Procedimento do Júri

 

Autor: Fernando Henrique Carvalho

“Júri”

A palavra “júri” tem origem no Latim, e significa algo parecido com “fazer juramento”, portanto, motivo este que leva alguns doutrinadores a afirmarem que o Tribunal do Júri se originou em Roma.

 

Fundamentos do tribunal do júri.

A doutrina diverge quanto à origem do tribunal do júri. No Brasil, a Constituição de 1988 assegura que o tribunal popular julgará os crimes dolosos contra a vida, prevendo a possibilidade de que seja sua competência ampliada por lei. No contexto mundial, a organização e competência do tribunal do júri variam em conformidade com o sistema adotado em cada país. A idéia do tribunal popular é a de que os casos importantes sejam julgados por pessoas que formam a comunidade, tal como o acusado seja parte desta, vale dizer, a noção que se tem do júri popular é a de que o julgamento se dê pelos pares do réu.

A origem do tribunal do júri é visualizada tanto na Grécia como em Roma, havendo quem veja um fundamento divino para a legitimidade desse órgão. Sob essa inspiração, o julgamento de Jesus Cristo, malgrado desprovido das garantias mínimas de defesa, é lembrado como um processo com características que se assemelham ao júri. De lado as controvérsias sobre a origem, a maior parte da doutrina indica como raiz do tribunal do júri a Magna Carta da Inglaterra, de 1215, bem como seu antecedente mais recente, a Revolução Francesa de 1789.

No Brasil, desde a Constituição Imperial de 1822, o tribunal popular é órgão com competência para julgar crimes que afetam determinados bens jurídicos, em especial, os crimes contra a vida. A única Constituição que não trouxe previsão do tribunal popular foi a Carta de 1937, que foi outorgada e inaugurou um período ditatorial, instaurando-se dúvida quanto a sua subsistência até o ano de 1938.

Com a Constituição do Brasil de 1988, o tribunal do júri foi confirmado  como direito e garantia fundamental . Garantia de sujeição ao tribunal popular, nos crimes de sua competência, para atendimento ao devido processo legal. E direito, conferido de forma ampla, de participar da atividade do Judiciário, na condição de jurado (juízes leigos). Partilhamos portanto, do magistério de Guilherme Nucci, que sustenta: “não deixamos de visualizar no júri, em segundo plano, mas não menos importante, um direito individual, consistente na possibilidade que o cidadão de bem possui de participar, diretamente, dos julgados do Poder Judiciário. Em síntese: o júri é uma garantia individual, precipuamente, mas também um direito individual. Constitui cláusula pétrea na Constituição Federal (cf. art. 60, § 4º,IV)”

 

 

Princípios reitores

A Constituição, em seu art. 5º, inc. XXXVIII, assenta os princípios do tribunal popular: (1) plenitude de defesa;  (2)  o sigilo das votações;  (3)  a soberania dos veredictos; e,  (4)  a competência para o julgamento de crimes dolosos contra a vida.

            A plenitude de defesa revela uma dupla faceta, a  final, a defesa está dividida em técnica e autodefesa. A primeira, de natureza obrigatória, é exercida por profissional habilitado, ao passo que a última é uma faculdade do imputado, que pode valer-se do direito ao silêncio. Prevalece no júri a possibilidade não só da utilização de argumentos técnicos, mas também de natureza sentimental, social e até mesmo de política criminal, no intuito de convencer o corpo de jurados. E se o réu, no interrogatório em plenário, apresenta tese defensiva distinta do seu advogado? Entendemos que as duas devem ser levadas à votação dos jurados, apesar do STF já ter se manifestado que devem ser quesitadas apenas as teses sustentadas pela defesa técnica, dando evidente prevalência a esta última.

Com a recente reforma do procedimento do júri, o quesito obrigatório sobre se o réu deve ser absolvido, gizado no inciso III, do art. 483, CPP(com redação dada pela Lei n.º 11.689/2008), findou por abranger tanto a tese do acusado quanto a do seu advogado. Com efeito, o §2º, do art.483, CPP, corrobora essa conclusão, ao impor que, mesmo que tenha o júri afirmado a materialidade e a autoria do fato (nos dois primeiros quesitos), deve ser formulado quesito específico com a seguinte redação: “o jurado absolve o acusado?”. Como se depreende, tal questão engloba todas as teses de defesa.

O sigilo das votações envolve o voto e o local do voto. Para evitar intimidação dos jurados, as votações ocorrem em uma sala especial, com a presença das pessoas indispensáveis a esse ato processual: o juiz, os jurados, o membro do Ministério Público, o advogado e os auxiliares da justiça (art. 481, CPP, redação anterior). Com o advento da Lei n.º 11.689/2008, a nova redação do artigo 485, CPP, dispõe que, ao final dos debates e “não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial afim de ser procedida a votação”. Em acréscimo, o seu § 1º preconiza que “na falta de sala especial, o juiz presidente determinará que o público se retire, permanecendo somente as pessoas mencionadas no Caput deste artigo”.

Para assegurar o sigilo – e cumprir a Constituição –, é adequado que o juiz se acautele para suspender a divulgação dos demais votos assim que se definir a votação de cada quesito, evitando que seja o sigilo violado por uma eventual votação unânime. Nesse sentido, por nós defendido antes da Lei n.º 11.689/2008, as novas redações dos parágrafos1º e 2º, do art. 483, CPP, estabelecem que: (1)  “a resposta negativa, demais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos” relativos à autoria e à materialidade delitiva “encerra a votação e implica a absolvição do acusado”; e, (2) “respondidos afirmativamente por mais de 3 (três) jurados” tais quesitos, “será formulado quesito com a seguinte redação: ‘O jurado absolve o acusado?’”.

A soberania dos veredictos alcança o julgamento dos fatos. Os jurados julgam os fatos. Esse julgamento não pode ser modificado pelo juiz togado ou pelo tribunal que venha a apreciar um recurso. Daí que em hipótese de julgamento manifestamente contrário à prova dos autos, a apelação provida terá o condão de cassar o julgamento e mandar o acusado a um novo júri. Note-se que o tribunal não altera o julgamento para condenar ou absolver o acusado, ou mesmo para acrescer ou suprimir  qualificadora.  Como a existência do crime e de suas circunstâncias é matéria fática, sobre ela recai o princípio da soberania dos veredictos, não podendo seu núcleo ser vilipendiado, senão por uma nova decisão do tribunal popular. Contudo, em prol da inocência, tal princípio não é absoluto, admitindo-se que o Tribunal de Justiça absolva de pronto o réu  condenado injustamente pelo júri em sentença transitada em julgado, no âmbito da ação de revisão criminal.

O tribunal do júri, com competência para processar e julgar os crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados, veio com seu conteúdo mínimo definido pela Constituição da República. Houve época em que outros crimes, diversos dos dolosos contra a vida, eram também julgados pelo tribunal do júri, a exemplo dos crimes de imprensa. Atualmente, não há lei ordinária alargando a competência desse tribunal popular. Para evitar a extinção do instituto, o constituinte protegeu assim sua competência mínima, em cláusula pétrea gizada no capítulo dos direitos fundamentais. Além do núcleo básico constitucional, vão também a júri as infrações comuns conexas aos crimes dolosos contra a vida. Desta forma, outros crimes comuns que não os dolosos contra a vida podem ser apreciados pelos jurados, desde que exista conexão, e mesmo que a infração conexa seja de menor potencial ofensivo, será atraída ao procedimento escalonado do tribunal popular. Advirta-se que o genocídio, por ser crime contra a humanidade, não irá a júri, da mesma forma que o latrocínio, que é crime contra o patrimônio ( Súmula nº 603, STF).

Características

 

a) Órgão heterogêneo: na Constituição de 1988, o júri popular érea firmado como órgão do Poder judiciário. Sua composição é formada por um juiz-presidente e por vinte e cinco jurados, nos termos da nova redação do art. 433, CPP, dada pela Lei n.º 11.689/2008 (antes o CPP previa o número de vinte e um jurados), dos quais sete compõem o Conselho de Sentença. O juiz-presidente aplica o direito de acordo com os fatos que são julgados pelos jurados. Aquele, o juiz do direito, estes, o juiz dos fatos. Sobre aquele, não vigora o princípio da soberania dos veredictos, pelo que o tribunal pode reformar sua sentença, para majorar ou minorar a pena por ele aplicada. Já quanto ao julgamento dos fatos pelos jurados, não cabe ingerência pelo órgão de segundo grau de jurisdição. Impede destacar que quanto a composição do órgão jurisdicional, as decisões estão assim classificadas:

- decisões subjetivamente simples: são aquelas proferidas por órgão singular. Ex: juiz de primeiro grau;

-decisões subjetivamente plúrimas: emanados de órgão colegiado homogêneo. Ex: turma recursal;

-decisões subjetivamente complexas: exaradas por órgão colegiados heterogêneo. Ex: júri.

b) Órgão horizontal: não há de se falar em hierarquia entre o juiz presidente e os jurados. Têm funções diversas, e a conjugação de esforços faz a harmonia do tribunal.

c) Órgão temporário: o tribunal funcionará durante alguns períodos no ano. Desta forma, a reunião do júri é o período do ano em que o tribunal opera, ao passo que a sessão do júri encontra a realização do julgamento. Pelo alto numero de crimes dolosos contra a vida, não é raro que o tribunal, notadamente nas capitais, opere durante todos os meses do ano. A definição dos períodos de reunião do júri é dada pela lei de organização judiciaria de cada Estado-membro (art. 453, CPP). Em um mesmo dia, o Conselho de Sentença poderá apreciar mais de um processo, desde que as partes concordem, devendo ser tomado novo compromisso (art. 452, CPP).

d) Decisões por maioria dos votos: não é necessário, ao contrário do que ocorre no tribunal do júri norte-americano, que haja unanimidade na votação. Basta a obtenção de quatro votos num determinado sentido, para que se tenha a majoritariedade na votação de cada quesito. Como salientamos acima, somos partidários de que o magistrado deve zelar para evitar a unanimidade, para que indiretamente não seja quebrado o sigilo das votações, afinal, havendo unanimidade, todos saberão que os jurados, em sua totalidade, se inclinaram a favor desta ou daquela tese, o que pode desaguar eventualmente em retaliação. Foi, aliás, o que fez o legislador recentemente, prevendo bastar a resposta de mais três jurados em um dado sentido, a fim de resguardar o sigilo das votações (art. 483, § 1º e 2º, CPP, com redação dada pela Lei nº 11.689/2008).

Rito especial do júri

Para que uma ação penal tenha inicio de forma válida, não se prescinde de um suporte probatório mínimo. A ação penal se reveste de requisitos, entre eles o da justa causa para o seu oferecimento. Os crimes dolosos contra a vida deixam, em regra, vestígios. Isso para a comprovação da materialidade delitiva. Daí que se terá , antes do oferecimento da denuncia com outras peças de informação, mas apenas saliente que a regra será a instauração de um inquérito policial para que o suporte probatório inicial seja formado de maneira regular.

O entendimento do procedimento especial para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida deve partir da visão estrutural do seu processo. O seu rito processual é escalonado, isto é, bifásico, com duas etapas bem distintas:

1)      A primeira fase, parecida com a do procedimento comum ordinário, porém com modificações recentes conferidas pela Lei nº 11689/2008, que inaugurou alegações escritas preliminares e inverteu o rito.

2)      A segunda fase, que só ocorrerá se pronunciado o acusado, ou seja, se admitida a acusação, com prolação de um juízo de admissibilidade positivo pelo juiz sumariamente (juiz singular).

A primeira fase, então, será inaugurada com a denúncia ou queixa subsidiária, podendo ser recebida ou rejeitada. É possível, ainda que exista verdadeiro litisconsórcio ativo entre o MP e o querelante, na hipótese de conexão entre um crime doloso contra a vida e o de iniciativa privada, no que se chama de ação penal adesiva.

O órgão de acusação poderá arrolar até oito testemunhas. Recebida a denuncia, antes das modificações introduzidas pela Lei nº 11689/2008, seguia-se o rito do procedimento comum ordinário. Agora, o CPP prevê que “o juiz, ao receber a denuncia ou a queixa, ordenará a citação do acusado para responder a acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias” (nova redação do art. 406, caput, CPP). Esse prazo deve ser contado a partir do efetivo cumprimento do mandado ou do comparecimento em juízo do réu ou de seu defensor quando inválida a citação ou realizada esta por edital. Em outras palavras, o prazo não é contado a partir da juntada aos autos do mandado, mas da realização da diligência (§1º, art. 406, CPP, nova redação).

O interrogatório não é mais o primeiro ato de instrução juntamente com as diligencias requeridas pelo MP ou querelante na inicial acusatória, porém, na tendência de realçar seu caráter por meio de defesa, o interrogatório é o último ato da instrução, depois da produção de prova testemunhal, pericial e demais diligencias, contudo antes dos debates orais finais.

Caso não seja apresentado a defesa (resposta preliminar escrita), no prazo legal, o juiz nomeara defensor para oferece-la, em até dez dias, atribuindo-lhes vista dos autos (art. 408, CPP), já que a peça é de natureza obrigatória. Depois de apresentada a defesa, o MP ou o querelante será ouvido sobre as preliminares e os documentos carreados, a teor do art. 409, CPP.

Antes das alterações feitas pela Lei nº 11689/2008, uma vez concluída a instrução, não havia fase de diligencias tal como se dava com o rito comum ordinário. As partes eram notificadas para, querendo, apresentar alegações finais, em cinco dias, não se oportunizando a juntada de documentos, face à disposição anterior do CPP de que não seria juntado documento algum nesta fase do processo (redação anterior do § 2º, do art. 406, CPP). Excepcionalmente, se um documento essencial que evitasse a pronuncia não estivesse nos autos, poderia ser apresentado, mitigando-se os rigores da Lei.

Agora, perdeu relevo tal discussão, pois o momento preclusivo para a conclusão da instrução da primeira fase é a da audiência de instrução, que deve concentra todos os atos e diligências pendentes.

Sentença de pronuncia

O Código de Processo Penal, em seu art. 413, caput e § 1º (redação dada pela Lei nº 11.689/2008), chama de “decisão de pronuncia” aquela a ser exarada quando o juiz estiver convencido da existência do lastro probatório necessário para a remessa do réu à segunda fase do julgamento. A pronúncia era denominada de “sentença” pelo legislador originário do CPP de 1941. Nos artigos ainda não alterados, permanece a menção à “sentença de pronuncia”. O texto dado pela reforma de 2008 confere a ela o tratamento mais técnico, reconhecendo-lhe a natureza de decisão.

A pronúncia conterá fundamentação que se limite “à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena.

A pronúncia tem uma técnica específica. A rigor, o réu é pronunciado pelo crime contra a vida ou pelos crimes contra a vida. Não é o réu pronunciado pelos crimes conexos. Se o acusado é pronunciado pelo crime contra a vida e foi denunciado também por outro crime àquele conexo, o juiz declarará levado ao júri, por consequência, os delitos conexos, desde que exista lastro probatório em relação a todos eles. A pronúncia é relativa ao delito contra a vida, suas qualificadoras e causas de aumento. Havendo delito conexo, declarará este remetido ao júri, por decorrência. A inclusão de eventual circunstância agravante, como referido, é encargo do MP ou querelante, por ocasião dos debates orais em plenário (não mais por ocasião do libelo – crime acusatório, extinto que foi pela Lei nº 11.689/2008).

Prolatada a pronunciam, devem ser delas intimados no Parquet, o acusado e seu defensor, notadamente porque um dos efeitos da pronúncia, uma vez mantida a prisão com base na presença dos requisitos da preventiva, é a superação da alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo, a teor da sumula nº 21 do STJ, o que deve ser tomado como reservas, afinal, se o temo do cárcere cautelar não é razoável, denotando abuso, a sumula deve ser afastada, e o relaxamento prisional é de rigor.

Na pronúncia deve o magistrado decidir se o réu enfrentará a segunda fase de julgamento em liberdade, e a nosso ver, só terá cabimento o encarceramento se estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva. Ao pronunciar o acusado, “se o crime for afiançável, o juiz arbitrará o valor da fiança para a concessão ou manutenção da liberdade provisória” (§2º, art. 413, CPP), podendo, se comportar o caso, aplicar medidas cautelares diversas da prisão (art. 319,  do CPP, com redação dada pela Lei nº 12.403/2011).

Impronúncia

 

            A decisão de impronuncia não julga o mérito da denuncia, tendo, pois, conteúdo terminativo.

           

            É a autentica sentença porque encerra o processo (ou, quando mais de um acusado pões fim ao processo quanto ao que foi impronunciado), embora não aprecie os fatos com profundidade por deficiência probatória).

            A impronuncia encerra o judicium accusationis sem inaugurar a segunda fase.

 

Despronúncia

 

            Termo cunhado pela doutrina que equivale a impronúncia de um acusado que, inicialmente havia sido pronunciado.

            A despronúncia pode se dar pelo juiz de primeiro grau ou pelo tribunal. Haverá despronuncia pelo juiz que prolatou a decisão quando ele se retratar ao apreciar a admissibilidade do recurso em sentido estrito interposto (art. 589, CPP), alterando sua decisão de pronúncia para impronúncia.

            De outro prisma, caso o juiz não se retrate e resolva sustentar sua decisão, ainda que pelos próprios fundamentos nela lançados, encaminhará os autos ao tribunal ad quem, que, apreciando o mérito do recurso em sentido estrito pode reconhecer que não foi correta a pronúncia, despronunciando (ou impronunciando) o réu.

Sentença de absolvição sumária

 

            A absolvição sumaria do crime contra a vida julga o mérito da ação penal, em momento antecipado.

            É semelhante ao que se tem como julgamento antecipado do mérito no processo civil.

            A denuncia é julgada improcedente e, por força da coisa julgada material formada, não pode ser reiniciada demanda penal pelos mesmos fatos narrados na peça acusatória.

            A sentença de absolvição sumária encerra a primeira fase do rito escalonado do júri, sem dar seguimento à segunda relativamente ao réu absolvido sumariamente.

Decisão de desclassificação da infração penal contra a vida.

 

            A desclassificação que se tem em vista aqui é a do crime doloso contra a vida para outro delito que não seja de competência do tribunal do júri.

            Desclassificação tem a ver com uma nova definição jurídica dada aos fatos pelo juiz.

            A decisão de desclassificação da infração penal contra a vida tratada neste tópico é a prolatada pelo juiz singular, no rito dos crimes dolosos contra a vida, quando do encerramento de sua primeira fase.

            O magistrado, apreciando os fatos, reconhecerá que o crime ali descrito é diverso de quaisquer tipificações de delitos contra a vida.

            A desclassificação tem, portanto, a natureza de uma decisão interlocutória modificadora de competência. O art. 419, CPP (com nova redação dada pela Lei nº 11.689/2008), prevê a decisão desclassificatória ao avivar que “ quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no § 1º do art. 74 e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja”, ficando a disposição deste último magistrado, o acusado preso (parágrafo único).

            Ponto controvertido é saber se o juiz que receber os autos com decisão de desclassificação preclusa pode ou não arguir conflito de competência. A compreensão dos fatos e da narrativa processual é essencial para se admitir ou não arguição. Se com o juiz recebedor dos autos for verificada situação que leve a prescrição dos fatos – tal como ocorre com o decorrer de demais de vinte anos sem causa interruptiva válida -, inadmissão do conflito é de rigor. A solução, antes de ser fechada, dá ensejo a uma  série de ordens fáticas, que impõe a conclusão de que o jurista hodierno não deve pensar com lastro em standarts, regras tomadas isoladamente, dogmas ou preconceitos.

Rito especial do júri: judicium causae

 

            A segunda fase do rito do júri, o judicium causae, só será iniciada se houver pronuncia de acusado em delito doloso contra a vida. Aliás, a consumação da delimitação do tbema decidendum para os jurados só ocorrerá com a preclusão da pronuncia, isto é, com a certidão de que esta decisão precluiu para o MP e para a defesa, mercê de não ter sido interposto recurso em sentido estrito, ou caso apresentado, após o seu julgamento definitivo.

            Com a imutabilidade do tbema decidendum, haverá possibilidade de oferecimento de rol de testemunhas pelas partes, até o numero de cinco para cada, no mesmo prazo de cinco dias em que era apresentado o libelo-crime acusatório anteriormente à alteração legislativa trazida pela Lei nº 11.689/2008.

            O libelo era a petição inicial da segunda fase do júri. Retratava a pronuncia e fixava a amplitude da acusação que não podia ultrapassar seus limites, porém se admitida que ficasse aquém, na esteira de que o papel atual do MP no processo criminal é dúplice, agindo não só como parte, mas também como fiscal da lei, sem estar obrigado a acusar a todo custo.

            Com a supressão do libelo, a pronuncia passou a ser o único parâmetro para a delimitação da acusação, ficando o MP, assistente ou querelante livre para sustentar em plenário circunstancias agravantes que antes deveriam ser consignadas no libelo-crime acusatório.

Libelo (revogado)

 

            O estudo do libelo-crime acusatório tem importância histórica, mercê de não ser mais previsto na legislação processual penal a partir do advento das modificações inseridas pela Lei nº 11.689/2008.

            Com a visão desse instituto, é possível entender, de um lado, os limites que a teses de acusação encontra na segunda fase do rito do júri, bem como das desvantagens  do reconhecimento judicial de nulidades que poderiam ser sanadas, sem a necessidade de dar prevalência exagerada à forma em detrimento do conteúdo do ato processual.

Instalações da sessão do júri

 

            Noções de sessão do júri

 

            Estando o processo maduro para julgamento pelo tribunal do júri, o juiz-presidente providenciará os preparativos para a sessão.

            A sessão do júri é termo que recai em certa ambiguidade na prática forense. Isso porque em comarca onde são realizados julgamentos de vários processos de crimes dolosos contra a vida por períodos sucessivos,  tem-se o hábito de se dar o nome de sessão á pauta do júri de determinado mês, por exemplo, onde se encontram listados dez processos prontos para julgamento.

            Alistamento dos jurados

 

             O alistamento dos jurados é procedido pelo juiz presidente, nos termos do art. 425, CPP.

            Os jurados serão alistados com base em informações prestadas ao magistrado por entidade idôneas (publicas e ou privadas), de que reúnem as condições para o exercício da função (considerada serviço publico relevante ), mormente que sejam “cidadãos maiores de 18(dezoito) anos de notório idoneidade” (art. 436, CPP).      

 

            Organização da pauta

            A organização da pauta do júri, pressupõe o alistamento dos jurados em uma lista geral.

            O art. 429, CPP, cria a estratégia de predileção na sequencia de julgamentos, estabelecendo que ressalvado “motivo relevante que autorize alteração na ordem dos julgamentos, terão preferencia; 1) os acusados presos, 2) aqueles que estiverem muito tempo na prisão, 3) em igualdade de condições os precedentemente pronunciados.

            Função dos jurados

 

            O Código de Processo Penal traz o regramento da função do jurado, verberando que “o serviço do júri é obrigatório” e que “alistamento compreenderá os cidadãos maiores e 18 (dezoito) anos de notória idoneidade” (art. 436, caput, CPP nova redação dada pela Lei nº 11.689/2008), não podendo nenhum cidadão “ser excluído dos trabalhos do júri ou deixar de ser alistado em razão de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau de instrução” (§1º).de outra parte, “ a recusa injustificada ao serviço do júri acarretará a multa no valor de 1(um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do jurado” (§2º).

            Também será imposta multa “ao jurado que, sem causa legítima, deixar de comparecer no dia marcado para a sessão ou retirar-se antes de ser dispensado pelo presidente” no valor “de 1(um) a 10(dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a sua condição econômica” (art. 442, CPP).

            Podemos analisar assim, que é um risco atribuir tamanha responsabilidade a pessoas as quais não estão devidamente preparadas para fazer um julgamento tão relevante, já que não possuem conhecimento técnico jurídico, o que em consequência acaba por tornar os jurados pessoas facilmente manipuláveis em função da apelação a emoção, tanto parte do defensor quanto pelo promotor, deixando de lado a razão.

Referencia Bibliográfica;

  • TAVORA, Nestor – ALENCAR, Rosmar Rodrigues – Curso de Direito Processual Penal, 9ª Edição – revista, ampliada e atualizada. 2014 – Editora JusPodivm.
  • MIRABETE, Julio Fabbrini – Processo Penal – 16. Ed. ver. E atual. – São Paulo: Atlas, 2004.