PARIS, SEMPRE PARIS

A Paris de Hemingway é sempre uma festa. O escritor que por lá viveu nos anos trinta, passava longas tardes escrevendo seus romances e contos nas mesas dos Cafés bebericando uma vodca ou então passava noites na boemia acompanhado de amigos e belas mulheres, quando tinha alguns francos no bolso. Paris era fundamental para se tornar um grande artista e por isso lá viveram ou passaram longas temporadas nomes como Fitzgerald, Van Gough, Gauguin, Henry Miller, Somerset Maughan e tantos outros. Paris é também o reduto da liberdade política e filosófica. A mesma cidade que expulsou Jorge Amado no início dos anos cinqüenta por imposição da Guerra Fria recebeu os exilados brasileiros depois do golpe de 1964.

               E Paris continua a mesma cidade da boêmia, das artes, dos charmosos cafés. É impossível andar por suas ruas sem encontrar alguns deles convidando para saborear um bom expresso. Alguns não são tão bons assim, mas aqui, terra do café isso acontece também.  Caminhar pelas margens do Sena, apreciando suas pontes centenárias e os velhos Bateau Mouch carregando turistas encantados com a beleza e a história dos palacetes, museus e monumentos. Cada rua é uma história a parte. Existem ruas especializadas em tudo o que se pode imaginar. Em Saint Germain é possível passar horas contemplando os antiquários com peças de mobiliário e obras de arte. Pode-se deixar-se levar pela nostalgia e se imaginar no século XIX olhando as encantadoras vitrines. À noite, as ruas e praças se enchem de “fantasmas” imaginários que conversam sobre coisas do passado, música, literatura e artes plásticas.

               Circular pela cidade de Metrô é prático e barato, pois as estações estão presentes em todos os lugares. Convenhamos, não são tão limpos e modernos como os paulistas, mas são eficientes e pontuais. Nos horários de picos ficam lotados como os nossos (ou nem tanto), mas nos horários menos concorridos com os trabalhadores, é possível ouvir músicos ambulantes com seus amplificadores cantando velhas canções francesas ou mesmo latino-americanas, já que os artistas são, invariavelmente, bolivianos. Diferente de São Paulo, onde os artistas de rua são convidados a circular, em Paris eles estão por toda parte e não são incomodados pelos gendarmes. É comum ver multidões aglomeradas em torno de alguma performance em plena Champs Élysées ou no jardim das Tuileries.  Faz parte de o cotidiano parisiense ver espetáculos nas ruas.

               Paris é uma cidade para todos os gostos e bolsos. Um café expresso por cinco euros ou por 1,70 numa cafeteria mais simples. Lojas da Louis Vitton com seus caríssimos produtos ou lojinhas de indianos ou coreanos com lembrancinhas populares. A culinária é uma coisa a parte. A variedade de queijos e bons vinhos a preços convidativos faz com que um turista menos endinheirado se sinta um rei.

               A cidade é uma verdadeira Babel e esta sensação é possível ter no topo do Arco do Triunfo, onde vários idiomas se confrontam, como europeus, asiáticos e africanos. Os turistas japoneses estão sempre em grandes grupos devoram antropofagicamente o que encontram. Fotografam tudo de forma ansiosa, como se as coisas fossem desaparecer de repente e haveria o risco de perdê-las. No Palácio de Versailles e no Louvre é preciso paciência para poder acessar as obras mais famosas entre os vários grupos de japoneses que se aglomeram em seu entorno. Esses dois museus são esplêndidos, monumentais, mas é impossível conhecê-los em apenas algumas horas. Mas o D’Orsay acaba sendo mais interessante por ser menor e por isso mais acolhedor. A disposição das obras possibilita apreciar melhor os impressionistas, pré-impressionistas e neoimpressionistas.

               As igrejas são espetáculos a parte é difícil alguém não se impressionar com a arquitetura da Notre Dame.  É impossível não ver na imaginação o corcunda com sua figura estranha a circular pela igreja e as gárgulas protegendo o templo, nos remetem a um lado sombrio da Igreja.  Tudo está igual, preservado. A memória francesa continua intocável como se o tempo tivesse parado depois da Revolução.  É estranho que um povo tão civilizado que valoriza as obras de arte, o bom gosto e a sofisticação, tenha decapitado o monarca, sua esposa e filhos pequenos. Há muitos mistérios nos comportamentos das massas...

               No primeiro bistrô, um pequeno e aconchegante na rue Copernic, que entramos para uma rápida refeição tarde da noite, descobrimos que seu proprietário é um lusitano, falando francês com sotaque do Porto e fazendo um apetitoso croc com salada acompanhado de um bom Bordeaux. Contou que na França são mais de um milhão de portugueses que lá vivem, trabalham e estudam. Fomos lá numa noite de sexta-feira e a casa estava repleta de patrícios que comemoravam um aniversário. Nenhum deles falava português. A banda só  interpretou músicas francesas e inglesas. Nada dos nostálgicos fados.

               Caminhar a noite em Paris é irresistível, pois a sensação de segurança, ainda que ingênua, convida a um bate pernas parando nos Cafés pelo caminho para uma taça de vinho ou um expresso. Andar na chuva devidamente protegido é bom em qualquer lugar, mas em Paris tem um sabor romântico de velhos filmes como Casablanca e as Neves do Kilimanjaro ou do mais recente “A meia noite em Paris”.  Enfim, Paris é tudo e mais alguma coisa a se descobrir. Muitos museus, ruelas repletas de surpresas e a arte presente em todos os cantos e praças. É a gostosa  sensação de retorno no tempo. Se há algum lugar na terra que mereça sobreviver depois de uma catástrofe, sem dúvida é Paris.