Há não muito tempo existiam apenas algumas categorias de softwares dedicados a produção de música. Nem precisamos ir muito longe. No começo dos anos 90 essas categorias eram, basicamente, as seguintes:

- Sequenciadores (ex.: Cakewalk, Logic, Power Tracks);
- Programas de notação (ex.: Encore, Finale);
- Multi-pistas (ex.: Pro Tools, que em sua primeira versão, de 1991, oferecia 4 pistas de áudio e custava U$ 6.000,00!);
- Arranjo automático (ex.: Band-in-a-box).

A tecnologia digital ainda era cara e inviável para o áudio. Os computadores de mesa não eram artigos comuns - especialmente em países como o Brasil - e tão pouco eram capazes de responder às exigências de processamento demandadas pelo áudio digital. Os músicos tinham pavor de sequenciadores, um pouco por preconceito outro pouco por preguiça de aprenderem a linguagem MIDI, que é bastante complicada. Os programas de notação também eram caros, difíceis de serem manipulados e nem sempre produziam partituras de fácil leitura. E o que dizer dos programas de arranjo automático? Soavam tão amadores quanto os teclados inteligentes da linha E da Roland (absolutamente nada contra esses equipamentos mas eles foram projetados para o público amador). Nesse cenário, os gravadores de rolo, o papel pautado, o lápis e a borracha ainda eram as melhores opções.

Na segunda metade da década de 80, os set-ups de teclados e módulos de sons conectados em sequencia via MIDI (em um tipo de ligação conhecida como daisy chain), começaram a ser frequentes nos palcos e especialmente nos estúdios de gravação. As possibilidades de combinações eram imensas mas, basicamente, duas formas de set-up eram mais comuns:

1. Teclado Controlador + Sequenciador + Teclados Escravos e/ou Módulos de Som. O Controlador (Master Keyboard) era responsável, como o próprio nome sugere, por controlar e acessar todos os Módulos de Som e/ou Teclados Escravos e também para gerar as informações MIDI para o Sequenciador. Um Controlador vastamente utilizado foi o Roland A-80, que tinha amplo controle do protocolo MIDI, extensão e ação de piano. Um exemplo de Sequenciador também usado à exaustão é o Roland MC-50. Já entre os muitos Módulos de Som que a indústria despejou no mercado um que merece destaque é o E-mu Protheus.

2. Workstation + Modulos de Som. Essa segunda configuração veio um pouco mais tarde quando surgiram os teclados do tipo Workstation que eram capazes de desempenhar o papel de Controlador, Módulo de Som e Sequenciador ao mesmo tempo. Os demais módulos ligados via MIDI ampliavam ainda mais as possibilidades sônicas do set-up. O Korg M1, lançado em 1988, foi o primeiro grande sucesso dessa categoria. Outros exemplos são o Roland W-30 (que também incorporava um sampler), o Korg 01/W e o Ensoniq TS-12. Essa categoria de teclados continua viva no mercado e em constante evolução. Veja o exemplo do Korg Kronos, lançado neste ano de 2011, o Yamaha Motif XF, evolução de seu impressionante predecessor Yamaha Motif XS, ou o Alesis Fusion 8HD.

Esses set-ups, dependendo de sua complexidade, eram difíceis de serem gerenciados e bastante susceptíveis a erros. Se por um lado levá-los aos palcos era uma aventura perigosa, por outro eles elevavam as apresentações a um novo patamar. Quando tudo transcorria bem, a reação do público era sempre positiva e de surpresa. Eu tive a sorte de ser maluco o suficiente para correr esse risco inúmeras vezes e fui brindado com momentos maravilhosos. É claro que também tive algumas dores de cabeça. Mas, se minha memória não me trai, uma e apenas uma vez tive um problema incontornável que obrigou a banda a parar e pular para a próxima música (fazendo de conta que nada tinha acontecido). Por sorte ou por compaixão não fui demitido!

Já no ambiente dos estúdio esses instrumentos foram mais do que bem vindos e começaram a produzir resultados muito interessantes que chamaram a atenção das pessoas que trabalhavam no ramo. Músicos, produtores e executivos de grandes gravadoras começaram a ver nesse caminho um mundo de possibilidades bastante promissoras. A tecnologia musical, vagarosamente, começou a ganhar mais e mais adeptos.

No próximo texto vamos continuar vendo como se deu a evolução até as atuais plataformas de áudio digital. Até lá!

Abraços,

DANIEL PEIXXE

PS: Quem tiver interesse e quiser se aprofundar ainda mais, procure ouvir o trilha sonora do filme Carruagens de Fogo (Chariots of Fire), composta por Vangelis Papathanassiou. Essa foi a primeira trilha de cinema totalmente feita com sintetizadores e outros instrumentos eletrônicos, quebrando o paradigma das trilhas orquestrais. A fusão dos mundos acústico e eletrônico teve aqui um marco decisivo e representou, especialmente no campo da composição de trilhas para cinema, um verdadeiro divisor de águas. Nesta obra também estão as raízes de muitas estações de trabalho baseadas em sintetizadores que surgiram nos anos subsequentes, inclusive as configurações das quais tratei neste texto.