Crônica

                                                        PIERRÔ SEM COLOMBINA

                                                                             Edevaldo Leal                             

 

 

                                      – Filho, este ano, a segunda e  a  terça-feira são minhas.

                                       – Não.  É a minha vez e disso  eu não abro mão. Você sai no sábado e no domingo. Não foi esse o nosso acordo, repetir os melhores dias a cada ano. Isso você sabe porque concordou, naquela conversa que tivemos sobre carnaval, o primeiro e último que passamos juntos, quer dizer, juntos, juntos, mesmo, não, que no último dia cada um acabou em lados diferentes, indo juntar os restos de cinza na quarta-feira ,sem remorsos – discursou, solene.

                                      – Ou você me libera a segunda e a terça-feira, ou adeus mamadas calorosas – fez birra a mulher, passando vagarosamente a língua molhada no lábio superior. Essa promessa da mulher, de negação do ato mais desejado, mexeu com íntimos prazeres de sua relação, duas semanas antes de ele decidir quem levaria vantagem nesse carnaval.

                                     Sábado e domingo a folia  não está naquele clima de pega pra capar. Os  foliões ainda se alongam, preparam o corpo para as noites inesquecivelmente delirantes  que virão: a nudez ousada nos salões, peitos que saltam para bocas sedentas, a liberdade carnal, carta de alforria para corpos famintos.

                                      Ele tinha Joana e tinha Raimunda. Das duas, reserva à espera do folião, Raimunda , de enorme bunda, molejo no corpo e samba no pé, era perfeita para segunda e terça-feira. Mesmo Joana, de poucos atributos físicos, a não ser pelos mamilos, duas  esculturas de pedra que lhe rasgavam  a blusa, também não era mulher para sábado e domingo de carnaval.

                                    Até parece que haviam combinado. Com Joana e Raimunda também não havia acordo, sábado e domingo descartados .A bunda de Raimunda e os peitos de Joana faziam a festa de mãos bobas no salão.

                                  A bunda de Raimunda e os peitos de Joana, esplendor e glória de seus sonhos .

                                  A bunda de Raimunda sempre teve espaço em seus pensamentos, desde que se conheceram há não sei quantos carnavais. Os peitos de Joana! Nos peitos de Joana tantas vezes se fez menino, se reencontrou  criança. Joana lhe amamentou desejos ocultos, vezes sem conta indesculpável convite ao pecado aquele objeto pontiagudo, carnudos mamilos saltitantes, de contornos tão bem vistos que a blusa molhada de suor não conseguia esconder.

                               De súbito, atravessou-lhe o pensamento a lembrança da língua molhada da mulher passada no lábio superior.  Essa lembrança e o sentimento de perda do ato sugerido o deixaram sem resistência, escravo desse desejo primal a que todos os homens se submetem.Que homem resistiria?

                                                                                         Ananindeua/PA, 06 de fevereiro de 2013.