Pequeno estudo sobre o

Hino Nacional Brasileiro

Copyright 2009 Fabbio Cortez

 

Introdução

 

O Hino Nacional parece ser um desafio para a maior parte de nosso povo. Pelo que se percebe, poucas pessoas o compreendem, haja vista as inversões de termos oracionais e algumas palavras em desuso. Acabamos, por causa disso – quando encontramos oportunidade de fazê-lo – cantando-o mecanicamente. Um trá-lá-lá irrefletido e frouxo; puxa, falta de civismo!

Portanto, mesmo sabendo haver outros trabalhos do tipo, resolvi despretensiosamente também escarafunchar a letra da obra e, após exame algo criterioso, pequena investigação histórica e desdobramento dos versos,  disseminar, de modo mais sucinto e claro possível, as conclusões a que cheguei.

Meu interesse estrito é o de tentar contribuir, ainda que de forma mínima, para que não venha totalmente à ruína o patriotismo tão abalado em nosso país, pois tenho desde sempre me amofinado pelo "orgulho" momentâneo – na realidade, a meu ver, pseudopatriotismo – vindo à tona somente em época de Copas do Mundo e eventos do tipo. Nada contra o esporte, isso é bom e tem de ser assim mesmo, mas só ter sentimento cívico nesses momentos, convenhamos, não é admissível.

 

Bem, vamos lá: para nos facilitar, separei o trabalho em três breves passos, a saber:

1) A letra aberta, com as principais marcações a serem depois desenvolvidas;

2) A interpretação em si; e

3) O entendimento simplificado do poema.

Espero sinceramente que, ao menos em algum ponto ou outro, o presente opúsculo lhe seja proveitoso.

 

 

Autoria do hino

 

A música, composta em 1822, é de Francisco Manuel da Silva (Rio de Janeiro/RJ, 1795 – Rio de Janeiro/RJ, 1865), que foi diretor musical da Capela Real, compositor, maestro, professor, posteriormente mestre-de-capela da Imperial Câmara, além de fundador do Conservatório do Rio de Janeiro, atual Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

 

Tentou-se adaptar algumas outras letras à melodia estabelecida, mas a atual – e definitiva – , escolhida por meio de concurso em 1909, é de Joaquim Osório Duque-Estrada (Pati do Alferes/RJ, 1870 – Rio de Janeiro/RJ, 1927), escritor, crítico literário, professor, jornalista e imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL).

 

Note que o autor da letra nasceu cinco anos depois da morte do autor da música. O texto só foi oficializado como letra do Hino Nacional em 6 de setembro de 1922, véspera do Centenário da Independência, por Decreto do então presidente Epitácio Pessoa.

 

Primeiro passo: a letra aberta (sem versificação, mas separada em suas estrofes originais), com as principais marcações a serem depois desenvolvidas

I

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heroico o brado retumbante, e o sol da Liberdade, em raios fúlgidos, brilhou no céu da Pátria nesse instante.

Se o penhor dessa igualdade conseguimos conquistar com braço forte, em teu seio, ó Liberdade, desafia o nosso peito a própria morte!

Ó Pátria amada, idolatrada, salve! Salve!

Brasil, um sonho intenso, um raio vívido de amor e de esperança à terra desce, se em teu formoso céu, risonho e límpido, a imagem do Cruzeiro resplandece.

Gigante pela própria natureza, és belo, és forte, impávido colosso, e o teu futuro espelha essa grandeza

Terra adorada, entre outras mil, és tu, Brasil, ó Pátria amada!

Dos filhos deste solo és mãe gentil, Pátria amada, Brasil!

II

Deitado eternamente em berço esplêndido, ao som do mar e à luz do céu profundo, fulguras, ó Brasil, florão da América, iluminado ao sol do Novo Mundo!

Do que a terra mais garrida, teus risonhos, lindos campos têm mais flores; "Nossos bosques têm mais vida", "Nossa vida" no teu seio "mais amores".

Ó Pátria amada, idolatrada, salve! Salve!

Brasil, de amor eterno seja símbolo o lábaro que ostentas estrelado, e diga o verde-louro desta flâmula - Paz no futuro e glória no passado.

Mas, se ergues da justiça a clava forte, verás que um filho teu não foge à luta, nem teme, quem te adora, a própria morte.

Terra adorada entre outras mil, és tu, Brasil, Ó Pátria amada!

Dos filhos deste solo és mãe gentil, Pátria amada, Brasil!

 

Segundo passo: a interpretação

I

Ouviram do Ipiranga (do tupi "ypiranga", que quer dizer "rio vermelho", riacho da cidade de São Paulo perto do qual o então príncipe herdeiro do trono de Portugal, Dom Pedro, futuramente D. Pedro I – primeiro imperador do Brasil –  teria declarado a Independência em 1822) as margens (observe que as margens do riacho é que ouviram o brado) plácidas (tranquilas) de um povo heroico (atualmente sem o sinal agudo) o brado retumbante (grito muito forte que chega a fazer eco) e o sol da Liberdade (o sol aqui – com letra minúscula – não é o astro e sim a força luminosa nascida da Liberdade personificada, o esclarecimento dela emanado naquele momento importante) em raios fúlgidos (cintilantes), brilhou no céu da Pátria ("pátria" invoca o tempo ido a história e, necessariamente, os antepassados, e a terra natal ou adotiva de alguém que tenha vínculos estritos de afeição, de cultura e valores locais; diferentemente de "nação", que tem a ver com  nascimento, de onde se vem, a nacionalidade, quer dizer, tudo o que é ligado  jurídica e politicamente ao Estado (União) nesse instante.

(Para melhor entendimento: As margens tranquilas do riacho Ipiranga ouviram o grito forte de um povo heroico e o sol da Liberdade, em raios cintilantes, brilhou no céu de nossa Pátria nesse momento.)

Se o penhor (se a garantia, penhora) dessa igualdade conseguimos conquistar com braço forte (muitos cantam erradamente "braços fortes"), em teu seio (em teu teu coração), ó Liberdade, desafia o nosso peito a própria morte! Ó Pátria amada, idolatrada (pela qual se transborda de amor), Salve! Salve! (Damos-lhe "Vivas!")

(Para melhor entendimento: O nosso peito desafia a própria morte, ó Liberdade personificada, dentro de teu próprio coração, se conseguimos conquistar a garantia dessa igualdade com firmeza!  Ó Pátria amada, pela qual transbordamos de amor, damos "Vivas" a ti!)

 

Brasil, um sonho intenso (às vezes há titubeação devido à dúvida entre este trecho e “de amor eterno” da 2ª parte), um raio vívido (destacado, bem visualizado, nítido) de amor e de esperança à terra desce, se em teu formoso céu, risonho e límpido (sem nehuma nuvem), a imagem do Cruzeiro (do Sul) resplandece (brilha intensamente).

 

(Para melhor entendimento: Um sonho intenso, meu Brasil, um raio nítido de amor e de esperança desce à terra, se a imagem da constelação "Cruzeiro do Sul" brilha intensamente em teu formoso, risonho e limpo céu.)

Gigante pela própria natureza, és belo, és forte, impávido (corajoso, destemido) colosso (outra vez o sentido de "gigante", corroborando o primeiro), e o teu futuro espelha (muitos cantam erradamente "espelha" com o timbre do segundo "e" aberto: /espélha/ - mas o correto é fechar o "e": /espêlha/) essa grandeza. Terra adorada, entre outras mil, és tu, Brasil, ó Pátria amada! Dos filhos deste solo és mãe gentil (mãe defensora dos filhos e generosa com eles, como qualquer boa mãe), Pátria amada, Brasil!

(Para melhor entendimento: Gigante destemido, pela própria natureza és belo e forte e o teu futuro mostra essa grandeza. Entre outras mil terras, tu és, meu Brasil, ó Pátria amada, a mãe generosa dos filhos deste solo. )

II

Deitado eternamente em berço esplêndido (aqui não significa um Brasil "preguiçoso", que descansa para sempre - como querem maldosa e levianamente interpretar alguns, mas sim um Brasil estabelecido num solo maravilhoso, extenso e riquíssimo, com recursos naturais intermináveis. Só pode ser essa a intenção de Duque-Estrada), ao som do mar e à luz do céu profundo ("profundo" aqui no sentido de "sem fim", eterno, inimaginável), fulguras (brilhas), ó Brasil, florão (ornato, enfeite de ouro e/ou pedras preciosas em forma de flor) da América, iluminado ao sol (luz solar) do Novo Mundo! (o continente americano; era como, às vezes, os europeus denominavam a América quando de sua descoberta, que era novo continente em relação ao "velho mundo"(Europa), assim como à África e à Ásia.)

(Para melhor entendimento: Ó meu Brasil, rico ornato da América, tu brilhas iluminado à luz solar do jovem continente, estabelecido para sempre neste solo extenso e rico ao som do mar que dominas e à luz dum céu inigualável . )

 

Do que a terra mais garrida (vistosa, contente) teus risonhos, lindos campos têm mais flores; "nossos bosques têm mais vida", "nossa vida" no (muitos cantam erradamente "em") teu seio "mais amores" (obs.: os termos entre aspas são partes do poema "Canção do Exílio", de Gonçalves Dias na obra "Primeiros cantos"- 1847). Ó Pátria amada, idolatrada, Salve! Salve! Brasil, de amor eterno (às vezes há titubeação devido à dúvida entre este trecho e “um sonho intenso” da 1ª parte) seja símbolo o lábaro (bandeira, estandarte) que ostentas (exibes com orgulho) estrelado, e diga o verde-louro (obviamente as cores verde e amarela da bandeira, símbolizando as florestas e matas e o ouro, as riquezas minerais) desta flâmula (também: bandeira ou estandarte – simples referência ao termo anterior): Paz no futuro e glória no passado (glória estabelecida, histórica, e anseio pela paz futura).

 

(Para melhor entendimento: Brasil, teus risonhos e lindos campos têm mais flores do que a terra mais vistosa, assim como nosso bosques têm mais vida e nossa vida em teu coração tem mais amores que qualquer outra terra.  Ó Pátria amada, pela qual transbordamos de amor, damos "Vivas" a ti! Brasil, que a bandeir estrelada que tu exibes com orgulho seja símbolo de amor eterno e suas cores verde e amarela digam "Glória estabelecida e anseio pela Paz futura".)

 

Mas, se ergues (para a luta) da justiça a clava (arma usada para bater nos antigos combates homem a homem – espécie de porrete) forte, verás que um filho teu não foge à luta, nem teme, quem te adora, a própria morte. Terra adorada entre outras mil, és tu, Brasil, ó Pátria amada! dos filhos deste solo és mãe gentil, Pátria amada, Brasil!

 

(Para melhor entendimento: Mas se para a guerra tu ergues a clava forte da justiça, verás que um filho teu não foge à luta nem quem te adora temea própria morte. Entre outras mil terras, tu és, meu Brasil, ó Pátria amada, a mãe generosa dos filhos deste solo. )

 

Terceiro passo, enfim: o entendimento simplificado da letra, em versão livre, mantendo-se a separação das estrofes originais

I

As margens tranquilas do riacho Ipiranga ouviram o grito forte de um povo heroico e o sol da Liberdade, em raios cintilantes, brilhou no céu de nossa Pátria naquele momento.

 

Contigo, ó Liberdade, o nosso peito desafia a própria morte se conseguimos conquistar a garantia dessa igualdade com firmeza!

 

Ó Pátria amada, por quem transbordamos de amor, damos "Vivas" a ti!

 

Meu Brasil, um sonho intenso, um raio nítido de amor e de esperança desce à terra se a imagem da constelação "Cruzeiro do Sul" brilha intensamente em teu céu formoso, risonho e claro.

 

Gigante corajoso, pela própria natureza és belo e forte, e no futuro será notória essa grandeza.

 

Entre outras mil terras, tu és adorada, ó Pátria amada, meu Brasil!

 

Tu és, Pátria amada, a mãe generosa dos filhos deste solo.

 

II

 

Ó meu Brasil, rico ornato da América, tu brilhas iluminado à luz solar deste jovem continente, estabelecido para sempre neste solo extenso e rico ao som do mar que dominas e à luz dum céu inigualável.

 

Brasil, teus risonhos e lindos campos têm mais flores do que a terra mais vistosa, assim como nossos bosques têm mais vida e nossa vida em teu coração tem mais amores que qualquer outra terra.

 

Ó Pátria amada, por quem transbordamos de amor, damos "Vivas" a ti!

 

Brasil, que a bandeira estrelada que tu exibes com orgulho seja símbolo de amor eterno e suas cores verde e amarela digam "Temos Glória no passado e ansiamos pela Paz futura".

 

Mas se para a guerra tu ergues a arma forte da justiça, verás que um filho teu não foge à luta e quem te adora não teme nem mesmo a própria morte.

 

Entre outras mil terras, tu és adorada, ó Pátria amada, meu Brasil!

 

Tu és, Pátria amada, a mãe generosa dos filhos deste solo.


Fabbio Cortez