O PRONAF

Apesar de ser submetido a condições marginais no cenário histórico de políticas públicas, o agricultor familiar pouco capitalizado ou descapitalizado tem ousado em continuar reproduzindo, com estratégias diferenciadas de resistência ou adaptação às novas facetas do capitalismo.

No Brasil apenas recentemente, diante do elevado grau de desemprego na área rural, da pressão exercida pelos movimentos sociais ligados a terra e a importância da propriedade familiar para o desenvolvimento da região, foi desenvolvida uma política voltada exclusivamente para o fortalecimento deste segmento. O Governo Federal lançou um programa de custeio a pequena produção - o PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), com o objetivo de propiciar condições para o aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria de renda, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida e a ampliação do exercício da cidadania por parte dos agricultores familiares (GOVERNO FEDERAL, 1996). Este foi considerado uma novidade, visto que é um programa voltado para um segmento historicamente desprezado (SANTOS, 2000).

O PRONAF foi estruturado de modo a atender diferentes grupos de agricultores familiares, a partir das linhas de crédito dirigidas para os Grupos A, B, C e D, que vão desde os assentados pelo Programa Nacional de Reforma Agrária, Banco da Terra ou Cédula Rural, passando pelos colonos de projetos de assentamentos estaduais e chegando até aos pescadores artesanais, extrativistas e aquicultores.

A crítica que se faz é diante das enormes dificuldades de obtenção dos créditos deste programa pelas famílias de mais baixa renda e daqueles que não têm a documentação que comprove a propriedade da terra, o que ocorre com grande parte do agricultor familiar do nordeste brasileiro, formado principalmente por posseiros.

Em Sergipe, estado nordestino com forte presença da agricultura familiar , além da atuação do PRONAF, destacam-se também outros dois importantes projetos: O PRONESE e o PRÓ-SERTÃO.

O PRONESE

A Unidade de Administração do Projeto Nordeste em Sergipe (PRONESE), foi criada em 1984 pelo decreto nº 6417, ou seja, anterior ao surgimento do PRONAF. O objetivo deste projeto era coordenar programas especiais de desenvolvimento rural integrado.

O Programa de Apoio ao Pequeno Produtor Rural (PAPP) foi o único efetivado do Projeto Nordeste e teve início através de empréstimo do Banco Mundial para as ações estaduais como o projeto Chapéu de Couro e o projeto Campo Verde. A atuação desse programa privilegiou a formação de associações que intermediariam os financiamentos. O acompanhamento feito pelo PRONESE ia desde a elaboração até a organização das propostas de financiamento. Comprometendo-se assim, com o assessoramento e o apoio técnico durante o decorrer do projeto.

Os projetos de irrigação no estado se desenvolveram através da COHIDRO (Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos de Sergipe). Entre as barragens de médio porte que foram construídas para atenderam a atividade agrícola do estado, uma foi destinada ao município de Poço Verde, no riacho Amargosa, afluente do rio Real.

O PRÓ-SERTÃO

O PRÓ-SERTÃO é um programa que foi resultado de um convênio assinado pelo Governo do Estado, com financiamento do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA). Este foi assinado em 30 de maio de 1995 , sendo um projeto de apoio às famílias de baixa renda da região semi-árida de Sergipe.

O objetivo geral do PRÓ-SERTÃO é incrementar a renda e melhorar a qualidade de vida dos que fizerem parte do projeto. No programa constam seis componentes que pressupõem o estímulo da participação ativa dos atendidos na condução do mesmo: ações que respondam adequadamente suas necessidades reais, através do apoio aos beneficiários, da redistribuição da terra, de providências quanto ao suprimento de água, do apoio ao desenvolvimento agrícola, do apoio a empreendimentos não agrícolas e crédito para melhorar a renda e o padrão de vida da população.

Ações públicas em Poço Verde

Na porção sudoeste do estado, em região de clima semi-árido, o município de Poço Verde destaca-se pelo cultivo consorciado de feijão e milho realizado por pequenos produtores. O feijão é o cultivo de maior expressão econômica, colocando o município como maior produtor do estado, sendo exportado para diversos estados, como Paraíba, São Paulo, Pernambuco, Goiás e Maranhão.

O grande problema enfrentado pelos agricultores do município de Poço Verde são os longos períodos de estiagem que ocorrem, comprometendo a produtividade dos cultivos. Assim, as políticas agrícolas implantadas no município como o PRONAF, o Fundo Municipal de Aval, o PRÓ-SERTÃO e a atuação do PRONESE, possibilitaram aos pequenos agricultores acesso a linhas de crédito, atuando assim para o desenvolvimento da sua agricultura.

No cenário nacional, Poço Verde assume um importante papel por ter sido o primeiro município brasileiro a desenvolver o Fundo Municipal de Aval, um mecanismo de parceria entre o Banco do Brasil e as Prefeituras, através do qual o município, visando promover o seu desenvolvimento, disponibiliza recursos para garantir operações de crédito dos agentes produtivos, bem como a ampliação e modernização dos já existentes. O Fundo Municipal de Aval implementado no município de Poço Verde, através da parceria entre Prefeitura Municipal/ Banco do Brasil/EMDAGRO, tornou-se um instrumento importante para o reestabelecimento do crédito rural aos agricultores familiares, transformando-o em modelo nacional e internacional, em razão da grande demanda de informações sobre seu funcionamento.

O Fundo foi instituído através da Lei Municipal nº 209/97, de 25 de março de 1997. Idealizado pelo prefeito municipal em exercício, na ocasião, buscou apoio junto a Superintendência do Banco do Brasil, no legislativo Municipal e no Ministério Público. O fundo tem como objetivo, dentre outros, a garantia de financiamento junto aos agentes de créditos, pela concessão de aval. Este programa promete crédito simplificado, juros baixos, rebates financeiros para os pequenos produtores que não têm sequer as garantias mínimas exigidas pelos bancos. Em Poço Verde 90% das propriedades não são escrituradas dificultando assim o acesso dos produtores aos créditos do PRONAF. O Fundo está constituído pelo: Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável que estabelece as diretrizes e administra o fundo. O Poder Público viabiliza recursos para o Fundo de Aval e libera o crédito agrícola. A EMDAGRO elabora projetos e presta assistência técnica além de, juntamente com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, avaliar a aptidão dos agricultores.

Os produtores se organizam em grupos com no mínimo 10(dez) agricultores, denominado Grupo de Aval Solidário para habilitar-se de forma associativa ao crédito quebrando, de certa forma, uma velha cultura individualista do sertanejo. Gregolin (1999) em seu trabalho sobre a municipalização da agricultura afirma ser evidente a necessidade de fortalecer a base econômica dos camponeses para potencializar sua participação. O acesso a terra e aos recursos produtivos, segundo o autor, é também colocado como condição básica para a redução das desigualdades sociais no campo.

Santos (2000, p.103), que trabalhou a atuação do PRONAF na organização do espaço rural de Sergipe, relata o destaque do município de Poço Verde, no aproveitamento dos recursos deste programa:

O melhor exemplo desse tipo de experiência no estado ficou por conta deste município, que desde 1997 tem o seu Fundo Municipal de Aval, alcançando resultados positivos devido aos financiamentos caracterizados pela linha de crédito do PRONAF. O programa em 1997, primeiro ano de experiência, e 1998, financiava apenas a cultura do feijão, passando a apoiar, em 1999, também o milho. Essa ampliação foi fundamental, pois, nesse ano, a safra do feijão foi prejudicada pelo excesso de chuva, que fez germinar os grãos devido à umidade. Como os agricultores plantavam feijão e milho, foi possível manter a adimplência no crédito do PRONAF.

Poço Verde é um dos destaques entre os municípios do estado em recursos recebidos do PRONAF para financiamento de infra-estrutura básica. Foram R$ 171.000,00 repassados em 1997, que junto com R$ 19.000,00 de contrapartida, possibilitaram a construção de 01 agroindústria de mandioca, 01 indústria de tecelagem, 01 beneficiadora de milho, 01 beneficiadora de calcário, 01 padaria e 01 indústria de cerâmica (OLIVEIRA,1998). Estas atividades caracterizam uma diversidade no meio rural do município com atividades agrícolas e não-agrícolas, podendo ser consideradas como estratégias de permanência e sobrevivência do agricultor familiar, já que o município localiza-se em uma área de clima semi-árido, tendo a escassez de chuvas como um sério problema para o desenvolvimento dos cultivos de sequeiro praticados.

O FUNDO MUNICIPAL DE AVAL TAMBÉM REFLETIU NO AUMENTO DO NÚMERO DE ASSOCIAÇÕES FORMAIS E INFORMAIS QUE ESTÃO SENDO FORMADAS NOS DIVERSOS POVOADOS PRESENTES NO MUNICÍPIO. ATRAVÉS DO CMDR (CONSELHO MUNICIPAL DE DESENVOLVIMENTO RURAL) E CONDEM ? CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO, INSTÂNCIA DELIBERATIVA MUNICIPAL CONCEBIDA NA CONSTITUIÇÃO DE 1988 COMO INSTRUMENTO DE CONTROLE SOCIAL, OS AGRICULTORES FAMILIARES PELOS SEUS REPRESENTANTES, PRESIDENTES DAS ASSOCIAÇÕES, TÊM CONQUISTADO BENFEITORIAS EM SUAS COMUNIDADES QUE ESTÃO TRAZENDO MELHORAS NA QUALIDADE DE VIDA.

O associativismo é a maneira da população conscientizar-se, mobilizar-se cada vez mais na luta por seus direitos. A partir da participação efetiva e organizada dos cidadãos podem ocorrer as transformações estruturais necessárias para se atingir um mundo mais digno. O passo é tentar modificar o que está próximo de si, da comunidade, mostrando ser possível melhorá-la e aperfeiçoá-la. (LISBOA, 1999, p. 24-25)

O Fundo Municipal de Aval, já utilizado por várias prefeituras em todo o Brasil, tem se mostrado eficiente no tocante ao acesso a créditos, pelos pequenos agricultores descapitalizados de forma associativa, através de aval solidário. Mas este ainda carece de muitos estudos e de vontade política para ser ampliado. A discussão dos que defendem e dos que são contra a descentralização de políticas públicas ainda está muito presente. O que não está em questão é que uma política agrícola diferenciada implica em reconhecer como legítimo o espaço da agricultura familiar dentro das políticas públicas (CARMO, 1998).