PROCESSO PENAL À LUZ DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE – Brevíssimas considerações com as mudanças advindas com a lei 12.403/11. 

Jailton Luiz de Vasconcelos Araújo Júnior. Serventuário do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Bacharelando em Direito pela Faculdade de Direito de Garanhuns – FDG/AESGA. Graduado em Licenciatura para o Ensino de História pela Universidade de Pernambuco – UPE. Aluno do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Penal e Processual Penal da Escola Superior da Magistratura de Pernambuco.

INTRODUÇÃO 

Atualmente o processo penal no Brasil tem sofrido diversas mudanças que visam a adequação e meios eficientes que tornem o próprio processo como instrumento eficaz e em consonância com a realidade social contemporânea, seja na esfera teórica, e, mais ainda, em toda sua praticidade.

Com efeito, nos dias atuais, pode-se observar no Código de Processo Penal Brasileiro, especialmente, com as mudanças introduzidas pela Lei nº 12.403/11 a presença constante do Princípio da Proporcionalidade como meio e método de adequar a atuação do Estado, quando instaurada uma ação penal.

Num Estado Democrático de Direito, regido por uma constituição que visa a proteção dos direitos fundamentais, deve o próprio Estado assegurar que esses direitos sejam sempre respeitados e que as interferências nesses direitos, já que não absolutos, se dêem de forma adequada e proporcional, para consecução do fim com o meio utilizado.

Dessa forma, o presente artigo, visa através de breves considerações conceituar o Princípio da Proporcionalidade e ainda, apontar a sua presença constante e atual no Código de Processo Penal Brasileiro, especialmente com as mudanças trazidas, no que concerne à aplicação de medidas cautelares, com o advento da Lei 12.403/11.

  1. 1.    PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

 

Inicialmente, cumpre destacar que o Princípio da Proporcionalidade, apesar de não constar expressamente em nossa Constituição da República de 1988, vem sendo reconhecido pela doutrina e jurisprudência nacional, e atualmente goza de status constitucional, posto que intrinsecamente inserido no texto da Carta Magna.

O Princípio da Proporcionalidade tem sua origem no Direito Constitucional alemão e cada vez mais tem sido utilizado como parâmetro e instrumento de controle de excessos do Poder Estatal aqui mesmo no Brasil.

Robert Alexy define o Princípio da Proporcionalidade como o princípio dos princípios, uma vez que serve de ferramenta para a solução de casos em que há colisão de princípios. O sistema de Alexy afirma que o Princípio da Proporcionalidade é composto de três subprincípios, ou como ele mesmo os define, de princípios parciais, quais sejam: idoneidade ou adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Rogério Greco, citando Alberto Silva Franco preceitua que o princípio da proporcionalidade rechaça, portanto, o estabelecimento de cominações legais (proporcionalidade em abstrato) e a imposição de penas (proporcionalidade em concreto) que careçam da relação valorativa do fato cometido considerado em seu significado global[1].

Seria em síntese, a adoção da medida certa, com o meio necessário, para atingir a finalidade desejada.

 

  1. 2.    PRINCÍPIOS PARCIAIS DA PROPORCIONALIDADE

 

2.1.        PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO

 

O Princípio da Proporcionalidade será o meio utilizado para a resolução, ante a colidência de princípios fundamentais, utilizando-se do método da ponderação como elemento essencial do aludido princípio. Robert Aley define que o aludido princípio é composto dos princípios parciais da adequação, necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito.

A adequação exige uma relação empírica entre o meio e o fim: o meio deve levar à realização do fim[2].

O Princípio da Adequação está ligado à medida adotada para realização do interesse público para consecução do seu fim, devendo ser controlada a adequação medida-fim.

Dessa forma, fundamental é análise minuciosa das espécies de relação que existem entre os mais variados meios disponíveis e a finalidade objetivada.

A consecução da adequabilidade de uma medida será a promoção satisfatória do fim desejado, caso observe-se que o fim não foi alcançado, deverá a medida adotada ser imediatamente revogada ou anulada.

 

2.2.        PRINCÍPIO DA NECESSIDADE

 

A necessidade ou exigibilidade corresponde à medida que não pode exceder os limites indispensáveis à conservação do fim legítimo que se pretende alcançar, vale dizer: a medida só pode ser admitida quando for necessária, sendo associada à busca do meio mais suave e ao direito à menor desvantagem possível[3].

Busca-se a indispensabilidade da medida para conservação do direito fundamental atacado, ao ponto que tal medida não possa ser substituída por outra de mesma eficácia e até menos gravosa.

O exame da necessidade envolve a verificação da existência de meios que sejam alternativos àquele inicialmente escolhido pelo Poder Legislativo e pelo Poder Executivo, e que possam promover igualmente o fim sem restringir, na mesma intensidade, os direitos fundamentais afetados[4].

Observa-se nesse sentido, a luz de tal princípio parcial, o balizamento de atos dos Poderes Institucionais, com intuito de não causar algum tipo de excesso e eventual atenuação ao exercício de qualquer dos direitos fundamentais institucionalizados.

 

2.3.        PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO

 

A proporcionalidade em sentido estrito está relacionada à constatação de que o resultado obtido com o ato estatal é proporcional à carga coativa, ou seja, importa na correspondência entre o meio e o fim, o que requer o exame de como se estabeleceu a relação entre um e outro[5].

O princípio da proporcionalidade em sentido estrito deixa formular-se como uma lei de ponderação, cuja forma mais simples relacionada a direitos fundamentais diz: Quanto mais intensiva é uma intervenção em um direito fundamental, tanto mais graves devem pesar os fundamentos que a justificam[6].

Desse modo, os fundamentos de qualquer tipo de restrição à liberdade, no âmbito do processo penal, por exemplo, devem obedecer a esta regra, uma vez que o direito fundamental à liberdade sofreria, nesse caso, afetação pelo Poder Público mesmo diante da colidência com outros direitos fundamentais, com outros titulares de direitos fundamentais.

  1. 3.    PRESENÇA DO PRINCÍPIO DA PORPORCIONALIDADE NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO.

A clarividência da presença do princípio da proporcionalidade no Código de Processo Penal Brasileiro, atualmente se dá através de seu expressamento, quando com as alterações trazidas pela Lei nº 12.403/11, especificamente em seu art. 282, inciso II, estabelecendo que:

“As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a adequação da medida à gravidade do crime, circunstância do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado”.

Logicamente, o legislador não deixou de observar o Princípio da Proporcionalidade na formulação do aludido diploma legal, adequando as medidas previstas à gravidade e circunstâncias do fato e do agente, o que de fato está associado à ideia de Alexy, da composição dos princípios parciais da proporcionalidade, quando leciona que o princípio parcial da idoneidade do meio empregado é eficaz para obtenção do resultado por ele aspirado.

No ensinamento de Eugênio Pacelli de Oliveira, em seus comentários à Lei nº 12.403/11, afirma que o Princípio da Proporcionalidade, presente implicitamente em nossa Constituição, exerce dupla função no Direito, a saber:

a)        na primeira, desdobrando-se, sobretudo, na proibição do excesso, mas, também, na máxima efetividade dos direitos fundamentais, serve de efetivo controle da validade e do alcance das normas, autorizando o intérprete a recusar a aplicação daquela (norma) que contiver sanções ou proibições excessivas e desbordantes da necessidade de regulação;

 

b)         na segunda, presta-se a permitir um juízo de ponderação na escolha da norma mais adequada em caso de eventual tensão entre elas, ou seja, quando mais de uma norma, legal ou constitucional, se apresentar como aplicável a um mesmo fato[7].

Ou seja, o que se almeja é o controle do excesso e a ponderação de direito para que as medidas sejam adequadas e tornem legítimas e justificáveis, a luz da razão, as ações do Estado no combate e repressão ao crime, de maneira proporcional, não tolhendo direitos fundamentais.

Tanto a atuação do Poder Legislativo como do Poder Judiciário deve estar em consonância e sintonia com o Princípio da Proporcionalidade para que de fato, como aduziu Beccaria em sua obra Dos Delitos e das Penas, “que o excesso não se torne uma violência por parte do Estado ao cidadão[8]”.

Analisando os requisitos para aplicação de medidas cautelares - previstas no Código de Processo Penal, com as alterações trazidas pela Lei 12.403/11- da necessidade e da adequação, Guilherme de Souza Nucci afirma que a adequabilidade concerne ao Princípio Constitucional da Proporcionalidade. Observa-se, cada vez mais, a vinculação e a integração entre os princípios constitucionais penais e processuais penais[9].

A vinculação e integração de princípios constitucionais decorrem exatamente da necessidade de ponderação de direitos fundamentais quando colidentes entre si, o que não deixa de acontecer quando o julgador se depara diante de um caso de possibilidade de aplicação de qualquer medida cautelar penal prevista no CPP, onde inevitavelmente a colidência de direitos fundamentais irá acontecer, cabendo ao respectivo julgador a análise do método adequado de ponderação e resolução satisfatória (meio-fim) para aplicação da medida. Fica claro, nesse caso, a busca no postulado da proporcionalidade como parâmetro e requisito ideal de sopesamento, para fundamentação de aplicação de medida cautelar penal, seja da mais branda a mais drástica.

  1. 4.    CONCLUSÕES

 

Apesar de algumas críticas à Lei 12.403/2011, pode-se chegar à conclusão que suas inovações ao Código de Processo Penal Brasileiro são bastante positivas e inovadoras, ao ponto de trazer certa satisfação no que concerne às exigências de nossa sociedade contemporânea e ao momento atual de nosso ordenamento jurídico.

Valendo-se do Princípio da Proporcionalidade, de acordo com as considerações acima apontadas, a legislação processual penal brasileira tem tido um grande avanço especialmente na asseguração dos direitos fundamentais, quando em situação de colidência.

A proporcionalidade como meio de ponderação de direitos fundamentais institucionalizados ou não, serve essencialmente para o controle de atos de excesso do Poder Público e solidificação de direitos constitucionalizados num Estado Democrático de Direito.

  1. 5.    REFERÊNCIAS

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7. ed. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

ALEXY, Robert. Constitucionalismo Discursivo: trad. Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

Dos Delitos e das Penas (1764). Edição Ridendo Castigat Mores. Versão para eBook: eBooksBrasil.com. Fonte Digital: www.jahr.org. Copyright ©. Autor: Cesare Beccaria. Edição eletrônica: Ed. Ridendo Castigat Mores.

GUERRA, Sérgio, REVISTA ELETRÔNICA DE DIREITO DO ESTADO: O Princípio da Proporcionalidade na Pós-Modernidade, nº 2. Salvador: 2005.

NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade: De acordo com a Lei 12.403/2011.2. atua e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

PACELLI. Eugênio Oliveira. CURSO DE PROCESSO PENAL. ATUALIZAÇÃO DO PROCESSO PENAL – Lei nº 12.403, de 05 de maio de 2011.



[1] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 11. ED. ATUD. Niterói: Impetus. 2009, p.77.

[2] ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7. ed. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 165.

[3] GUERRA, Sérgio, REVISTA ELETRÔNICA DE DIREITO DO ESTADO: O Princípio da Proporcionalidade na Pós-Modernidade, nº 2. Salvador: 2005. p. 16-17.

[4] ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7. ed. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 170.

[5] GUERRA, Sérgio, REVISTA ELETRÔNICA DE DIREITO DO ESTADO: O Princípio da Proporcionalidade na Pós-Modernidade, nº 2. Salvador: 2005. p. 17.

[6] ALEXY, Robert. Constitucionalismo Discursivo: trad. Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 67/68.

[7] PACELLI. Eugênio Oliveira. CURSO DE PROCESSO PENAL. ATUALIZAÇÃO DO PROCESSO PENAL – Lei nº 12.403, de 05 de maio de 2011. 

[8] Dos Delitos e das Penas (1764). Edição Ridendo Castigat Mores. Versão para eBook: eBooksBrasil.com. Fonte Digital: www.jahr.org. Copyright ©. Autor: Cesare Beccaria. Edição eletrônica: Ed. Ridendo Castigat Mores.

[9] NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade: De acordo com a Lei 12.403/2011.2. atua e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 31.