Para tentar entender sua partida

Talma Bastos de Barros ( 11 de fevereiro de 2010....já se passaram 10 dias...)

 

 

 

Teu rosto é o íntimo da hora
mais solitária e perdida,
que surge como o afastar-se
de ramos, brando, na noite.
Não choro tua partida.

Não choro tua viagem
imprevista e sem aviso.
Mas o ter chegado tarde
para o fechar-se da flor
noturna do teu sorriso.

O não saber que paisagens
enchem teus olhos de agora,
e este intervalo na vida,
esta tua larga, triste,
definitiva demora.

(Elegia: Oliveira, M.)

Houve um tempo em que as coisas não eram assim tão calmas. Havia crianças para cuidar e com elas os deveres e obrigações de alimentos, banhos, lazer, educação. Nesta época eu sabia que era mãe e queria ser também uma pessoa, ligada aos fatos cotidianos, fazendo coisas que me agradassem individualmente. Era muito difícil conseguir conciliar estas duas necessidades: de zelar por meus filhos e crescer como pessoa.  Minha mãe e meu marido já não se encontravam mais conosco. A depressão era minha companheira secreta. Meu querido Neto, conhecido também por Xico Xadrez, sempre foi meu vizinho e sempre foi um solicito amigo de todas as horas, ajudando a compor o quadro da minha vida. Organizava torneios de Xadrez nos quais eu e meus filhos, ainda crianças, participávamos e não ficava por aí. Se eu passava por alguma dificuldade momentânea, como falta de dinheiro para gasolina, para o café, para alguma diversão mais cara, sempre estava pronto a me ajudar, a compartilhar, a me fazer companhia. Líamos os mesmos romances, assistíamos aos mesmos filmes, tínhamos o mesmo gosto musical e apreciávamos solidários, o desenrolar da política local. Nossa vontade era de crescimento interior. Ele sempre se propôs a ajudar ao próximo, a ensiná-lo a crescer, a proporcionar ambiente adequado para o desenvolvimento das questões humanitárias.  Empunhando um jogo de Xadrez, resgatou das ruas muitos adolescentes, que de outra forma estariam perdidos socialmente. Com a mesma garra, anos a fio lutou para que o Xadrez fosse visto como portal de inclusão da juventude em Uberaba. Claudicando vida afora, superando sua própria dor física de caminhar, para desvelar caminhos aos que o seguiam, desbravou o cenário intelectual de Uberaba. Seus méritos e grande inteligência o projetaram por toda a região do Triângulo Mineiro, por Minas Gerais, pelo Brasil e o levaram até para o exterior. Lecionou Xadrez em Açores, em Lisboa e sei lá mais quantos lugares estrangeiros que o aplaudiam, que o queriam, que o valorizavam. Das lembranças mais queridas fica “O Regional”, o jornal que, como jornalista íntegro e brilhantemente privilegiado que era, publicou durante muito tempo, abordando questões humanitárias, pregando a paz, mostrando as mazelas da guerrilha burguesa e valorizando o ser humano residente em todos nós. A morte não é aceita e não é explicável. As doenças surgem e levam o que de nós poderia ser palpável, Mas a morte não pode (e isso deve lhe ser frustrante) tirar de alguns a bondade que espalham, as virtudes que têm, a inteligência que cultivam e semeiam. Isso permanece por aqui e os anos não dissipam essas belezas. Assim, tenho certeza, que o Neto, o Xico (Xadrez) ainda está presente e muito próximo a todos que tiveram a felicidade de com ele participar da Vida.