Rogério Cunha*

Cícero, romano que viveu século I a.C., dizia que a História é a mestra da vida - ou seja, para o senador, o passado nos fornece um conjunto de experiências capazes de nos auxiliar a tomar decisões mais assertivas. Esse raciocínio continua atual. Quando revisitamos a catástrofe de Chernobyl, recuperamos na memória os perigos da manipulação irresponsável da energia nuclear. Era o ano de 1986, fins do mês de abril. Algumas semanas antes, o líder soviético Gorbachev havia prometido publicamente ampliar o fornecimento de energia elétrica. Sua estratégia era aumentar a produção das usinas nucleares. Chernobyl era uma das principais.

 O novíssimo reator de número 4 ainda não havia passado pelos protocolos de segurança, mas, em função das pressões políticas do Partido Comunista, deveria em breve estar em pleno funcionamento. No dia 26 daquele mês, falhas no fornecimento de eletricidade na região norte da Ucrânia fez um governante local ligar para os administradores de Chernobyl, pedindo para que intensificassem a produção. Nesse mesmo dia, o administrador de Chernobyl recebeu a visita de uma alta autoridade soviética que tentara o convencer a fazer os testes de segurança com a maior brevidade possível.

Próximo ao meio dia, o reator 4 foi alçado ao pico de produção e respondeu muito bem. Passadas algumas horas, no mesmo dia 26, o abastecimento se restabeleceu e era hora de testar a segurança. Para isso, o reator foi submetido a baixos níveis de energia, quando se tornou instável. O resultado foi um superaquecimento, seguido de uma grande explosão que jogou radioatividade na atmosfera. A equipe da usina, composta basicamente por engenheiros elétricos, não possuía os conhecimentos necessários sobre força nuclear para lidar com a situação.

A cidade de Pripyat, planejada e construída exclusivamente para atender as demandas da usina de Chernobyl, foi duramente afetada. Contudo, as informações sobre o acidente foram censuradas e o governo soviético demorou a dar uma resposta prática: a cidade foi evacuada apenas nove dias após o acidente, quando boa parte da população já estava contaminada. Medidas para conter o vazamento de radioatividade demoraram muitos dias mais. A radiação se espalhou pela Ucrânia, Rússia e Bielorrússia. Os resultados foram mortes, doenças e contaminações da biodiversidade.

Em épocas como a nossa, de intensas discussões sobre poluição e aquecimento global, não demorará até que grupos se levantem para defender a produção de energia nuclear (pouco poluente e relativamente barata). Mas se tem algo que podemos aprender com Chernobyl é que quando medidas políticas e populistas dominam decisões que deveriam ser puramente técnicas, corremos um sério risco de promovermos novos acidentes que podem colocar em risco vidas humanas. 

*Rogério Cunha é Mestre em História (UFPR) e assessor de História do Ensino Fundamental II dos Colégios Positivo (Curitiba-PR).