Preço Astronômico da farinha de Mandioca: Uma explicação Acadêmica

 

Francisco de Assis Pinto Bezerra

Especialista em Economia Agro bioindustrial/UFPA

 

Historicamente às populações sempre foram dependentes da farinha de mandioca, cuja região nordestina e amazônica é a que mais consume este produto, de tal modo que Milton de Albuquerque, na década de 1970, já afirmara: A mandioca é uma cultura milenar, base da alimentação das populações primitivas, rurais e de menor poder aquisitivo. Todavia, no momento contemporâneo, a mandioca deixou de ser objeto apenas do homem do campo ou de ser sinônimo de uma cultura de subsistência ou pobreza, pois as inovações tecnológicas permitem explorar a fécula (goma), um insumo que vem sendo usado em distintas linhas dos ramos industriais.

 

Para se ter uma noção da importância da mandioca na indústria, a fécula tem visibilidade na composição de mais de mil produtos, atuando no ramo da alimentação (como pão, embutidos, margarinas e chicletes), de papelão, têxtil, de cosméticos, da construção civil, de mineração, farmacêutica e petrolífera. Dada a maior valorização deste insumo no mercado (Inter)nacional, é de fácil compreensão concluir que boa parte da mandioca é deslocada para as indústrias, resultando na escassez de matéria para fabricar a tradicional farinha de mandioca, o que eleva o seu preço.

 

Ao lado da forte concorrência industrial, contribui para desequilibrar a produção de mandioca, afetando seu preço, alguns fatores de ordens internas, como: A intervenção de um conjunto de mais de 10 (dez) agentes intermediários na distribuição deste produto, isto é, antes de chegar ao consumidor, à farinha perpassa por vários caminhos, sendo os atravessadores e os feirantes apenas uns dos elos desta cadeia de comercialização, cuja maior retenção do produto fica nas mãos dos armazéns, que controlam o preço. Esta intermediação entre produtor e mercado é fruto de uma região de tamanho continental, onde a dominância de pequenos produtores impossibilita colocar o produto diretamente no mercado, indicando a ausência de politicas públicas agrarias para dar assistência aos produtores de mandioca.

 

O baixo preço pago ao produtor é outro implicador, pois o agente intermediário paga um preço ínfimo pela saca (60 Kg) do produto e, nos pontos atacadistas, chega a comercializar até o triplo do valor pago. O produtor ganha apenas para as suas necessidades básicas, embora de muito trabalho, desestimulando o produtor de mandioca, o que leva a ingressar em outra atividade mais rentável ou migrar para a cidade, reduzindo a produção.

 

Outro fator que contribui para retrair a produção de mandioca foi o ingresso do setor varejista na distribuição dos produtos da mandioca, pois tem gerado uma situação de concorrência com o produtor local. Os supermercados preferem importar a farinha e derivados do Estado do Paraná, em função da constância na oferta, qualidade e a diversificação de produtos, sinalizando que a produção local é pouca competitiva.

 

E, a baixa competitividade, é consequência do pouco investimento na atividade (pois o tipiti, que faz o tucupi, data do século XVIII), fruto da dificuldade de se obter crédito, uma vez que às instituições bancarias exigem critérios formais, como capacidade de pagamento e cumprimento de contratos, o que excluem os pequenos produtores, sem falar que requer leitura e conhecimento para fechar acordo financeiro. Afeta também a competitividade tupiniquim a ideia obsoleta de que o cultivo de mandioca exige nenhuma ou pouca adubação, o que levou a terra a ficar improdutiva, isto sendo visível na região nordeste paraense, onde se iniciou as plantações de mandioca há mais de cem anos atrás.

 

Para intensificar a situação de escassez de mandioca e da farinha, os órgãos da infância e da adolescência vêm combatendo o trabalho de menor de idade nas atividades agrícolas, implicando em “golpe” para a mandioca, visto que demanda muito trabalho.  O pior desta proibição é que os pais deixam de repassar as atividades/valores aos membros mais novos das famílias, colocando em risco a reprodução das tradicionais profissões, como os produtores de farinha de mandioca. E, para se reproduzirem como tal, estes têm que recorrer à contratação de pessoas de fora da família, pagando salários, cuja relação de trabalho é pouco permitida neste segmento, visto que parte da renda é deslocada para os agentes intermediários.

 

Outro recente fenômeno que interfere no ramo da mandioca é a agroindústria da farinha, ou seja, alguns empresários passaram a operar nesta atividade. Trata das casas de farinha mecanizadas, cuja produção é para atender os grandes estabelecimentos comerciais e mercados fora do Estado (Macapá/região nordeste). Neste caso, o produtor da farinha não é o mesmo agente que planta a mandioca (como na produção tradicional), ou seja, muitos produtores não produz mais farinha, e sim comercializa a produção de mandioca in natura ao empresário. Para completar os fatores adversos à produção de farinha, os órgãos ambientais proíbem o corte e/ou aquisição de lenha para os fornos, que torram a farinha, o que beneficia os empresários.

                                    

Tudo bem que o Estado do Pará faça parte da recente inovação no mercado internacional, agregando produtos e valores distintos à mandioca (como ocorre na fecularia no Município de Moju), no entanto o poder público não pode esquecer que somos os maiores consumidores de farinha de mandioca do Brasil, cujo indicativo per capita é de 43 kg/ano, seguido da Cidade de Fortaleza (15 Kg/ano), isto é, milhares de famílias vêm alterando o seu cardápio, dado a impossibilidade de adquirir o produto.

O fenômeno da seca no nordeste ou a entre safra da cultura apenas contribui para manifestar este conjunto de implicações na indústria mandioqueira local que, ao se interagirem, resultou no aumento astronômico da farinha em mais de 90% no final de 2012 (R$ 5,56), aquém da inflação do período (6%). Em 2013, o preço continua subindo, onde a farinha é vendida até R$ 7,00 o quilo. A politica governamental - sugere-se, deve atentar para dois campos: O interno, diminuindo os gargalos que emperram a atividade e, outro, a nível externo, estabelecendo quotas de mandioca destinada à produção de fécula, valendo também isto para exportação dos produtos da mandioca.