OS REFLEXOS DO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA NA GESTÃO TRIBUTÁRIA – IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS (ISSQN)

I - INTRODUÇÃO

Relativamente à primeira ordem, vale ressaltar, desde logo, o fato de que o desenvolvimento de um país, de um estado, de um município e até mesmo o de uma família está inarredavelmente ligado à sua capacidade de gerar riquezas.

Os municípios brasileiros só poderão atender as necessidades de sua população em saúde, educação, transporte, cultura, lazer e etc., se contarem com recursos financeiros suficientes.

A Constituição Federal consagrou princípios fundamentais à função administrativa e da cooperação entre os entes da federação, a exemplo do princípio da eficiência e das alterações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 42, de 2003 que trata do compartilhamento de informações. Ora, para que este comando constitucional tenha eficácia e seja efetivamente observado por Estados e Municípios, é claro que estes deverão, antes, estruturar, organizar, capacitar e aparelhar as suas administrações tributárias, coisa que ainda não fizeram plenamente, não porque não a tenham querido, mas sim por não saberem como fazê-lo.

II. ARRECADAÇÃO DO ISS NOS MUNICÍPIOS.

II. 1. Pontos de Estrangulamento

Não é novidade que os municípios ostentam desempenho desastroso na arrecadação do Imposto sobre serviços (ISS). E isto se deve a três fatores preponderantes:

a)      Inadequada legislação reguladora do tributo, tanto no que se refere à identificação do fato gerador e à responsabilidade de seu recolhimento, quanto no que diz com o processo de arrecadação, com as normas que disciplinam e asseguram a eficácia da imposição fiscal.

b)      As deficiências de toda ordem dos aparelhos administrativos de arrecadação tributária, desassistidos e despreparados para o exercício da difícil tarefa de identificar a operação que gera o ISS e proceder sua cobrança.

c)       Ausência de sintonia entre os recursos legais, administrativos e tecnológicos necessários à implantação de um sistema confiável e eficaz na arrecadação do ISS.

A combinação destes três elementos, com os seus desdobramentos naturais, impedem que os Municípios apanhem receitas que lhes são indispensáveis, estimulando – o que é pior - o hábito de sonegar ou inadimplir.

III. A GESTÃO TRIBUTÁRIA E O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA NA ARRECADAÇÃO DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS

A legislação tributária por si só não garante os resultados esperados pelos municípios. Os mecanismos introduzidos pela norma, como os que cuidam da substituição, retenção, responsabilidade e obrigação tributárias precisam de ferramentas que otimizem a ação fiscal, propriamente dita, e que abrange desde a verificação das hipóteses de incidência, sua apuração e quantificação, até a resolução do processo fiscal que se lhe seguir.

Para que se exija a aplicação do princípio da eficiência é necessária a introdução de práticas administrativas e recursos tecnológicos afinados com a capacitação dos executores do processo.

No artigo 37[1], caput, da Constituição Federal está previsto o princípio da eficiência. E a Emenda Constitucional 19/98, que introduziu expressamente o princípio trouxe os elementos norteadores de sua aplicabilidade:

art. 39, § 2º- a União, os Estados e o Distrito Federal manterão escolas de governo para a formação e o aperfeiçoamento dos servidores públicos, constituindo-se a participação nos cursos um dos requisitos para a promoção na carreira, facultada, para isso, a celebração de convênios ou contratos entre os entes federados; [2]

art. 41, §1º, III- O servidor público estável só perderá o cargo: III mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa; [3]

 art. 41, § 4º- como condição para a aquisição da estabilidade, é obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade. [4]

A Emenda Constitucional nº 42, de 2003, ao introduzir no artigo 37, da Constituição Federal, o inciso XXII:

XXII - as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou convênio. [5]

Ao definir as administrações tributárias como "atividades essenciais ao funcionamento do Estado", a Constituição Federal determinou que as entidades federativas atuassem de forma integrada e isso pressupõe organização, estrutura e disciplina aliadas à capacidade do agente público em exercer a função.

Destaca-se do conceito do princípio da eficiência exarado por ALEXANDRE MORAES:

"Assim, princípio da eficiência é o que impõe à administração pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, rimando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitarem-se desperdícios e garantir-se maior rentabilidade social." [6]

A efetiva aplicação do princípio da eficiência possui relação direta com os resultados alcançados na arrecadação e fiscalização tributária, de maneira que a otimização de procedimento e o comprometimento dos trabalhos, tudo isso aliado à estrutura condizente com as necessidades, trazem o comprometimento dos agentes responsáveis, sob pena de sanção e até perda do cargo.

IV. A ILUSÃO DO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS - FPM

Por sintomático, vale um esclarecimento em torno da luta dos prefeitos para aumentar de 22,5% para 23,5% o FPM, ou seja, a participação dos municípios na arrecadação do imposto de renda e imposto sobre produtos industrializados. Periodicamente, 3 ou 4 mil prefeitos "marcham" sobre Brasília, para reclamar junto ao Governo e ao Congresso, o aumento de 1% no FPM. Agora mesmo, mais uma dessas "marchas" deve estar sendo programada, sem que se avalie sua eficácia, seus resultados práticos. Mesmo supondo-se venham os Prefeitos a obter o que reclamam: o dito aumento de 1% - seria de se perguntar o que isto representa, realmente, em acréscimo de receita para os municípios. A realidade revelada é desalentadora, principalmente para quem alardeia que a alteração do índice de participação será a "salvação da lavoura".

Tomem-se, como exemplos, o maior município do Estado, Joinville, e um dos menores, Bom Jardim da Serra. Se obtido o tal incremento de 1%, a Joinville caberia, no ano de 2006, conforme o projeto de partilha a ser apreciado em proposta de emenda constitucional pelo Congresso Nacional, um acréscimo de transferência anual de R$ 150.403,32, ou R$ 12.533,61 mensais.

Embora não se possa ter como desprezível qualquer soma de dinheiro público, é preciso que se convenha que em face das necessidades de Joinville e de sua pujança econômica, o que lhe cabe nesta famigerada partilha é ridículo.

Mais risível ainda é a situação de Bom Jardim da Serra, idêntica, é bom frisar, a de outros 155 municípios catarinenses.

Aprovado o novo índice de participação dos municípios, repita-se, de 23,5%, Bom Jardim da Serra e cada um dos demais 155 municípios catarinenses equivalentes receberiam, em acréscimo ao que hoje recebem, anualmente, a importância de R$ 90.242,04, ou, mensalmente, o valor de R$ 7.520,17!                       

Reconheça-se então, e por fim, que a depender destas transferências tão angustiosamente reclamadas pelos Prefeitos em suas andanças por Brasília, os projetos de desenvolvimento dos municípios e de melhoria das condições de vida de seus habitantes não sairão, nunca, do estágio de projetos. [7]

V. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Do que foi até aqui exposto, salta aos olhos algumas conclusões que precisam ser alinhadas:

1ª) Os municípios não arrecadam tributo que lhes é devido.

2ª) Não arrecadam, porque sequer conseguem identificar as operações que dão origem ao tributo.

3ª) Seus aparelhos de arrecadação não estão preparados e dotados de recursos adequados a lhes garantir eficiência na administração tributária.

4ª) Sua legislação tributária é ineficaz.

5ª) O aumento no Fundo de Participação dos Municípios é irrelevante no rol de receitas municipais possíveis.

6ª) O processo de desenvolvimento social e econômico dos municípios está irremediavelmente atrelado à capacidade de arrecadar seus tributos.

7ª) Não há Estado desenvolvido, com municípios empobrecidos.

O certo é que a eficiência no serviço público não deve recair apenas sobre o servidor público, pois a estrutura necessária deve ser colocada à disposição pela Administração.

Mecanismos eficientes de gestão tributária e capacitação do pessoal responsável repercutem diretamente na capacidade de gerar riqueza própria dos Municípios, diminuindo a dependência perante os demais entes federativos, ao exemplo do repasse do FPM.

Por fim, o sucesso na implantação de novas políticas administrativas depende diretamente do comprometimento dos agentes públicos envolvidos, que devem estar afinados com o princípio da eficiência, sob as penas da lei.

NOTAS



[1] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988 / obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Livia Céspedes. – 34. São Paulo, 2004, p. 39.

[2]BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Ob. Cit. p. 44.

[3]BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Ob. Cit. p. 48.

[4]BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Ob. Cit. p. 48.

[5]BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Ob. Cit. p. 42.

[6]MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13ª ed. São Paulo, Atlas, 2003.

[7]Brasil. Resultado do Tesouro Nacional / Secretaria do Tesouro Nacional. – Transferências Constitucionais. Estado de Santa Catarina, 2006.