PRECEDENTES JUDICIAIS: CONTEXTO HISTÓRICO, TÉCNICA NORMATIVA E SUA INSERÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO.[1]

Lucas Ranieri Ferreira da Rocha

Esp. Carlos Anderson dos S. Ferreira[2]

 

SUMÁRIO: RESUMO; 1 INTRODUÇÃO; 2 A CENTRALIZAÇÃO ENTRE OS SISTEMAS DA CIVIL LAW E COMMON LAW; 3 CONCEITO E TÉCNICAS FUNDAMENTAIS PARA A OPERAÇÃO DOS PRECEDENTES NORMATIVOS; 4 ESTRUTURAÇÃO E EFICÁRCIA DOS PRECEDETNES JUDICIAIS NO CENÁRIO JURIDICO BRASILEIRO; 5 EFEITOS E CLASSIFICÃO VINCULATÓRIOS DOS PRECEDENTES JUDICIAIS; 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS; 7 REFERÊNCIAS.

 

 

 

RESUMO

Na tentativa do legislador brasileiro buscar mais segurança jurídica e coesão as sentenças judiciais, foi adotado pelo NCPC/15 a Teoria Precedentes Judiciais. Sendo assim, é interessante vislumbrar a adoção de um mecanismo judicial predominantemente utilizado pelo sistema da Common Law em uma tradição abarcada pela da Civil Law, como a brasileira, bem como o processo de convergência entre essas duas tradições jurídicas. A de se analisar também as peculiares que esse sistema de Precedentes carrega consigo, como ratiodecidendi, obiter dictum ou distinguishing. Cabe refletir como os Precedentes Judiciais, com suas adições e peculiaridades irá se efetivar no cenário jurídico brasileiro.

1 INTRODUÇÃO

Na busca de equacionar os problemas da sociedade, o Poder Judiciário tem por objetivo resolver os conflitos da forma mais coerente e justa possível. Devido o Estado brasileiro abarcar a tradição românico-germânico da Civil Law, a solvência dos conflitos pelo Judiciário é baseada pela primazia e análise da lei. Assim quando um juiz for provocado por um litigio, ele deve resolvê-lo a partir do que é traçado pela lei, interpretando-a e aplicando-a de acordo com o caso.

É evidente que a lei se demonstra muito rígida quando aplicada ao caso concreto, o que leva a impossibilidade de conceber um Estado exclusivamente legalista. Conforme esclarece Elpídio Donizetti, isso acontece seja porque a sociedade passa por constantes modificações que não são acompanhadas pelo legislador, seja por que este nunca será capaz de tutelar e prever todas as situações concretas e futuras submetidas à observância do juiz. (DONIZETTI, 2015)

É nessa falta de especificidade da lei que se abria um pretexto para a interpretação do judiciário, – uma vez que, ao juiz é deferido o dever de controlar a constitucionalidade da lei – onde não se exigia do magistrado uma postura hermeneuticamente construtiva nas soluções dos litígios. Deste modo, era possível que em casos iguais o mesmo tribunal proferisse decisões distintas, ou, ainda, que decisões em primeira instância fossem contrárias ao entendimento dos Tribunais Superiores.

É nesse sentido que o Novo Código de Processo Civil de 2015, adota uma solida teoria de precedentes, para que o sistema jurídico possa gozar dos benefícios da previsibilidade, excelência e qualidade na produção de decisões judiciais. Dessa forma, os artigos 926-928 do novo CPC, impõem uma nova abordagem do direito jurisprudencial no Brasil, a fim de adequá-la a uma nova tradição jurídica. Podendo-se perceber uma tendência mundial de convergência entre os sistemas da Common Law e Civil Law.

2 A CENTRALIZAÇÃO ENTRE OS SISTEMAS DA CIVIL LAW E COMMOM LAW

O Brasil adota o modelo jurídico romano-germânico de Civil Law, diretamente relacionado à produção legislativa, no qual predomina o positivismo jurídico e que se baseia na estrita aplicação da lei pelo juiz, ou seja, o magistrado assim é considerado a “boca da lei”. Como observa Morgana Galio, a criação da tradição jurídica romano-germânica tem suas origens no século XII e XIII no período do Renascimento da Europa Ocidental. E posteriormente foi modificado e consagrado com surgimento das teorias de Montesquieu (com a divisão dos poderes) e Rousseana. O que deu origem a um intenso processo de codificação do direito, limitando o papel do juiz com a finalidade de garantir a tão sonhada igualdade entre todos. (GALIO, p. 4, 2015).

Por outro lado, a Common Law representa um modelo antagônico, no qual as fontes de direito são as decisões judiciais, desta forma o desenvolvimento deste sistema jurídico se deu de maneira ininterrupta, baseado no cotidiano da sociedade inglesa. Assim, como discorre Morgana Galio, na tradição de Common Law o direito não sofreu as amarras de uma codificação, razão pela qual permaneceu aberto e íntimo da ordem judicial. A tradição de Common Law entende que direito é “coisa de juristas e que não pode ser senão a ordem dos juristas a fixá-lo e exprimi-lo”, garantindo sua evolução com relação às necessidades de uma sociedade em crescimento. (GALIO apud GROSSI, 2015, p. 5).

Foi a partir do sistema jurídico de Common Law que foi desenvolvido a doutrina do Stares Decisis que tem sua origem na expressão latina “stare decisis et non quieta movere”,ou seja, “mantenha aquilo que já foi decidido e não altere aquilo que já foi estabelecido”. Segundo Donizetti, o Stares Decisis é entendido como precedente de respeito obrigatório, corresponde à norma criada por uma decisão judicial e que, em razão do status do órgão que a criou, deve ser obrigatoriamente respeitada pelos órgãos de grau inferior. É essa doutrina que é responsável pela definição de precedentes vinculantes. (DONIZETTI, 2013).

Por mais que as dicotomias entre os dois sistemas ainda exista, há décadas nota-se uma aproximação entre a Civil Law e a Common Law. Onde cada vez é maior a relevância que a jurisprudência assume na civil law; e são cada vez mais frequentes as normas jurídicas na common law, que advêm de textos legais positivados, como pontua Eduardo Talamini(2016).

Assim, a adoção pelo novo ordenamento processual, dos Precedentes Judiciais, demonstra não somente um avanço no sistema jurídico brasileiro, mas uma postura global de centralização dos sistemas de Civil Law e Common Law, o que Cappelletti denomina de “convergência evolutiva”. (CAPPELLETTI, 1993, p. 123-124).

Sobre o tema em questão, o doutrinador italiano Michele Taruffo chama a atenção para o fenômeno por ele denominado “consequências jurídicas da globalização”, que se trata de um fator da evolução dos modelos jurídicos e abrange diversas áreas do direito, em especial o processo civil, assumindo crescente relevância para os juristas em todo mundo. (GALIO apud TARUFFO, 2015, p.6)

Desta forma, podemos pautar que a globalização teve um papel crucial nesse ponto de sincronização entre os sistemas de direito inglês e continental. Já que o avanço tecnológico, a rapidez de informação, não somente possibilitaram o encontro mais comum entre interesses e sociedades, mas abarcou e levou a troca de experiências na área jurídica.

3 CONCEITOS E TÉCNICAS FUNDAMENTAIS PARA A OPERAÇÃO DOS PRECEDENTES NORMATIVOS

Com a disposição dos precedentes judiciais no ordenamento jurídico brasileiro, através do CPC/15, é comum surgir duvidas da sua inserção e utilização, pelos interpretadores do direito. Ainda mais quando analisamos um instituto novo, transportado de uma cultura jurídica antagônica à brasileira, em especifico quando nos referimos a três conceitos importantes para a operalização desse instrumento inovador. Como esclarece Patrícia Perrone:

 

São eles:i)a ideia deratio decidendiouholding, que chamaremos de “razão de decidir” do julgado;ii)a noção deobiter dictum, que designaremos “consideração marginal ao caso”; eiii)o mecanismo de distinção entre casos (distinguish). (MELLO, 2016).

 

Para Teoria dos Precedentes, o ratio decidendi ou holding, se refere à parte de uma decisão judicial, que vinculará os demais órgãos judiciais. Como afirma Didier (2015): “em sentido estrito, o precedente pode ser definido como sendo a própria ratio decidendi”. A ratio decidendi corresponde, portanto, à questão de direito que foi enfrentada como uma premissa necessária a alcançar o dispositivo do julgamento. Este é o conteúdo que vinculará os casos futuros.

Como clarifica Fredie Didier:

A ratio decidendi – ou, para os norte-americanos, a holdins – são os fundamentos jurídicos que sustentam a decisão; a opção hermenêutica adotada na sentença, sem a qual a decisão não teria sido proferida como foi. “A ratio decidendi (...) constitui a essência da tese jurídica suficiente para decidir o caso concreto (rufe of law)”.  (DIDIER apud TUCCI, 2015, p. 442).

 

Outro ponto de particularidade da Teoria dos Precedentes é em relação ao obter dictum, que envolve a discussão de questão jurídica que não foi utilizada como carga vinculatória na decisão do tribunal, isto é, opiniões eventuais manifestadas por membro(s) do tribunal, fundamentos que não foram acolhidos pela maioria. Como alude Didier (2015): “o obter dictum é a proposição ou regra jurídica que não compuser a ratio decidendi”.

Como expõe Fredie Didier:

O obter dictum, ou simplesmente dictum, é o argumento jurídico, consideração, comentário exposto apenas de passagem na motivação da decisão, que se convola em juízo normativo acessório, provisório, secundário, impressão ou qualquer outro elemento jurídico-hermenêutico que não tenha influencia relevante e substancial para a decisão. (DIDIER, 2015, p.444).

 

Proferida a decisão, e uma vez gerado o precedente judicial vinculante, compete o juiz interpreta-lo em aplica-lo aos novos casos semelhantes. Mas como bem observa Oldack Alves, a aplicação de um precedente não pode ser feito de qualquer maneira. O magistrado deve comparar os casos concretos postos à sua analise com a ratio decidendi, firmando na decisão que constitui o precedente judicial, a fim de verificar se guardam alguma semelhança.

Segundo Cruz e Tucci, esse método de confronto, pelo qual o juiz verifica se o caso em julgamento pode ou não ser considerado análogo ao paradigma”, denomina-se distinguishing (ou distinguish).

Consoante ao ensinamento de Fredie Didier:

Fala-se em distinguishing (ou distinguish) quando houver distinção entre o caso concrento (em julgamento) e o paradigma, seja porque não há coincidência entre os fatos fundamentais discutidos e aqueles que serviram de base à ratio decidendi (tese jurídica) constante no precedente, seja porque, a despeito de existir uma aproximação entre eles, alguma peculiaridade no caso em julgamento afasta a aplicação do precedente. (DIDIER, 2015, p. 491).

 

Outra característica se concerne na técnica de superação de Precedentes, denominado overruling ou overriding. Isso acontece como informa Donizetti (2015)

 

Como explicita Fredie Didier:

 

  • é a técnica através da qual um precedente perde a sua força vinculante e é substituído (overruled) por outro precedente. O próprio tribunal, que firmou o precedente pode abandoná-lo em julgamento futuro, caracterizando o overruling. Essa substituição pode ser: i) expressa (express overruling), quando um tribunal resolve, expressamente, adotar uma nova orientação, abandonando a anterior; ou ii) tácita ou implícita (implied overruling), quando uma orientação é adotada em confronto com posição anterior, embora sem expressa substituição desta última. O implied overruling não é, porém, admitido no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista a exigência de fundamentação adequada e especifica para a superação de uma determinada orientação jurisprudencial (art. 927, §4°, CPC). É preciso dialogar com o precedente anterior para que se proceda ao overruling. (DIDIER, 2015, p.494).

 

4 ESTRUTURAÇÃO E EFICÁCIA DOS PRECEDENTES JUDICIAIS NO CENÁRIO JURÍDICO BRASILEIRO

 

No bojo das modificações do NCPC, a inauguração dos Precedentes Judiciais representa uma mudança de paradigma, não somente processual, mas na cultura jurídica brasileira como um todo. Por mais que a expressão “precedentes judiciais” já estivesse presente antes do código processual de 2015, como esclarece Eduardo Talamini, ela se limitava de forma que a resolução de novos casos por decisões analógicas, não eram proeminentemente qualificadas como um precedente vinculatório, por mais que já fosse fácil prever que no futuro ela assumiria essa função. (TALAMINI, 2016).

Com o NCPC, a observância dos Precedentes Judiciais é obrigatório, o que favorece uma acepção mais ampla e extensiva do termo. Assim um pronunciamento judicial já se origina com o parâmetro vinculatório, tal presente no artigo 927, inc. III do NCPC: “O juízes e os tribunais observarão: os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamentos de recursos extraordinário e especial repetitivos”.

Com a admissão do novo código processual outro ponto de interesse, foi no perfilhamento dos Precedentes Judiciais de origem da Common Law ao modelo brasileiro da Civil Law, circunstância que levou a debates na tramitação do projeto do CPC no Congresso Nacional. Como elucida Hermes Zanetti e Carlos Frederico, uma parcela da doutrina enxerga nos precedentes uma absorção impropria de outra cultura judicial, o que causa uma ruptura catastrófica com os princípios da legalidade e da separação de poderes; outra parte da doutrina visualiza os precedentes como sendo decorrentes das mudanças hermenêuticas vislumbradas tanto em países de tradição romana, quanto anglo-saxônica. (ZANETI e PEREIRA, 2016).

Por mais importante que sejam as criticas, mesmo com o contexto da Civil Law, nada leva a crer que o acolhimento dos Precedentes Judiciais desestabiliza o nosso ordenamento jurídico brasileiro frente à observância pura e simples da lei. Pelo contrario, como clarifica Elpídio Donizetti, o que se pretende, é oferecer soluções semelhantes para questões que possuam o mesmo embasamento jurídico, assegurando aos jurisdicionados a mínima segurança jurídica que se espera de um Estado Democrático de Direito. O que permitiria também evitar a utilização excessiva de recursos e o aumento na quantidade de demandas (DONIZETTI, 2015).

Complementando nesse sentido, Morgana Henicka Galio afirma que:

 

 “O sistema brasileiro é fundamentalmente baseado na lei. Diante desta situação, que não tende a ser alterada, convém aprimorar os institutos já existentes, a fim de garantir a segurança jurídica dentro da realidade do nosso sistema. É neste contexto que a jurisprudência e as decisões judiciais devem ser entendidas como instrumentos disponíveis para conciliar a aplicação da lei, justiça e segurança jurídica. Sendo assim, não há incoerência em aproveitar os princípios do common law, uma vez que não se pretende mitigar o poder de decisão do juiz e sim uniformizar as decisões judiciais”.  (GALIO, p. 2, 2015)

 

É de se esperar que um instituto tão novo quanto o da Teoria dos Precedentes ainda possa gerar algum tipo de confusão no meio jurídico – seja porque o termo já era utilizado em sentido estrito antes do NCPC, seja pela já existência de outros regimes vinculatórios semelhantes – mas é inquestionável que o novo código tenha dado um passo adiante na busca do desenvolvimento processual constitucionalista.

 

5 EFEITOS E CLASSIFICAÇÃO VINCULATÓRIOS DOS PRECEDENTES JUDICIAIS

 

No direito brasileiro, os precedentes judiciais tem aptidão para produzir diversos efeitos jurídicos. Fredie Didier (2017) observa que tais efeitos decorrem do ratio decidendi, e é preciso que a mesma tenha sido adotada pelos membros do colegiado. E a contrario sensu as decisões não referendadas pelo tribunal não possuirão efeitos de precedentes vinculantes, nesse caso obiter dicta.

Segundo Fredie Didier (2017) no Brasil há ao menos seis tipos de efeitos jurídicos que um precedente por ter: (i) o vinculante/obrigatório; (ii) persuasivo; (iii) obstativo da revisão de decisões; (iv) autorizante; (v)rescindente/deseficacizante e de (vi)  revisão da sentença. Na busca de se fazer um apanhado geral adotemos a perspectiva da doutrina que dá foco a três efeitos: (i) o vinculante/obrigatório (ou vinculação forte), o (ii) o persuasivo (ou vinculação fraca) e o (iv) autorizante (ou vinculação média).

Em relação à eficácia vinculante/obrigatória, Fredie Didier Júnior (2017) expõe, que deve se ter em mente, que em determinadas situações, a norma jurídica (fundamentação jurídica, ratio decidendi) estabelecida a partir das decisões judiciais tem o condão de vincular decisões posteriores, obrigando que os órgãos jurisdicionais adotem aquela mesma tese jurídica na sua própria fundamentação.

Eduardo Talamini (2016) explica que o exame dos vinculantes em sentido estrito pela justiça é obrigatório, assim a própria imposição da adoção do pronunciamento que se reveste de tal força, pelos demais órgãos aplicadores do direito na generalidade dos casos em que a mesma questão jurídica se puser – sob pena de afronta à autoridade do tribunal emissor daquela decisão.

Fredie Didier adiciona que:

Para adequeda compreensão desse dispositivo, é necessário observar que o efeito vinculante do precedente abrage os demais efeitos, sendo o mais intenso de todos eles. Por isso, o precedente que tem efeito vinculante por determinação legal também deve ter reconhecida sua aptidão para produzir efeitos persuasivos, obstativos, autorizantes etc. (DIDIER, Fredie, 2017, p.520).

 

O precedente com efeito persuasivo como o próprio nome já se refere, é utilizado para designar a força persuasiva de um determinado precedente judicial, porem este não tem eficácia vinculante. Como Fredie Didier (2017) observa de Tucci e Souza, o precedente possui apenas força persuasiva na medida em que constitui indício de solução racional e socialmente adequada. Assim nenhum magistrado esta obrigado a segui-lo, se este os faz, é por estar convencido de sua correção.

Nesse sentido Eduardo Talamini designa tais precedentes judiciais detêm “vinculação fraca ou vinculação padrão” (TALAMINI, 2015). Didier (2017) afirma que é a eficácia mínima de todo precedente.

Fredie Didier Júnior vislumbra que:

Há situações em que o próprio legislador reconhece a autoridade do precedente persuasivo e isso tem o condão de repercutir em processos posteriores. Isso ocorre, por exemplo, quando admite a interposição de recursos que têm por objetivo uniformizar a jurisprudência com base em precedentes judiciais, tais como os embargos de divergência (art.1.043, CPC) e o recurso especial fundado em divergência (art.105, III, “c”, CF e 1.029, §1°, CPC). São casos em que a existência de precedentes em sentido diverso é utilizada como mecanismo de convencimento e persuasão do julgador no sentido de reformar sua decisão e adotar aquele outro entendimento. (DIDIER, Fredie, 2017, p.521).

 

Os precedentes judiciais detêm efeito autorizante (ou de vinculação média), quando é determinante para admissão ou acolhimento de ato postulatório. Como alude Talamini (2015), a vinculação média, se da a partir de hipóteses em que, haja vista a existência de precedentes ou de uma orientação jurisprudencial consolidada, a lei autoriza os órgãos judiciais ou da Administração Pública a adotar providências de simplificação do procedimento e que possibilita consequente celeridade do processo.

Fredie Didier (2017, p.523) considera os seguintes exemplos:

i) a existência de “tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante”, ao autorizar a concessão de tutela de evidencia documentada (art.311, II, CPC); ii) bem como o precedente ou enuciado de súmula contrariados pela decisão recorrida, ao implicar o provimento do recurso por decisão monocrática do relator (após garantido o contraditório) (art.932, V, CPC).

 

Eduardo Talamini (2015) também observa a regra que dispensa o órgão fracionário do tribunal de remeter a questão de constitucionalidade para o seu plenário ou órgão especial, nos termos do art. 97 da CF/88, quando o STF já tenha firmado entendimento anterior deste (art. 949, par. ún.).

Conclui o advogado Eduardo Talamini que:

 

Nessas normas, a ênfase não está tanto na imposição, na obrigatoriedade, de observância do precedente (que, de todo modo, pode existir – e normalmente existe – por força de outras normas, adiante examinadas), mas sim na autorização ao órgão jurisdicional inferior (ou ao procurador público) para que ele deixe de observar uma determinada imposição, para que ele possa, invocando o precedente, simplificar sua atividade (em vez de levar a apelação ao julgamento do colegiado, o relator mesmo julga; em vez de mandar o recurso especial ao STJ, o próprio tribunal local já o extingue – e assim por diante). (TALAMINI, Eduardo, 2015, p.(?)).

 

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Diante da mudança trazida pelo NCPC acerca dos precedentes judiciais é natural que muitos debates estejam por vir, de forma que estão sendo desenvolvidas características de um modelo tipicamente da common law em um ordenamento jurídico tipicamente da civil law. A partir deste novo paradigma, o processo passa a ser visto como verdadeiro instrumento de criação de direito, pois o que for ali decidido poderá ser vinculado a outros casos.

Este tema também deve ser analisado pelo ponto de vista dos magistrados, que tem que se acostumar ao fato de que suas decisões não serão mais individualizadas ao caso específico que estes estejam julgando, mas que poderá servir de referência para tomada de decisão do judiciário em processos futuros, ou seja, esses julgados podem vir a influenciar casos que ainda serão levados ao crivo deste órgão. Isso faz com que o magistrado tenha que usar de sua técnica para dar a decisão mais correta e mais completa possível a cada caso, não deixando brecha para interpretações diversas, ou então erros que possam descaracterizá-las no futuro. Estes atuarão como verdadeiros legisladores, mesmo ainda estando vinculados a certos preceitos.

Observa-se uma mudança de mentalidade por parte operadores do direito, doutrinadores e outros, que alteram certas características implementadas em nosso ordenamento jurídico como forma de adaptá-lo à sociedade que está em constante mudança. Neste caso seria a lenta transformação de um ordenamento predominantemente legalista para um que privilegia o conteúdo das decisões judiciais de seus magistrados.

Esta alteração trazida pelo novo CPC tem o intuito de gerar celeridade ao processo, isonomia e segurança jurídica, sem, contudo, engessar a interpretação de tribunais e juízes, como muitos tem criticado. Há intenção de abertura, para que haja diálogo entre os processos, para que se crie um contexto de coerência dos julgados. Deverá ser analisada a motivação apresentada pelo magistrado, pois através dele será possível observar se o mesmo aplicou a lei, se observou precedentes, os motivos de ter desconsiderado estes últimos, se for o caso; o motivo de tê-los adotado, dentre outras fatos.

7 REFERÊNCIAS

CAPPELLETTI, Mauro. Juízes legisladores? Tradução por Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabres Editor, 1993.

DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 10° ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2015.

DIDIER, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 12° ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2017.

DONIZETTI, Elpídio. A Força dos Precedentes do Novo Código de Processo Civil. Disponível em: < https://elpidiodonizetti.jusbrasil.com.br/artigos/155178268/a-forca-dos-precedentes-do-novo-codigo-de-processo-civil >. Acesso em: 10 de março de 2017.

DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 17° Ed. São Paulo: Atlas, 2013.

GALIO, Morgana Henicka. Vinculação aos precedentes: crítica e reflexão acerca da segurança jurídica e eficácia do judiciário. Disponível em: < http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=68ff9c82826dcda9 >. Acesso em: 10 de março de 2017.

MELLO. Patrícia Perrone. Como se Opera com  Precedentes no Novo CPC? Disponível em: < https://jota.info/artigos/como-se-opera-com-precedentes-segundo-o-novo-cpc-22032016>. Acesso em: 09 de abr. 2017.

NETO. Oldack Alves da Silva. Conceitos Básicos Inerentes à Teoria dos Precedentes Judiciais. Disponível em: . Acesso em: 08 de abr. 2017.

TALAMINI, Eduardo. O que são os ´´precedentes vinculantes`` no CPC/15. Disponível em:http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI236392,31047O+que+sao+os+precedentes+vinculantes+no+CPC15. Acesso em: 10 de março de 2017.

 

[1] Paper apresentado à disciplina Recursos no Processo Civil, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco- UNDB.

[2] Professor da disciplina Direito Processual Penal I da UNDB.