OS MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS COMO UM DOS INSTRUMENTOS NO COMBATE À POBREZA NO BRASIL.

RESUMO

O presente trabalho aborda os meios alternativos de solução de conflitos, como a conciliação, mediação e arbitragem, focando em suas funções e diferenças no processo de facilitação do acesso à justiça para os cidadãos mais carentes e classes sociais subalternas. Como estratégia de trabalho, num primeiro momento buscou-se elencar e explicar as principais barreiras para o acesso à solução jurisdicional que acometem os mais pobres. Num segundo momento, analisa-se as formas e exemplos de como os meios alternativos de solução de conflitos contribuíram para o alcance de resolução conflitiva e garantia de direitos em regiões marginalizadas onde o poder econômico é inferior. Por fim, analisa-se num panorama holístico a gravidade da desigualdade social atualmente e o papel do sistema jurídico nesse processo.

Palavras-chave: Direito Processual. Conciliação. Mediação. Arbitragem. Desigualdade social. Pobreza. Justiça. Direitos Fundamentais.

Sumário: 1. Introdução. 2. A influência dos meios alternativos de solução de conflitos nas desigualdades sociais. 2.1. Limitadores para o acesso à justiça pelas classes hipossuficientes. 2.2. O acesso à justiça no combate à desigualdade social. 3. Considerações finais.

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Alunos do 3º Período Vespertino, Turma 2, do curso de Direito, da UNDB: Andrey Fontes Farias e Carla da Costa Pires.

Professor Mestre, orientador: Roberto Almeida.

1 INTRODUÇÃO

A pobreza é uma das mazelas que, ao longo da história, perpetua-se com o menor grau de atenção e intenção da classe detentora do poder. Medidas paliativas e, por consequência insuficientes, são tomadas para mitigar a problemática. O acesso à justiça é um fator determinante à manutenção do poder. No entanto, as classes hipossuficientes da sociedade são justamente as que têm menor influência econômica e, concomitantemente, menor acesso à justiça.

Este fato acaba por perpetuar a lógica capitalista, onde as classes abastadas sobrepõem-se às subalternas, uma vez que estas não entendem seus direitos e, muitas vezes, seus deveres. A capacidade de reclamar um direito está, primeiramente, em reconhecer a existência deste direito e se ele é juridicamente possível. Devido a tal falta de conhecimento, acabam submetendo-se a essa malévola lógica. No entanto, o Judiciário brasileiro chegou ao seu ponto de estrangulamento, pois tanto as varas quanto os tribunais não mais conseguem dar conta da quantidade de processos que chegam diariamente. Além do mais, a burocracia, a lentidão, a linguagem excessivamente técnica, a geografia da distribuição das instituições e os altos custos para a dedução em juízo, acabam por limitar com maior ênfase o acesso das classes hipossuficientes à lógica jurisdicional.

No entanto, o acesso a justiça é um direito fundamental previsto na Constituição em seu artigo 5°, inciso XXXV, quando esta assevera que: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”. Demonstra-se então que o constituinte objetivava a eficácia das decisões jurisdicionais para beneficiar os a elas procuram, quer fossem pobres ou ricos, indiscriminadamente. Com o entendimento de que o acesso a justiça é a base para a efetivação de todos os outros direitos, depreende-se que a efetivação desse direito contribui não apenas para o combate à pobreza, mas para uma sociedade mais justa, uma vez que os interesses e conflitos são alcançados e/ou solucionados em juízo. Porém, a inserção das classes hipossuficientes à lógica jurisdicional é uma profunda problemática, quase utópica, em decorrência das diversas barreiras supracitadas. Assim, o presente trabalho busca apresentar os meios alternativos de resolução de conflitos, mostrando o papel de suas características e funções facilitando o acesso à justiça por essas classes e consequentemente, diminuindo a desigualdade social. Na busca destes aspectos, a pesquisa deste trabalho assume um caráter exploratório, essencialmente sob a forma de pesquisa teórica ou bibliográfica, vez que se constitui de livros de referência, de leitura corrente, publicações periódicas, jurisprudência, artigos etc (GIL, 2002).

2 A INFLUÊNCIA DOS MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS NAS DESIGUALDADES SOCIAIS

2.1 Limitadores para o acesso à justiça pelas classes hipossuficientes

Atualmente, há incontáveis obstáculos de acesso no espectro da justiça atual do Brasil. Por problemas de acesso, percebe-se que podem estender-se desde o alcance, o ideal de justiça nas decisões, até a efetivação destas na realidade. Neste trabalho, pretende-se focar no alcance, mais especificamente na dificuldade inerente das classes subalternas da sociedade valorizando o papel dos meios alternativos de solução de conflitos. Com isso, percebe-se a um nível subjetivo-intelectual, a dificuldade linguística marcante no ordenamento jurídico brasileiro. O ex-presidente da OAB/SP, João Roberto Egydio Piza Fontes, congrui esse questionamento ao dizer que “a linguagem jurídica tem de ser acessível, sob pena de que a Justiça não cumpra seu papel social, de contrapeso aos demais poderes da República e de árbitro nos litígios privados.”5 Tanto na doutrina quanto nos documentos jurídicos, na maioria das vezes a linguagem é excessivamente rebuscada com elementos não apenas da língua materna do Brasil, mas também de línguas estrangeiras que aumentam o intervalo entre o universo jurídico e o cidadão comum.

Outro aspecto dificultoso é a abissal incapacidade numérica de juízes em relação à quantidade de habitantes no Brasil. Renato Jakitas (2012), em artigo para a Veja, publica:

[...] a proporção entre juízes e desembargadores por habitantes no Brasil é uma das menores do mundo, sobretudo na comparação com países europeus. Enquanto na Alemanha, que tem uma das justiças mais ágeis do mundo, existem 24 magistrados para 100.000 pessoas, por aqui são 6,2 juízes para o mesmo grupo populacional. (p. [?]).

As consequências disso são o inchaço do judiciário tornando o acesso à justiça uma disputa altamente concorrida. Nesta, os mais bem sucedidos são os que ganham a corrida. Somado a isso, nota-se um incrível déficit no âmbito tecnológico das instituições de justiça. Paulo Mendonça (2007), expõe que é notável pelos fóruns do Brasil uma informática ineficiente. Os meios eletrônicos não são usados suficientemente para acelerar os processos e facilitar a comunicação. E acrescenta que a celeridade impulsionada pela informatização não deve acontecer apenas nos principais centros urbanos, mas “no mais remoto rincão."

Com isso, o custo do atendimento jurisdicional eleva-se, encarecendo e dificultando o acesso do necessitado de amparo judicial. Cappelletti e Garth (2002), amplia tal questionamento ao dizer que “qualquer tentativa realística de enfrentar os problemas de acesso deve começar por reconhecer esta situação: os advogados e seus serviços são muito caros.” Em um efeito encadeador, a burocracia do sistema judiciário também dificulta o acesso, seja pelo encarecimento do processo como também o prolongamento do tempo de solução dos problemas. O próprio déficit de juízes já mencionado contribui para este efeito.

Entretanto, além dos problemas institucionais, é importante salientar as dificuldades geográficas para o acesso à justiça. Cidades interioranas geralmente comportam as pessoas com menos poder aquisitivo. Estas pessoas, as que justamente mais precisam de assistência jurídica, são impedidas geograficamente (muitas vezes até por questões econômicas). Porém, essa distinção espacial não se configura apenas a municípios, Estados ou até países apenas. Dentro da própria capital existe essa separação. As instituições jurídicas acabam se concentrando em uma mesma região dificultando o acesso dos moradores de áreas mais longínquas da cidade. Ana Flávia Melo Torres (20??), resume as várias acepções restritivas do acesso à justiça:

Desse modo, pretende-se enfrentar e concatenar diferentes possibilidades de melhoria e efetivação de mais acesso das classes subalternas à justiça. O Judiciário brasileiro chegou ao seu desgaste máximo, pois “tanto as varas quanto os tribunais não mais conseguem dar conta da quantidade de processos que chegam diariamente. Culpa dos juízes? Culpa da legislação arcaica? Quem sabe.” (MALUF, 2006).

A crise econômica e de legitimidade enfrentada pelo Poder Judiciário, consubstanciada em constante denúncias de corrupção e nepotismo, na carência de recursos materiais e humanos, a centralização geográfica de suas instalações, dificultando o acesso de quem mora nas periferias, a inexistência de instrumentos de controle externo por parte da sociedade, tem contribuído para o aumento das restrições de grande parcela da sociedade à acessibilidade. (p.[?]).

O fato é que o maior prejudicado é o cidadão pertencente às classes menos favorecidas, quer seja pela sua falta de conhecimento no tocante a jurisprudência, quer seja pela existências de leis cada vez mais complexas e procedimentos misteriosos. O que acaba fazendo com que estes se acomodem e esqueçam o problema ao invés de gastar anos e anos em processos longos e desgastantes.

Magdalena Sepúlveda demonstra, no relatório da Assembleia Geral das Nações Unidas, que no intuito de amenizar tal situação e proporcionar medidas efetivas para remover qualquer obstáculo de cunho regulamentativo, social ou econômico que venham impedir as pessoas que vivem na pobreza de ter acesso e garantia a justos e equitativos resultados em qualquer processo judicial, criou-se por exemplo os meios alternativos de solução de conflitos, que por proporcionarem aspectos menos burocráticos e mais simplistas, acabam por tornar a justiça acessível aos mais pobres. Além da assistência jurídica gratuita como meio de inserir a referida classe na lógica jurisdicional.

Os meios alternativos na resolução de conflitos podem dividir-se em três modalidades: A mediação que vem a ser um método de resolução de conflitos, cujo objeto é buscar um acordo duradouro entre as partes, através da dinâmica corporativa. Esse é um método muito usado na área familiar, e o mediador deve ser uma pessoa estranha às partes, escolhido de comum acordo, cuja principal característica deve ser a imparcialidade. Hoje a mediação é exercida por advogados, psicólogos, assistentes sociais, os mais requisitados, justamente pela intimidade que têm com os problemas familiares. É de extrema importância a mediação para que os mais pobres tenham acesso à justiça pois, uma vez que profissionais de outra área podem fazer a mediação entre as partes, a quase intransponível barreira da linguagem técnica do direito pode ser derrubada o que resultaria num estímulo para que os mais carentes tenham acesso à justiça e principalmente no conhecimento dos seus direitos.

Tem-se também a conciliação, que é outro método de resolução não adversarial de conflitos, distinta da mediação, porquanto, ela busca solução imediata para um determinado litígio. Aqui cabe ressaltar um aspecto importante com relação aos conciliadores, que na verdade nem sempre estes vão necessitar ser operadores do direito, como acontece na conciliação de primeiro grau, formada por vários profissionais de diferentes ramos de atividades. Diferentemente da mediação, na conciliação temos uma total liberdade por parte do conciliador na sessão conciliatória. Por ter como principal característica a rapidez, esta pode facilitar o acesso dos mais pobres à justiça a partir do momento que vai diminuir as barreiras burocráticas e diminuir o longo e desgastante tempo que se enfrentaria em um processo convencional, o que acaba por ser um estimulo àqueles que não têm acesso à justiça.

Por fim, tem-se a arbitragem, que provavelmente é o mais antigo dos métodos de resolução de conflitos e que diferentemente da mediação e conciliação, é de origem contratual. O árbitro funciona como uma espécie de juiz, inquirindo as partes, requisitando documentos, ouvindo testemunhas etc. Tudo para que possa afinal prolatar uma sentença arbitral, que tem força de coisa julgada, e portanto, constitui título extrajudicial. Por ser um processo mais simples, a arbitragem pode facilitar o acesso à justiça pelos mais pobres pois, ela vai reduzir as taxas onerosas dos processos convencionais, além de acabar com a barreira em relação ao estereótipo dos juízes a advogados, umas vez que os mais carentes veem nos mesmos a imagem de pessoas imponentes e inatingíveis.

2.2 O acesso à justiça no combate à desigualdade social

As pessoas que vivem na pobreza enfrentam sérios obstáculos para acessar os sistemas de Justiça que perpetuam e agravam sua desvantagem. Estas são muitas vezes impedidas de buscar a justiça, devido ao custo e tempo de viagem para um tribunal distante, as taxas cobradas para pedidos de inserção para assistência jurídica de qualidade, a falta de informação sobre seus direitos, o analfabetismo ou as barreiras linguísticas. Cada vez mais o direito se vale de uma linguagem complexa e procedimentos misteriosos que, juntamente com o estigma enraizado ligado à pobreza, também tornam mais difícil para os pobres se envolver com o sistema de justiça. Ao pobre pode até mesmo ser negada legitimidade para registrar uma reivindicação, porque eles não têm uma certidão de nascimento oficial (RABINOVICH, 2012). O próprio Ministério da Justiça (20??) demonstra a importância do acesso e compara esse fator à democracia:

O acesso à Justiça é considerado um direito humano e um caminho para a redução da pobreza, por meio da promoção da equidade econômica e social. Onde não há amplo acesso a uma Justiça efetiva e transparente, a democracia está em risco e o desenvolvimento sustentável não é possível. Assim, a ampliação do acesso à Justiça no Brasil é uma contribuição certeira no sentido da ampliação do espaço público, do exercício da cidadania e do fortalecimento da democracia. (p.[?])

É através do acesso à justiça, que as classes hipossuficientes tornam-se conhecedoras de seus direitos, o que a faz sair da zona de invisibilidade contribuindo para o combate à desigualdade social. É como alude (SEPÚLVEDA, 2012) “Sem acesso à Justiça, as pessoas que vivem na pobreza são incapazes de reivindicar e perceber toda uma gama de direitos humanos, ou contestar crimes, abusos ou violações cometidas contra eles” . No combate a essa incapacidade podemos elencar os meios alternativos de resolução de conflitos como uma forma eficaz, através da conciliação, mediação e arbitragem.

É importante salientar que cada meio alternativo tem suas características em comum e também próprias sendo que cada um oferece contribuições específicas que facilitam o acesso à justiça em favor dos mais necessitados. Na conciliação percebemos um esforço das partes para a solução dos problemas. Elas podem ou não escolher um conciliador, mas este apenas irá atuar de forma imparcial e condutora, podendo opinar soluções quando as partes encontrarem um impasse no seu entendimento. Assim, com essa liberdade, casos que envolvam uma ou duas partes de pequeno poder econômico podem chegar a um consenso sem necessitar de gerar a lide, segundo o conceito de Liebman que é o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida deduzida em juízo (NUNES, 2009), podendo então não despender recursos para uma ação tradicional. As partes que decidem se acatam as soluções do conciliador ou não de acordo com sua conveniência. Para Nazareth (2006, p.130), a conciliação é mais eficaz em conflitos novos e puntuais. Um grande exemplo da atuação eficaz da conciliação, por exemplo, em regiões onde moram pessoas de nível econômico mais baixo é a atuação de Cássio Bitar Vasconcelos (2012). Ele como defensor público descreve os efeitos desse tipo de meio alternativo de solução de conflitos. Diz que em Ourilândia do Norte, localizada no sul do Pará, depois de algum tempo trabalhando lá, percebeu a importância social dos meios extrajudiciais de solução de conflitos. Relata que ao se utilizar da conciliação, passou a resolver quase cem por cento das questões que chegavam ao seu gabinete. A rapidez e eficiência faziam com que questões pequenas mais muito recorrentes entre as pessoas das classes sociais mais baixas como reconhecimento de paternidade, pensão alimentícia, demarcação de vizinhos etc, se resolvessem muito mais rápido. Isso faz com que o acesso à justiça por parte dessas pessoas pudesse ser maior e, de forma justa, pois a conciliação é um método pacífico e as duas partes concordam com a conclusão do processo. Cássio Vasconcelos também demonstra que “em regra são pessoas pobres, sem recursos para viajar, [assim] a ideia é otimizar e ampliar a atuação extrajudicial do defensor, com a superação dos fatores geográficos.” Reitera que essa prática contribui para o aumento da cidadania pois viabiliza a famigerada participação extrajudicial a um maior número de pessoas carentes “assegurando-lhes direitos e garantias previstos na Lei e na Constituição de forma célere e eficaz.”

Com relação à arbitragem, as vantagens são as mais diversas possíveis, porém a mais benéfica é a facilitação do acesso à justiça. Nela existe a informalidade do procedimento, evidenciada não só pela faculdade que as partes possuem de não contratar advogado, economizando, inclusive, com os honorários advocatícios, mas também pela possibilidade de as partes se manifestarem apenas oralmente. Tudo corre em segredo de justiça, sem publicidade. Sem dúvidas uma informalidade no procedimento, estimula as classes hipossuficientes a participar desse processo, pois diminui consideravelmente uma barreira chamada burocracia.

Há rapidez de julgamento, uma vez que este terá de ser realizado em um prazo máximo de seis meses, diminuirá de forma considerável os gastos. Há economia também por parte do Estado, uma vez que não são cobradas custas e taxa judiciária ao Estado para se dar início ao procedimento arbitral, dispensando-se, em muitos casos, a necessidade de nomeação de peritos e assistentes técnicos. As únicas despesas que se pagam são com os honorários arbitrais, e assim mesmo fixados em percentuais módicos que variam de 1% a 12%, a depender do valor da causa. Tonar o processo menos oneroso é um outro benefício proporcionado pela arbitragem que estimula o ingresso das classes hipossuficientes a ter acesso à justiça, pois muitas vezes essas pessoas se privam de ingressar em juízo, receosas de altos gastos. A impossibilidade de se recorrer da decisão proferida pelo árbitro ou Tribunal Arbitral, sendo a decisão mais rápida e econômica, pois não se perde tempo (prazos) e nem despesas com recursos. As medidas cautelares e coercitivas dispensam o ajuizamento de ação própria (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO). Tais impossibilidades são outros benefícios que tornam o processo ainda menos oneroso, pois blinda o litigante de despesas inesperadas. As suas vantagens em relação à jurisdição tradicional são visíveis.

Enquanto a sentença arbitral é de seis meses, o processo judicial em regra não possui a mesma rapidez, tampouco a fixação de prazo para a prolação da decisão, a celeridade do processo faz com que haja menores custos, vantagem essa que pode ser ampliada pelo fato de que as partes não são obrigadas a ser representadas por advogado no procedimento arbitral (art. 21, § 3o, da Lei no 9.307/1996). (CARDOSO, 20??). O processo judicial pode ter novas despesas em seu andamento (diligências de oficial de Justiça, perícia etc), enquanto o gasto com arbitragem normalmente é fixo (logo, previsível), o que pode importar em despesas totais menores; a simplificação e a flexibilidade do procedimento, que pode ser definido pelas próprias partes, sem a possibilidade de interposição de inúmeros recursos e reapreciações, considerando que um mesmo processo judicial pode ser julgado por um juiz e três tribunais, e o procedimento de cumprimento da decisão final é ainda passível de novos recursos (CARDOSO, 20??).

Ao uso de uma linguagem simples: ao contrário do uso excessivo de expressões técnicas e/ou estrangeiras que ainda permeia o Judiciário, a arbitragem deve ser caracterizada pela informalidade, fazendo com que haja maior compreensão da parte acerca do que foi decidido; e a possibilidade de selecionar pessoa com conhecimento técnico no assunto discutido: por exemplo, uma discussão sobre índices de reajuste contratual pode ser decidida por um economista ou um contador, e não por um bacharel em Direito. (CARDOSO, 20??).

Envolvidos a uma solução rápida de seus problemas, consequentemente menos onerosa, com uma linguagem mais simples, promove o exercício eficaz da cidadania que leva as classes hipossuficientes a atender à sua necessidade na situação posta, e consequentemente, a facilitação no acesso à justiça. Para Cachapuz e Condado (2008),

Sem sombra de dúvida, a arbitragem tem um grande papel a desempenhar na sociedade, especialmente no tocante à viabilização do efetivo acesso à justiça. Indiscutível sua utilização na distribuição da justiça, razão pela qual, cada vez mais, deva ser valorizada e escolhida pelo cidadão, como um instrumento extrajudicial de solução de controvérsias e como alternativa para o enfrentamento dos litígios no âmbito privado, sem a intervenção do Judiciário (CACHAPUZ; CONDADO, 2008).

Já na mediação, as pessoas envolvidas buscam tratamento para o conflito contando com a ajuda de um mediador, terceiro, que não tem poder de decisão, mas que facilita a comunicação na busca da construção autônoma de uma resposta que satisfaça as partes.

A arbitragem consagra o cidadão na administração da justiça e o acesso à justiça é o meio de se promover o Estado de Direito. [...] Assim, a arbitragem na forma instituída no Brasil atende, consequentemente, aos propósitos fundamentais veiculados na Carta Magna e se aproxima dos anseios do povo de conviver com uma justiça rápida, segura, desburocratizada e de fácil acesso. Há a necessidade, porém, que o Estado estimule a criação de órgãos arbitrais, facilitando o seu funcionamento e criando condições materiais para que cumpram a missão a que estão destinados. (p. [?]).

No entanto na jurisdição tradicional, ocorre uma absoluta falta de diálogo e que acarreta um enorme número de processos ajuizados. Quantas vezes as partes propõem ações sem, ao menos, antes terem se falado? A cultura da justiça estritamente adversarial e formal alimenta conflitos e, muitas vezes, mais violência, tanto entre as partes como na sociedade e nos profissionais, perpetuando-se pelas gerações. A mediação por ser um meio mais humanizado e menos burocrático, facilita o acesso das classes hipossuficientes a essa lógica, a conduta ética dos mediadores não necessariamente impõe neutralidade e equidade, mas leva à tranquilidade e segurança, e estas no momento de fragilidade das partes são um grande passo para a sua pacificação. “Cabe lembrar a ideia de que o ser não tem natureza exclusivamente jurídica, mas múltiplas faces, e não enxergar isso é restringir, segmentar e subestimar demasiadamente o universo humano e o conhecimento.” (ZAPPAROLLI, 2003).

Em vários países, foram instalados centros de mediação comunitário, onde estes representam a coluna vertebral de todos os tipos de serviços de mediação, funcionando ao mesmo tempo como o principal local de treinamento de mediadores, como os núcleos geradores de novos programas e alternativas de intervenção em resolução de conflitos, e também como os maiores responsáveis pelo oferecimento de serviços de mediação às classes menos favorecidas. No Brasil a localização escolhida por este centro para a sua atuação, foi a periferia da zona oeste do município de São Paulo, uma comunidade altamente carente, onde aproximadamente metade dos moradores tinham renda familiar inferior a 150 reais, ou seja, a mediação se torna um poderoso instrumento de viabilização ao acesso à justiça às classes de baixa renda (SOUZA, 2003).

Uma população pobre, de fato necessita de atendimento gratuito. Porém, mais do que isso, tem poucas condições de deslocamento, talvez necessitando de um atendimento local. E é exatamente esse o maior benefício de levar literalmente a justiça àqueles que não tem como chegar até ela, através dos centos comunitários. Logo, é evidente que “a mediação pode cumprir a promessa de ser um meio de transformação social quer no sentido restrito, quer da sociedade como um todo, pois com um pensamento sistêmico tem ajudado a compreender, todas as coisas estão ligadas.” (SOUZA, 2003).

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com isso, ao demonstrar-se as funções e importante papel dos meios alternativos de solução de conflitos para o acesso à justiça, diminuição da violência e desigualdade social, percebe-se então que estes papeis não são onipotentes em si mesmos. Os meios alternativos não conseguiriam, por si só, causar efeito significante na sociedade. A pobreza é um problema multifatorial e complexo que tem origens e consequências tanto nacionais quanto internacionais. Na Constituição italiana, em seu artigo 24, explicita-se que “o meio de estar em justiça e o de se defender perante qualquer jurisdição são assegurados aos mais pobres, por instituições especiais.” (tradução livre). A Constituição espanhola, no artigo 119, revela a mesma preocupação: "La justicia será gratuita cuando así lo disponga la ley, y, en todo caso, respecto de quienes acrediten insuficiencia de recursos para litigar.” Assim, não se conseguiria achar apenas uma solução uniforme com aplicação universal para o combate à pobreza. Percebe-se que o Estado oferece os juizados especiais cíveis, tribunais especiais destinados às pessoas comuns para garantir direitos de baixo caráter econômico; a defensoria pública, que objetiva prestar assistência jurídica aos cidadãos necessitados; assistência judiciária gratuita, conforme a lei 1.060/50, etc.

Entretanto, somente um sistema de soluções, congruente, harmônico, eficiente, em que todas as instituições, sejam jurisdicionais ou não, estivessem comprometidas numa responsabilidade conjunta, a longo prazo, para a diminuição da desigualdade social, poderia conduzir a sociedade à libertação da miséria. Para isso, é preciso uma reeducação do homem político — seja o que está formalmente no poder, seja o povo em sua participação na construção do futuro da sociedade. Na atual conjuntura desta, é preciso investir ainda mais nos mecanismos jurídicos de combate à pobreza e trilhar os caminhos alternativos de solução de conflitos, para se efetivar a realização da justiça. O acesso à justiça é base para a aplicação de todos os outros princípios e garantias constitucionais, pois não protege apenas o direito individual violado como também o direito de ação, o devido processo legal como também pode prevenir a ameaça de violação do direito. É um valor fundamental da própria democracia.

REFERÊNCIAS

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