1- Introdução

 

Este artigo tem por objetivo discutir o tema “Os recursos tecnológicos como ferramentas de aprendizagem X Currículo nas Escolas”. Apresentamos uma discussão onde pretendemos confrontar as concepções que envolvem o termo currículo com a construção do conhecimento a partir da inserção de meios multimídicos nos processos de ensino aprendizagem no ambiente escolar e sugerimos a inserção das mídias nesse contexto de forma eficaz e produtiva.

Temos a consciência de que o conhecimento não se dá de forma fragmentada. Numa sociedade onde a informação está presente das mais diversas formas, não podemos exigir que os alunos aprendam de forma desconexa e disciplinar.

Moran (2006) afirma o seguinte a respeito do conhecimento:

 

O conhecimento não é fragmentado, mas interdependente, interligado, intersensorial. Conhecer significa compreender todas as dimensões da realidade, captar e expressar essa totalidade de forma cada vez mais ampla e integral. Conhecemos mais e melhor conectando, juntando, relacionando, acessando o nosso objeto de todos os pontos de vista, por todos os caminhos, integrando-os da forma mais rica. (MORAN, 2006, p.18)

 

A afirmação de Moran retrata o pensamento de vários educadores e estudiosos, entretanto os “currículos escolares” demonstram certa incoerência entre as teorias da aprendizagem e as propostas curriculares que se efetivam nas instituições educativas. O equívoco começa pela compreensão do termo “currículo”. Vários educadores ainda estão presos a uma visão do currículo tradicional, formado por conteúdos isolados, que levam a uma prática educacional desarticulada da realidade sócio-cultural do aluno.

Moreira e Silva (1995) afirmam que numa análise crítica e sociológica do currículo o “conhecimento corporificado como currículo educacional” (p.29) não pode ser analisado fora de sua constituição social e histórica, ou seja, a teoria curricular “(...) não pode se preocupar apenas com a organização do conhecimento escolar, nem pode encarar de modo ingênuo e não problemático o conhecimento recebido” (MOREIRA & SILVA, 1995, p.21). De acordo com essa concepção o currículo se transforma num campo em que cultura e política se fazem presentes de forma significativa, ele deixa de ser apenas uma seleção de conteúdos, tanto para professores quanto para alunos, e passa a fazer parte da vida cultural e política da população regional, envolvendo toda uma sociedade.

O currículo, na visão crítica desses autores está diretamente envolvido nas relações de poder, ele serve como meio de manipulação das classes que possuem maior poder aquisitivo sobre aquelas de menor poder.

Portanto, não podemos realizar a tarefa da teorização curricular sem um esforço contínuo de identificação e análise das relações de poder envolvidas na educação e análise das relações de poder envolvidas na educação e no currículo.

Moreira e Silva (1995) demonstram através das relações: currículo/ideologia, currículo/cultura e currículo/poder, que o sistema educacional e as instituições caminham de forma articulada com as estruturas estabelecidas e criadas pelo homem e conseqüentemente reproduzem as relações sociais, ideológicas e culturais das várias classes existentes podendo interferir e transformar também as relações de poder.

No que concerne à trajetória do campo curricular no Brasil, nos anos oitenta, verificamos o quanto esse campo foi e é até os dias atuais influenciado pelas condições políticas (internacionais e nacionais), ideológicas, societárias, culturais e processuais (MOREIRA, 1995).

Neste trabalho pretendemos abordar a questão curricular no Brasil, especificamente no Estado de Goiás. Enfocaremos as discussões sobre as concepções curriculares, que tem por intuito refletir acerca do ensino, aprendizagem e avaliação que contemple as necessidades sociais e culturais das novas gerações.

Para tanto faremos um breve apontamento referente ao campo currículo no Brasil; e, discutiremos a introdução dos recursos midiáticos na educação.

 

2- Currículo numa perspectiva crítica e sociológica

Na análise crítica e sociológica do currículo, o conhecimento corporificado como currículo educacional não pode ser analisado fora de sua constituição social e histórica. O currículo envolve toda uma organização social, ele faz parte da história e das concepções de uma população, das relações de poder existentes neste meio, dessa forma ele não pode ser encarado como uma seqüência de conteúdos a serem transmitidos e recebidos de forma passiva e aleatória.

Quando falamos em educação no ambiente escolar não podemos restringir o conhecimento a ser transmitido a quatro paredes, o currículo se faz presente como expressão da sociedade na qual cada instituição escolar está inserida. Dessa forma ele envolve todos os aspectos que compõem esta organização social, ele passa a representar os jogos de interesse de diferentes grupos, o poder de determinadas classes sociais, enfim ele é moldado conforme o “pensamento” que circunda o meio social e político de determinada sociedade.

Moreira (1995) analisa essa questão mais detalhadamente em estudo realizado sobre “A questão da transferência educacional” afirmando que as pessoas envolvidas diretamente no desenvolvimento do campo e na adaptação de novas teorias não podem ser vistas como receptores passivos de ideologias todo-poderosas. Ficou claro, também, o poder das lutas travadas por professores especialistas na demarcação de novos espaços, limites e orientação do campo do currículo, ou seja, que idéias e teorias são filtradas, transformadas e até mesmo rejeitadas por esses mesmos profissionais:

 

Em síntese, julgamos que a reconceituação da transferência educacional, para ser mais bem dimensionada, depende de novos estudos que, além de situá-la em relação ao contexto sócio-econômico e político e as forças internacionais, discutam: a) a questão da adaptação do material estrangeiro; b) a influência do contexto cultural do país receptor; c) as especificidades e a dinâmica do contexto ideativo do campo transferido; d) o efeito de lutas e conflitos envolvendo os grupos direta ou indiretamente participante do processo; e, e) as peculiaridades e os efeitos do contexto institucional no qual o campo se desenvolve. (...) Sugerimos, ainda, que investigações da prática curricular complementem as linhas acima mencionadas. (MOREIRA, 1995, p204-205).

 

Essa questão curricular no Brasil vem travando muitas discussões atualmente, não só no Brasil, mas em todo o mundo, num processo de profundas transformações.

SANTIAGO (1990) faz uma análise específica sobre o papel do professor e sua interferência no processo ensino-aprendizagem, dentro do contexto sócio-político-econômico:

O professor tem uma concepção de mundo que se corporifica — mantida ou modificada — nas relações dadas entre educador e educando, em um contexto determinado. Seu atuar é um esforço para atingir o projeto idealizado de homem e de sociedade.(...)

Encarando a atuação do professor como uma opção política, vemos a necessidade de buscar o significado da sua prática na natureza e desenvolvimento das atividades vivenciadas. Buscar, no sentido de verificar em que direção apontam os propósitos pedagógicos e se realmente o encaminhamento das atividades representam uma opção; em que proporção se observa que os elementos teórico-práticos aproximam e/ou afastam o profissional da compreensão das condições objetivas de vida e de trabalho na estrutura educacional e na sociedade brasileira. (...) Portanto, o empenho para compreender como é gerado, organizado e se materializa o currículo é conteúdo da prática pedagógica. Daí que procuramos entendê-lo não apenas na forma apresentada no seu sentido clássico de organização de disciplinas e listagem de conteúdos, mas a partir de sua natureza e dimensão conceptual, como fundamento teórico-metodológico que dirige, traça diretrizes e aciona os segmentos do sistema educacional e, particularmente, as atividades na escola. (SANTIAGO, 1990)

 

Nestas poucas leituras que desenvolvemos sobre o currículo, pois este é um campo extenso e teríamos que mergulhar nas várias teorias com maior afinco para analisá-las num âmbito mais profundo, percebemos que a Política Educacional e suas diretrizes têm sido analisadas por profissionais da educação de forma mais criteriosa, buscando valorizar os interesses das classes menos favorecidas economicamente num esforço para transformar as instituições escolares em lugares onde todos tenham a oportunidade de se desenvolver intelectual e pessoalmente. Percebemos também que para reformularmos os currículos escolares precisamos, como educadores que somos, ter uma visão ampla sobre este campo chamado “currículo”. Precisamos deixar de pensar em currículo como uma seqüência de disciplinas e passar a compreender o universo que envolve as questões curriculares. Apenas de porte dessa consciência seremos capazes de transformar as relações dentro e fora do ambiente escolar, e buscar propostas que superem essas diferenças e se pautem em interesses de emancipação e formação crítica das gerações vigentes (MOREIRA, 1995).

LIBÂNEO (2005) afirma que:

 

Quando se pensa num currículo numa perspectiva pós-moderna, pensa-se como são construídos os saberes particulares, quais práticas discursivas constroem sentidos que as pessoas dão às coisas. Destacam-se, nesse quadro, as questões do multiculturalismo, desdobradas na diversidade social, no relativismo cultural, na valorização de experiências intersubjetivas.

 

Desta forma as relações de poder, os modos de dominação social e cultural, em termos macro e micro, precisam ser considerados, pois os processos sociais são controlados por essas relações de poder. O currículo, como parte integrante das relações de classe, etnia, gênero, constitui relações de poder. Essas relações não estão apenas no poder da instituição, das pessoas, da legislação, mas naquelas relações que impregnam as rotinas organizacionais, os rituais cotidianos. Daí a importância que se tem dado à cultura da escola, além da cultura na escola. (LIBÂNEO, 2005)

 

3- Ensino, aprendizagem e as tecnologias audiovisuais e telemáticas

Segundo Moran (2006) o campo da educação vem sendo pressionado por mudanças, assim como todos os segmentos da sociedade contemporânea. As mudanças nas relações de poder, ou seja, o enfraquecimento do Estado frente ao mercado globalizado traz novas possibilidades para as organizações e grupos econômicos, incluindo-se aqui a educação, que passa a ser um produto comercial, transformando-se assim os processos de reorganização e gestão em moldes trazidos de empresas mercadológicas. Em meio a essa disputa por “clientes” uma das áreas prioritárias de investimento é a implantação de tecnologias telemáticas de alta velocidade, para conectar alunos, professores e a administração. Existe uma expectativa de que as novas tecnologias trarão soluções rápidas para o ensino, mas como afirma Moran,

Sem dúvida as tecnologias nos permitem ampliar o conceito de aula, de espaço e tempo, de comunicação audiovisual, e estabelecer pontes novas entre o presencial e o virtual, entre o estar juntos e o estarmos conectados a distância. Mas se ensinar dependesse só de tecnologias já teríamos achado as melhores soluções há muito tempo. Elas são importantes, mas não resolvem as questões de fundo. Ensinar e aprender são os desafios maiores que enfrentamos em todas as épocas e particularmente agora em que estamos pressionados pela transição do modelo de gestão industrial para o da informação e do conhecimento. (MORAN, 2006, p 12)

 

Desta forma o desafio central do ensino não é a inserção ou não da tecnologia, mas, é a preocupação como a formação integral dos indivíduos. É a forma como os conteúdos escolares são organizados. É a falta de consciência e compreensão pelo professor sobre as políticas e relações de poder que envolvem os currículos escolares. Chamamos a atenção para o professor porque ele é o elemento principal na formação e “execução de conteúdos” no interior dos ambientes escolares.

Libâneo (2005) afirma que:

As pedagogias modernas reconhecem o impacto do desenvolvimento tecnológico na vida social e, em particular, nos processos de formação das pessoas. Mas não aceitam que haja uma crise da noção de formação geral. A democratização da sociedade supõe uma educação básica como necessidade imperativa de desenvolver nos jovens capacidades cognitivas, de modo que aprendam a se expressar, a compreender diferentes contextos da realidade, a relativizar certezas, a pensar estrategicamente, aspectos em que a lógica do mundo técnico-informacional pode ajudar, mas sem subsumir nela todo o processo formativo que implica o crescimento do ser humano, domínio gradativo de conhecimentos, técnicas, habilidades, o desenvolvimento da capacidade de se apropriar da realidade. (LIBÂNEO, 2005, p. 45).

 

Os dois autores, Moran e Libâneo, concordam que tecnologia não é solução para aprendizagem, nem para os problemas do ensino brasileiro. Pelo contrário, os recursos tecnológicos são meios para o professor dinamizar e ampliar suas estratégias em sala de aula.

Ao observarrmos o contexto educacional em que estamos inseridas, pois estamos sempre em contato com educadores da rede estadual da cidade de Anápolis-GO por meio de cursos ministrados no Núcleo de Tecnologia Educacional, percebemos que a afirmação de Libâneo sobre a compreensão de contextos diferentes e a revitalização do pensamento estratégico neste mundo informacional realmente “incomoda” o educador, pois nos falta a percepção de que a informatização não irá anular a formação do ser humano como pessoa. Ou, usando um “clichê” “a máquina não irá substituir o humano”, as técnicas utilizadas em sala de aula apenas irão acompanhar o desenvolvimento tecnológico presente na sociedade em que a instituição escolar está inserida.

 

4- Os recursos tecnológicos como ferramentas de aprendizagem X Currículo nas Escolas

As escolas brasileiras estão, aos poucos, sendo equipadas com computadores e vários outros recursos como TV/vídeo; retroprojetores etc. A grande questão é como integrar essas tecnologias de forma inovadora ajustando-as ao desenvolvimento do currículo escolar. Por isso, existe uma necessidade urgente “de se colocarem essas coisas num mesmo tempo, de compatibilizá-las ou, usando expressão da moda nos tempos das tecnologias digitais, sincronizá-las” (MARINHO, 2006). O computador já é peça do cenário de uma grande quantidade de escolas, como o quadro de giz. Por isso exige-se essa sincronização, que vai significar repensar o currículo na escola. Não queremos dizer aqui que o currículo deve ser repensado por causa das tecnologias, pois, sabemos que as tecnologias digitais não serão, por si só, sem uma ressignificação, motivos para mudanças na escola. Como afirma Castells (1999, apud MARINHO, 2006), “a tecnologia não determina a sociedade”, mas gera possibilidades de mudanças.

Essas novas tecnologias da informação e comunicação chegam à escola e se deparam com velhos currículos, com velhas formas de pensar e processos arcaicos de aprendizagem. Em nossa experiência como professoras, observamos que grande parte dos educadores ainda privilegiam conteúdos, muitas vezes sem significado para o aluno porque este está pré-determinado como essencial para a classificação dos alunos para as séries subseqüentes. Não existe ainda em nosso meio (de professores) o hábito de pensar o currículo como instrumento de aprendizagem, ou seja, como forma de proporcionar a formação global do ser humano. Para a maioria dos professores, o currículo continua sendo o elenco de conteúdos que devem ser ministrados independentemente de sua significação ou origem.

A escola está sendo desafiada a repensar seu currículo, de forma a integrar o computador e tecnologias associadas, como a Internet, nos processos de aprendizagem. Mas, como repensar o que é visto por tantos profissionais como determinado e imutável? Este questionamento está presente no pensamento de muitos professores. Quando se propõe a inserção de atividades nos laboratórios de informática, ou a exibição de filmes, ou excursões a locais como museus, galerias de artes etc. a primeira pergunta é “será que isto não vai atrasar o conteúdo?”. Esta preocupação com o conteúdo a ser ministrado demonstra que o maior desafio da escola é fazer com que todos os atores envolvidos neste processo (professores, alunos, pais, comunidade etc) compreendam que aprendizagem, como afirma Moran et al. (2005), acontece quando “conseguimos integrar todas as tecnologias, as telemáticas, as audiovisuais, as textuais, as orais, musicais, lúdicas, corporais”. O professor atualmente tem um grande número de opções metodológicas, de organizar sua comunicação com os alunos, de introduzir um tema, de trabalhar com os alunos presencial e virtualmente, de avaliá-los. Neste contexto é importante que o docente encontre a forma mais adequada de utilizar esses recursos, ampliando as formas de comunicação interpessoal/grupal e as de comunicação audiovisual/telemática.

Segundo Marinho (2006), pensar o currículo na escola do século XXI significa pensar currículo numa nova escola, para uma nova educação. Um dos maiores desafios para a escola atual é pensar qual a sua função social nessa sociedade da informação e globalizada, mas que ainda continua injusta, que ainda discrimina, que ainda diz não aos menos favorecidos. Ao buscarmos vislumbrar o processo de ensino e aprendizagem necessário aos novos tempos e que seja capaz de dar pronta e eficiente resposta às novas demandas socioculturais concretas, a questão do currículo torna-se desafiadora. Segundo o autor, a escola se depara, hoje, com três desafios: vencer o analfabetismo da lecto-escritura, o sociocultural e o tecnológico. Dessa forma “a escola tem que permitir que as pessoas aprendam a ler, escrever e fazer contas, que saibam em que tipo de sociedade se vive e aprendam a interagir com máquinas complexas” (p. 11).

Nessa sociedade do conhecimento todos estamos reaprendendo a conhecer, a comunicar-nos, a ensinar, a aprender, a integrar o humano e o tecnológico, o individual, o grupal e o social (Mora net al, 2005). A escola e seus atores estão reaprendendo a pensar o currículo como processo e meio de agregar todas essas transformações em prol do saber e da formação integral do ser humano. Currículo hoje não é sinônimo de organização disciplinar e sim de projetos colaborativos que integram ser e saber.

 

5- Proposta Curricular e tecnologias audiovisuais e telemáticas: dinamismo no processo ensino-aprendizagem

 

A escola ficou meio que à parte dos avanços tecnológicos justamente devido às políticas públicas que investem na educação de forma meio tímida em nosso país. Com isto os educadores também se acomodaram e desenvolveu-se uma espécie de acordo entre uma grande maioria: “fingimos que investimos, fingimos que ensinamos e todos fingem aprender”. Esta frase infelizmente vem se fazendo presente em diversas discussões entre educadores, chegou-se a uma conclusão de que não é possível mudar, pois não temos recursos e nem vontade política. Ora e a vontade dos profissionais da educação, onde fica? Acreditamos que as tecnologias são um meio para renovar as formas de se ensinar. A criança de hoje é educada pela mídia, principalmente pela TV e por jogos eletrônicos. A relação que tem com essas mídias é prazerosa, é feita de sedução, de emoção, da exploração sensorial, da narrativa, elas aprendem vendo e sentindo, sem precisar fazer esforço.

O grande desafio da educação hoje é transformar os conteúdos escolares em situações prazerosas de aprendizagem, é fazer com que o aluno sinta prazer em aprender, em trocar idéias, em avançar no conhecimento. Nesse sentido acreditamos serem as tecnologias telemáticas e audiovisuais grandes parceiras do professor e do aluno na busca do conhecimento.

Para ilustrar nossa proposta tomamos como referência os estudos de dois autores Behrens (2006) e Masetto (2006), que apesar de se referirem mais acentuadamente ao ensino superior trazem importantes apontamentos para uma mudança de postura e de visão educacional por parte dos educadores e demais atores envolvidos no processo educativo.

Behrens (2006) afirma ser necessário uma mudança substancial nos papéis do professor e do aluno. Ambos têm que abandonar a postura passiva diante dos vários saberes e assumirem uma postura inovadora, articuladora, reflexiva. Assumir novas posturas não é fácil principalmente quando estamos cercados de ideologias que insistem em afirmar que “a educação deve formar cidadãos críticos”, mas na realidade forma o cidadão para o mercado de trabalho perpetuando o interesse das classes dominantes. Para romper com esta realidade a autora propõe um modelo, intitulado por ela de “aprendizagem colaborativa”. Esta proposta pressupõe um professor familiarizado com a era digital, capaz de interagir com as informações de forma crítica e reflexiva, um aluno motivado a buscar o conhecimento e com habilidades para compreender as várias linguagens, oral, escrita, digital etc. Neste processo a sala de aula se transforma num local de interação onde o professor propõe estudos significativos e alunos buscam o conhecimento como indivíduos críticos e capazes de transformá-los em ação. Ambos se transformam em pesquisadores e investigadores, a aprendizagem passa a ser significativa, desafiadora, problematizadora e instigante.

Behrens (2006) faz um alerta importante sobre essa mudança de abordagem:

A aprendizagem colaborativa precisa ter como referência uma prática pedagógica num paradigma emergente. Para alicerçar uma prática pedagógica compatível com as mudanças paradigmáticas da ciência, num paradigma emergente, Behrens (1999) acredita na necessidade de desencadear uma aliança de abordagens pedagógicas, formando uma verdadeira teia, da visão holística, com a abordagem progressista e com o ensino com pesquisa. Essa aliança justifica-se e torna-se necessária de acordo com as características de cada abordagem:

a) O ensino com pesquisa pode provocar a superação de reprodução para a produção do conhecimento, com autonomia, espírito crítico e investigativo. Considera a pesquisa como princípio educativo, portanto o aluno e o professor tornam-se pesquisadores e produtores dos seus próprios conhecimentos.

b) A abordagem progressista tem como pressuposto central a transformação social. Instiga o diálogo e a discussão coletiva como forças propulsoras de uma aprendizagem significativa e contempla os trabalhos coletivos, as parcerias e a participação crítica e reflexiva dos alunos  e dos professores.'

c) A visão holística ou Sistêmica busca a superação da fragmentação do conhecimento, o resgate do ser humano em sua totalidade, considerando o homem com suas inteligências múltiplas, levando à formação de um profissional humano, ético e sensível (BEHRENS, 2006, p.87)

 

Essa teia partindo das três abordagens, proposta pela autora, permite uma aproximação de pressupostos significativos, cada uma em sua dimensão. O computador e a rede de informações se transformam em recursos para uma ação docente inovadora e eficaz, onde o aluno é o agente principal do processo deixando a passividade e passando a atuar como pesquisador.

A segunda proposta da autora é o trabalho por projetos, que vai de encontro à proposta que temos feito aos professores para utilizarem os laboratórios de informática instalados nas escolas estaduais e municipais em nível de primeiro e segundo grau do Ensino fundamental.

Como vimos no documento da Reorientação Curricular d0 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental de Goiás, os dois focos principais para a dinamização das aulas e a renovação da prática educativa se voltam para ações criativas e para a elaboração de projetos de ação. Na visão da aprendizagem colaborativa a tecnologia se transforma numa ferramenta a serviço do profissional da educação. Os professores passam a ser críticos e contemplam sua prática pedagógica com o uso de recursos inovadores no intuito de desenvolver aptidões e formar seres humanos reflexivos e criativos.

Ao se conectar a rede de informações (ou tecnologia da informação) por meio de computadores o professor terá acesso: a projetos pedagógicos de escolas do mundo inteiro em todos os níveis, às políticas públicas, a projetos de aprendizagem elaborados por professores e alunos, à proposições metodológicas de várias instituições de ensino etc. Além disso a rede cria a possibilidade de exposição e disponibilização das pesquisas dos alunos de maneira atrativa e produtiva. Os programas tutoriais e aplicativos, jogos, linguagem, programas de autoria, editores de textos e simulações, são alguns exemplos de recursos que estão diretamente ligados à formação de uma geração que já se encontra inserida numa sociedade que se utiliza desses recursos, dessa forma é função da escola também oferecer essas possibilidades aos educandos e educadores.

Não queremos aqui dizer que a tecnologia é a solução dos problemas educacionais do Brasil, mas que ela pode colaborar se for utilizada de forma adequada para o desenvolvimento dos estudantes e para o aprimoramento da prática pedagógica do professor.

Masetto (2006) faz algumas observações relevantes sobre o processo de aprendizagem e tecnologia. Ele chama a atenção sobre cinco elementos: o conceito de ensinar, o conceito de aprender, o papel do aluno, o papel do professor e o uso da tecnologia. Em sua concepção:

 

O conceito de ensinar está mais diretamente ligado a um sujeito (que é o professor) que, por suas ações, transmite conhecimentos e experiências a um aluno que tem por obrigação receber, absorver e reproduzir as informações recebidas. O conceito de aprender está ligado mais diretamente a um sujeito (que é o aprendiz) que, por suas ações, envolvendo ele próprio, os outros colegas e o professor, busca e adquire informações, dá significado ao conhecimento, produz reflexões e conhecimentos próprios, pesquisa, dialoga, debate, desenvolve competências pessoais e profissionais, atitudes éticas, políticas, muda comportamentos, transfere aprendizagens, integra conceitos teóricos com realidades práticas, relaciona e contextualiza experiências, dá sentido às diferentes práticas da vida cotidiana, desenvolve sua criticidade, a capacidade de considerar e olhar para os fatos e fenômenos sob diversos ângulos, compara posições e teorias, resolve problemas. Numa palavra, o aprendiz cresce e desenvolve-se. (MASETTO, 2006, p. 139-140)

 

Essa concepção de aprendizagem exposta pelo autor demonstra um conceito de desenvolvimento do ser humano como um todo, ou seja, não é a escola ou o professor que promove a aprendizagem, o professor e a escola são meios para o indivíduo desenvolver-se como ser. O papel do professor neste processo é de mediador entre o aprendiz e sua aprendizagem. Dessa forma ele também se transforma num aprendiz, ele também está num processo constante de aprendizagem e evolução. Este papel mediador não é fácil para nós professores que estamos impregnados por um modelo tradicional de transmissão de conhecimentos. Sair dessa postura implica perder o “controle” da situação, ficamos à mercê de uma proposta que não dominamos, que, no fundo, não acreditamos.

Vejamos uma experiência que tivemos em um dos cursos ministrados pelo NTE (Núcleo de Tecnologia Educacional) a professores do Ensino Médio: a proposta do curso em questão visava o trabalho no laboratório de informática instalado nas escolas pelo Governo Federal. O teor principal era demonstrar aos professores que não se interrompe o conteúdo curricular para desenvolver atividades extras nos laboratórios, pelo contrário, a intenção é a de se trabalhar os conteúdos utilizando-se dos recursos do laboratório. O curso propunha a elaboração de “questões essenciais” para a elaboração das unidades de estudo, essas questões deveriam ser extraídas do conteúdo programático, mas de forma seletiva, o professor deveria identificar a essência do conteúdo a ser ministrado e transformá-lo em questões para provocar nos alunos a motivação e a pesquisa individual e coletiva. A reação dos professores foi unânime: não podemos prejudicar nossos alunos com este tipo de ação pedagógica, pois estão se preparando para o vestibular e temos um “currículo” a cumprir.

Percebe-se nessa reação que o foco da educação não está na formação integral do ser humano e sim na transmissão de conteúdos tidos como essenciais para a inserção dos alunos no ensino superior, ou seja, a intencionalidade maior não é a aprendizagem, dessa forma a tecnologia e recursos inovadores são um empecilho para o cumprimento da meta final.

A inserção da tecnologia como mediação pedagógica requer, antes de tudo, a mudança de postura do professor. É ele que se propõe a ser um mediador pedagógico, que elabora situações de aprendizagem, que interage com os novos recursos, que cria momentos especiais e motivadores. Se o aluno é o foco da aprendizagem e o professor é o mediador, responsável por promover a interação entre o ser e o conhecimento, o currículo neste processo, se faz presente em todos os setores, interligando culturas, políticas, aprendizagens e concepções.

 

6- Considerações finais

Ao optarmos por refletir sobre o currículo, a tecnologia e a mediação pedagógica, procuramos visualizar a influência que os meios tecnológicos podem provocar no sistema educacional brasileiro.

Em nosso trajeto reflexivo discutimos o conceito de currículo e as ideologias que estão nas entrelinhas deste termo. As reflexões aqui explicitadas nos conduzem a uma nova concepção do que vem a ser um currículo e da responsabilidade que temos, enquanto educadores, de interferirmos e refletirmos sobre este “termo”. Percebemos que existe uma assincronia entre o currículo proposto nas escolas e a realidade presente na sociedade contemporânea.

Observamos que a utilização de recursos midiáticos, no contexto da reforma curricular, poderá trazer contribuições para a melhoria do processo de aprendizagem dos alunos na medida em que forem realmente contempladas e se fizerem presentes como um auxiliar do professor, ou seja, os recursos midiáticos contribuem para a motivação dos alunos e para ampliar as formas de se trabalhar em sala de aula proporcionando novas formas de questionar, pesquisar, busca do conhecimento. 

Ao sugerirmos a aprendizagem colaborativa e o ensino por projetos de aprendizagem acreditamos que essas propostas contribuirão para a mudança de postura do professor, do aluno, da comunidade, da sociedade. A intenção é a de que todos se envolvam para a busca de uma aprendizagem onde o aprendiz seja o centro do processo, onde a confiança entre aluno e professor seja fortalecida por meio de uma aprendizagem cooperativa, motivadora e eficaz.

 

 

7- Bibliografia:

BEHRENS, M. A. Projetos de Aprendizagem Colaborativa num paradigma emergente. In: MORAN, J., BEHRENS, M. A., MASETTO, M. T. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas, SP: Papirus, 2005.

CORAZZA, S. O que quer um currículo?: pesquisas pós-críticas em educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.

GOODSON, I. F. trad. BRUNETTA, Attílio. Currículo: teoria e história. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

LIBÂNEO, J. C. As teorias pedagógicas modernas revisitadas pelo debate contemporâneo na Educação. Educação na Era do conhecimento em Rede e transdisciplinaridade. Campinas-SP, Alínea, n. p. 43, ISBN: 8575161334, Impresso. 2005.

MARINHO, Simão Pedro P. Novas tecnologias e velhos currículos; já é hora de sincronizar. Revista E-Curriculum, São Paulo, v. 2, n. 3, dez. 2006. Disponível em http://www.pucsp.br/ecurriculum.

MASETTO, M. T.  Mediação Pedagógica e o uso da tecnologia. 10 ed. In: MORAN, J., BEHRENS, M. A., MASETTO, M. T. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas, SP: Papirus, 2006.

MORAN, J., BEHRENS, M. A., MASETTO, M. T. Novas tecnologias e mediação pedagógica. Campinas, SP: Papirus, 2006.

MOREIRA, A. F. e SILVA,T. T. Currículo, cultura e sociedade. 2.ed. São Paulo: Cortez, 1995.

MOREIRA, A. F. Currículos e programas no Brasil. 2 ed. Campinas, SP: Papirus, 1995.

SEE - Secretaria de Estado da Educação de Goiás - Reorientação Curricular do 6º ao 9º ano: currículo em debate. Goiânia, 2005. (Cadernos 1 - 4)

SEE – Site da Secretaria de Estado da Educação de Goiás. Disponível em: <http://www.educacao.go.gov.br/portal/default.asp>. Data: 10/08/2007.