DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS DA UNIÃO ESTÁVEL E TERCEIROS DE BOA-FÉ.

OS CASAIS QUE VIVEM A UNIÃO ESTÁVEL

Crispino, Nicolau Eládio Bassalo. Os negócios jurídicos na união estável e terceiros de boa-fé. São Paulo, 2005.323 p.

Desde a Constituição brasileira de 1988, a união estável é considerada entidade familiar merecedora de tratamento jurídico semelhante ao dado à família formada pelo matrimônio. A partir de então, surgiram às leis de 1994 e de 1996, que trataram desse relacionamento de fato, trazendo regras patrimoniais aplicadas aos casais que vivem esta união estável. Em janeiro de 2003 entrou em vigor o novo Código Civil reconhecendo a união estável como sendo aquela entidade familiar "entre homem e a mulher, configurado-se na convivência pública, continua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição da família" (artigo 1.723). No novo Código determina ainda que, na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens "(artigo 1.725). Os companheiros que se unem com o intuito de formar uma união estável de fato, passam a viver um regime patrimonial por meio do qual todos os bens móveis e imóveis adquiridos a título oneroso durante a existência dessa união passam a pertencer a ambos, formando, assim, o patrimônio comum do casal. É permitido ao casal firmar contrato escrito estabelecendo regras patrimoniais destinadas a ter efeito dentro da união estável, inclusive dispondo de diretrizes econômicas diversas da regras estabelecidas pelo texto do Código Civil.

Este trabalho estuda, essencialmente, os negócios nos quais um dos companheiros que vivem em união estável aliena sozinho um bem imóvel para terceiros, sem que o outro participe do acordo, sendo prejudicado. Como conseqüência, este último, em alguns casos, passa a ter o direito de impugnar o negócio feito sem a sua participação. Além dessa alienação, procura-se analisar todo e qualquer negócio que apenas um dos companheiros pratica indevidamente com terceiros, quando a presença do outro consorte deveria ser exigida. Em todos os casos, preserva-se o terceiros de boa-fé, para a segurança dos negócios jurídicos; contudo, há uma nova leitura da configuração dessa posição do negociante com o companheiro. Descata-se o Projeto de Lei n° 2.686/96 propõe um Estatuto da União Estável, possuindo dispositivos reguladores da relação dos companheiros com terceiros; entretanto, criticam-se alguns pontos desse projeto e apresentam-se sugestões de mudança em seu texto.

O instituto jurídico da união estável nem sempre é bem compreendido por muitos casais que vivem sob o mesmo teto, como se "casados" fossem; dúvidas e apreensões por vezes interferem nesse tipo de relacionamento; isso se deve, em grande parte, ao desconhecimento dos direitos e dos deveres aos quais estão pactuados; o resultado é a insegurança quanto ao futuro do casal, com reflexo nocivo à sua prole.

Muitos dos casais que vivem em união estável são afetados por preocupações relacionadas a bens patrimoniais. Esse tipo de preocupação costuma aparecer quando há, para um dos companheiros, uma expectativa de lucro em negócios futuros; isso vai representar um aumento de seu patrimônio na constância da união estável, que por isso, deveria ser encarado como uma melhora de vida para ambos e seus filhos, caso já exista uma família.

Às vezes uma das pessoas que integram o casal vê sua fortuna aumentada e logo procura esconder esse fato de quem nada recebeu, a sua companheira ou companheiro. É justamente nesse momento que, com a trama de um plano para viabilizar o desvio desses patrimônios que começa a derrocada para quem quer subtrair o que deveria ser do casal; a medida tomada nesse sentido poderá decretar a perda completa dos novos bens.

O parceiro quem tem aumentado o seu patrimônio com bens móveis e imóveis procura advogado especializado em Direito de família para saber quais os meios que deve usar para fazer com que os novos bens não sejam transmitidos à companheira ou companheiro – depende de quem os recebe. Normalmente essa iniciativa deixa uma marca de constrangimento e sentimento de culpa em quem a toma, mesmo que disso sua companheira ou companheiro não tomem conhecimento do fato ardiloso.

Mas o êxito do plano que visa esconder os novos bens da união estável não é nada fácil; sem falar na questão ética. Via de regra essas pessoas escolhem parentes ( pais ou irmãos) para fazer em seu nomes a falsa compra, medidas como essas que desaconselho porque poderão resultar em prejuízo de maior significado para quem as toma e para o outro companheiro, da união estável,conforme o caso; para que o desastre patrimonial aconteça basta que ocorra a morte da pessoa que supostamente adquire os bens do companheiro da união estável; nesse caso, os bens passarão a ser objeto de inventário e de partilha entre os herdeiros do falecido, que na realidade nada comprará. Feita a partilha judicial após o inventário, certamente esses falsos herdeiros não aceitarão devolver os bens que a eles tocaram, por direito, embora de fato pertençam a um dos que forma o casal na união estável. E ninguém vai desatar este fato.

Fica aqui mais uma observação: aqueles que optarem pela união estável, preterindo o casamento, deverá fazê-lo com pleno conhecimento desse regime, que, sem dúvida, se constitui em considerável avanço social. Não é demais esclarecer que a união estável veio consolidar milhares de "casamento de fato" que até então existiam em todo o território brasileiro só que de forma marginalizada, com sérios prejuízos – sendo material ou até mesmo social- para os companheiros e para os seus filhos.

União estável veio dar maior dignidade a todos os casais que passaram a viver sob esse regime, por livre escolha, sendo assim uma legislação que a criou é avançada é moderna, razão pela qual eliminou definitivamente o estigma da família a beira da sociedade; podendo ter dado aos casais a oportunidade de viver uma união plena de dignidade, com proteção legal que antes só era alcançado pelas pessoas que casavam pela lei civil.