O tabaco é uma droga psicoativa classificada, de acordo com sua origem, como natural (proveniente de plantas). Sua classificação como ação no sistema nervoso central (SNC) é estimulante, pois pode causar euforia, agitação psicomotora, inibição de fome, sensação de coragem e poder, dentre outros. E também está classificada no rol das drogas lícitas, consumidas livremente no país sendo muito fácil de ser adquirida (encontrada em tabacarias, padarias, bares, bancas de revista, supermercados, etc.).

A substância estimulante presente no tabaco, causadora da dependência química é a nicotina. O consumo do tabaco foi estimulado pela mídia durante muitos anos. Sempre associado aos prazeres da vida, beleza e classe social elevada. Seus malefícios foram comprovados cientificamente por volta de 1960, época em que se inicia o combate a esta droga.

Como não poderia deixar de ser diferente, a Polícia Militar do Estado de Minas Gerais também possui profissionais afetos ao abuso do tabaco, em sua grande maioria, consumida por meio de cigarros industrializados.
Não há como negar que a saúde desses profissionais será degradada e que o tempo gasto para alimentar o vício vai ser diminuído do seu horário produtivo.

Visto isso, faz-se necessário a implantação de um tipo de prevenção que estimule os profissionais da área a diminuírem ou largarem seu vício. Muito interessante é a técnica de Intervenção Breve (IB) aos dependentes químicos. Ela se sobressai a outras técnicas devido ao seu baixo custo, necessidade de poucas pessoas empregadas e curta duração. Ronzaní explica que:

Estudos anteriores sugerem que a efetividade da IB e seu desempenho possam ser superiores aos de outras intervenções que demandam maior tempo. Além disso, a IB é apontada como uma técnica eficiente, levando em conta os resultados obtidos e o baixo custo para sua execução (RONZANÍ, 2010).

A aplicabilidade da técnica de Intervenção Breve é baseada na entrevista motivacional que visa à mudança de comportamento da síndrome de dependência do tabaco. Os princípios norteadores são explicados da seguinte forma:

O objetivo da Intervenção Breve na atenção primária é promover a percepção do paciente de que seu uso da substância está colocando-o em risco e encorajá-lo a reduzir ou deixar o uso a partir de estratégias e metas construídas entre o profissional e o paciente. Uma das técnicas de IB utilizadas é baseada no método FRAMES, que é composto por seis princípios básicos:

1) Feedback (Retorno): uma devolução de informação objetiva sobre o padrão de uso de substância do paciente. Este retorno (feedback) pode ser oferecido, por exemplo, apresentando ao paciente seu resultado do AUDIT ou ASSIST. O retorno é um passo importante para promover a percepção do nível de uso e iniciar o processo motivacional.
2) Responsability (Responsabilidade): é proposta a adoção de uma postura de não-confrontação do profissional e sinalização ao paciente sobre sua responsabilidade com relação ao seu uso de álcool e ao processo de mudança de comportamento.
3) Advice (Aconselhamento): orientações claras e objetivas sobre os problemas que o paciente apresenta ou possa vir a apresentar e sua possível relação com outros problemas de saúde.
4) Menu de Estratégias: é a identificação de situações de risco para o uso da substância, definição de metas com relação ao uso (diminuição ou abstinência) e estratégias para se alcançar tais metas.
5) Empatia: é proposta a adoção de uma postura empática e acolhedora, mas ao mesmo tempo segura e objetiva na relação com o paciente, a fim de promover maior aceitação do aconselhamento.
6) Self-efficacy (Autoeficácia): é uma proposta de promoção de sentimento de segurança e autoestima em relação ao problema.
A forma de aplicação do método FRAMES depende do nível de motivação dos pacientes para a mudança de comportamento. O objetivo é sempre provocar uma mudança na prontidão para a mudança de comportamento do paciente. É importante notar que a IB, apesar de desenvolvida especificamente para a mudança do padrão de uso de substâncias psicoativas, pode ser utilizada como técnica de mudança de vários outros comportamentos (RONZANÍ, 2010).

No Feedback (Retorno), o autor cita dois tipos de testes utilizado internacionalmente: o AUDIT (Alcohol Use Disorders Identification Test) e o ASSIST (Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test), que podem ser adaptados a qualquer substância. Assim, somados a orientações do setor de saúde da PMMG, a percepção do nível de uso da droga e o processo motivacional podem se iniciar da seguinte forma de acordo com o quadro abaixo:

Quadro 2 - Abordagem Inicial do Tabagismo.
1. Você fuma? Há quanto tempo?
2. Quantos cigarros fuma por dia?
3. Quanto tempo após acordar acende o 1º cigarro?
4. O que você acha de marcar uma data para deixar de fumar?
5. Já tentou parar?
6. O que aconteceu?
Fonte: PMMG - INSTRUÇÃO DE SAÚDE No 05/08, de 30 Jul/08.

O segundo princípio é Responsability (Responsabilidade), em que se destaca a não-confrontação com o paciente e a demonstração na responsabilidade do uso do tabaco (aqui adaptado do texto citado). Tem de ficar clara a necessidade de mudança de comportamento do paciente. A dependência fisiológica da droga termina rapidamente (em poucos dias), porém, hábitos despertam a fissura de usar a droga. Um exemplo disso refere-se ao fato de o indivíduo associar o "cafezinho" ao ato de acender o cigarro. Em outro exemplo, ele se senta à mesa do bar e fuma. Da mesma forma, existem vários outros hábitos, como esse, que se relacionam a essa possível recaída.
O próximo princípio é o da Advice (Aconselhamento), no qual se deve levar em conta o estágio motivacional em que o paciente se encontra (procurando sempre evoluir/melhorar o estágio). É necessário falar dos malefícios que o tabaco provoca e dos problemas decorrentes desse vício.

O "terrorismo farmacológico"1 não é recomendado, pois a droga causa prejuízos ao corpo humano lentamente e, em cada pessoa, de uma forma diferente.
Dentro do "Menu de Estratégias", primeiramente, devem ser abordados e esclarecidos os sintomas da forte redução e abstinência do uso do tabaco. Dentre eles destacam-se:
a) Vontade intensa de fumar (fissura);
b) Estado disfórico ou depressivo;
c) Insônia;
d) Irritabilidade;
e) Ansiedade;
f) Dificuldades de concentração;
g) Inquietude;
h) Diminuição da freqüência cardíaca; e
i) Aumento do apetite e/ou do peso.
A fissura é um fator complicador grave, pois é proveniente de fatores fisiológicos e psicológicos.

A fissura é a reação intensa, motivada por fator orgânico ou afetivo, provocada pela ânsia de ingestão de nicotina (no caso de fissura por esta droga). É descrita como um desejo forte e imediatista de satisfação, seguido de ansiedade, com presença, ou não, de reações orgânicas.
A boa notícia em relação à fissura, é que ela dura pouco tempo. Uns dois minutos ou menos, relatam os tabagistas que já passaram por isso. Recomendamos os nossos pacientes que criem uma sequência de ações que permitam controlar o efeito da fissura e ajudem a passar o tempo. Por exemplo: respirar fundo 10 vezes, em seguida beber um copo d?água, iniciar uma atividade diferente daquela que estava no momento do surgimento da fissura e, por fim, ligar para os colegas de grupo se ela não tiver passado (SALGADO e MURAD, 2002, p. 31).

O principal do enfrentamento à fissura é tirar o pensamento na droga. Nossas emoções estão diretamente ligadas à respiração. Assim, respirando profundamente, dez vezes, a tendência será de se acalmar. Ligar para outras pessoas o ajudará a parar de pensar na droga, desviando sua atenção.

O voluntário a esta ação deve preparar para lidar com as outras pessoas durante o período de abstinência, pois "os nervos estarão à flor da pele". Além da fissura, os outros sintomas como irritabilidade, ansiedade e inquietude dificultarão as relações interpessoais. Ele deverá monitorar seu comportamento para não sair dos padrões normais e não "explodir por pouca coisa".

Após o exposto acima, seguem dicas importantes para tentar tolerar esses sintomas: Procurar profissionais de saúde é uma excelente sugestão. Psicólogos e nutricionistas são boas indicações, mesmo que o nutricionista participe na mudança da qualidade da alimentação e cessação de ganho de peso (se for o caso). Também uma intervenção farmacológica deverá ser recomendada em caso de grau mais elevado do abuso da substância (mais de 30 cigarros/dia).

Porém, a essência do "Menu de Estratégias" é a definição das metas e estratégias para a redução ou cessação do tabagismo. Nestes termos, faz-se a estimulação do paciente para que ele consiga diminuir ou cercear o uso do tabaco em um período mais curto que ele considere que consiga cumprir. Será uma espécie de conciliação, com a estipulação de metas. Nestes termos, deve-se observar as estratégias de gradação da diminuição, e o tempo proposto. Leva-se em conta, também, se o paciente possui algum auxílio farmacológico (mesmo os naturais ou aqueles que não precisam de prescrição médica como as gomas de mascar ou adesivos).

Claro que cada ser humano é único e deve ser tratado como tal. Cabe ao entrevistador ou à equipe entrevistadora a flexibilidade e o discernimento de se adequar a cada caso e não ter respostas e metas "engessadas".
Outro principio citado é a Empatia. Saber reconhecer a dificuldade de cercear/diminuir a dependência química já é um passo importante. Mostrar-se sensível ao grande problema vivenciado e colocar-se à disposição para auxílio são fatores primordiais à empatia com o outro ser humano. A objetividade e a segurança de quem transmite as informações trazem impacto positivo nessa ação.

Fica fácil saber por que as pessoas abusam das drogas. A sensação de prazer que a droga dá ao ser humano (batizada de sistema de recompensa do sistema nervoso central) é muito grande. Fica fácil, em um mundo de constantes problemas e conflitos sociais, econômicos, políticos e familiares, descarregar suas preocupações nas drogas. Principalmente na cultura brasileira, o ser humano tem tendência a procurar o caminho mais fácil. Porém, esse caminho se torna penoso, pois sair desse caminho esbarra em um muro alto chamado Dependência Química. Por isso, é melhor não entrar, para depois não ter de se tratar.

Por último, mas não menos importante, o princípio Self-efficacy (Auto-eficácia), que nada mais é que trabalhar no indivíduo sua capacidade de realizar ou de ter êxito em sua tarefa. Motivando-o neste ponto, mostrando relatos positivos de intervenções que deram certo, e mostrando também que ele é capaz de realizar as metas e estratégias estipuladas.
Vale lembrar que, na execução dessa técnica, a redução do abuso do tabaco já é um passo importante e satisfatório.

Como forma de avaliação de resultados e busca de melhoramento na abordagem, após seis meses, o voluntário que participou deve ser chamado a relatar sobre a ação decorrida, sendo colhidas, independentemente do resultado, informações pertinentes, tais como:
a) Conseguiu manter as metas e estratégias por quanto tempo?
b) Houve dificuldades encontradas?
c) Apresentou sintomas de abstinência? Quais? Por quanto tempo?
d) As informações passadas durante a aplicação da técnica foram úteis?
e) Recomenda a técnica de Intervenção Breve a outras pessoas? Por quê?
f) Há sugestões de melhorias?

O tabagismo está classificado internacionalmente no grupo de transtornos mentais e de comportamento decorrentes do uso de substâncias psicoativas (CID ? 10/ T65.2 - Efeito tóxico do tabaco e da nicotina).

A CID - 10 (Classificação Internacional de Doenças, em sua 10ª. edição) visa catalogar e padronizar problemas de saúde, tendo como referência a Nomenclatura Internacional de Doenças, estabelecida pela Organização Mundial de Saúde. O governo brasileiro divulgou o arquivo em todo território nacional, por meio do DATASUS.

A CID - 10 mostra critérios para caracterizar a dependência de substâncias:

Quadro 5: Critérios do CID-10 para Dependência de Substância.
Um diagnóstico definitivo de dependência deve usualmente ser feito somente se três ou mais dos seguintes requisitos tenham sido experienciados ou exibidos em algum momento do ano anterior.
a. Um forte desejo ou senso de compulsão para consumir a substância;
b. Dificuldades em controlar o comportamento de consumir a substância
em termos de seu início, término e níveis de consumo;
c. Um estado de abstinência fisiológico quando o uso da substância cessou ou foi reduzido, como evidenciado por: síndrome de abstinência para a substância ou o uso da mesma substância (ou de uma intimamente relacionada) com a intenção de aliviar ou evitar sintomas de abstinência;
d. Evidência de tolerância, de tal forma que doses crescentes da substância psicoativa são requeridas para alcançar efeitos originalmente produzidos por doses mais baixas;
e. Abandono progressivo de prazeres e interesses alternativos em favor do uso da substância psicoativa, aumento da quantidade de tempo necessária para se recuperar de seus efeitos;
f. Persistência no uso da substância, a despeito de evidência clara de consequências manifestamente nocivas. Devem-se fazer esforços claros para determinar se o usuário estava realmente consciente da natureza e a extensão do dano.
Fonte: OMS (1997).

Visto isso, outro auxílio à prevenção ao abuso do tabaco é a intervenção farmacológica (medicamentosa). O auxílio do médico é muito importante em prescrever um medicamento que irá minimizar os sintomas de abstinência do paciente, facilitando a abordagem cognitivo-comportamental.

Nestes termos, como exemplos, existem as gomas de mascar e adesivos contendo nicotina, pois reduzem as substâncias tóxicas recebidas pelo organismo humano e quebram a barreira dos hábitos de usar/abusar do tabaco, além de minimizarem os efeitos da abstinência. Porém, continuam alimentando a pessoa com a nicotina.
Outro tipo de intervenção farmacológica é o uso da Bupropiona e da Nortriptilina. São medicamentos antidepressivos, com ações noradrenérgicas (têm função de manter o equilíbrio homeostático do sistema nervoso) no tratamento do tabagismo. Esse tratamento seria mais adequado para fumantes que fracassaram ao usar outras técnicas. Possuem efeitos colaterais, sendo os mais comuns insônia, boca seca e cefaléia (dor de cabeça). Como todo medicamento, deve ser consumido conforme orientação médica para que não cause outro mal.

É importante destacar que o nosso foco é a prevenção. O tratamento pode ser auxiliador, porém a técnica de Intervenção Breve utilizando o método FRAMES é mais adequada para fumantes iniciantes. O principal é que o profissional sinta a preocupação da empresa com a sua saúde e modo de vida. Essa empatia traz uma força extra para que a decisão de diminuição ou cerceamento do uso do tabaco seja tomada.
Considerando o baixo custo de implantação do projeto, o pouco tempo gasto e a problemática de um funcionário tabagista, torna-se um projeto viável, com bons resultados já comprovados, que, provavelmente, vai requerer adequação a prática, mas esclarece muito bem o tema e dá a direção a seguir. Em uma empresa como a Polícia Militar de Minas Gerais servirá como uma excelente tentativa de reduzir este mal das drogas.