OS PRINCIPAIS ATORES DA POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS: GESTÃO INTEGRADA ENTRE PODER PÚBLICO, SETOR EMPRESARIAL E COLETIVIDADE[1]

Raissa Luzia Braga Dias[2]

Ingrid Brandão dos Santos[3]

Isabella Pearce[4]

Sumário: Introdução; 1. Perspectiva histórica e socioeconômica dos resíduos sólidos e da Lei 12.305/2010; 1.1 A influencia e importância da Lei de Política Nacional de Resíduos Sólidos para os principais atores; 2. A correlação de deveres e obrigações dos principais personagens da LNPRS; 3. LNPRS no plano social concreto: falhas, críticas e possíveis soluções a cerca dos atores; Conclusão.

RESUMO

O presente trabalho visa analisar, inicialmente, a perspectiva histórica e socioeconômica dos resíduos sólidos e da Lei 12.305/2010, bem como mostrar a sua correlação com as três gerações, discutindo sobre a incidência e os objetivos da Lei de Política Nacional dos Resíduos Sólidos na coletividade, no poder público e no setor empresarial. Após discutir a incidência, os deveres e obrigações na gestão integrada desses três personagens, expor-se-á os problemas dessa lei no plano concreto, na gestão integrada desses três personagens, apontando falhas e construindo críticas, que fomentaram uma rica discussão e reflexão a respeito da lei e do contexto que a envolve e que ela é inserida pra ter eficácia, para, assim, gerar possíveis soluções para melhor aplicabilidade da LNPRS no plano social concreto.

Palavras-chaves: Resíduos Sólidos; Coletividade; Poder Público; Setor Empresarial; Plano Social Concreto.

 

INTRODUÇÃO

 

O Desenvolvimento Sustentável é de grande importância para a sociedade, visto que nos dias atuais é a produção em massa que prevalece, devendo-se buscar o equilíbrio entre o desenvolvimento e as necessidades das atuais gerações, preocupando-se também com as futuras.

Após longa gestação no Congresso Nacional, foi aprovada a Política Nacional dos Resíduos Sólidos, diploma este atualizado e motivador que possibilitará gerar práticas e ideias a respeito de uma problemática bastante atual. A lei aponta elementos valiosos em seu dispositivo, com a finalidade de superar as adversidades e não somente contorná-las.

A inadequada disposição final dos resíduos sólidos e transporte, bem como o mal reaproveitamento do mesmo, é uma abrangente problemática ambiental que assola o país. Nessa perspectiva, a consciência para a importância da gestão dos resíduos sólidos se propagará, em virtude que a recente lei editada e inovadora, abrirá novos horizontes tanto para a doutrina como para a ação concreta dos três atores.

Por isso, a relevância em se abordar a Lei 12.305/2010 em conjunto com os a atuação dos três âmbitos (poder público, setor empresarial e a coletividade) de forma que corroborem entre si para alcançar a efetivação dessa lei e garantir que as gerações futuras habitem um mundo que possua recursos naturais disponíveis.

Sendo assim, o presente trabalho, torna-se uma ferramenta importante para a análise dessa problemática, levando a reflexões que gerem ou guiem para possíveis soluções, tanto em relação a aplicabilidade da lei quanto ao comportamento da sociedade e do setor empresarial.

 

  1. PERSPECTIVA HISTÓRICA E SOCIECONÔMICA DOS RESÍDUOS SÓLIDOS E DA LEI 12.305/2010

 

A Política Nacional dos Resíduos Sólidos fora criada com objetivo de sanar uma série de problematizações acerca da destinação e disposição dos resíduos sólidos, afim de que estes não sejam dispostos em locais inadequados e venham a poluir o solo enquanto recurso ambiental.

A preocupação com o problema dos resíduos sólidos deu-se, incialmente, sob o enfoque da saúde humana, prescrevendo-se que a coleta, o transporte e o destino final do lixo deveriam dar-se em condições que não importassem inconvenientes à saúde e ao bem-estar público. (MILARÉ, Édis, 2011, p. 282). Tem-se por cerne dizer, que com a constante evolução industrial e tecnológica ao redor do mundo, diversos são os problemas enfrentados em razão dos resíduos sólidos. Édis Milaré aponta que essa problemática tornou-se tecnicamente complexa por muitas razões, tais como urbanização acelerada com reflexo na ocupação e no uso do solo urbano, aumento exponencial de embalagens, o descarte maior de resíduos, o despreparo dos municípios para gerir essa problemática, e principalmente, a quase absoluta carência de educação ambiental nos três setores de atuação.

Autores como Lewis Mumford citado por Édis Milaré, afirma que o lixo vem, por muitos séculos, acoplado ao saneamento básico e igualmente associado a higienização das cidades durante a Idade Média. De fato, não era o que ocorria em todas as civilizações do mundo, uma vez que o tratamento adequado dos resíduos sólidos foi um problema de grande relevância para a terceira geração que se preocupa com os Direitos Sociais e para a crescente dinâmica de preservação do Meio Ambiente.

A primeira lei sanitária foi disposta na Inglaterra pelo Parlamento Inglês, em 1338, à vista da sujeira ali existente e para que não se jogasse mais lixo em cursos de água, como afirma Mumford.

Com o surgimento da industrialização, no século XIX, Mumford apud Édis Milarés afirma:

O espírito capitalista insensível, então dominante, induziu as administrações a passar para a iniciativa privada o suprimento de água e coleta do lixo. Isso nos faz crer que tais serviços em apanágio da autoridade citadina – como acontecia em Paris e outras grandes cidades. No passado, eram os burgomestres (espécie de prefeito) das pequenas cidades que, cercados pelo conselho municipal, geriam tais serviços. Provavelmente se encontre, nesse tipo de organização, a prática (para não dizer tradição) de atribuir ao Município tais encargos relevantes que, na linguagem técnica jurídica anterior, referiam-se ao ‘’peculiar interesse municipal’’. (2011, p. 853)

     Porém, como será relatado mais adiante, não é só esse ‘’peculiar interesse municipal’’ que poderá tornará a Política Nacional de Resíduos Sólidos efetiva, pois outros atores precisam trabalhar em consonância com este, como a coletividade de inconsciência relativa e o Poder Público.

Em razão disso, a Lei 12.305/10 foi sancionada pelo governo, mas até 2010 muitos problemas foram enfrentados por esses atores.

Em 1980 houve os primeiros sinais de legislação, e posteriormente, em 1999, foi elaborado as "Diretrizes Técnicas para a Gestão de Resíduos Sólidos" que foi aprovada, mas não entrou em vigor. E assim, este tema conseguiu grande repercussão no poder legislativo, até que em 2007 foi enviado para o Presidente da República analisar. (NETO, 2012).

Após diversas discussões o projeto de lei foi aprovado em 2010, e este buscou gerenciar o destino dos resíduos sólidos, bem como regulamentar as diretrizes e os princípios que regem esta lei.

Atualmente, os resíduos sólidos possuem vários tipos de destinação, tais como: lixão, aterro sanitário, usina de compostagem, reciclagem, incineração, bem como o destino final que os resíduos sólidos domésticos e industriais levam, todos regulamentados pela atual PNRS ou legislação auxiliar.

O lixão, atualmente, é uma prática arcaica e condenável de disposição final. De acordo com Édis Milaré, sendo os resíduos lançados ao solo, em área a tal destinada, sem qualquer estudo prévio, monitoramento ou tratamento. Este ainda afirma que o impacto ambiental consiste em contaminação do solo por chorume, podendo atingir o lençol freático e cursos de água, e supressão de vegetação. Hoje em dia o lixão é uma prática condenável pela PNRS.

O aterro sanitário não é uma forma custosa de ser implantada, bem como é tecnicamente adequado para disposição final dos resíduos sólidos. Além disso, há a resolução CONAMA 404/08 que estabelece diretrizes e critérios de licenciamento de aterros sanitários de pequeno porte (só pode ser depositado até vinte toneladas de resíduos sólidos urbanos por dia) com a finalidade de não ocorrer ou diminuir a ocorrência de danos ambientais.

Também temos como forma de disposição final adequada a usina de compostagem, e esta é a que possibilita os maiores ganhos ambientais. Destina-se tão somente aos resíduos sólidos domésticos e compreende processo de transformação de matéria orgânica em composto a ser utilizado como enriquecedor do solo em áreas agrícolas (MILARÉ, 2011, p. 856). Além disso, esta prática pressupõe obediência a rígidos critérios, uma vez que, por exemplo, não pode haver usinas de compostagens próximas a áreas urbanas, em razão do dor odor que esta provoca.

A reciclagem, disposta no art. 3°, inciso XIV da PNRS, é a forma mais inovadora do século XIX de disposição final dos resíduos sólidos (vidro, papel, metal e plástico), pois possibilita que estes possam ser reutilizados novamente através de alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas. Além disso, esta prática diminui a necessidade de exploração de recursos naturais, bem como menos se terá que utilizar aterros sanitários. Édis Milaré afirma que o processo de reciclagem tem início com a coleta seletiva, que consiste em ser a separação dos resíduos domésticos em orgânicos e inorgânicos, e a reciclagem é indissociável do processo de compostagem: esta se inicia somente após a separação, por meio da coleta seletiva, dos resíduos orgânicos e inorgânicos.

A incineração é um processo muito custoso de queima controlada de resíduos industriais, combustíveis inertes e lixo domiciliar com a eliminação quase total dos resíduos, bem como ocupa um espaço físico bastante reduzido. Além disso, a operação dos incineradores precisa ser efetuada de acordo com os critérios técnicos exigidos para evitar a liberação de gases poluentes na atmosfera em níveis indesejáveis e não permitidos. Para Miralé, deverá ser feita a prévia caracterização dos materiais resultantes do processo de incineração e equipamentos de controle, contemplando o potencial de inflamabilidade, corrosividade, reatividade e toxicidade dos materiais, de modo a definir corretamente sua destinação final. A incineração é regulamentada pela Resolução CONAMA 401/08 e PNRS.

O destino final que levam os resíduos sólidos domésticos está disposto no art. 30, inciso V da Constituição Federal, de competência das administrações municipais. Já as industriais, por sua vez, são obrigadas a determinar o destino final dos resíduos que produzem. Caso as empresas optem por sistemas próprios de disposição final dos resíduos que geram, deverão seguir os padrões legais e regulamentares vigentes. (MILARÉ, 2011). A Resolução CONAMA 313/02 dispõe sobre o Inventário Nacional de Resíduos Sólidos Industriais, e em seu art. 1° estabelece que os resíduos existentes ou gerados pelas atividades industriais serão objeto de controle específico, como parte integrante do processo de licenciamento ambiental.

Porém, mesmo que a inovadora lei viesse abordar os objetivos, princípios e diretrizes que devem tomar os resíduos sólidos e apontasse uma árdua conscientização para que mudanças de conduta por parte de todos os atores ocorressem, outras legislações foram criadas com a necessidade de auxiliar na gestão do tema também, como a Lei 11.445/07 que trata do Saneamento Básico, bem como as resoluções da CONAMA.

 

  • A INFLUÊNCIA E IMPORTÂNCIA DA LEI DE POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS PARA OS PRINCIPAIS ATORES

A lei 12.305/10 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos sistematizou objetivos, princípios e diretrizes relativas ao gerenciamento e gestão integrada dos resíduos sólidos, bem como buscou delimitar a esfera de responsabilidade do poder público e dos geradores de resíduos.

Por isso, a coletividade, o setor empresarial e o poder público precisam trabalhar em consonância para que a lei incida de forma efetiva, através dos Planos de Resíduos Sólidos: o próprio plano nacional dos resíduos sólidos, os planos estaduais dos resíduos sólidos, os planos microrregionais de resíduos sólidos e os planos de resíduos sólidos de regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas, os planos municipais e intermunicipais de resíduos sólidos, os planos de gerenciamentos dos resíduos sólidos; a Coleta Seletiva, a Logística Reserva e a Educação Ambiental, tudo isso combinado a incentivos fiscais, financeiros e creditícios e o sistema de responsabilidade pela geração e gerenciamento dos resíduos sólidos, todos sistematizados na Política Nacional dos Resíduos Sólidos.

A PNRS, integrante da Política Nacional do Meio Ambiente e relacionada com a Política Nacional de Educação Ambiental e a Política Federal de Saneamento Básico, estabelece ainda metas e ações a serem adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos. (MILARÉ, 2011, p. 860).

Portanto, apesar e por conta desses atos auxiliares e regulamentares, necessitávamos e carecíamos de um diploma que gerenciasse sobre o tema dos resíduos sólidos em uma Política Nacional de Resíduos Sólidos, dispondo sobre normas relativas a transporte, reciclagem, disposição final, reaproveitamento, prevenção de geração, entre outras.

Por isso, nos termos desta lei e em consonância com o texto constitucional, tanto as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, sendo responsáveis diretamente ou indiretamente pela geração de resíduos sólidos, estão sujeitas à observância desta lei da Política Nacional dos Resíduos Sólidos.

 

  1. A CORRELAÇÃO DE DEVERES E OBRIGAÇÕES DOS PRINCIPAIS PERSONAGENS DA PNRS

 

A Política Nacional dos Resíduos Sólidos, como visto no item anterior, incide sobre a coletividade, o setor empresarial e o setor público, os quais tem a responsabilidade de efetivar as ações que servem para garantir o cumprimento das diretrizes e determinações que estão previstas na Lei n° 12.305/2010. É necessário observar que estes atores devem cumprir as suas obrigações de forma correlata, ou seja, que cada um realize a sua parcela obrigacional de forma que um dê subsídios ao outro, formando, assim, uma cadeia harmônica que, analogicamente, pode-se comparar com a cadeia alimentar dos animais, a qual cada animal cumpre com o seu papel e, em virtude disso, mantem-se o equilíbrio e o seu funcionamento perfeito. É dessa forma que a PNRS estabelece as obrigações desses autores, devendo ser aplicada da mesma forma no plano social concreto.

Essa gestão integrada está prevista no art. 30º da Lei 12.305/2010:

Art. 30.  É instituída a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, a ser implementada de forma individualizada e encadeada, abrangendo os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, consoante as atribuições e procedimentos previstos nesta Seção. 

Parágrafo único.  A responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos tem por objetivo:

I - compatibilizar interesses entre os agentes econômicos e sociais e os processos de gestão empresarial e mercadológica com os de gestão ambiental, desenvolvendo estratégias sustentáveis; 

II - promover o aproveitamento de resíduos sólidos, direcionando-os para a sua cadeia produtiva ou para outras cadeias produtivas; 

III - reduzir a geração de resíduos sólidos, o desperdício de materiais, a poluição e os danos ambientais; 

IV - incentivar a utilização de insumos de menor agressividade ao meio ambiente e de maior sustentabilidade; 

V - estimular o desenvolvimento de mercado, a produção e o consumo de produtos derivados de materiais reciclados e recicláveis; 

VI - propiciar que as atividades produtivas alcancem eficiência e sustentabilidade; 

VII - incentivar as boas práticas de responsabilidade socioambiental. 

O referido instituto da responsabilidade compartilhada traz um aglomerado de obrigações e deveres que são individualizados e correspondentes entre todos os partícipes do ciclo de vida dos produtos, seja pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, cada uma delas devem ser responsabilizadas pela criação, seja ela de forma direta ou indireta, dos resíduos sólidos, desde a sua criação até a destinação do seu fim, devendo-se observar a ordem hierárquica estabelecida pelo art 9º da PNRS: “Na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, deve ser observada a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”. (BONETTO, 2013)

A respeito da gestão integrada entre os principais atores, Arnaldo Jardim fala que:

A experiência no Estado de São Paulo deixou como ensinamento que esses agentes são indispensáveis para a construção da Política Nacional de Resíduos. Elaborar uma legislação com as peculiaridades exigidas pela questão dos resíduos exige um olhar dos diversos setores da sociedade. Não pode ficar apenas no âmbito do Poder Público.
Os trabalhos que nortearão a elaboração do parecer a ser votado pelo Congresso sem nenhum tipo de dúvidas terá as digitais de todos esses setores mencionados. Queremos construir uma lei exequível que ganhe prática e retrate a nossa realidade.

É interessante ressaltar que, a responsabilidade do gerador e de todos os que estabelecem uma “relação” (apesar de os resíduos sólidos serem inanimados é importante o uso da palavra “relação” para que fique claro a parcela de responsabilidade que cada um dos principais atores tem frente ao meio ambiente e, consequentemente, a própria coletividade) só terá seu término no momento em que o resíduo sólido tiver a sua destinação final, a qual deve ser ambientalmente correta, caso contrário de nada valeria toda a mobilidade dos atores em cumprir as obrigações previstas na PNRS se não existisse uma destinação final adequada.

Deve-se observar que, segundo a ordem hierárquica estabelecida pelo art. 9º da PNRS, antes de os resíduos sólidos serem “levados” a destinação final ambientalmente correta, ou seja, aos aterros sanitários, é necessário que se cumpra rigorosamente algumas etapas. Primeiramente deve-se buscar ao máximo não gerar, se isso for inevitável, deve-se primar agora pela redução, se nessa etapa ainda sobrar algo, busca-se realizar a reciclagem e, por último, se não for possível reciclar, parte-se para o tratamento, o qual pode ser feito pelo método da incineração, com ou sem aproveitamento energético. Ainda dentro do tratamento, deve-se atentar ao seguinte requisito, caso seja alegado a não possibilidade de se fazer o tratamento, fica obrigado a comprovar que não foi possível fazê-lo por questões técnicas, econômicas e ambientais. Em ultima hipótese, de forma subsidiária como visto, deve-se levar s resíduos sólidos para o aterro sanitário, após verifica-se todas essas etapas.

A coletividade tem um papel importantíssimo, podendo congitar-se que seja, talvez, até o mais difícil, visto que, é difícil mudar os hábitos das pessoas, tendo em vista que  no Brasil não há uma cultura que se preocupa com os efeitos do seu consumo, de que forma as coisas adquiridas irão refletir no meio ambiente. O papel desse ator, de avaliar a sua forma de consumo, do tratamento que se dá após o consumo, de dividir os resíduos sólidos de acordo com o seu tipo, dentro da própria residência, é importantíssimo em consonância com os dos demais atores.

O Poder Público, devendo estar em harmonia com os demais atores, deve informar a população, pois só através da informação é possível que haja a compreensão e sentido nas ações almejadas (não gerar, reduzir, e todas as demais ações contidas no art.9ºda PNRS). A informação irá orientá-los e esclarecer, mudando o comportamento dentro de casa e possibilitando que seja implantada a coleta seletiva, devendo o Poder Público ser dotado de transparência, para que o cidadão saiba o quanto custa, porque custa e ter resultados positivos.

O setor empresarial deve corroborar, principalmente, com a coletividade, pois este primeiro tem uma relação muito próxima com este segundo, visto que, constantemente as pessoas estão adquirindo produtos fabricados por este setor. Sendo assim, o Poder Público deve criar incentivo fiscal e creditício, tais como os trazidos pela Lei 12.375/2010 que prevê um desconto de até 50% no IPI para as empresas que comprarem resíduos de catadores organizados em cooperativas, esse tipo de medida facilita o cumprimento adequado das previsões da PNRS.

Art. 33.  São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de: 

I - agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas; 

II - pilhas e baterias; 

III - pneus; 

IV - óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; 

V - lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista; 

VI - produtos eletroeletrônicos e seus componentes. 

  • 1o Na forma do disposto em regulamento ou em acordos setoriais e termos de compromisso firmados entre o poder público e o setor empresarial, os sistemas previstos no caput serão estendidos a produtos comercializados em embalagens plásticas, metálicas ou de vidro, e aos demais produtos e embalagens, considerando, prioritariamente, o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados. 
  • 2o A definição dos produtos e embalagens a que se refere o § 1o considerará a viabilidade técnica e econômica da logística reversa, bem como o grau e a extensão do impacto à saúde pública e ao meio ambiente dos resíduos gerados. 
  • 3o Sem prejuízo de exigências específicas fixadas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS, ou em acordos setoriais e termos de compromisso firmados entre o poder público e o setor empresarial, cabe aos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes dos produtos a que se referem os incisos II, III, V e VI ou dos produtos e embalagens a que se referem os incisos I e IV do caput e o § 1o tomar todas as medidas necessárias para assegurar a implementação e operacionalização do sistema de logística reversa sob seu encargo, consoante o estabelecido neste artigo, podendo, entre outras medidas: 

I - implantar procedimentos de compra de produtos ou embalagens usados; 

II - disponibilizar postos de entrega de resíduos reutilizáveis e recicláveis; 

III - atuar em parceria com cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, nos casos de que trata o § 1o

  • 4o Os consumidores deverão efetuar a devolução após o uso, aos comerciantes ou distribuidores, dos produtos e das embalagens a que se referem os incisos I a VI do caput, e de outros produtos ou embalagens objeto de logística reversa, na forma do § 1o
  • 5o Os comerciantes e distribuidores deverão efetuar a devolução aos fabricantes ou aos importadores dos produtos e embalagens reunidos ou devolvidos na forma dos §§ 3o e 4o
  • 6o Os fabricantes e os importadores darão destinação ambientalmente adequada aos produtos e às embalagens reunidos ou devolvidos, sendo o rejeito encaminhado para a disposição final ambientalmente adequada, na forma estabelecida pelo órgão competente do Sisnama e, se houver, pelo plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos. 
  • 7o Se o titular do serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, por acordo setorial ou termo de compromisso firmado com o setor empresarial, encarregar-se de atividades de responsabilidade dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes nos sistemas de logística reversa dos produtos e embalagens a que se refere este artigo, as ações do poder público serão devidamente remuneradas, na forma previamente acordada entre as partes. 
  • 8o Com exceção dos consumidores, todos os participantes dos sistemas de logística reversa manterão atualizadas e disponíveis ao órgão municipal competente e a outras autoridades informações completas sobre a realização das ações sob sua responsabilidade. 

Outro aspecto importante da PNRS foi a inserção da logística reversa, que segundo o Ministério do Meio Ambiente:


A logística reversa é "instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação.

A Lei nº 12.305/2010 dedicou especial atenção à Logística Reversa e definiu três diferentes instrumentos que poderão ser usados para a sua implantação: regulamento, acordo setorial e termo de compromisso.

Acordo setorial é um "ato de natureza contratual firmado entre o poder público e fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto."

Por permitir grande participação social, o Acordo Setorial tem sido privilegiado pelo Comitê Orientador como instrumento preferencial para a implantação de logística reversa.

 

O acordo setorial é um instrumento indispensável e de extrema importância para se instaurar a logística reversa e a responsabilidade compartilhada pelo ciclo da vida dos produtos, visto que, ele possibilita a instauração da divisão de obrigações entre os atores(coletividade, poder público e setor empresarial)., dando margem para a responsabilidade correlata, a qual está no espírito da lei 12.305/2010.

A logística de reserva, segundo Milaré:

A logística de reserva constitui uma das ferramentas relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. O aludido instrumento tem como fundamento o princípio do poluidor pagador, na medida em que exige a internalização dos custos provenientes da destinação e disposição final dos resíduos sólidos gerados por determinados produtos e embalagens. (2011, p.878)

O princípio do poluidor pagador, segundo Fiorillo:

[...] Num primeiro momento, impõe-se ao poluidor o dever de arcar com as despesas e prevenção dos danos ao meio ambiente que a sua atividade possa ocasionar. Cabe a ele o ônus de utilizar instrumentos necessários a prevenção dos danos. Numa segunda órbita de alcance, e esclarece este princípio que, ocorrendo danos ao meio ambiente m razão da atividade desenvolvida, o poluidor será responsável pela sua reparação. (2007, p.32-33)

Portanto, a logística de reserva e a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos (ambas inseridas pela PNRS) surgem para corroborar na solução de um dos maiores desafios sofridos pela sociedade, que consiste na demasiada geração de resíduos e, consequentemente, a diminuição de área que possivelmente poderiam ser construídos aterros sanitários, os quais evitam o surgimento de problemas de saúde e ambiental intrageracionais e intergeracionais.

 

  1. PNRS NO PLANO SOCIAL CONCRETO: FALHAS, CRÍTICAS E POSSÍVEIS SOLUÇÕES A CERCA DOS ATORES

 

A Lei 12.305/2010 tardou a ser editada, tramitou por mais de duas décadas no Congresso Nacional, demora esta que trouxe inúmeras consequências negativas para a sociedade e o meio ambiente. Como, por exemplo, o caso ocorrido em 08 de abril de 2010, no Morro do Bumba, localizado na cidade de Niterói/RJ, em que houve um deslizamento de terra em que as casas construídas em cima desse morro desabaram, um dos fortes motivos que contribuíram para esse fato foi o de que o local há décadas atrás era um aterro sanitário. A PNRS veda essa possibilidade no seu inciso IV do art.48:

Art. 48: São proibidas, nas áreas de disposição final de resíduos ou rejeitos, as seguintes atividades: 

IV - fixação de habitações temporárias ou permanentes.

 

É um ponto positivo e que previne esse tipo de situação, porém é necessário que o Poder Público faça o remanejamento dessas pessoas, para que elas possam habitar locais adequados, visto que, não adianta existir somente a lei proibindo sem se pensar “no amanhã” dessas pessoas, ficarão desabrigadas? É necessário a atuação do Poder Público em conjunto com a legislação, para que possa ser possível de se realizar no plano concreto o que a lei prevê.

Segundo Gonçalves:

Um problema sério a ser destacado é que, embora o governo federal invista na gestão de resíduos, repassando recursos para os Municípios fazerem obras, nossos estudos mostram que uma obra de resíduos não se sustenta mais de dois anos e torna-se um lixão. Portanto o problema não é só dispor de recursos financeiros para construir, mas é fundamentalmente de gestão. Um dos problemas da gestão é a questão econômica financeira, relativa à sustentabilidade do serviço. Temos de enfrentar esse desafio, caso contrário, a Prefeitura enganará que presta o serviço e o cidadão enganará que paga ou não, e também não receberá. No entanto, isso precisa ser feito com transparência, discutindo-se o quanto deve ser pago. (2012, p.42)

Constata-se que para obter êxito na implementação das previsões da PNRS não basta apenas recursos financeiros, mas uma boa gestão. É indispensável que haja a transparência por parte do Poder Público, para que os cidadãos tenham um serviço bem prestado e saibam quanto e como estão sendo gastos o dinheiro arrecadado por eles, através dos impostos. Uma interessante opção, que é apontada por Gonçalves, é a realização de consórcios, opção muito interessante para os pequenos municípios, visto que, a sua gestão municipal não se sustenta, na maioria das vezes.

Por meio de consórcios, os custos vão caindo de maneira exponencial. [...] Com escala, o custo reduz muito, uma vez que é rateado entre os municípios do consórcio e assim a população paga menos, porque o custo da implementação e da instalação é bem menor. (GONÇALVES, 2012, p.43)

Ainda dentro da solução do consórcio, tem-se um problema, a sua dificuldade para implementá-la, visto que, condiz a uma questão cultural, a qual é preponderantemente individualista, sendo necessário que haja uma evolução democrática para que, com o tempo, vá cessando esse impecílio, para que os consórcios possam se consolidar, possibilitando, assim, com que se enfrente a gestão de resíduos sólidos da melhor maneira possível. (GONÇALVES, 2012, p.43)

Outro problema presente na PNRS possui um cunho mais subjetivo, mas que pode alcançar resultados positivos a partir de ações objetivas. Esse problema é o da consciência do indivíduo como cidadão e como condição de consumidor, a sua mudança é mais difícil e requer maior esforço, pois é algo que acompanha a sociedade por séculos. Sendo assim, é necessário que se criem políticas pública para informar e orientar a população, de todas as faixas etária, para alertar sobre os problemas que as suas atitudes podem desencadeia e já desencadeiam. É necessário inserir nas pessoas a consciência, a reflexão sobre o que se consome, como se consome e o que se deve fazer após o consumo, para que a mudança comece dentro das próprias residências e que, assim, possa se difundir nos outros setores e serem repassadas as novas gerações.

Por fim, observa-se que a PNRS possui uma interdependência normativa (possibilitada pelo seu art.2º) com a lei de Politica Nacional de Saneamento Básico, Agrotóxicos, Poluição em porto e outras áreas portuárias, inclusive com as normas estabelecidas pelo Sistema Nacional do Meio Ambiente, Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, Sistema Unificado de Atenção a Sanidade Agropecuária e o Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial. Milaré, a respeito disso, diz que:

Obviamente, a integração de todos os princípios e regras, no corpo de único texto normativo, se configuraria como situação ideal. Entretanto, são de conhecimento de todos os dificultadores da regulamentação, especialmente em setores nos quais está presente incontável número de interesses. (2011, p.860)

A PNRS depende dessas outras leis para ter eficácia, como Milaré disse, o ideal era que tudo estivesse num único texto, no entanto, não é assim, por motivos que o próprio autor expõe, em virtude de ser um setor em que envolve muitos interesses de diferentes âmbitos (econômico, social, ambiental etc).

 

CONCLUSÃO

 

A Política Nacional dos Resíduos Sólidos com sua abrangência excepcional (sanitária, social, econômica, técnica, cultural e política) fazem dela uma política nacional extremamente dinâmica. Contudo, é de fundamental importância que ela seja propagada, conhecida e aplicada à luz do princípio da sustentabilidade.

A inadequada gestão dos resíduos sólidos era uma problemática que assolava o país, e a espera por sua implementação gerou uma série de problemas a serem sanados e contornados pela mesma. A PNRS abre caminho para ações concretas e eficazes por meio dos três âmbitos de atuação (setor empresarial, poder público e coletividade), nas quais o planejamento e a devida atuação desses três atores são as peças-chave para a eficácia da devida gestão integradas dos resíduos sólidos.

Contudo, deve-se frisar que se trata de uma tomada de consciência moderna à respeito da problemática que é a gestão inadequada dos resíduos sólidos no mundo todo. Por isso, de certo modo é gratificante saber que o Brasil pretende não ser um mero caudatário desse processo através do que garante a nova legislação. Todos devem ser participantes ativos nas transformações que se expandem em todo o Planeta, buscando sempre a preocupação com as gerações futuras de acordo com a visão do Direito Ambiental.

A PNRS é importantíssima e traz conceitos a serem aplicados na realidade concreta que são de extrema importância para diversos âmbitos, entre eles o ambiental, econômico e social, visto que, ela não lança olhares apenas para o meio ambiente, ela traz consigo por exemplo a valorização do catador de lixo, dá valor monetário aos resíduos sólidos. Porém, apesar de tantos benefícios em seu bojo, existem, também, as suas falhas, tais como a necessidade de outras leis para que ela se torne completa, a transparência do poder público, e a dificuldade de mudar o pensamento dos indivíduos para que reflitam no seu comportamento como cidadão e na sua condição de consumidor.   

REFERENCIAS

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HARLEY, Karen; JARDIM, João; WALKER Lucy. Lixo Extraordinário. [Filme-vídeo]. Produção de Angus Aynsley, coprodução de Peter Martin. Duque de Caxias (RJ), Jardim Gramacho, 2010. 1 Dvd, 99 min, som Moby.

 JARDIM, Arnaldo. Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) em foco: Arnaldo Jardim, deputado federal por SP, fala sobre a proposta de PNRS e os caminhos da sustentabilidade. Disponível em: http://www.fatorambiental.com.br/imprensa/entrevista_jardim.php. Acesso em:01 de nov. 2013.

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MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência e glossário. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

MONTEIRO, Isabella Pearce. Direito do Desenvolvimento Sustentável: produção Histórica internacional, sistematização e constitucionalização do discurso do desenvolvimento sustentável. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 2011

NETO, Mario Corbucci. Política Nacional dos Resíduos Sólidos e Responsabilidade Compartilhada. Disponível em: http://rmai.com.br/v4/Read/1218/politica-nacional-de-residuos-solidos-e-a-responsabilidade-compartilhada.aspx            Acesso em: 8 de nov. 13.

 

Resíduos sólidos urbanos e seus impactos sócio/organizadoras, Maria Cecília Loschiavo dos Santos, Sylmara Lopes Francelino Gonçalves-Dias. –São Paulo: IEE-USP, 2012, 82 p.: il.

Resolução CONAMA Nº 404/2008. Licenciamento Ambiental de Aterros Sanitários. Disponível em: http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=592 Acesso em: 01 de nov. de 2013

Resolução CONAMA Nº 313/2002. Gestão de Resíduos e Produtos Perigosos. Disponível em: http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=335 Acesso em: 01 de nov. de 2013

Resolução CONAMA Nº 401/2008. Proposta de Resolução que dispõe sobre pilhas e baterias. Disponível em: http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=589 Acesso em: 01 de nov. 2013.

[1] Paper apresentado à disciplina de Direito Ambiental, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco-UNDB;

[2] Aluna do 4º período, do curdo de Direito, da UNDB;

[3] Aluna do 4º período, do curdo de Direito, da UNDB;

[4] Professora Mestre e Orientadora.