RESUMO

A presente monografia, cujo tema é Outorga de água: cobrança pelo uso de recursos hídricos ou cobrança por serviço ambiental, procurará responder, mais especificamente a seguinte problemática: sendo a água um bem comum de uso coletivo de todo um povo, se cobra pelo uso de recursos hídricos ou por serviços ambientais? O objetivo geral da pesquisa é verificar se a cobrança é pelo uso de recursos hídricos ou por serviços ambientais. E para se alcançar o objetivo geral definiu-se os seguintes objetivos específicos: definir a cobrança da água como serviço ambiental; mostrar os modos de uso racional dos recursos hídricos e falar dos métodos utilizados pelo Poder Público para cobrança dos recursos hídricos. A justificativa a problemática apontada se dará pelo fato de resolver os questionamentos sobre a cobrança da água, mostrando suas formas de uso racional e as consequências do seu mau uso para as presentes e futuras gerações, além de ser o instrumento legal empregado pelo Poder Público para se obter os recursos financeiros necessários para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos de acordo com o artigo 19 da Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos ou Lei das Águas como é melhor conhecida (Lei nº 9,433/1997). E para a condução da presente pesquisa bibliográfica utilizou-se como método cientifico o hipotético-dedutivo, como a teórica, empregando como base a legislação pátria atual, doutrinas e artigos, tendo um cunho interdisciplinar, ou seja, aborda Direito Constitucional, Direito Ambiental, Direito Civil e Direito Tributário. A hipótese a ser comprovada é a definição da água sendo um recurso natural limitado e incentivar a racionalização do uso da água. Sendo assim a cobrança da água objetiva incentivar a racionalização do uso da água e obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos.

 

Palavras-chave: Outorga de água. Cobrança pelo uso. Serviço ambiental.

I - INTRODUÇÃO

 Esse estudo tem como propósito demonstrar a importância da outorga e da cobrança pelo uso dos recursos hídricos, pois ele além de ser o instrumento, previsto na Política Nacional de Recursos Hídricos é considerado também como sendo um grande progresso na luta pela preservação e proteção do bem “água”.

A abordagem do instituto da cobrança é de grande relevância, pois constitui o fundamento teórico dessa monografia, ao ser definida a natureza jurídica da cobrança, os objetivos previstos na legislação, sua destinação, os impactos das diversas atividades econômicas, se a cobrança poderá virar um meio de exclusão social, e se seria a cobrança pelo uso da água a forma mais adequada ao consumo consciente ou não.

Diversas dúvidas aparecerão, inúmeras discussões também serão feitas, e este trabalho, sem sombra de dúvidas, não irá acabar com todas as polêmicas referentes ao tema. Todavia, este estudo busca abordar os mais importantes aspectos referentes a esse instrumento tão fundamental para as presentes e futuras gerações.

Com o desenvolvimento das cidades não existia ainda o cuidado sobre o problema da capacidade de sustentação e absorção dos cursos d´água. Fundamentado nessa ideia, o acesso à água é ilimitado e gratuito e sua cobrança se dava pela captação e distribuição da água tratada e pelo esgotamento sanitário.

O caso se torna um problema quando os despejos de esgoto começam a ultrapassar a capacidade de autodepuração dos corpos d´água, além de aumentar a intensidade de retirada, superando a capacidade de suporte e recarga d´água.

O que já justifica a importância deste estudo é a necessidade de frear essa situação, através do instrumento da cobrança pelo uso da água, e da crescente escassez de água potável, que fortalece ainda mais a importância de se dar valor econômico para este bem.

A Política de Recursos Hídricos possui a cobrança pelo uso da água como instrumento financeiro de gestão e controle destinado à realização dessa política, conferindo à água um valor econômico, o que leva ao uso racional.

Este trabalho, possui uma breve narração histórica pelas égides legais e normativas que permitiram a instituição da cobrança, além de abordar sobre as questões socioeconômicas e da eficácia desse instrumento sob a ótica da natureza jurídica da cobrança. E por fim, será analisada a aplicabilidade do instituto da cobrança e sua funcionalidade e eficiência.

II - Dos recursos hídricos no Brasil 

Desde tempos mais remotos as pessoas já demonstravam que a água era fundamental para a sobrevivência e desenvolvimento de todas as populações do mundo. Portanto, a água como sendo um bem comum de uso da coletividade, alimentava a todos a um pequeno valor, sendo que estes povos já haviam criado maneiras de controlar as águas dos rios, construindo obras para evitar as enchentes e desenvolvendo cada vez mais suas técnicas de irrigação.

No entanto já existia a preocupação com a falta de água, e muitas foram às causas de morte e doenças ocorridas devido ao consumo das águas dos rios que eram contaminadas por esgotos não tratados. Com isso se tem a ideia de que o desenvolvimento de uma sociedade está ligado com o cuidado com a água.

De acordo com Paulo de Bessa Antunes: Não é recente a preocupação do Direito brasileiro com as águas. A legislação colonial, sobretudo as Ordenações Filipinas, decretadas em 11 de janeiro de 1603 e vigentes por quase três séculos, já tratava da proteção das águas. Assim é que no LIVRO V, Título LXXXVIII, foi estabelecida a proibição a qualquer pessoa de jogar material que pudesse matar os peixes e sua criação ou sujar a água dos rios e lagoas.

 Esse desperdício de água observado hoje em dia, em muitos lugares do Brasil, está diretamente ligado ao fato da população pensar que temos grande abundância de água existente em nosso território, tendo a falsa ilusão que essas águas são infinitas.

Após o aparecimento dos grandes centros urbanos, como o do Rio de Janeiro e de São Paulo, os problemas de saúde pública agravaram devido ao pouco investimento em obras de infraestrutura por parte do Poder Público e por causa das inúmeras indústrias que surgiram ao longo das décadas poluindo-se cada vez mais com seus dejetos não tratados nossos mananciais.

O Brasil igualmente com os outros países subdesenvolvidos possui graves problemas referentes aos serviços de saneamento básico e falta de fornecimento d’água na maioria das cidades, causando com isso problemas de saúde que preocupam a todos da sociedade. De acordo com Paulo Sirvinskas, cerca de 80% de todas as doenças nos países em desenvolvimento são disseminadas pelas águas, já que a poluição da água pode transmitir várias doenças, pois traz consigo grande variedade de bactérias e vírus.

O problema da falta de saneamento tem ganhado maior destaque com o passar dos anos, pela falta de investimentos suficientes para suprir as necessidades, especialmente da população de baixa renda, que pouco se utilizam desses serviços de abastecimento e coleta de esgotos. Sirvinskas completa dizendo que:

 Como podemos ver, a água é muito importante para o ser humano, mas também pode ser um grande agente transmissor das mais variadas doenças (cólera, malária, dengue), e essas doenças, geralmente, levam à morte em especial das crianças, provocada pela diarreia (desidratação). Tudo isso ocorre por causa de nosso desleixo para com o meio ambiente e, consequentemente, para com a água. 

Esses casos vêm comprometendo, cada vez mais, a qualidade dos recursos hídricos, dificultando e ocasionando custos crescentes para atender aos objetivos do fornecimento de água de boa qualidade.

 III - Código das Águas

 O Código Civil de 1916 é que disciplinou a proteção jurídica da água no Brasil, colocando que o uso dos bens públicos, como a água, por exemplo, pode ser gratuita ou paga, que desde logo serviu de base para fundamentar o princípio do usuário-pagador.

Com a criação do Código das Águas (Dec. nº 24.643, de 1934), regulamentado posteriormente pelo Decreto-Lei nº 852 de 1938, é que se teve uma melhor aprovação e utilização da água no que diz respeito aos aspectos de domínio e econômico.

Maria Luiza Machado Granziera descreve que: O Código de Águas, alterado parcialmente pela Lei de Águas, assegurava, no art. 34, “o uso gratuito de qualquer corrente ou nascente de água, para as primeiras necessidades da vida, se houver caminho público que a torne acessível”. E o art. 36 estabelecia que é permitido a todos usar de quaisquer águas públicas, conformando-se com os regulamentos administrativos. Quando esse uso depender de derivação, terá preferência a derivação para o abastecimento das populações. E o uso das águas pode ser gratuito ou retribuído, conforme leis e regulamentos da circunscrição administrativa a que pertencerem. 

Como se nota, o Brasil acompanhando a tendência mundial apresentou um bom progresso de suas políticas de meio ambiente, tendo criado uma vasta estrutura legal e institucional de gestão ambiental ao longo dos anos.

Todavia, essa política de controle ambiental da época era centralizada e desempenhada por órgãos estaduais e federais do meio ambiente, fundamentada em estruturas de domínio e administração, com foco no controle da emissão de poluentes industriais. Entretanto, existia uma falta de relação entre as políticas de meio ambiente e de desenvolvimento e uma ausência da sociedade e do poder público.

 IV - Política Nacional de Meio Ambiente 

A Constituição Federal de 1988 foi responsável pela implantação de uma política nacional de meio ambiente, onde se inseriu o conceito de gestão ambiental agregada e participativa, criando os conselhos estaduais e federais de meio ambiente, procurando a integração entre os setores privado e público e entre os distintos níveis de governo, sendo que os graves problemas ambientais foram seguidos por uma maior participação e mobilização por parte do poder público.

A partir da década de 90 com a proximidade da realização do Rio-92[5] introduziu-se o conceito de desenvolvimento sustentável juntamente com os novos instrumentos econômicos na gestão ambiental dando-se início ao processo de reformulação dos órgãos setoriais de gestão.

De modo geral, a gestão de recursos hídricos no Brasil vem apresentando um considerável progresso nas últimas décadas, que até então se produzia projetos no campo de recursos hídricos pro meio de setores específicos como no de saneamento e irrigação sem nenhuma integração entre si, gerando com isso graves conflitos de uso da água dando-se início a diversas discussões nas faculdades e no meio profissional sobre como diminuir os problemas decorrentes da área.

 V - Constituição Federal de 1988 

Assim como a Lei das Águas (Lei nº 9.433/97), a Constituição Federal de 1988 tratou de proteger a água em seu artigo 225 caput que diz: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

 Deixando claro com isso que se tratando da propriedade das águas, o social sobrepõe-se ao individual na legislação brasileira, ou seja, o bem estar coletivo é mais importante do que o individual ou de classes específicas.

Complementando esse conceito a Lei nº 10.257/01, que regulamenta os artigos. 182 e 183 da Constituição Federal e estabelece diretrizes gerais da política urbana, aborda explicitamente, no seu artigo 2º, da sustentabilidade das cidades e do equilíbrio ambiental. Desse modo, refere-se à água como propriedade no conjunto das cidades, bem como, na sua preservação na manutenção do equilíbrio ambiental. Assim, as cidades devem cumprir sua função social, abrangendo a água como elemento indispensável nessa tarefa.

Pompeu esclarece em sua obra que: A cobrança pela utilização das águas deve ser e tem sido instituída por lei, ou em decorrência desta, em observância ao preceito constitucional segundo o qual ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Com isso, a sua implantação depende da participação dos Poderes Executivo e Legislativo. 

A água, também, se relaciona com princípios constitucionais, sendo que não é possível preencher o preceito constitucional de uma vida digna sem se considerar a disponibilidade de água de qualidade. A Constituição Federal restringe o domínio das águas entre a União e os Estados Membros, excluindo-se os municípios e os particulares, como assim também menciona a Lei nº 9.433/97: 

 Art. 1º. A Política Nacional de Recursos Hídricos baseia-se nos seguintes fundamentos:

I - a água é um bem de domínio público;

 Não obstante o Código Civil de 2002 em seu artigo 99, inciso I expõe que as águas pertencem ao domínio público da União e dos estados. Assim, cabe aos particulares somente a outorga, mediante pagamento do direito de uso das águas, que segundo a Lei nº 9.433/97, não implica a alienação de qualquer forma de bens que são inalienáveis. 

Entretanto, apesar dessas normas, não se pode dizer que o ser humano tomou consciência de que água é finita enquanto recurso natural e que é o bem mais importante para o homem continuar vivendo nesse planeta.

Sirvinskas cita em uma de suas obras a fala do ministro do Superior Tribunal de Justiça, Dr. Paulo da Costa Leite, que inicia seu discurso na abertura do Seminário Internacional afirmando que a água é o bem mais precioso do milênio, e que com isso devemos sempre lembrar o velho e sempre atual provérbio chinês: “Quando beber água, lembre-se da fonte”.

A Constituição Federal de 1988 delegou ainda em seu art. 21, inciso XIX, que compete à União instituir o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso.

 VI - Política Nacional de Recursos Hídricos 

Segundo Édis Milaré[8] a Lei nº 9.433/97 criou a Política Nacional de Recursos Hídricos e instituiu o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH). A mencionada Lei implementou a cobrança pelo uso da água, sendo apontada como um dos órgãos principais para a implantação da Política Nacional de Recursos Hídricos.

A referida Lei ainda definiu a criação da Agência Nacional da Água (ANA), como instituição federal de implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, complementando o Sistema Nacional de Recursos Hídricos e ligada ao Ministério do Meio Ambiente.

Mesmo com os crescidos progressos experimentados no campo legal e institucional, o Brasil não se utiliza de fontes apropriadas de financiamento para gestão, conservação e recuperação ambiental e constata-se também a deficiência na aplicação dos pequenos recursos existentes. Os órgãos de gestão estaduais incumbidos de licenciamentos e fiscalização das atividades impactantes e poluidoras do meio ambiente estão atuando de maneira precária.

No Brasil a poluição dos corpos hídricos internos e costeiros por efluentes domésticos ocorre em todo o território sendo pior nas áreas de maior concentração urbana, que não possuem um modelo sustentável de financiamento ao setor para mudar essa situação.[9] Com isso fica evidente essa controvérsia, como que o Brasil exerce uma função de destaque nos fóruns internacionais de debate dos problemas ambientais globais provenientes do desenvolvimento e ainda não se conseguiu tratar corretamente os resíduos que sua população produz diariamente em suas casas.

Devido às grandes extensões territoriais e as diferenças geográficas que o Brasil possui, ele tem casos bastante diferentes com relação à disponibilidade hídrica em cada região, sendo afetado tanto pela escassez de água de um lado, quanto pela degradação dos recursos hídricos por causa da poluição doméstica e industrial do outro.

Luís Paulo Sirvinskas[10] lembra que a região sul e sudeste do Brasil apresenta pouca disponibilidade de recursos hídricos, devido à enorme quantidade de poluição doméstica e industrial que está concentrada naquela região, como na cidade de São Paulo, por exemplo. Já na região do nordeste tem se os problemas da escassez causados pela poluição doméstica, pelo clima semiárido e agravado pela má distribuição das chuvas.

Entretanto, nas regiões norte e centro-oeste do Brasil pode se notar uma maior disponibilidade dos recursos hídricos com relação às outras regiões do país, isso se deve ao fato da baixa poluição doméstica e industrial, devido a pouca ocupação urbana, além de ser uma região protegida pelos ecossistemas da Amazônia e do Pantanal.

A falta de maiores investimentos em coletas e tratamentos de esgotos tem causado a degradação ambiental e o aumento da poluição dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos pelo despejo desses resíduos não tratados de forma correta. Tendo como consequências a diminuição da disponibilidade dos recursos hídricos e o aumento dos valores do tratamento feito pelo Poder Público para o abastecimento da população.

Sirvinskas[11] destaca ainda que: Para evitar a escassez da água, seja pela falta de disponibilidade, seja por excesso de poluição, é necessário:

a) (...);

b) diminuir o consumo e reciclar a água. É fundamental reduzir a demanda de água, estabelecer cobrança para seu uso, taxar poluidores e estimular o reuso. Novas técnicas para usos múltiplos devem ser pesquisadas e implementadas.

 Com o passar dos anos, grande parte da população será prejudicada por causa da destruição dos ecossistemas que dependem desses recursos para sua sobrevivência, e apenas será revertida essa situação através de melhores investimentos no tratamento, recuperação e preservação desses recursos que deve ser um dos objetivos primordiais do sistema de gestão.

De acordo com esse contexto, torna-se necessário evidenciar que algumas medidas têm sido adotadas, tanto no plano federal, como no plano dos estados, com a criação de leis e a organização dos entes envolvidos na área. O desenvolvimento e a implantação desses sistemas de gestão estão baseados nas ideias de que o gerenciamento dos recursos hídricos deve ser feito de maneira unificada, tendo como forma de gestão a bacia hidrográfica que incluirá também a vegetação e o solo.

Em razão disso, a gestão dos recursos deve ser descentralizada, criando-se comitês de bacia que terá a participação da sociedade civil, dos usuários, que pagarão pelo uso dos recursos hídricos e do Poder Público. A gestão também deverá compreender o princípio do poluidor-pagador e do usuário-pagador, possibilitando associar os gastos ambientais com os múltiplos usos da água, e as políticas de gestão devem direcionar para verificar a viabilidade financeira do gerenciamento integrado.

VII - Do Conselho Nacional de Recursos Hídricos

Segundo Maria Luiza Machado Granziera[1] conselho consiste na reunião de pessoas que deliberam sobre negócios, ou em outras palavras, quer dizer reunião de pessoas encarregadas de dirigir, conduzir, administrar.

O Conselho Nacional de Recursos Hídricos é composto por representantes dos Ministérios e Secretarias da Presidência da República com atuação no gerenciamento ou no uso de recursos hídricos; representantes indicados pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos; representantes dos usuários dos recursos hídricos; representantes das organizações civis de recursos hídricos, com reunião ordinária a cada seis meses em Brasília, o Conselho apresenta suas competências na Lei nº 9.984/00.

Incumbe ao Conselho determinar as prioridades quanto à aplicação dos recursos, incluindo os da cobrança, juntamente com os Comitês de Bacias Hidrográficas, sendo possível determinar os valores para a cobrança desde a captação, derivação e extração de águas ao aproveitamento do potencial hidráulico até mesmo para o lançamento de esgotos e outros poluentes.

Vale lembrar que outra competência importante do Conselho Nacional é ser a última instância da decisão administrativa dos conflitos existentes entre os Conselhos Estaduais ou oriundos de outros órgãos do Sistema, não excluindo a apreciação judiciária.

O Conselho Nacional também tem o poder de criar Agências de Águas, quando existir um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica de domínio da União (Art. 43, I da Lei nº 9.433/97).

E por fim deve-se destacar o poder do Conselho de instituir critérios gerais para a cobrança e outorga pelo uso da água, obedecendo à lei e regulamentações já existentes. Sendo necessário observar que os critérios estabelecidos vincularão os Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, os Comitês de Bacias Hidrográficas de domínio da União e os Comitês de Bacias Hidrográficas de domínio dos Estados.

 VIII - Agência Nacional de Águas (ANA)

 Na continuidade da regulamentação da Lei nº 9.433/97, a ANA foi instituída pela Lei nº 9.984, de 17-07-2000 possuindo caráter de autarquia sob regime especial, com autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de implementar, em sua esfera de atribuições, a Política Nacional de Recursos Hídricos, integrando o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, nos termos do Art. 3º.

A implementação da ANA foi o passo fundamental no processo de gestão estratégica, planejamento e organização institucional das águas brasileiras. A Agência é administrada por uma diretoria composta por cinco membros, todos nomeados pelo Presidente da República e aprovados pelo Senado Federal.

Vale salientar que, sendo a ANA o braço executivo do Conselho Nacional do Meio Ambiente, no âmbito da cobrança pelo uso da água, caberá a ANA conforme determina o Art. 4º, incisos V e VI da Lei nº 9.984/00:

 (...)

V - fiscalizar os usos de recursos hídricos nos corpos de água de domínio da União;

VI - elaborar estudos técnicos pra subsidiar a definição, pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, dos valores a serem cobrados pelo uso de recursos hídricos de domínio da União, com base nos mecanismos e quantitativos sugeridos pelos Comitês de Bacia Hidrográfica;

 Convém ponderar que, em se tratando de bacias hidrográficas compartilhadas com países vizinhos, evidentemente que a ANA não poderá ultrapassar ou deixar de observar os limites instituídos em tratados internacionais ou multilaterais.

Segundo o Art. 21 da Lei nº 9.984/00, no âmbito das águas da União, as receitas provenientes da cobrança pelo uso dos recursos hídricos, ficarão na Conta Única do Tesouro Nacional podendo ser movimentada somente pela ANA. E como a aplicação do recurso é vinculada, a ANA manterá registros que permitam correlacionar as receitas com as bacias em que forem geradas.

Oportuno se torna dizer que a água, quando apropriável com finalidades econômicas, é tratada pela moderna legislação ambiental brasileira como recurso hídrico. Este é um elemento importante na adequada compreensão do novo tratamento feito às águas pelo direito brasileiro, especialmente naquilo que diz respeito à apropriação de águas públicas com a finalidade de gerar riquezas econômicas, sejam publicas ou privadas.

Nesse sentido Paulo de Bessa Antunes observa que: O legislador brasileiro entendeu que a natureza comunitária da titularidade dos recursos hídricos impede que os mesmos sejam utilizados como instrumentos para produzir riquezas apenas para um individuo ou grupo de indivíduos, sem que se estabeleça um mecanismo de compensação para a coletividade.

 Por tais razões, a outorga é o instrumento jurídico administrativo que foi criado pelo legislador para determinar as condições pelas quais o usuário dos recursos hídricos poderá captá-la ou nele lançar efluentes, dentro de critérios técnicos que garantam a sustentabilidade do recurso.

IX - Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal

 Maria Luiza Machado Granziera relata que os Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, possuem cada qual uma composição especifica em que se determina a proporção da participação do Poder Público – União, Estados, Municípios – e da sociedade civil.

Os Conselhos Estaduais não possuem sua competência inteiramente estruturada em lei federal, incumbindo aos Estados, em seu caráter suplementar, regularizá-los. Os Conselhos Estaduais podem criar Agências de Águas referentes a Comitês de Bacias Hidrográficas estaduais, e são instância recursais destes.

 X - Comitês de Bacia Hidrográfica (CBHs)

 Os Comitês de Bacia Hidrográfica possuem uma área de abrangência de forma flexível, haja vista que de acordo com o art. 37 da Lei nº 9.433/97 eles terão como área de atuação:

 I - a totalidade de uma bacia hidrográfica;

II - sub-bacia hidrográfica de tributário do curso de água principal da bacia, ou de tributário desse tributário; ou

III - grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas

 Édis Milaré diz que vale notar que a bacia hidrográfica é um espaço territorial desenhado pela geografia física e não pela geografia política. No Brasil, a mesma bacia hidrográfica quase sempre compreende partes de Estados diferentes.

No entanto, deve se ter uma melhor negociação desses diferentes Comitês no sentido de que, caso não existindo oposição da União, os Estados fossem autorizados a criarem Comitês de Bacia em rios de domínio federal que não tenham importância estratégica para a União.

Os Comitês de Bacia Hidrográfica são órgãos colegiados, nos termos do art. 39 da Lei nº 9.433/97, compostos pelos representantes:

I - da União;

II - dos Estados e do Distrito Federal cujos territórios se situem, ainda que parcialmente, em suas respectivas áreas de atuação;

III - dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua área de atuação;

IV - dos usuários das águas de sua área de atuação;

V - das entidades civis de recursos hídricos com atuação comprovada na bacia.

 Com isso, Édis Milaré nota que os Comitês de Bacias Hidrográficas possuem um formato diferente de gestão, ao admitir a participação efetiva dos diversos usuários das águas, do Poder Público e da sociedade civil de uma bacia hidrográfica no processo decisório. E o sucesso desse inovador modelo vai depender, portanto, do entendimento e da capacidade da sociedade de se articular através desses órgãos colegiados, onde terá voz e vez.[5]

Os Comitês de Bacias Hidrográficas têm, entre outras atribuições, as do art. 38 da Lei nº 9.433/97 que são:

 (...)

V - propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de direitos de uso de recursos hídricos, de acordo com os domínios destes;

VI - estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados;

 A Lei nº 9.433/97 em seu artigo 1º, inciso V mostra que a cobrança, como instrumento de implantação da Política Nacional de Recursos Hídricos, deve acontecer na unidade territorial da bacia hidrográfica. Entretanto, Paulo Affonso Leme Machado, em seu livro Direito Ambiental Brasileiro apresenta um conflito sobre quem terá o domínio das águas, quais sejam federais ou estaduais.

Como existem águas de domínio da União e águas dos Estados, essa implantação da cobrança pelo uso da água no Brasil torna-se complicada por causa das particularidades jurídicas referentes aos recursos hídricos, assim para haver a cobrança, é necessário determinar primeiro quem vai administrá-la. A Constituição Federal em seu art. 24 parágrafo 2º determina que a competência legislativa é prioritariamente da União e suplementar aos Estados. Todavia, a própria Constituição em seu artigo 23, inciso VI, determina competência administrativa concorrente entre todos os entes federativos.

Como os recursos hídricos são divididos em competência federal e estadual, conforme garante a Constituição Federal em seus artigos 20, inciso III e 26, inciso I, existirão sistemas de cobrança distintos nos níveis federal e estadual. Lembrando-se que o Município não tem águas em seu domínio, o que não exclui seu dever de preservação e proteção. Com isso, a bacia é considerada de domínio da União quando envolve mais de um estado, sirva de limite com outros países ou que tenha participação em território estrangeiro, e é de domínio do Estado quando se encontrar totalmente dentro do mesmo.

A cobrança pelo uso da água é instituída a partir de um acordo entre o poder público, sociedade civil e os usuários da água, no âmbito do Comitê, instância regional de gestão. Contudo, a Lei nº 9.433/97 não determinou mais especificamente o que é bacia hidrográfica, distinguindo-se apenas as bacias como principal ou tributário, com isso essas definições de domínio só serão decididas com o passar do tempo.

Paulo Affonso Leme Machado cita que: O futuro vai dizer se a ideia dessa nova administração hídrica ficou só no terreno da imaginação ou se uma nova descentralização pode ser realizada, com alteração constitucional da partilha das águas entre a União e Estados, para que estas sejam realmente geridas pelos novos organismos hídricos.

 Como se nota, quando existir um Comitê Federal e outros comitês estaduais no mesmo território, haverá um duplo domínio público, e logo, deverá ter uma gestão compartilhada, sendo que as ações dos diferentes Comitês não podem ser contrárias, mas sim integradas ou articuladas.

Maria Luiza Machado Granziera menciona que: Embora a lei seja adequada na formatação do Sistema, ela é apenas um passo inicial para que ocorra, de fato, o gerenciamento, com vista em alcançar os princípios e objetivos propostos. O fato de os usuários e da sociedade civil, e também os Municípios, participarem ativamente dos Comitês é a única condição capaz de garantir comprometimento de cada um com o processo. Sem isso, não há como ser efetivada a lei.

 Dentro desse contexto, se faz necessário saber que o direito ambiental possui diversos princípios nos quais se fundamenta com o objetivo alcançar o máximo status quo natural juntamente com o desenvolvimento humano e suas relações socioeconômicas.

É bom de se lembrar que o Código de Águas, já em 1934 declarou, em seus artigos 109 e 110, que a ninguém é licito conspurcar ou contaminar as águas que consome, em prejuízo de terceiros, sendo os trabalhos para a salubridade das águas executado à custas dos infratores, os quais, além de responsabilidade criminal, se houver, respondem pelas perdas e danos que causarem e pelas multas previstas que lhes forem impostas nos regulamentos administrativos.

Celso Antônio Pacheco Fiorillo[9] considera que o direito ambiental é tido como uma ciência independente que possui princípios que buscam solucionar seus problemas, mas que gera um ônus resultante dessa atividade, e dentro desses princípios tem o do Poluidor-Pagador, do Desenvolvimento Sustentável, da Prevenção/Precaução, do Usuário-Pagador e o princípio preventivo da Participação envolvendo informação e Educação Ambiental.

A Lei nº 6.938/81 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, trata em seu art. 4º, inciso VII, dos conceitos dos Princípios do Poluidor-Pagador e Usuário-Pagador ao informar da obrigação que visará à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.

Nesse sentido, o Princípio do Usuário-Pagador significa que quem deve arcar com os gastos destinados à utilização dos recursos hídricos são quem se utiliza dele, estabelecendo com isso que esses custos não serão suportados nem por terceiros e nem pelo Poder Público.

Já o Princípio do Desenvolvimento Sustentável está definido no caput do art. 225 da Constituição Federal, que assim dispõe:

 Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

 O termo “presentes e futuras gerações”, de acordo com Celso Fiorillo[10] está ligado ao desenvolvimento sustentável, de modo que traz a ideia de economia que conserva o recurso sem esgotá-lo e não apenas com o sentido de solidariedade.

Os Princípios da Prevenção e da Precaução estão presentes também no caput do art. 225 da Constituição Federal, e têm por objetivos, no caso da precaução evitar o começo da atividade lesiva ao meio ambiente, por não haver a noção do risco da degradação do bem, e no caso da prevenção deve se evitar o prosseguimento da atividade lesiva ao meio ambiente por não saber sobre a probabilidade de risco de degradação ambiental.

XI - Órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do Distrito Federal e municipais cujas competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos 

Aqui se inserem os órgãos do Poder Executivo Federal, como o Ministério do Meio Ambiente e Ministério de Minas e Energia, e que a estes, segundo o art. 29 da Lei nº 9.433/97 lhes compete:

 I - tomar as providências necessárias à implementação e ao funcionamento do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

II - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos, e regulamentar e fiscalizar os usos, na sua esfera de competência;

III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito nacional;

IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental.

 Já no que se refere à implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, a cargo dos Poderes Executivos Estaduais e do Distrito Federal, composto pelas Secretarias Estaduais de Meio Ambiente e Secretaria Estadual de Energia e Saneamento, o art. 30 da Lei nº 9.433/97 fixa as seguintes competências, que correspondem às competências federais:

 I - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos e regulamentar e fiscalizar os seus usos;

II - realizar o controle técnico das obras de oferta hídrica;

III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito estadual e do Distrito Federal;

IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental.

 E no âmbito municipal têm as Secretarias Municipais de Meio Ambiente e outras correlatas que segundo o art. 31 da Lei nº 9.433/97, promoverão a integração das políticas locais de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e de meio ambiente com as políticas federal e estaduais de recursos hídricos.

 XII - Agências de Água

 As Agências de Água integram o Sistema Nacional de Recursos Hídricos, nos termos do art. 33, V da Lei nº 9.433/987 e exercerão a função de atuar como secretaria executiva dos respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica. O art. 42, em seu parágrafo único, preconiza que sua criação será autorizada pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos ou pelos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, mediante solicitação de um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica.

Além disso, a Lei nº 9.433/97 conferiu às Agências de Água diversas competências, na forma fixada pelo art. 44, entre outras:

 I - manter balanço atualizado da disponibilidade de recursos hídricos em sua área de atuação;

II - manter o cadastro de usuários de recursos hídricos;

III - efetuar, mediante delegação do outorgante, a cobrança pelo uso de recursos hídricos;

IV - analisar e emitir pareceres sobre os projetos e obras a serem financiados com recursos gerados pela cobrança pelo uso de Recursos Hídricos e encaminhá-los à instituição financeira responsável pela administração desses recursos;

V - acompanhar a administração financeira dos recursos arrecadados com a cobrança pelo uso de recursos hídricos em sua área de atuação.

 E para que haja uma agência é indispensável à prévia existência de um Comitê de Bacia e que exista viabilidade financeira, assegurada pela cobrança do uso dos recursos hídricos em sua área de atuação.

É importante ressaltar que a ANA, apesar de estar especificada em Lei, não passa de uma Agência de Águas, podendo ter sido perfeitamente enquadrada no inciso V, do art. 33 da Lei nº 9.433/97.

XIII - CONSIDERAÇÕES FINAIS

 De tudo quanto foi exposto no presente trabalho desde a história, as normas, os princípios e os aspectos ambientais, tributários e socioeconômicos, a conclusão mais preponderante é que se deve cobrar pelo uso de recursos hídricos, pois esta cobrança é tida como um instrumento de gestão das águas para favorecer a racionalização das águas na bacia, saneamento, recuperação ambiental e proteção das áreas de nascentes e rios, portanto, precisa cobrar e aplicar esses recursos de forma transparente para que quem pagou veja o retorno.

Muitos recursos foram arrecadados e numerosos projetos já foram contemplados, diversos deles apresentando efetiva melhoria no curso d´água, alcançando com isso os objetivos da implantação da cobrança que é justamente seu caráter educativo.

A cobrança pelo uso da água não tem a natureza tributária, todavia, não se enquadra de forma perfeita como preço público em razão da água ser de domínio público e essencial a sadia qualidade de vida e não ser objeto de disponibilidade, característica do preço público.

É relevante analisar as normas do direito ambiental e os princípios da água como um bem tão essencial, considerando seu valor econômico fruto da crescente escassez. Observando com isso um exemplo de gestão diferente da gestão pública habitual, admitindo uma participação eficiente, principalmente da sociedade civil organizada, nas decisões referentes aos recursos provenientes da cobrança. Não se esquecendo da competência dos órgãos do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos em obediência à Política Nacional de Recursos Hídricos.

Quanto á adequação da lei, não restou dúvida que é de caráter flexível o suficiente para que o Sistema de Gerenciamento, em cada bacia hidrográfica, se atue em conformidade com as características e necessidades locais, observando a interação no âmbito dos Sistemas Estaduais e Nacional de Gerenciamento, pois não poderia ser de outra forma, em um país com as dimensões do Brasil, com tanta diversidade em matéria de águas, não caberia estabelecer um sistema rígido.

É importante salientar o que seria necessário, além do sistema legal, para que existisse, de fato, efetividade na proteção dos recursos hídricos. Antes de tudo, a Lei nº 9.433/97, é uma norma endereçada à Administração Pública e ao administrador público. A lei se dirige ao poder público – federal, estadual, distrital e municipal – e o administrador deve tratar dos recursos hídricos com base em seus preceitos legais.

Completando as leis, além dos regulamentos, existem os mandamentos específicos, constituídos em outorgas de direito de uso da água e em processo de licenciamento ambiental. Ao contrário dos regulamentos, não são de aplicabilidade genérica, mas especifica, e valem somente em relação ao interessado, usuário da água, no campo dos respectivos processos.

Como se observa a todo o momento, em qualquer região do país, a situação dos recursos hídricos, tanto em qualidade como em quantidade, ainda se encontra muito comprometida. E quando se busca uma causa para essa degradação, a primeira certeza que se obtém é que isso não ocorre por falta de leis.

Ainda que a Lei nº 9.433/97 seja recente, o Código de Águas e o próprio ordenamento jurídico brasileiro, referente aos recursos ambientais já seriam instrumentos mais que suficientes para evitar que houvesse um aumento tão grande na degradação dos corpos hídricos, até porque esse problema é muito atual.

 Existem, no Brasil, mais leis do que se consegue cumprir, como ocorre em matéria ambiental e urbanística, por exemplo. É inegável que, embora as leis ambientais representem um avanço no sistema normativo brasileiro, pela sua abrangência, conteúdo e modernidade, o Estado encontra-se longe de estar preparado para garantir a efetividade desse sistema normativo.

As falhas serão constatadas por meio da poluição, da escassez e de doenças ocasionadas por vetores hídricos, o que colabora para a continuidade do desrespeito às regras, da impunidade, e para o empobrecimento do país.

O mais importante que se pode ressaltar é que a água denota sempre novos desafios, implantação de novos instrumentos, como o da cobrança, e a população deve fazer parte desse processo de desenvolvimento acompanhando de perto essa questão pelo simples fato da sobrevivência.

Como se nota, os recursos hídricos têm de ser administrados de forma integrada, atendendo às necessidades sociais, econômicas e de saúde das pessoas, além de suprir o meio ambiente, pois é dele onde tiramos todos os recursos naturais indispensáveis à sobrevivência de todos no mundo.

Nas regiões urbanas o gerenciamento desses recursos é complexo e precisa de bacias hidrográficas, que promovam uma mudança substancial na demanda, diminuam desperdícios e produzam alternativas para o uso da água, como por exemplo, a redução do uso doméstico, reúso de água, coletas de águas de chuvas e alteração dos métodos de irrigação na agricultura.

A gestão das águas deverá passar, necessariamente, pelo setor agrícola e umas das soluções é economizar a água utilizada em produtos para exportação, tais como soja, café, laranja e carne, uma vez que esses produtos consomem muita água em seu cultivo e indiretamente é exportada.

Consequentemente, o futuro das águas se restringirá á sua captação em pequena escala, técnicas inteligentes de preservação, irrigação por gotejamento, destinação especifica de recursos hídricos para o meio ambiente, informações aperfeiçoadas sobre quando irrigar, dentre outras medidas de pequena escala.

Por tais razões, o futuro das águas do mundo está na berlinda, os possíveis cenários variam e dependem de políticas e ações locais, nacionais e internacionais. Prevê-se que no futuro o mundo poderá enfrentar uma grave falta de água. A consequência disso será a queda na produção de alimentos, o que levará à desnutrição, às doenças e a um desastre ecológico sem precedentes.

A melhor solução para se minimizar o problema da falta de água no futuro é melhorar a produtividade do uso da água em vez de buscar permanentemente fontes para novos suprimentos. Deve-se fazer o abastecimento de água de qualidade, de acordo com as necessidades do usuário, em vez de apenas distribuir água em qualidade.

Esse caminho utiliza instrumentos econômicos, como as concepções de mercado e de preço, mas com a finalidade de estimular o uso eficiente, a distribuição equitativa do recurso e um sistema operacional sustentável no decorrer do tempo. E inclui as comunidades locais nas decisões sobre a administração, a distribuição e o uso da água.

Enfim, muitas são as medidas que podem ser adotadas pela comunidade, devendo o Poder Público incentivar através de campanhas periódicas nos veículos de comunicação e nas escolas.

XIV - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

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