POLÍTICA E LEGISLAÇÃO AMBIENTAIS NA PERCEPÇÃO DE
ESTUDANTES DE AGRONOMIA E ENGENHARIA FLORESTAL DA
UFRPE (trabalho apresentado na JEPEX 2012 - UFRPE)
Isabelle Maria Jacqueline Meunier
Introdução
A política ambiental brasileira teve seu marco fundamental na Lei Nº 6.938 de 31 de agosto de 1981, consolidando-se
com a promulgação da Constituição Federal, em 1988. A partir dos anos 1990 foram aprovadas as leis ambientais
mais importantes, como a Lei de Crimes Ambientais (Lei Nº 9.605/ 1998) e a que estabelece o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação (Lei Nº 9.985/ 2000), entre diversas outras e, principalmente, se estabeleceram princípios,
diretrizes e instrumentos da política ambiental. O aparato legal ambiental brasileiro é considerado um dos mais amplos e
completos do mundo (Souza Jr., 2011; Cericato, 2008), aliado à estruturação de uma política ambiental descentralizada,
que insere a sociedade e os diferentes níveis de poder público na sua formulação e execução.
Por outro lado, para que haja cumprimento das leis e participação social, é necessários conhecimento das leis e
políticas públicas para o meio ambiente. Cericato (2008) reconhece a lei como um instrumento fundamental para o
respeito ao meio ambiente mas alerta para a necessidade de sua democratização para que a mesma seja cumprida.
Segundo Beheregaray (nd), a incorporação das leis ambientais no processo educacional, de forma permanente, pode
ajudar a alcançar metas de prevenção importantes ao equilíbrio ambiental, sendo a sua correta compreensão um
instrumento eficaz da política de educação ambiental.
A incorporação das leis ambientais no processo educacional pode se dar a todos os níveis de ensino, mas é
especialmente necessária na formação profissional superior, ainda mais em cursos de graduação como Agronomia e
Engenharia Florestal, que lidam diretamente com questões ambientais objetivas. As formas de abordagens dessa
temática nos currículos dos cursos podem ser as mais variadas, incorporadas ou não a disciplinas específicas e, além de
transmitir o conteúdo normativo, devem permitir o exercício da análise e da crítica, contribuindo para a formação do
cidadão e para o fortalecimento dos valores democráticos.
Para o planejamento de ações educativas que ajudem a desenvolver a cidadania ativa e participativa dos
universitários e os preparem para os desafios da vida profissional é necessário conhecer como os jovens percebem a
formulação e a aplicação da legislação e das políticas ambientais nacionais e as formas que interagem no meio
universitário e fora dele para obter informações e formar opiniões. Para isso, diferentes instrumentos podem ser usados
e, entre esses, questionários focando diferentes aspectos do tema contribuem para avaliar a percepção e o conhecimento
sobre o assunto, subsidiando ações futuras que possam promover maior sensibilização e, ao mesmo tempo, fornecer as
informações necessárias à formação profissional.
Este trabalho objetivou investigar o conhecimento e a percepção de estudantes de Agronomia e Engenharia Florestal
da Universidade Federal Rural de Pernambuco, em Recife, sobre a legislação e a política ambiental do Brasil, buscando
identificar as lacunas a serem supridas por meio de diferentes ações educativas, curriculares e extra-curriculares.
Material e métodos
Foi adotado questionário integrado por 24 perguntas, sendo a maioria de questões fechadas, de múltipla escolha,
aplicado a turmas dos cursos de Agronomia e Engenharia Florestal da Universidade Federal Rural de Pernambuco
(UFRPE), campus Dois Irmãos, que não tinham cursado disciplinas relacionadas à legislação e à política ambiental.
Para isso, selecionaram-se turmas dos períodos inicial e final do curso de Agronomia, que não tem abordagem desses
temas em sua matriz curricular, e de estudantes de Engenharia Florestal que não tivessem cursado as disciplinas de
Legislação Ambiental e Florestal, Política Florestal e Política e Legislação Florestal (essa última integrante do antigo
currículo do curso).
Resultados e Discussão
Responderam ao questionário 77 estudantes, sendo 42 do curso de Agronomia (20 dos 3º e 4º períodos e 22 do 9º ao
11º período) e 35 de Engenharia Florestal (entre o 1º e o 6º períodos). O sexo masculino foi discretamente majoritário
na amostra de estudantes de Agronomia (53,4%) enquanto as mulheres foram maioria entre os estudantes entrevistados
de Engenharia Florestal (57,1%). A idade média dos estudantes de Agronomia foi 24,3 anos e dos de Engenharia
Florestal, 22 anos. A classe etária mais frequente dos estudantes de Agronomia foi de 21 a 25 anos e dos de Engenharia
Florestal, de 17 a 20 anos, já que 65,7% dos entrevistados se encontravam no 2º período do curso. A maioria dos jovens
entrevistados declarou não trabalhar e apenas 4 entre os estudantes de Agronomia e 3 entre os de Engenharia Florestal
realizavam estágios na época da entrevista.
Pode-se considerar, assim, que a maioria dos entrevistados representou o perfil médio dos estudantes ingressos
recentemente nos seus cursos, sem experiências acadêmicas ou profissionais que possibilitassem algum conhecimento
mais aprofundado da legislação ambiental. Parte dos entrevistados de Agronomia, cursando os últimos períodos de
curso, teria possibilidade de, mesmo sem cursar disciplinas específicas, contar com algum tipo de informação
proporcionada pela vivência na universidade.
Os conhecimentos sobre legislação ambiental foram considerados muito importantes para o exercício da cidadania e
para a participação social por 80,5% dos entrevistados e para o desempenho e inserção profissional por 85,7%, havendo
maior percepção da importância no campo profissional para os estudantes de Engenharia Florestal, dos quais 91,4%
julgaram ser de grande importância, frente a 81,0% dos estudantes de Agronomia. Essa temática, portanto, dada a sua
relevância, deve integrar os currículos dos cursos e não apenas ser tratada acessoriamente.
Programas de televisão foram, em ambas as amostras, as fontes de informações mais frequentes sobre leis e políticas
ambientais, sendo a fonte exclusiva de 54% dos entrevistados. Jornal Nacional, Globo Rural e Globo Ecologia foram os
programas mais citados. Revistas semanais de grande circulação e jornais, em geral, foram mencionados como fontes de
informações por alguns entrevistados. A consulta a sites especializados da internet foi rara entre os estudantes. A
temática precisa, portanto, ser tratada no ambiente universitário de forma mais ampla e aprofundada, em contraponto à
informação ligeira, superficial e não raro tendenciosa da grande imprensa.
A participação em cursos, palestras e outras atividades relativas ao meio ambiente foi apontada como esporádica por
52,4% dos estudantes de Agronomia (AG) e 62,9% de Engenharia Florestal (EF). Por outro lado, outros números
atestam a maior participação de estudantes de Engenharia Florestal em iniciativas dessa natureza: 31,4% dos estudantes
de Engenharia Florestal informaram ter participação frequente, o que ocorreu com 19,0% dos de Agronomia, enquanto
23,8% dos estudantes de Agronomia e apenas 2,9% dos de Engenharia Florestal declararam participar raramente.
Assim, mesmo aparentando perceber a importância da temática para a formação pessoal e profissional, os estudantes dos
dois cursos informaram ter diferentes níveis de participação em eventos e outras atividades que poderiam contribuir para
a melhor compreensão de questões ambientais.
Os termos mais citados para definir a legislação ambiental brasileira foram ineficiente, flexível e burocrática. Entre os
entrevistados de Agronomia, a percepção mais frequente da legislação ambiental brasileira é de que há necessidade de
mais leis e de maior rigor na sua aplicação para que o Brasil tenha a efetiva proteção dos seus recursos ambientais
(35,7%). Entre os estudantes de Engenharia Florestal, a maior parte (28,6%) concordou que a legislação brasileira é uma
das mais avançadas do mundo, mas sua aplicação é ineficiente, comprometendo a conservação dos recursos ambientais.
Um possível avanço na legislação ambiental e nas políticas públicas para o meio ambiente, nos últimos 20 anos, não foi
observado por estudantes de Engenharia Florestal e o foi por apenas 2,4% dos de Agronomia.
O poder público foi percebido como ineficiente e incapaz de coibir danos ao meio ambiente por 57,1% (AG) e
60,0% (EF), ou mesmo conivente e promotor da degradação ambiental (AG - 26,2% e EF - 25,7%). Apenas 7,1% (AG)
e 14,0% (EF) consideram o poder público como eficiente e comprometido com a conservação do meio ambiente. Assim,
mesmo com conhecimento parcial das leis e políticas ambientais, a imagem do poder público na proteção do meio
ambiente é negativa e as leis consideradas insuficientes ou deficientes na sua aplicação.
Questionados sobre os órgãos federais constituintes do Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), não houve
respostas de 33% dos estudantes de Agronomia e 37% de Engenharia Florestal. O órgão federal do SISNAMA mais
conhecido foi o IBAMA, citado por 55% dos estudantes de Agronomia e 51% de Engenharia Florestal. Além do
IBAMA, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) foi lembrado por 17% (AG) e 8% (EF) enquanto o CONAMA
(Conselho Nacional do Meio Ambiente) foi lembrado por apenas 2 entrevistados de Engenharia Florestal (5,7%). As
demais respostas referiram-se a órgãos não integrantes do SISNAMA como Embrapa, Funai, Ministério da Agricultura
ou ainda Incra, citado por 14,2% dos entrevistados de Agronomia, ou órgãos da esfera estadual, integrantes do
SISNAMA, como CPRH (Agência Estadual de Meio Ambiente), ou não, como o IPA (Instituto Agronômico de
Pernambuco).
O desconhecimento dos órgãos estaduais do SISNAMA foi maior do que o dos federais, com 66,67% e 65,7% de
ausência de respostas entre os entrevistados de Agronomia e Engenharia Florestal, respectivamente. A CPRH foi o
órgão mais lembrado entre os que responderam, mencionada por 14,3% (AG) e 22,8% (EF) dos entrevistados. Os
responsáveis pela formulação da política estadual de meio ambiente foram apontados como desconhecidos por 88%
(AG) e 80% (EF), sendo que apenas 3 estudantes atribuíram a responsabilidade à Secretaria Estadual de Meio
Ambiente.
Na esfera municipal, o nível de desinformação foi ainda maior nas duas amostras: 73,1 e 80,0% dos entrevistados de
Agronomia e Engenharia Florestal, respectivamente, não apontaram órgãos municipais com atribuições de gestão
ambiental. Secretarias municipais de meio ambiente foram citadas por 20% dos estudantes de Engenharia Florestal.
Embora a participação social seja um dos princípios da política ambiental, os universitários consultados
desconheceram instâncias colegiadas que proporcionam essa participação: 90% dos estudantes de Agronomia e 80% dos
de Engenharia Florestal disseram desconhecer órgãos colegiados no quais a sociedade pode participar das definições da
política ambiental. Perguntados se já haviam participado de audiências ou consultas públicas para discussão de assuntos
relacionados à temática ambiental, os resultados foram semelhantes: 83,3 e 82,8% dos estudantes de Agronomia e
Engenharia Florestal, respectivamente, nunca haviam participado. Mesmo os que responderam positivamente não
souberam informar de qual evento haviam participado ou mencionaram a participação em palestras, mostrando
desconhecer os objetivos e as dinâmicas de audiências e consultas públicas.
Entre os estudantes de Agronomia, 50% disseram desconhecer os objetivos do licenciamento ambiental, percentual
superior ao encontrado entre os estudantes de Engenharia Florestal (17,1%). Dos que disseram conhecer, mais de 80%
dos entrevistados dos dois cursos consideraram o licenciamento ambiental importante para garantir a sustentabilidade de
obras e empreendimentos.
Entre diferentes entidades e organizações relacionadas ao meio ambiente, as mais conhecidas entre os universitários
dos dois cursos foram IBAMA e CPRH. CIPOMA (Companhia de Policiamento Ostensivo do Meio Ambiente) e
CONAMA foram conhecidos por 40% estudantes de Engenharia Florestal, enquanto que por menos de 20% dos de
Agronomia; O CONSEMA (Conselho Estadual do Meio Ambiente), por outro lado, esteve entre as mais desconhecidas
por ambas as amostra. Três organizações não governamentais ambientalistas mencionadas no questionário, das mais
tradicionais em Recife (ASPAN, SNE e ECOS), foram desconhecidas por ampla maioria.
Conceitos, objetivos e tipos de Unidades de Conservação foram desconhecidos de grande parte dos entrevistados. A
ideia de serem as Unidades de Conservação espaços de preservação e proteção integral foi dominante entre os
entrevistados, notadamente entre estudantes de Engenharia Florestal. Entre os entrevistados de Agronomia, embora
tenha havido maior porcentagem daqueles que disseram não saber ou não responderam, houve o maior número de
respostas corretas - Unidades de conservação são espaços territoriais protegidos nos quais se pode, em função dos
objetivos e restrições de cada grupo e categoria, permitir a exploração sustentável dos recursos ambientais ou a sua
preservação. A maioria não soube apontar nomes de Unidades de Conservação (80,1% - AG e 77,1% - EF) sendo o
Parque Nacional do Catimbau a mais citada, mas apenas por estudantes de Engenharia Florestal (20%). A Reserva
Biológica de Saltinho também foi referida por 4 estudantes de Engenharia Florestal e apenas 3 estudantes reconheceram
como Unidade de Conservação a mata de Dois Irmãos, vizinha à UFRPE, que integra um Parque Estadual.
Se as Unidades de Conservação foram pouco conhecidas, os órgãos responsáveis pela sua gestão foram ainda mais:
não houve um único acerto quanto aos órgãos competentes para a gestão das unidades citadas, identificando-se a
confusão entre as esferas federal e estadual e a atribuição ao IBAMA de responsabilidades do Instituto Chico Mendes,
não citado.
Desmatamentos, queimadas, degradação de áreas protegidas, caça e tráfico de animais silvestres foram os crimes
ambientais mais citados. Perguntados o que fazer caso presenciassem um crime ambiental, a maioria declarou que faria
denúncia ao órgão responsável, geralmente não identificado. Entre os órgãos nomeados estiveram o IBAMA com maior
número de referências, havendo raras menções a CPRH, CIPOMA, policia especializada e defensoria ambiental.
Apesar dos estudantes de Agronomia e Engenharia Florestal da UFRPE reconhecerem a importância da legislação e
da política ambientais, os conhecimentos apresentados foram superficiais, resultado de informações veiculadas pela
grande imprensa, que não permitem reflexões mais aprofundadas. A gestão pública ambiental é percebida como ações
proibitivas e medidas coercitivas, que se reflete no maior conhecimento do IBAMA como agente de fiscalização. Por
outro lado, a gestão municipal é a mais desconhecida, resultado provável da própria timidez de suas ações. Por outro
lado, o ambiente universitário parece não oferecer as oportunidades necessárias a uma melhor percepção do assunto,
principalmente para estudantes de Agronomia, e é importante notar que, mesmo se a temática integrar disciplinas
específicas, abordagens teóricas não permitirão, necessariamente, o desenvolvimento de atitudes de participação cidadã,
havendo necessidade de se promover o efetivo envolvimento dos estudantes nos debates das principais questões
ambientais.
Referências
Beheregaray, E. S. O papel das leis ambientais para a educação ambiental. Artigos, Associação Nacional de Advogados
da União, nd. <http://www.anauni.org.br/portal/centro-de-estudos/14-artigos/14-o-papel-das-leis-ambientais-para-aeducacao-
ambiental> 14 out. 2012
Cericato. E. W. Direito ambiental como meio de construção da cidadania. Cadernos de Temas Jurídicos, OAB-SC, n.
129. 2008.<www.oab-sc.org.br> 10 out. 2012
Souza Jr. E. L. Aparatos legais ambientais brasileiros: território, economia e sustentabilidade. Observatório de la
Economia Latino Americana, n. 159, 2011. <http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br> 14 out. 2012