PODER FAMILIAR


Matheus Henrique Nogueira Cipriano, aluno da Faculdade de Direito "Laudo de Camargo" da Universidade de Ribeirão Preto.



Sumario: 1. Evolução e Conceito. 2. Características. 3. Poder familiar quanto a pessoa do filho. 4. Poder familiar quanto aos bens do filho 5.Cessação, Extinção, suspensão e perda do poder familiar. 6. Conclusão. 7. Bibliografia


1. Evolução e Conceito


No direito antigo, a estrutura autocrática da família, alicerçada no principio da autoridade, constitui a noção de pátrio poder em termos rígidos e severos.
O chefe de família "pater" era ao mesmo tempo o sacerdote do culto domestico. Na Grécia era assim, não obstante os monumentos históricos admitirem o deslocamento da autoridade do pai atingido pela senectude ao filho mais hábil.
O código de 1916, no seu texto original, ficou mais na linha de nossas tradições atribuindo o pátrio poder ao marido, e em sua falta a mulher (artigo 380), ou seja, só na falta ou impedimento do chefe da sociedade conjugal passava o pátrio poder a ser exercido pela mulher. O seu exercício não era simultaneamente, mas sucessivo. Tal situação foi alterada pela Lei n. 4.121/62 conhecida como "Estatuto da Mulher Casada", que deu nova redação ao artigo 380 determinando que, durante o casamento, compete o pátrio poder aos pais.

A igualdade completa no tocante a titularidade e exercício do poder familiar pelos cônjuges só se concretizou com o advento da Constituição Federal de 1988, com desdobramento do principio da isonomia estabelecida no artigo 226, §5º, da Constituição, o Estatuto da Criança e Adolescente (Lei nº 8.069/90) estabelece no artigo 21 que "o pátrio poder será exercido igualmente pelo pai e pela mãe."
O Código Civil de 2002, ao introduzir uma nova terminologia no que tange ao Pátrio Poder, identificando-o como "poder familiar", não abandonou a sua natureza de "poder" do instituto, marcado modernamente por obrigações e responsabilidades decorrentes da necessidade de proteção dos filhos, como pessoas em peculiar condição de desenvolvimento. No regime do Código Civil de 1916, em que predominava o conceito de chefia da família, atribuído ao marido. O código Civil de 2002 seguindo os princípios constitucionais se desvencilhou daquela idéia, e agora o poder familiar é exercido pelos pais conjuntamente.

Poder Familiar é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores. Segundo Silvio Rodrigues "é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados, tendo em vista a proteção destes."

Portanto, quando se falar em poder familiar, esta se falando as relações jurídicas existente entre pais e filhos.


2. Características

O poder paternal faz parte do Estado das pessoas e por isso não pode ser alienado nem renunciado, delegado ou substabelecido. Qualquer convenção, em que o pai ou a mãe abdiquem desse poder, será nula.

O aludido instituto constitui, como foi dito, um múnus publico, pois ao Estado, que fixa normas para o seu exercício, interessa o seu bom desempenho. É, portanto, irrenunciável, incompatível com a transação e indelegável, não podendo os pais renunciá-lo, nem transferi-lo a outrem. O poder familiar é também imprescritível, no sentido de que dele o genitor não recai pelo fato de não exercitá-lo, somente podendo perdê-lo na forma e nos casos expressos em lei.

Preceitua o artigo 1.630 do Código Civil que "os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores". Este artigo abrange os filhos emancipados, havidos ou não no casamento, ou resultantes de outra origem, desde que reconhecidos, bem como os adotivos.
A maioridade cessa aos 18 anos completos (artigo 5º CC), quando o jovem esta habilitado a pratica de todos os atos da vida civil.



3. Poder familiar quanto à pessoa do filho



O filho deve permanecer na família, e ligado aos pais. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90) determinou, definitivamente, a preferência pela família biológica, autorizando, excepcionalmente, a colocação em lar substituto (artigo 19 ECA).

O artigo 1.634 do Código Civil enumera os direitos e deveres que incumbem aos pais, no tocante a pessoas dos filhos menores: "I - dirigir-lhes a criação e educação; II - tê-los em sua companhia e guarda; III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição"

Observa Paulo Luiz Netto, que as hipóteses elecandas estão a demonstrar que significariam " expressão do poder domestico, segundo o antigo modelo de pátrio poder, sem referencia expressa aos deveres, que passaram a frente na configuração do instituo".
Compete então aos pais:
I- o dever de dirigir a criação e educação dos filhos menores, é o mais importante de todos, pois os pais devem velar não só pelo sustento dos filhos e sim pela sua formação, a fim de torná-los úteis a si, a família e a sociedade.
II - cabe aos pais ter o filho em sua companhia e sob sua guarda, é uma questão de conveniência, deixada a discrição dos genitores, podendo reclamar de quem os detenha ilegalmente. Porem quando há divergência entre eles, cabe ao juiz a prerrogativa de decidir, reprimindo as interferências por capricho e inspirando-se no interesse do filho.
Tal dever direito cabe a ambos os pais.
III- dar ou negar seu consentimento para que o filho se case, pressupõe que ninguém poderá manifestar maior interesse pelo filho do que os seus pais. Antigamente, na falta de acordo, prevalecia a opinião do pai. Atualmente, a igualdade entre os genitores determina que os menores decidam em paridade de condições.
IV- nomear tutor aos filhos por testamento ou documento idêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobreviveu não puder exercer o poder de família, aqui também se presume que ninguém melhor que os pais saberão escolher a pessoa quem confiar a tutela ao filho menor.
V- aos pais incumbe a representação do filho ate os 16 anos e assisti-los após essa idade, nos atos em que for parte, a incapacidade de fato ou de exercício impede que os menores exerçam, por si só, os atos da vida civil. A incapacidade relativa permite que o incapaz pratique os atos da vida civil, desde que assistido, sob pena de anulidade, portanto a incapacidade, absoluta ou relativa, é suprida, pois, pela representação do filho, desde a concepção ate aos 16 anos, e pela assistência, após essa idade e ate completar 18 anos, nos atos em que for parte.
VI- reclamá-los de quem ilegalmente os detenha, por meio de ação de busca e apreensão, para exercer o direito e dever de ter os filhos em sua companhia e guarda.
VII- exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição, os pais podem ate castigar os filhos desde que de forma moderada, a aplicação de castigos imoderados caracteriza o crime de maus-tratos, e também causa de perda do poder familiar (artigo 1.638, I CC).


4. Poder familiar quanto aos bens do filho


No direito Romano, o filho in potestate nada tinha de seu. Não valia a doação feita pelo pai, porque seria como doar a si mesmo. De estranhos não podia adquirir por qualquer forma que fosse, por lhe ser vedado constituir patrimônio próprio.
Os atributos na ordem patrimonial dizem respeito a administração e ao direito de usufruto. O Código Civil de 2002 transferiu toda a seção relativa ao poder familiar quanto aos bens dos filhos para o Titulo II, destinado ao poder patrimonial, com a denominação "Do usufruto e da administração dos bens dos filhos menores".
Dispõe o artigo 1.689 do Código Civil: "o pai e a mãe, enquanto no exercício do poder familiar: I- são usufrutuários dos bens dos filhos; II- tem a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade".
Os pais, em igualdade condições, são, pois, os administradores legais dos bens dos filhos menores sob sua autoridade. Havendo divergência, poderá qualquer deles recorrer ao juiz para a solução necessária (CC, artigos 1.689, II e 1.690, parágrafo único).
Silvio Rodrigues enfatiza que "se é verdade que os pais incumbem as despesas com a criação dos filhos quando estes não as possam atender, justo é também que, tendo os filhos bens para criarem-se e educarem-se, usem as rendas dos mesmos bens para este fim".
Dispõe o Art. 1693 do Código Civil que: "Excluem-se do usufruto e da administração dos pais":
I ? os bens adquiridos pelo filho havido fora do casamento, antes do reconhecimento;
II ? os valores auferidos pelo filho maior de dezesseis anos, no exercício de atividade profissional e os bens com tais recursos adquiridos;
III ? os bens deixados ou doados ao filho, sob a condição de não serem usufruídos, ou administrados, pelos pais;
IV ? os bens que aos filhos couberem na herança, quando os pais forem excluídos da sucessão.




5. Extinção, suspensão e perda do poder familiar

A extinção, a suspensão e a perda do poder familiar são reguladas pelo código Civil.
Dispõe o artigo 1.635 do Código Civil sobre a extinção do poder familiar ocorre quando: "I ? pela morte dos pais ou do filho; II ? pela emancipação, nos termos do artigo 5º, § único do Código Civil; III ? pela maioridade; IV ? pela adoção; V ? por decisão judicial, na forma do artigo 1638, quando da perda familiar quando o pai ou mãe castigam imoderadamente o filho ou o coloca em situação de abandono ou o expõe à situação de risco e de imoralidade".
A perda ou destituição constitui espécie de extinção do poder familiar decretada por decisão judicial (arts. 1.635, V e 1.638 CC). Assim, como a suspensao, constitui sanção aplicada aos pais pela infração com as normas regulamentares, que visam atender ao melhor interesse do menor.
A extinção do poder familiar dar-se por fatos naturais, de pleno direito ou por decisão judicial. Como já dito, ocorre com a morte dos pais, ou seja, desaparecem os titulares do direito, a de um deles faz concentrar no sobrevivente o aludido poder. A de ambos impõe a nomeação de um tutor, para a seqüência à proteção dos interesses pessoais e patrimoniais do órfão. A morte do filho, a emancipação e a maioridade fazem desaparecer a razão de ser do instituto, que é a proteção do menor.
A adoção também extingue o poder familiar na pessoa do pai natural, transferindo-o ao adotante. E finalmente, extingue-se, o poder familiar por decisão judicial na forma do artigo 1.638 do Código Civil, quando os pais castigam imoderadamente os seus filhos. As hipóteses são: "I ? castigo imoderado do filho; II- abandono do filho; III- pratica de atos contrários a moral e aos bons costumes; IV- reiteração de faltas aos deveres inerentes ao poder familiar". A perda é imposta no interesse do filho.
Dispõe o artigo 1.637 do Código Civil:
"se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, ate suspendendo o poder familiar, quando convenha."
Parágrafo único: suspende-se igualmente o exercicio do poder familiar ao pai ou a mae condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.
Dá-se a suspensão do Poder familiar por ato de autoridade, após a apuração devida, se o pai ou a mãe, abusar de seu poder, faltando aos seus deveres ou arruinando os bens do filho. A imposição da pena de suspensão é deixada ao juiz, que tem a liberdade de não a aplicar, posto que o filho receberá do pai ou da mãe o tratamento conveniente. Como expressão legal sugere, a suspensão das prerrogativas materna e paternas dá-se pro tempore.
A perda do poder familiar é a mais grave sanção imposta ao que faltar aos seus deveres para com o filho, ou falhar em relação a sua condição paterna e materna.
A suspensão do poder familiar constitui uma sanção aplicada aos pais pelo juiz, não tanto como intuito punitivo, mas para proteger o menor. A suspensão é temporária, perdurando somente ate quando se mostre necessária. Cessada a causa que motivou, volta a mãe, ou ao pai, temporariamente impedido, a exercer o poder familiar, pois a sua modificação ou suspensão deixa intacto o direito como tal, excluindo apenas o exercício.
A suspensão, deixada ao arbitrium boni viri do juiz, poderá assim ser revogada, a critério dele. A suspensão pode ser total, envolvendo todos os poderes inerentes ao poder familiar, ou parcial, restringindo, por exemplo, a administração dos bens ou a proibição de o genitor ou genitores ter o filho em sua companhia.
O código civil de 2002 não traça regras procedimentais para a extinção ou suspensão do poder familiar. Por inexistir incompatibilidade, permanecerão as do ECA. Neste são legitimados para a ação o Ministério Público ou "quem tenha legitimo interesse".
Já a perda do poder familiar é permanente, mas não se pode dizer que seja definitiva, pois os pais podem recuperá-lo em procedimento judicial, de caráter contencioso, desde que comprovem a cessação das causas que determinaram. É imperativa e não facultativa. Abrange toda a prole, por representar um reconhecimento judicial de que o titular do poder familiar não esta capacitado para o seu exercício.


BIBLIOGRAFIA:

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. V. 6. 28. Ed. Atualização de Francisco José Cahali. São Paulo: Saraiva 2004.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. Vol. VI. São Paulo. Saraiva. 2006

SILVA PEREIRA, Caio Mario da. Instituições de Direito Civil. Vol. V. 16 ed. Rio de Janeiro. Forense. 2007.