A idéia de escrever um artigo que fale de uma disciplina vista do “avesso” parte de várias idéias e leituras ainda principiantes de autores sociológicamente quase que improváveis.

Ao efetuar a matrícula na disciplina de estágio 3 do oitavo semestre no curso de Ciências Sociais da UFPEL,comecei a me perguntar sobre o trabalho que seria realizado nesta disciplina visto que já haviam sido concluídas as disciplinas de estágio 1 onde foram realizadas as observações e o primeiro contato para muitos com as instituições escolares,e o estágio 2 onde praticamos a “possibilidade”de ensinar sociologia.

Para minha surpresa a proposta de trabalho das educadoras titulares do estágio 3,fora a da composição de um artigo onde pudessem conter nossas percepções sobre a efetiva aplicação da disciplina de sociologia no ensino médio.

Então minha cabeça começou a fervilhar, e neste fervilho exposto pensei em fazer uma conexão entre sociologia, educação, arte, modernidade e outros temas que só poderiam culminar em um processo vulcânico.

Voltando ao campo do possível resolvi satisfazer minha excentricidade me concentrando na sociologia, na educação e na vida.

Neste momento voltei-me ao mestre Paulo Freire de onde com certeza tiraria o suporte necessário para poder sonhar. Voltando-me a Paulo Freire e ao estágio comecei a reformular indagações, minhas, dos educandos,educandas e da minha futura profissão.

Nestas indagações pude repensar o quão responsável é a disciplina que escolhi lecionar pela formação “cidadã” dos jovens que começam a apreendê-la no ensino médio.

Formação cidadã dita desta forma, parece impetuosa, impafiosa, "coisa de sociólogo" porém a formação que quero falar é outra, é uma formação que deforma conceitos neoliberais mas que também se declara oposta à venda nos olhos, à obscuridade dos discursos cheios de cientificidade e totalmente alheios à prática pedagógica.

Lembrei-me então que dos poucos debates realizados durante o estágio, quando os educandos eram trazidos para seu cotidiano eram capazes de ocupar os mais diversos espaços políticos onde podiam sentir-se parte de um processo de desigualdade operado por um sistema que se legitima através da exploração e outros problemas sociais.

Nestes momentos pude me dar conta de que a formação cidadã que eu gostaria de propor não estava presente apenas nos objetos científicos aos quais me debrucei e ainda me debruçarei durante minha formação mas também na experiência de meus alunos, que ali eram muito mais que abstrações, eram possibilidades vivas de transformação:

”Por que não aproveitar a experiência que têm os alunos de viver em áreas da cidade descuidadas pelo poder público para discutir por exemplo,a poluição dos riachos e dos córregos e os baixos níveis de bem estar das populações,os lixões e os riscos que oferecem à saúde das gentes.Por que não há lixões nos bairros ricos e mesmo puramente remediados dos centros urbanos?” (Freire,1996,p.30)

 

O desafio agora era falar de sonhos, de experiências, de educação e de sociologia o desafio era abandonar a neutralidade, pois ”ninguém pode estar no mundo, com o mundo e com os outros de forma neutra”. (Freire,1996,p.77)

O desafio era a partir de então, era“desneutralizar”as explicações sociológicas para a pobreza,a marginalidade,o Subdesenvolvimento.

Logo o desafio era o de propor um imanência ao programa de sociologia.”Agora como precisamente chegar a isso, é uma questão de arte.”(Tadeu; Corazza,Zordan,2004.p.178)

“Artisticamente” era preciso traduzir a sociologia “academicista” para um sociologia dos e para os educandos imanente à suas vidas.”Há nisso tudo um risco,mas acredito que nas circunstâncias atuais valha a pena corrê-lo”(Artaud,1996,p.175)

 O objetivo de trabalhar a disciplina para mim sempre fora o de “plantar” questionamentos para que os educandos pudessem perceber para além da mídia aberta, para além do que, por exemplo, se apresenta no jornal Nacional que aproveitando-se do seu poder de influência forma opiniões baseadas em conceitos dentro de um padrão:de direita,masculinos,heterossexuais,brancos,de classe média,que se traduzem,muitas vezes em noções machistas,racistas e preenchidas de todo o preconceito que tem por objetivo resignar o popular ao inculto e incapaz.
Penso que ao trabalhar sociologia no ensino médio era imprescindível discutir a degradação do trabalho em tempos de advento de celebridades e do topa tudo por dinheiro para além Marx, era preciso discutir o senso comum para além de Roberto da Matta era preciso discutir o suicídio (neste caso o da sociedade) para além de Durkheim.

Não que seja possível desprezar os clássicos autores trabalhados em sociologia mas também não é possível preservar o gosto pela superioridade da abordagem dos mesmos por alguns professores,é preciso trabalhar estes autores intervindo dialogando com os alunos,tendo neles um meio e não um fim para estudar sociologia.

 “É por isso que precisamos de um plano de imanência. Para pensar,para se comportar,para experimentar,para intervir.”( Tadeu;Corazza;Zordan,2004.p.150)

Como futura licenciada em sociologia, pretendia algo novo distante da sala de aula da universidade onde alguns muitos professores, mesmo se dizendo críticos e esquerdistas, não perdem oportunidades de cultivar o “superado” e nortear a conduta de seus alunos para a distância da realidade fazendo-os contribuir para seus trabalhos de onde retiram o suporte necessário para dar a “manutenção” essencial  para sua vaidade.

O espaço de tempo foi curto os problemas também,o papo pessimista na sala dos professores,o dinheiro Curto para o Xerox,a escola fechada várias vezes à noite não dando oportunidade de utilizar os recursos para as aulas ou muitas vezes nem conseguindo dar aula,o cansaço físico e mental,o medo do desconhecido.

A experiência também foi curta,porém a vontade de proceder de maneira “certa” como diria o mestre Paulo Freire,me fez aprender bem mais do que ensinar no estágio.

O caminho segue,meu processo de formação também mas o sonho de aprender “ensinando” permanece e se renova principalmente em situações como as do Dezembro passado onde encontrei uma educanda de uma das observações para o estágio 2, no corredor do Enem onde ela me chamou de professora ao me contar que pretendia cursar matemática na UFPEL,e eu feliz à respondi: - Seremos colegas com certeza.

 

 

 

 

 

 

 

 

Bibliografia:

 

ARTAUD,Antonin.Escritos de Antonin Artaud. Porto Alegre:L&PM,1996

 

CORAZZA,S.M.;ZORDAN,P.;TADEU,T..Linhas de escrita.1.ed.Belo Horizonte:

Autêntica,2004.v.1.208p.

 

FREIRE,Paulo.Pedagogia da AUTONOMIA:Saberes necessários à prática educativa.

São Paulo:Paz e Terra,2009,146 p.