PROCISSÃO

“Não se sabe se essa criança teve que passar

pela via crucis. Todos passam”.

Clarice Lispector, A via crucis

 

A cada passo, o suor

Lentamente, caminho no asfalto...

Na mente, carrego a cruz

De repente, sinto-me Cristo.

 

Carrego a cruz dos que sentem

a dor, o desespero, o tormento,

a falta de sentido, as marcas

dos açoites do poder, da vida.

 

A estrada, a via crucis

Vejo aqueles que pouco me querem,

Gritam: “Crucifica-o, Crucifica-o”

Ouço poucas vozes que clamam

a minha liberdade,

a sensação, nestes, se faz presente de verdade.

 

Ao calvário, chego forte

Duas cruzes ao lado,

os ladrões, os subversivos,

Sou eles, eles me são.

  

Crucificam-me num mundo

Certo, previsível,

Onde não há espaço

Para o diferente,

Para a poesia

Para o indizível.

   

“- Por que me abandonastes? Por que me abandonastes?

Grito aos céus,

A resposta vem,

vem apenas com a escuridão.