundar-se de forma objetiva e clara sobre os quatro princípios que protegem o salário e, consequentemente, o trabalhador brasileiro, quais sejam: princípio da irredutibilidade, princípio da impenhorabilidade, princípio da intangibilidade salarial e princípio da imodificabilidade. O problema: “os princípios em questão são suficientes para efetivar a real proteção ao salário do empregado?” foi resolvido identificando se os princípios são realmente eficazes no que tange ao salário, e, para isso, destacou-se as funções dos princípios, apresentou-se os diferentes aspectos da proteção ao salário, exemplificou-se os princípios do salário de acordo com a legislação brasileira e analisou-se a relativização dos princípios que protegem o salário. Para tanto foi utilizada a técnica de pesquisa teórica, com objeto de estudo interdisciplinar, método dedutivo, e dados primários e secundários. Com o presente trabalho, notou-se que cada princípio possui suas exceções dependendo do caso concreto ao qual esteja inserido, portanto nenhum deles é pleno porque ocorrem variações, logo não efetivam a real proteção ao salário do empregado.

 

 

PALAVRAS-CHAVE: Trabalhador. Proteção. Exceções. Direito fundamental.

 

ABSTRACT: The synthesis of the study of the principles as a basis for the formulation of standards and their impact on the application of them was of utmost importance, since each standard has a foundation that is guided by a principle, whether specific or general. The wage labor as the source and fundamental human right now has the necessary legal protection, both within the constitutional framework as well as in harvest labor. For a better understanding of the topic, the essential distinction between compensation and salary was necessary, since the employee takes possession of these institutes in a relationship of employment. Sought to deepen the article is an objective and clear on the four principles that protect the wages and hence the Brazilian worker, namely: the principle of irreducibility, unseizability principle, the principle of inviolability of the principle and wage unchangeablelity. The problem: "the principles in question are sufficient to effect real protection to the employee's salary?" was solved by identifying the principles are really effective with respect to wages, and, therefore, stood out the functions of the principles presented to different aspects of salary protection, exemplified the principles of salary in accordance with Brazilian law and analyzed the relativity principles that protect the wages. For this we used the technique of theoretical research, with the object of interdisciplinary study, deductive method, and primary and secondary data. With this work, it was noted that each principle has its exceptions depending on the case to which it is inserted, so none of them are full because there are variations, so no real protection to actualize the employee's salary.

KEYWORDS: Worker. Protection. Exceptions. Fundamental right.

 

 

1. Introdução

 

 

Nos dias hodiernos, a relevância do salário é até mesmo óbvia. Quando o futuro empregado celebra o contrato de trabalho, almeja o recebimento da remuneração, que assegurará sua subsistência e de sua família.

Além de ser fato atual, o trabalho mediante salário demonstra a progressão da sociedade, que antes possuía o trabalho escravo como mero sistema de produção para o reconhecimento deste como um valor.

A Carta Magna assegura e protege o salário, portanto este é um direito fundamental do trabalhador e é caracterizado como crime quando ocorre sua retenção dolosa.

Diante da importância do salário destacada acima, o presente artigo abordará, na seara do direito do trabalho, o salário e os seus principais princípios dentre os quais estão emoldurados o da irredutibilidade, impenhorabilidade, intangibilidade e imodificabilidade.

Para tanto, o projeto de pesquisa possui como tema, “Proteção ao salário e aos princípios da irredutibilidade, impenhorabilidade, intangibilidade e imodificabilidade” que se refere à proteção ao salário dos trabalhadores garantidos constitucionalmente.

Neste sentido, surge o seguinte problema: os princípios em questão são suficientes para efetivar a real proteção ao salário do empregado? Levantada esta dúvida, traça-se como objetivo geral: identificar se os princípios são realmente eficazes no que tange ao salário e se há uma proteção real para os trabalhadores. Para tanto, visando alcançá-lo, se elucidam como objetivos específicos: a) destacar as funções que os princípios tem; b) apresentar os diferentes aspectos da proteção ao salário; c) exemplificar os princípios do salário de acordo com a legislação brasileira; e d) analisar as garantias que o Estado assegura ao trabalhador assalariado.

No presente trabalho foi utilizada a técnica de pesquisa teórica, que reconstrói conceitos, ideologias e polêmicas, tendo em vista aprimorar os seus fundamentos. Como objeto de estudo, tem-se o trabalho interdisciplinar, pois trabalha com mais de uma disciplina ligada à outra. O método utilizado foi o dedutivo, uma vez que parte-se de leis e teorias (geral) para explicar fenômenos particulares. Por fim, os dados empregados foram primários e secundários, visto que foram retirados da legislação, desta interpretada e de livros.

 

2. Considerações sobre Princípios e Regras

2.1. Conceito

Princípio, tem como significado origem, ponto de partida. Ele é claramente a base de todas as normas formuladas, que passam do plano essencialmente ético para o mundo jurídico, e se propaga por todo o ordenamento, influenciando direta e efetivamente, dando-lhes sustentação na interpretação e aplicação das normas.

Para Miguel Reale (MARTINS, 2009 apud REALE, p. 58):

 princípios são verdades fundantes de um sistema de conhecimento,como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pela necessidade da pesquisa e da práxis.

Já na definição de Celso Antônio Bandeira de Mello (MARTINS, 2009 apud MELLO, p. 58), princípio seria um mandamento nuclear de um sistema, trazendo o alicerce e se irradiando sobre diferentes normas, compondo-lhe o espírito e servindo para a exata compreensão.

É importante enfatizar que existem os princípios gerais, que são aqueles decorrentes da Constituição Federal, que se aplicam em regra, a todas as ramificações do direito, e os específicos, destinados a aplicação somente no ramo jurídico peculiar.

Para Canaris (ÁVILA, 2011, p. 36 apud CANARIS, p. 50, 53 e 55) as características que afastam os princípios das regras estariam relacionados com o conteúdo axiológico, onde os princípios, ao contrário das regras, possuem este conteúdo explicito e precisariam portanto de regras para sua efetivação. Outro quesito seria a interação com outras normas, onde os princípios de maneira adversa às regas, receberiam seu conteúdo de sentido exclusivamente por meio de um método dialético de complementação e limitação.

2.2. Funções dos Princípios e Regras

É de extrema importância salientar as diferenças existentes entre os princípios e regras, visto ser este um polêmico processo que, ao longo do tempo, sofreu diversas transformações. Para Humberto Ávila, (ÁVILA, 2011, p. 37). A importância que eles representavam no sistema jurídico, era clara, porém esta percepção, todavia, não era por si só apta para efetuar o discernimento necessário entre essas duas espécies.

Possuidores de três funções principais, os princípios podem ter funções distintas, sendo elas classificadas em: a) informativa, servindo como referencial e fundamento para o legislador na criação da norma jurídica, b) interpretativa, auxiliando na interpretação do sentido normativo, servindo de critério orientador para os aplicadores da lei e os intérpretes e c) normativa, já que os princípios se aplicam na solução de casos concretos, de forma direta ou indireta na hipótese de lacuna ou omissão da lei.

Ainda segundo Ávila, foi somente através da tradição Anglo-Saxônica que os princípios obtiveram uma dimensão significativa. Os escritos de Ronald Dworkin se propagaram no Brasil, e o tema teve um desenvolvimento peremptório. Seu estudo tinha como finalidade fazer um ataque direto ao Positivismo, especialmente ao modo aberto de argumentação que posteriormente ele iria denominar como sendo chamados de princípios.

As regras para ele são aplicadas de modo a excluir uma em favor de outra, (modo tudo ou nada) sendo que aquela não sobreposta à outra tem sua invalidade concedida. E os princípios, ao contrário das regras, são possuidores de peso, que são comparados, e ao ocorrer esta sobreposição, sua validade continua vigente. Estudos posteriores ao de Dworkin foram feitos por Robert Alexy que teve como consequência um verdadeiro ápice sobre o tema.

Ele partiu das premissas feitas por Dworkin e teve como objetivo aprimorá-las para que se tornassem ainda mais precisas, os princípios jurídicos, para ele, são uma espécie de normas jurídicas, em razão disto são estipulados deveres de otimização que se aplicam em vários graus, segundo as perspectivas normativas e fáticas. Alexy ainda ressalta que em caso de colisão entre dois princípios, o desenlace não se resolveria pela mera exclusão de um princípio sobre o outro, mas se resolveria pela ponderação entre eles, visando sempre o caso concreto em que se encontrar, ele afirma em sua ideologia que os princípios ao contrário das regras, não determinam de forma direta o resultado normativo (ÁVILA, 2011, p. 37).

E assim, a doutrina estabeleceu vários critérios para proporcionar uma distinção adequada entre os princípios e regras, sendo eles, em primeiro lugar, o critério quanto ao conteúdo – onde o princípio irá remeter a valores éticos, dignidade humana, segurança jurídica, fins públicos, razoabilidade, erradicação da pobreza, entre outros, podendo aludir tanto aos interesses coletivos quanto individuais, já as regras, por outro parâmetro, são taxativas, indicando uma permissão ou proibição, pode-se dizer que elas seriam a concretização dos valores e fins públicos defendidos nos princípios.

Em segundo lugar, há a estrutura normativa – sobre o qual os princípios são ideais a serem alcançados, sem que se tenha uma diretriz a ser seguida. As regras, no entanto, são normas predominantemente descritivas de comportamentos.

Em terceiro lugar, quanto ao modo de aplicação – onde ocorre a mais importante diferença entre as duas espécies. Os princípios indicam um valor, um fim, sendo aplicados de acordo com a dimensão de peso que assumem em determinada situação, cabendo ao interprete do direito fazer a ponderação dos princípios. As regras, por sua vez, são guiadas pela modalidade do tudo ou nada, são mais objetivas, e possuidoras de um caráter mais previsível trazendo com isso uma maior segurança jurídica.

3. Remuneração e as garantias de proteção ao salário.

 

 

3.1. Remuneração

 

 

3.1.1. Conceito

 

 

Antes de tratar a respeito do conceito de remuneração, faz-se necessário entender o significado etimológico da palavra. Preleciona Sérgio Pinto Martins (2009, p. 204) que remuneração vem do latim remuneratio, do verbo remuneror. A palavra é constituída de re, que significa reciprocidade, e muneror, que tem o sentido de recompensar.

Remuneração se compõe em um conjunto de vantagens, que compreende tanto o salário, que é a quantia paga ao empregado pelo empregador, quanto às gorjetas, que é o pagamento feito por terceiros.

É o complexo de prestações, seja em utilidades ou em dinheiro, que são recebidas habitualmente pelo empregado em favor da prestação de serviços, vindas de terceiro ou do empregador, porém provenientes do contrato de trabalho, de maneira que satisfaça as necessidades básicas do empregado e de sua família.

3.1.2. Distinção entre remuneração e salário

 

 

“Remuneração é o gênero do qual salário é espécie. Salário deriva de salarium, que vem de salis e significa sal, que era a forma de pagamento nas legiões romanas” (PINTO, Sérgio, 2009).

Segundo o artigo 457, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho, salário é o valor pago “diretamente pelo empregador” decorrente do contrato de trabalho. O salário é devido não só como contraprestação do serviço que foi prestado, como também o tempo em que o empregado ficou à disposição do empregador, executando ou aguardando ordens para serem cumpridas.

Já a remuneração é a soma dos pagamentos diretos, que são aqueles feitos pelo empregador, e os indiretos, realizados por terceiros. Ela engloba o salário, as gorjetas, que são pagamentos feitos por terceiros, subdivididas em: próprias, quando cedidas espontaneamente, e impróprias, quando se observa obrigatoriedade em concedê-las. As Gueltas, por sua vez, também são ofertadas por terceiros, porém, estas são pagas somente por fornecedores do empregador, com o devido consentimento deste, e tem por finalidade incentivar a venda de serviços ou produtos de determinado fornecedor.

Por fim, as gratificações, que podem ser gratificações expressa, isto é, aquelas ajustadas por escrito ou verbalmente, compreendem as: de função, de quebra caixa, por tempo de serviço, décimo terceiro salário, prêmios, percentagens e comissões. Já as gratificações tácitas, tem por elemento fundamental a habitualidade. Todas estas, são integrantes do salário.

3.2. Garantia de proteção ao salário

 

 

Nos dias hodiernos, a relevância do salário como direito fundamental do trabalhador é até mesmo óbvia. Quando o contrato de trabalho é celebrado, o motivo para a prestação do labor é o recebimento da remuneração, que garantirá tanto a subsistência do trabalhador como também de seu ceio familiar.

O trabalho mediante salário representa a passagem do trabalho escravo, como apenas um sistema de produção, para o reconhecimento, perante toda a sociedade, do valor do trabalho. Na sociedade atual, que é baseada no capitalismo, o fato de receber o salário faz-se essencial para a mantença da vida.

Preleciona Arnaldo Süssekind (1.999, p. 332 apud GARCIA, Gustavo, 2013, p.460):

A história do Direito do Trabalho se confunde, em grande parte, com a história da política dos salários; mesmo porque esse ramo da ciência jurídica objetiva, primordialmente, regular e proteger os interesses do trabalhador, e o salário é, indubitavelmente, o principal ou único meio de subsistência da família operária.

O artigo 3º caput da CLT é claro ao elencar a remuneração como um dos requisitos caracterizadores da relação empregatícia. Neste mesmo sentido, o artigo 7º da Carta Magna inciso X, confere uma proteção ainda maior no que tange aos trabalhadores, urbanos e rurais que é a proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa. Por tamanha importância deste direito trabalhista, torna-se necessária e indispensável à ênfase nos princípios que o protegem. Já que são eles que sustentam o ordenamento jurídico.

3.2.1. Princípio da Irredutibilidade Salarial

 

 

Como abordado acima, existem princípios que regem a proteção do salário. Um deles é o princípio da irredutibilidade, disposto no artigo 7°, inciso IV da Constituição Federal: “IV – Irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo.”.

O principio da irredutibilidade sustenta que o salário é irredutível e, nada mais legítimo, dada sua tamanha importância não somente individualmente para cada trabalhador, mas também para a sociedade como um todo.

Além de ser uma exceção, a redução salarial somente é valida se prevista por acordo ou convenção coletiva, que são instrumentos normativos vindouros de negociação coletiva.

Neste sentido é o destaque de Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2013, p. 462):

Diante da clareza do mandamento constitucional, tem-se que a redução salarial não poderá ser prevista, de forma válida, em sentença normativa, ainda que posterior a uma negociação coletiva frustrada. Não tendo sido possível ao empregador, ou ao sindicato da categoria econômica, obter essa redução de forma negociada, a Constituição da República indica dever ser respeitada a vontade coletiva dos trabalhadores, não podendo, nesse tema, ser substituída pelo poder normativo da Justiça do Trabalho.

Inúmeros são os inconvenientes resultantes de quando a redução salarial carece de justificativa plausível. Preleciona, ainda, Gustavo Garcia (2013, p. 462), que dentre eles pode-se versar a violação da dignidade da pessoa humana e a desconsideração do valor social do trabalho, os quais integram os fundamentos protegidos no artigo 1º da Constituição Federal: a afronta à valorização do trabalho humano; e a desconsideração dos objetivos fundamentais de “garantir o desenvolvimento nacional”, “construir uma sociedade livre, justa e solidária”, “promover o bem de todos” e “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”.

Afirma Francisco Antonio de Oliveira (2005, p. 375):

É até intuitivo que a redução de salário só tenha vez quando motivos ponderosos a justifiquem. Se assim não fosse, estar-se-ia simplesmente transferindo o ônus do empregador, o risco do empreendimento, para o trabalhador, medida que contraria o artigo 458 da CLT, que firma residência em regra geral. A irredutibilidade é a regra, a exceção haverá de ser regulada.

Portanto, desde que por motivo devidamente justificado, o “salário” em seu sentido estrito, próprio, técnico e legal, pode ser reduzido por meio de negociações coletivas. Mas vale ressaltar que não são todas as importâncias que compreendem a remuneração nem todas as parcelas de natureza salarial ou remuneratória que podem ser reduzidas.

O inciso IV se torna amplo, como no caso de uma empresa que não tem condições de manter o nível salarial dos empregados e, para não perderem o emprego, estes preferem concordar, em uma convenção coletiva, fazer acordos reduzindo o salário e também a jornada de trabalho.

Quando houver necessidade de utilizar a redução salarial ou a jornada de trabalho, o empregador deverá utilizar o disposto no artigo 2º, “caput” da Lei 4.923/65:

Art. 2º - A empresa que, em face de conjuntura econômica, devidamente comprovada, se encontrar em condições que recomendem, transitoriamente, a redução da jornada normal ou do número de dias do trabalho, poderá fazê-lo, mediante prévio acordo com a entidade sindical representativa dos seus empregados, homologado pela Delegacia Regional do Trabalho, por prazo certo, não excedente de 3 (três) meses, prorrogável, nas mesmas condições, se ainda indispensável, e sempre de modo que a redução do salário mensal resultante não seja superior a 25% (vinte e cinco por cento) do salário contratual, respeitado o salário-mínimo regional e reduzidas proporcionalmente a remuneração e as gratificações de gerentes e diretores.

Para que essa redução seja válida, deve estar previsto e assinado pelo sindicato’, que é o representante do empregado perante o empregador. E, se comprovado o benefício somente pelo lado da empresa, caso queira, o empregado acionará a Justiça do Trabalho em face de seu empregador e este poderá ter que reaver alguma diferença salarial.

3.2.2. Princípio da Impenhorabilidade

 

 

Por apresentar natureza alimentícia, o salário é considerado impenhorável. Assegurado no artigo 649, inciso IV, do Código de Processo Civil, o princípio da impenhorabilidade acentua que os salários são considerados impenhoráveis. A jurisdição alega que o salário de um empregado é o seu meio de sobrevivência, de seu sustento e também de sua família. Assim sendo, é considerado meio de subsistência de um trabalhador comum. Porém existem algumas exceções que merecem o devido destaque, como todo princípio este também não é absoluto.

Alice Monteiro de Barros (2004, p. 301) declara que existe a discussão a respeito de ser esta penhora ser absoluta ou relativa:

Discute-se sobre ser absoluta ou relativa a impenhorabilidade, entendendo os adeptos desta última tese que nos salários mais altos há uma parcela tida como alimentar, impenhorável, e outra que sobeja, passível de penhora. Como a lei não faz a distinção, sendo, ao contrário, de ofuscante clareza quanto à possibilidade de penhora apenas relativamente à pensão alimentícia, tem-se que a impenhorabilidade é inegavelmente absoluta.

O princípio em questão pode também ser considerado como um meio de proteção diante de seus credores, incluindo não só o salário como os seus agregados (férias, 13° salário). Mesmo quando o salário estiver depositado em conta corrente, o valor não perderá sua natureza salarial, portanto não perderá sua finalidade alimentar.

Ao tratar da penhorabilidade de apenas um percentual do salário, Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2003, p. 481) cita a Orientação Jurisprudencial 153 da SBDI-II do TST:

Mandado de segurança. Execução. Ordem de penhora sobre valores existentes em conta salário. Art. 649, IV, do CPC. Ilegalidade. Ofende direito líquido e certo decisão que determina o bloqueio de numerário existente em conta salário, para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a valor  revertido para fundo de aplicação ou poupança, visto que o art. 649, IV, do CPC contém norma imperativa que não admite interpretação ampliativa, sendo a exceção prevista no art. 649, §2º, do CPC espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia, não englobando o crédito trabalhista (Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho 03.08.2008).

De outro modo, quando o valor é destinado a aplicação financeira ou depósito bancário similar, o objetivo e a natureza do salário se perdem e este passa a ser penhorável. As hipóteses possíveis de penhora estão relacionadas com o pagamento de pensão alimentícia, os descontos podem ocorrer em vencimentos de magistrados, professores, funcionários públicos, soldo de militares, salários em geral incluindo subsídio de parlamentares (CPC, art. 649, IV), desconto em folha de pagamento da pessoa obrigada. (CPC, art. 734) , pode ocorrer a penhorar também com os bens de uso pessoal, somente quando estes forem de elevado valor, E mais recentemente os tribunais estão entendendo que se pode penhorar 30% do salário do trabalhador, desde que o restante possa conferir ao trabalhador uma vida digna.

 

 

 

 

3.2.3. Princípio da Intangibilidade Salarial

 

 

O princípio da intangibilidade salarial proíbe que sejam feitos descontos abusivos e ilegais no valor do salário do empregado. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) autoriza que, apesar de se tratar do salário mínimo legal, os empregados regidos por ela tenham descontos de utilidades (parcelas in natura).

Quando versar a respeito do empregado urbano, a CLT autoriza, em seu §3º do artigo 458, que “a habitação e a alimentação fornecidas como salário-utilidade deverão atender aos fins a que se destinam e não poderão exceder, respectivamente, a 25% (vinte e cinco por cento) e 20% (vinte por cento) do salário contratual”.

Porém, quando caso de empregado rural, a Lei 5.889/1973, no artigo 9º, permite que sejam feitos descontos somente quando houver autorização legal ou decisão judiciária, e quando se destinar à ocupação da moradia e ao fornecimento de alimentação sadia e farta, não podendo exceder de 20% (vinte por cento) e 25% (vinte e cinco por cento), nesta ordem, do salário mínimo.

Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2013, p. 465) ressalva que:

(...) a habitação e a alimentação não podem ficar a cargo de intermediários, que explorem eventual desconhecimento ou despreparo relativamente a preços e direitos trabalhistas por parte do trabalhador, mas, sim, do próprio empregador, no âmbito do contrato de trabalho e das suas condições pactuadas e previstas na legislação.

Cabe reiterar que a alimentação deve ser “sadia e farta” e deve atender o preço daqueles vigentes na região. Quando a habitação for fornecida para viabilizar a prestação de serviços, não será tratada como utilidade de natureza salarial por não estar servindo ao empregado, mas apenas ao empregador.

 

 

3.2.4. Princípio da Imodificabilidade

 

 

A regra geral em relação ao empregado e seu empregador é que um contrato de trabalho não pode ser alterado ou modificado unilateralmente pelo empregador, regra incluída no Art. 468 da CLT. Assim, não pode o empregador fazer alterações sem o consentimento do empregado, ressaltando que mesmo se o empregado vier a consentir com tais mudanças e provadas posteriormente prejudiciais, serão consideradas nulas.

Pode-se tomar como exemplo neste princípio, trabalhadores comissionados e, por escolha do empregador, passam a receber salário fixo. De acordo com Amauri Mascaro Nascimento (2001, p. 346), aqueles poderão pleitear uma ação junto a Justiça do Trabalho. O autor esclarece que existem razões pelas quais um empregador poderá realizar mudanças que podem ser consideradas toleráveis, denominado “jus variandi do empregador”.

O princípio da imodificabilidade, então, é considerado uma intervenção do Estado para manter uma observância diante do trabalhador e de seu empregador, assim buscar ordem eficaz e manter o melhor a todos os envolvidos em um pacto laboral, com a finalidade de restringir a autonomia das partes contratantes.

Após versar a respeito do princípio da inalterabilidade, é interessante destacar suas exceções.

O empregador pode realizar modificações no contrato de trabalho desde que essas não prejudiquem de forma alguma o trabalhador. Exemplos a serem citados são abrangidos pelo “jus variandi”, considerado o poder de direção do empregador, modificações essas que não serão consideradas de teor unilateral, como a mudança em sua função. Determinado empregado poderá retornar, por determinação do empregador, a um cargo que ocupava anteriormente, deixando assim o exercício de função de confiança.

4. Considerações Finais

 

 

Os princípios são os verdadeiros responsáveis pela formulação das normas jurídicas, são eles que fornecem o amparo e toda a fundamentação necessária para a criação e aplicabilidade destas. Possuidores de uma divisão interna própria, os princípios podem ser gerais, decorrentes da Constituição Federal, ou específicos, quando destinados à matéria jurídica própria.

As funções principais exercidas por eles são: informação, pois serve como referencial e fundamento na criação das normas; interpretação, ajudando o orientador do direito na compreensão e aplicação das leis; e por último, exerce a função normativa, sendo os princípios aplicados direta ou indiretamente, quando há lacunas ou omissão da lei.

Se contrapondo aos princípios que são meramente ideológicos, surgem as regras que são taxativas e descritivas de comportamento. Com a contínua pesquisa a respeito do tema que engloba os princípios e o salário, fez-se necessário o estudo a respeito da remuneração, já que esta, é a soma dos pagamentos diretos, que são aqueles feitos pelo empregador, e os indiretos, realizados por terceiros.

Com o amparo da Constituição Federal e da CLT, estabeleceu-se um comparativo entre estes princípios e é notório que nenhum deles de fato é absoluto, já que todos possuem exceções e variantes dependendo de cada caso concreto.

A exceção ao princípio da irredutibilidade salarial é valida somente quando esta se obtiver através de acordo ou convenção coletiva, porém, não são todas as importâncias que compreendem a remuneração nem todas as parcelas salariais ou remuneratória que podem ser reduzidas.

Passo seguinte, o princípio da impenhorabilidade salarial, tem como exceção à regra a penhora parcial de salário, visto que a jurisprudência permite o bloqueio de até 30% do salário do trabalhador, por meio dos instrumentos de efetivação das execuções ou através de penhora eletrônica. Outra hipótese aceitável são os casos de pensão alimentícia, em que o valor maior a ser protegido, no caso, é a integridade física do alimentando e, por essa razão, é admissível o desconto salarial.

O princípio da intangibilidade salarial por sua vez, veta os descontos abusivos e ilegais sobre o salário do empregado, porém se admite os descontos de utilidades (parcelas in natura), tanto do empregado urbano, artigo 458, §3º CLT ou rural, Lei 5.889/1973, no artigo 9º. Por último, o princípio da imodificabilidade, traz como exceção, a alteração contratual unilateral pelo empregador, desde que esta não prejudique o empregado em hipótese alguma.

 

5. Referências Bibliográficas

 

 

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RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de direito do trabalho – 8 ed. Curitiba: Juruá, 2000.



[1] Alunas do 6º período do Curso de Direito do Instituto Luterano de Ensino Superior/Ulbra.