Por que ser professor? 

          Invariavelmente sou questionada sobre minha formação profissional e a resposta, quase sempre, parece desconsertar o interlocutor, causando-lhe um espanto irremediável como se eu fosse portadora de uma chaga cruel. São contínuas as perguntas do tipo:

          _ Você é formada em Direito e dá aulas em escola pública? Não passou na OAB, nem num concurso... né?  ( um ar de piedade paira)

         Ou ainda...


        _ Você é louca? Deixar de advogar, ter vida boa, pra ‘tá quebrando a cabeça com quem não quer nada?

        Sim, eu sou bacharelada em Direito, especialista em Direito Penal e Processo Penal, por sinal uma das áreas que muito me apaixona, mas também sou Licenciada em Letras e OPTEI, DECIDI, RESOLVI, permanecer em sala de aula como professora de Língua Portuguesa, mobilizando adolescentes e jovens para o ser e fazer social através dos textos. Escolhi continuar travando batalhas diárias, não como as de Cervantes (embora os dragões e gigantes também nos persigam), em nome da efetivação da cidadania desses jovens.

       Assim como o Direito tutela garantias individuais e coletivas, visando a paz e a ordem social por meio de suas leis, a docência em Língua Portuguesa propende à formação linguística e social do indivíduo, o despertar de sua visão crítica e a participação ativa na sociedade por meio da palavra, do (re) construir textual.

       Creio no poder do texto como ferramenta indispensável à conscientização e formação de indivíduos, de igual modo que acredito no Direito como meio de efetivação da Justiça e garantia da ordem social. Na verdade, acredito naquilo que se vive com paixão, desprendido de rotulações ou títulos, indiferente às honrarias.

       Sou professora com muito orgulho e uma apaixonada pelo meu trabalho, o que não me impede, porém, de afirmar que o direito fundamental à educação, como prevê a Constituição Federal em seu art. 205  “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” , não está sendo plenamente respeitado. Outrossim,  nós professores não somos tratados com dignidade pelos governantes, trabalhamos em condições lastimáveis e recebendo salários vergonhosos e, ainda, somos desrespeitados diariamente por nossos alunos (alguns). Todavia, todos esses percalços não me impedem de manter-me firme nesta luta.

       Prefiro, sinceramente, investir na formação dos meus alunos, no poder criativo e transformador que eles têm (e na maioria das vezes desconhecem ), despertando paixões pela leitura e escrita, a ter que defendê-los em uma contenda judicial. Prefiro ainda, empregar meus argumentos em sala de aula que no Tribunal do Júri, tentando livrá-los de uma condenação.

      A mim interessa mais embebê-los na magia de Cecília Meireles, na beleza profunda de Patativa do Assaré e Rogaciano Leite, nos tantos mundos de Moacyr Scliar e Rubem Braga, tornando-os cidadãos livres em seu pensar e agir, que valer-me de lacunas da lei ou de remédios constitucionais  para mantê-los “livres”.

      Em sala de aula também faço uso do Direito, lá sou advogada, promotora, juíza, ré... Misturo poesia e normas; garantias e utopias; fracassos que condenam, mas também ensinam.  Em suma, sou professora porque ainda acredito no poder da educação e, apesar de tudo, a poesia ainda vive em minha sala de aula. Porém, quando a palavra não for suficientemente forte para vencermos, o Direito nos socorrerá!

 

Erika Jane Ribeiro

Poeta e  Professora de Língua Portuguesa da Rede Pública de Ensino do Estado do Pernambuco.
Licenciada em Letras pela UPE/FFPP
Bacharelada em Direito pela UNEB
Especialista em Direito Penal e Processo Penal  pelo Complexo Jurídico Damásio de Jesus/UNAR