Projeto de lei 4330/2004: regularização trabalhista da terceirização desfocada

Raissa Campagnaro de Oliveira [1]

Sérgio Henrique Sorocaba Ayoub Omena [2]Sérgio Henrique Sorocaba Ayoub Omena [2]

Teodora Silva Santos[3]

Hélio Bittencourt[4]

[1] Aluna do 8º período de Direito da UNDB

[2]Aluno do 9º período de Direito da UNDB

[3]Aluna do 8º período de Direito da UNDB

[4] Professor, orientador

RESUMO

A terceirização desde que regularmente instituída é prática lícita e vem ganhando cada vez mais espaço no âmbito trabalhista, por oferecer diversos benefícios para o empregador, especialmente com relação á redução de custos, e na possibilidade deste em focar na função essencial da empresa e terceirizar as atividades periféricas. Contudo, a terceirização não possui legislação especifica que a regulamente, pois se trata de atividade peculiar onde a empresa contratante não estabelece relação de subordinação direta com os empregados da empresa terceirizada. Os princípios do direito do trabalho e a súmula 331 do TST são atualmente as regulações em vigor a respeito do tema. O tribunal Superior do Trabalho não tem como função principal a inovação legislativa, papel este precípuo do poder legislativo, com vistas a sanar essa carência encontra-se em tramitação no Congresso Nacional o projeto de lei 4330/04 que estabelece as diretrizes necessárias para alinhar e guiar o exercício da terceirização no Brasil. O intuito principal é de garantir os direitos dos trabalhadores, que muitas vezes ao serem enganados pelos empregadores não contam com legislação de base solida e ampla que discipline o tema e possa salvaguardar seus direitos. Em meio ás previsões é valido ressaltar o preocupante dispositivo que pretende permitir a terceirização de atividades-fim, uma vez que a característica principal da terceirização é justamente tomar conta das atividades-meio para que o empregador possa se dedicar a sua atividade-fim, sua função essencial, o que acarretaria um pouco de desvio do foco da atividade de terceirização.

 

Palavras-chave: Terceirização, Projeto de Lei 4330/04, direitos trabalhistas.

1 INTRODUÇÃO

 

A Terceirização é mecanismo de organização empresarial, que foge do padrão de contratação clássico que estabelece uma relação direta entre empregador e emprega. Nesta forma de contração uma empresa que queria delegar as atividades meio de sua empresa, contrata outra para que está administre e realize tal atividade, esta última é responsável por sua vez pela contratação da mão de obra e consequentemente pelo pagamento de todas as obrigações trabalhistas que diz respeitam aos empregados. A única regulamentação acerca do tema é a súmula 333 do Tribunal Superior do Trabalho, o que acaba por fragilizar às relações de trabalho que se baseiam na terceirização, demanda-se assim por uma legislação em sentido formal que regule a terceirização do trabalho.  A respeito da carência de legislação, a tentativa de ignorar a expansão do fenômeno da terceirização comprometeu por diversas vezes o direito dos trabalhadores, uma vez que estes se viam vulneráveis e submissos ás clausulas e medidas impostas pelos contratadores por ausência de legislação contundente.

O projeto de lei 4330/04 vem para tentar sanar tais carências e dispõe alguns pressupostos para o funcionamento das empresas prestadoras de serviços (terceirizadas) como a exigência de capital social mínimo de acordo com a quantidade de empregados, possibilidade de imobilizar 50% do capital social se assim ficar estabelecido em acordo ou convenção coletiva de trabalho. Inova ao permitir que aquele que contrata a prestadora de serviços pode ser pessoa física também, além de pessoa jurídica já aceita anteriormente. Por outro lado, de forma preocupante o projeto permite a terceirização de atividades-fim o que contraria o sentido da terceirização que de delegação das atividades-meio para que a tomadora de serviços possa otimizar o desenvolvimento de sua atividade principal.

 

 

2 PERCURSO ATÉ A TERCEIRIZAÇÃO E CONJUNTURA ATUAL

 

 

Em um breve relato de evolução do sistema econômico é possível perceber a influencia e as mudanças proporcionadas as relações de trabalho no mundo. Após a crise financeira de 1929 que afetou vários países ocidentais, a ideologia liberal enfraqueceu, e o Estado entendeu como necessário o intervencionismo na economia. Foi a partir daí que se seguiu “a era de ouro” com investimento “[...] na criação de obras de infraestrutura, concessão de empréstimos, programas assistenciais a trabalhadores, redução da jornada de trabalho [...]”, entre outras medidas adotadas para acabar com o desemprego, e gerar trabalho, por seguinte gerando renda que possa ser utilizada para movimentar a economia e fazê-la crescer novamente (COURA 2011).  Contudo os defensores do liberalismo permaneceram inquietos e em meados de 1970 toma forma o neoliberalismo, com sua ideologia atualizada, em outras palavras se nos anos dourados o foco era geração de emprego e renda, o neoliberalismo não tem o trabalho no ponto principal. O novo empreendedor, fruto do neoliberalismo, não mais busca ajudar a economia nacional proporcionando empregos e geração de renda, com a globalização a preocupação destes passa a ser o lucro próprio, de maneira rápida, uma vez que o mundo globalizado é marcado pelo imediatismo, e de modo a gastar o mínimo possível também, o que significa mão de obra barata demonstrando a não preocupação com a geração de renda para estimular a economia “Como processo de globalização, o destino do capital volátil passou a ser os países que lhe oferecessem melhores condições” (COURA, 2011, p. 11).

A partir de 1970 o modelo de produção inicia um processo de transição do modelo taylorista/fordista para o modelo toyotista. O primeiro caracterizava-se pela concentração da produção em um único local, aonde cada funcionário tinha apenas uma função e era responsável por cumprir com a mesma no decorrer do dia, repetindo a diversas vezes. O exemplo visual mais utilizado é o da esteira rolante de uma linha de produção, onde cada trabalhador tem sua localização ao longo dela e sua função pré-estabelecida.  No segundo modelo, as empresas parecem reconhecer que “menos é mais”, ao reduzir o numero de trabalhadores, os torna multifuncionais, e apesar da remuneração passar a ser proporcional ao rendimento do trabalho de cada um, o empregador diminui seus custos, uma vez que pode focar na realização da função essencial da empresa ao delegar as atividades-meio para outras empresas. Nesse cenário de mudança da organização empresarial e do desenvolvimento da produção foi que a terceirização ganhou maior dimensão.

Os primeiros registros relevantes sobre o instituto se deram no seguimento público, ao qual a terceirização (ainda que recebesse tal denominação) era restrita. O Decreto 200/67 em seu art. 10, §7º dispunha:

A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada. §7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e controle com o objetivo de impedir o crescimento desmensurado da maquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, a execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar encargos de execução.

No setor privado, o instituto ingressou no ordenamento jurídico através da lei do trabalho temporário, e posteriormente foi permitida a terceirização dos serviços de vigilância no âmbito bancário, o que evoluiu para uma permissão aos serviços de vigilância em qualquer âmbito de trabalho.

Entende-se por terceirização a transferência “[...] para outrem atividades consideradas secundarias, ou seja, de suporte, atendo-se a empresa à sua atividade principal. Assim, a empresa se concentra na sua atividade-fim, transferindo as atividades-meio” (TRINDADE, 1992 apud. BARROS, 2013). Pode ser classificada como uma técnica administrativa, um mecanismo de organização da empresa, não é em principio instituto de técnica trabalhista, pois foge ao padrão da relação de emprego onde há vinculo direto e de subordinação entre o empregador e o empregado. A necessidade de transferir determinadas atividades para empresas especializadas está relacionado diretamente a diminuição de custos para alcançar maiores lucros, cujo pensamento atinge todas as empresas atualmente. O tipo de terceirização que vêm ganhando cada vez mais espaço é a modalidade na qual uma empresa chamada de tomadora de serviços contrata outra, a empresa prestadora de serviços para assumirem determinada atividade dentro de sua empresa, esta última empresa é portanto aquela que contrata diretamente os empregados e possui relação direta de empregos com estes. Apesar dos empregados trabalharem para a empresa tomadora de serviços, não são subordinadas a esta, logo não possuem relação de emprego (COURA, 2011).

O setor empresarial brasileiro, observando as inúmeras vantagens da técnica de terceirização começou a utiliza-la mesmo sem legislação que a autorizasse. Como visto as primeiras atividades a serem terceirizadas foram os de conservação e limpeza. A terceirização, portanto, escalou seu caminho para dentro das relações trabalhistas, na verdade como uma exceção à relação trabalhista clássica e logo o Tribunal Superior do Trabalho não mais pôde negar a existência de tal prática o que ensejou a edição de duas sumulas a 256 e a 331 do TST.

A primeira súmula 256 afirmava “salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previstos nas Leis nºs 6.019, de 03.01.1974, e 7.102, de 20.06.1983, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços”. É possível perceber uma previsão mais restritiva, fixando um rol pequeno de atividades que poderiam ser terceirizadas e caracterizando como ilegal qualquer outra terceirização. Tal súmula demonstra ainda uma tentativa de negação dos Tribunais a respeito da prática de terceirização, de modo a não permiti-la e não regula-la em uma tentativa de manter a contratação no modo clássico para assim assegurar os direitos dos trabalhadores (GODINHO, 2014).

Apesar de a terceirização continuar sendo uma modalidade de contratação por exceção, fez-se necessário permiti-la, ainda que por meio de jurisprudência dos tribunais, uma vez que as contratações de outras atividades não listadas pela sumula anterior, continuaram a ocorrer ainda que de forma ilegal, causando maior gravame aos trabalhadores, do que a súmula tentou evitar. Foi neste contexto que a súmula 331, vigente até hoje, foi aprovado em revisão à súmula anterior. Nesta previsão mais recente pode-se observar um senso maior de realidade dos juristas, porém ainda pouco desenvolvimento de conceitos, como o de atividade-meio, que ficam por responsabilidade da doutrina. É preciso fazer uma leitura a contrario sensu de tal súmula, uma vez que esta não proíbe a contratação por meio de terceirização, ou seja, permitem sua prática desde que cumprindo alguns requisitos. A repressão está na contratação irregular de trabalhadores de modo a cercear os direitos que lhe são devidos (GODINHO, 2014).

 Apesar de representar vários avanços, a nova súmula não contempla todas as possibilidades trazidas por essa forma de contratação ímpar, sem uma lei em sentido formal especifica sobre a terceirização os empregadores agem no sentido de que o que não é proibido, será permitido e os juristas são os mais afetados uma vez que não possuem respaldo para decidires com segurança jurídica os mais de 17 mil processos a respeito da terceirização trabalhista (MAIA, 2015)

A súmula 331 do TST dispõe

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
 III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
 IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
  V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
 VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

Em aspectos gerais foi sumulado o entendimento de que a empresa terceirizante é quem tem responsabilidade na contratação dos empregados e por seguinte no pagamento de salários e encargos sociais do trabalho, deixando a tomadora de serviços, a empresa que contrata a terceirizante com responsabilidade subsidiária, caso esta não cumpra com suas devidas obrigações.

O item I da súmula dispõe sobre a proibição de contratação por empresa interposta, são estas as empresas “locadoras de mão de obra” que agem de forma ilegal na contratação de mão de obra, para oferecer para empresas tomadoras de serviços. Muitas vezes estas se passam por Prestadoras de serviços, ou empreiteiras mas, são apenas intermediarias na contratação de mão de obra que proporcionam valores mais baixos devido ao irregular pagamento de salários e encargos, ferindo completamente a legislação trabalhista. Caso fique caracterizada a contratação por empresa interposta, a sanção será o estabelecimento da relação de emprego diretamente com a empresa tomadora de serviços, onde está se torna a responsável principal por todos os direitos trabalhistas devidos. O item estabelece apenas a exceção caso a empresa seja de contrato de trabalho temporário

No item II inicialmente pode aparentar um tratamento diferenciado para a administração pública, uma vez que não recai a sanção de estabelecimento de vinculo empregatício direto com esta caso haja contratação por empresa interposta. Porém a súmula tentou evitar justamente o apadrinhamento ocorrido com frequência no serviço público, onde sujeitos são contratados sob o argumento de serem mão de obra contrata por intermediária e acabam trabalhando como servidores públicos sem o devido processo seletivo que é o concurso público. Portanto, a sanção neste caso, apesar de deixar o trabalhador sem emprego e assim prejudicado, é justamente a não contratação direta à administração pública. O direito conferido ao trabalhador para que não fique totalmente prejudicado é o pagamento dos salários acordados referentes ao trabalho já prestado, assim como o FGTS devido (BARROS, 2007).

Em seguida a súmula lista as atividades que não geram contratação direta com a tomadora de serviços, ou seja, os casos de terceirização legal quais sejam atividades de vigilância, de conservação e limpeza e as de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador. Neste item percebe-se que o jurista reconheceu a necessidade de aumentar o rol de possibilidades de contratação por terceirização, uma vez que isso já vinha ocorrendo com frequência ainda que ilegalmente. Mais ainda assim estabeleceu requisitos, quais sejam a necessidade de ser atividade especializada e ser também atividade-meio da empresa tomadora de serviços. Como já dito, a súmula não fixa tais conceitos, ficando a cargo da doutrina e outros julgados demonstrar. Godinho (2014) entende que são “[...] atividades que não se ajustam ao núcleo das atividades empresariais do tomador de serviços – não se ajustam, pois às atividades-fim do tomador”. Em contrapartida a atividade que será terceirizada deve ser a atividade principal da empresa contratada, ou empresa terceirizada, deve ser portando a sua especialidade realizar tal serviço, dessa forma poderá tirar esse encargo do sistema de produtividade da empresa tomadora de serviços, para que esta preocupe-se exclusivamente em realizar sua atividade-fim na melhor qualidade possível.

Ainda sobre atividades-meio há uma exceção prevista na súmula, porém em apartado, foi trazida logo no item I, qual seja o trabalho temporário. Este último pode ser contrato para a realização de atividade-fim, porém há discussão na doutrina sobre a natureza desta contratação de trabalho temporário, mas prevalece que esta não se encaixa como forma de terceirização. Sobre o assunto o TST em Recuso de Revista entendeu que a “Locação de mão de obra em atividade-fim é medida excepcional e transitória, somente possível nos restritos casos de trabalho temporário, sob pena de leitura interpretativa em desconformidade com preceitos e regras constitucionais decisivas [...]”.

Outros requisitos trazidos pelo item III da súmula são inexistência de pessoalidade e subordinação direta. Como já dito a subordinação do empregado se dá com a empresa que o contrata, denominada de empresa prestadora de serviços, ou empresa terceirizada, a empresa tomadora de serviços não pode exercer, portanto, seus poderes diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar (BARROS, 2007). Neste sentido vários são os processos que requerem o reconhecimento de vinculo empregatício com a tomadora de serviços, pois está muitas vezes acaba estabelecendo um vinculo de pessoalidade e subordinação direta com o empregado que lhe está prestando serviço de forma terceirizada. Não é por acaso, contudo, que empresas tomadoras estabelecem este vinculo de pessoalidade e subordinação, muitas vezes tais empresas demitem e recontratam seus empregados sob o argumento de agora serem terceirizados para diminuir no custo com a mão de obra, mas a relação estabelecida continua a mesma, assim o entendimento do TRT se dá no sentido de que “não pode a tomadora de serviços se valer do instituto da terceirização de mão de obra, para burlar a legislação trabalhista, ampliando ainda mais a desigualdade das categorias profissionais, com o único intuito de diminuir seus custos com contratação e remuneração de pessoal” Logo, no caso acima descrito, fica caracterizado a terceirização ilícita e por consequência é estabelecido o vinculo direto com a empresa tomadora de serviços para que esta pague todos os encargos devidos e faltantes pelo trabalho já realizado.

Em resumo o TRT em Recurso Ordinário entendeu de forma bem realista o instituto da terceirização e a forma como deve regulado, uma vez que ele já encontra-se em plena pratica nas empresas atuais, cabe aos tribunais apenas evitar suas ilicitudes capazes de prejudicar o trabalhador

A terceirização é uma realidade em nosso país. O instrumento tem sido utilizado para que as empresas se concentrem no aperfeiçoamento da sua atividade-fim, buscando em fornecedores de serviços o apoio técnico e especializado nas áreas que não dizem respeito tão diretamente à sua natureza. Em se tratando de terceirização de serviços de conservação e limpeza, o vínculo de emprego com o tomador só deve ser reconhecido nas hipóteses em que seja comprovada a pessoalidade e subordinação (Inteligência do item III da Súmula 331/TST).

No entanto, a inexistência de vinculo direto de trabalho entre a tomadora de serviços e o empregado, não lhe isenta de responsabilidade, especificamente uma responsabilidade subsidiaria como determinada na súmula. Caso a empresa que fornece a mão de obra caia em inadimplemento das obrigações trabalhistas, a empresa tomadora de serviços deverá ser responsabilizada por estas obrigações, podendo ser ainda a administração publica responsabilizada também da mesma forma. Nada mais justo, uma vez que esta última usufruiu dos serviços prestados, e não há devolução de trabalho, a empresa já colheu os frutos deste trabalho na sua produção, não pode restar o trabalhador desamparado. Serve ainda como sanção para a tomadora de serviços, de modo a alerta-la para que nas futuras contratações seja mais cautelosa na escolha da empresa prestadora de serviços, pois deve ser uma empresa com histórico de bom adimplemento, para que não corra o risco de arcar com os pagamentos devidos aos trabalhadores (BARROS, 2007).

Apesar da súmula 331 do TST ter representado grandes benefícios para os trabalhadores, uma vez que podem exigir seus direitos com base no entendimento sumulado, ainda é possível identificar na prática o acontecimento de acordos ilícitos na terceirização, uma vez que pouco foi regulado pela súmula. Além disso, o papel de inovar no ordenamento jurídico não é dos tribunais, em primeiro lugar e sim do poder legislativo. É necessário que o Poder Legislativo abra verdadeira os olhos para a prática de terceirização, pois ela já existe no país há bastante tempo e mais ainda é tendência nas administrações de empresas, e resolva regular legalmente e com qualidade tal mecanismo.

3 GARANTIAS E RESTRIÇÕES NO PL 4330/04       

 

Inicialmente faz-se necessário conhecer alguns aspectos mencionados na justificação do projeto de lei. A análise deste texto permite ao leitor entender a motivação e as lacunas legislativas que precisam ser preenchidas com a possível promulgação da lei. O deputado Sandro Mabel em seu texto contextualizou as mudanças ocorridas na forma de organizar o trabalho, com a revolução nos meios de produção já mencionada aqui, e destacou a terceirização como mecanismo crescente e capaz de atender às necessidades do novo modelo de empresa, pois possibilita que a concentração desta no seu “[...] negocio principal e na melhoria da qualidade ou do produto da prestação de serviço”. Segue reconhecendo que a rapidez com que tais transformações ocorreram atropelaram o direito existente, e que a tentativa de proteger os trabalhadores ao não regular a terceirização, acabou deixando-os mais vulneráveis no mercado de trabalho que adotava tal forma de contratação com frequência e há algum tempo já.

O projeto inicial de 1998 foi substituído pelo projeto nº 4330/2004 que deixou apenas os dispositivos de regulação da terceirização, deixando de lado os que correspondiam ao tratamento do trabalho temporário, uma vez que se tratam de mecanismos diferentes de contratação de serviços.

A respeito das previsões do projeto há muitos críticos, assim como muitas pessoas a favor. É bem verdade que o Projeto não violará diretamente nenhum direito do trabalhador, na verdade um exemplo de ganho para o trabalhador é que os mesmos direitos assegurados aos empregados direto das tomadoras de serviço deverão ser assegurados aos empregados que realizam a mesma atividade com a única diferença de serem contratados por uma terceirizada. Encontrava-se em muitos lugares empregados com as mesmas funções mas que na hora do almoço, a alimentação e o local de refeição eram separados, logo com a nova lei este problema será resolvido. Além disso, os direitos aos salários, às horas extras, ao 13º salário, às férias, e a todos os outros direitos e garantias estabelecidos na legislação trabalhista  e em acordos e convenções coletivas de suas respectivas categorias profissionais, também serão assegurados aos trabalhadores de terceirizadas. Apesar de estar implícito, é bom que a nova lei esclareça, para que não haja nenhuma ilegalidade por parte dos empregadores tomadores de serviços e/ou prestadoras de serviços (CNI).

Há ainda alteração no tipo de responsabilidade que poderá recair sobre a tomadora de serviços, o que proporciona maior segurança para os trabalhadores e mais meios de alcançar a satisfação de seus direitos pois, o Projeto de Lei  prevê aos trabalhadores contratados por terceirização uma garantia dupla. Já é sabido que a responsabilidade subsidiaria obriga as duas empresas (tomadora e prestado de serviços) de modo a garantir os direitos trabalhistas. Agora, com a nova lei se a contratante não tiver cautela na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias da contratada, aquela poderá ser diretamente responsabilizada por essas obrigações, ou seja, o trabalhador poderá lhe acionar diretamente, configurando assim a responsabilidade solidaria e mais benéfica. Fez bem o legislador em manter além da solidária, a responsabilidade subsidiária, pois casocontrario a empresa prestadora de serviços poderia se sentir  desobrigada em cumprir com suas obrigações e manter uma relação adequada com trabalhadores e empresas contratantes (CNI).

Aqueles que criticam, entre eles os sindicatos, o entendimento é de que haverá precarização do trabalho com base nos seguintes dados

Segundo levantamento da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Dieese, ao comparar trabalhadores que realizavam a mesma função em 2010, os terceirizados recebiam em média 27% a menos do que os contratados diretos, tinham uma jornada semanal 7% maior e permaneciam menos tempo no mesmo trabalho (em média 2,6 anos, ante 5,8 anos para os trabalhadores diretos). Estudo da Unicamp revelou que, dos 40 maiores resgates de trabalhadores em condições análogas à escravidão nos últimos quatro anos, 36 envolviam empresas terceirizadas ( MAIA, 2015).

Entendem, portanto, que a permissão de terceirização em um maior numero de atividades, incluindo também as atividades-fim neste rol, estará proporcionando um meio para as empresas não cumprirem com todas as obrigações trabalhistas e pagar salários mais baixos o que colocará por agua a baixo todas as lutas dos trabalhadores para chegar no patamar de direitos que se têm hoje.  No mesmo sentido Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, ministro do TST afirma que “‘franquear a terceirização é desconstruir todo o sistema trabalhista’, parte integrante da democracia brasileira. Para o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, por trás do argumento da competitividade existe uma ‘regressão dos direitos sociais’” (MAIA, 2015).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Reconhecendo que a terceirização é forma de organização já inerente nas empresas modernas, o poder legislativo acertou ao preocupar-se com a regulação de tal instituto através do projeto de lei 4330/04. Muitas são os benefícios trazidos pelo projeto, como o desenvolvimento de conceitos antes somente doutrinários, o estabelecimento expresso de garantias trabalhistas aos empregados contratados sob essa modalidade, a maior segurança jurídica nos futuros processos contra as empresas e segundo os empresários a maior competitividade, só que agora regulada legalmente, proporcionada pelos custos mais baixos da terceirização. Por outro lado, o Projeto deve levar em conta este ultimo aspecto de baixa de custos, apesar da ideia de regulação ser inicialmente boa, isso não significa que uma analise mais profunda das consequências reais dessa lei na prática trabalhista. É preciso um maior estudo sobre o assunto e o equilíbrio nas previsões em debate para aprovação. 

REFERÊNCIAS 

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BARROS, Alice Monteiro. Curso de direito do trabalho. 3 ed. São Paulo: Editora LTr, 2007.

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COURA, Solange Barbosa de Castro. O capitalismo contemporâneo e suas transformações: o impacto da terceirização trabalhista. In: Justiça do Trabalho. Ano 28, n. 333, Set de 2011. Porto Alegre: HS Editora.                                              

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 13 ed. São Paulo: Editora LTr, 2014.

MAIA, SAMANTHA. A terceirização do trabalho será liberada no Brasil? Carta Capital. 2015. Disponivel em < http://www.cartacapital.com.br/economia/a-terceirizacao-do-trabalho-sera-liberada-no-brasil-3999.html >.

SANTOS, Ciamara dos. Considerações acerca da terceirização no Direito do Trabalho. In: Revista de Direito do Trabalho. Ano 37, v. 141. Jan-Mar 2011. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.

PEREIRA, Leone. Terceirização – Aspectos Atuais e Polêmicos. In: Revista de Direito do Trabalho. Ano 41, v. 162. Mar-Abril 2015. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais.      

RECCO, Hermenegildo. Empresa Interposta. Porta Folha Regional. 2010. Disponível em < http://jfolharegional.com.br/mostra.asp?noticias=5806 >