OS MANGUEZAIS, POLÍTICA HABITACIONAL E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL.

 

 

Jéssica Silva Prata

 

Sumário: Introdução; 1. Considerações Iniciais: aspectos ambientais e econômicos dos manguezais; 2. A utilização sustentável dos manguezais; 3. Atuação da legislação Ambiental no ecossistema manguezal; 4. O contexto habitacional envolvendo o ecossistema manguezal; 5.  O valor da opção de preservação dos manguezais no meio urbano; Conclusão; Referências.

 

 

RESUMO

 

O Ecossistema manguezal possui grande relevância para a zona costeira, fato este, que o caracteriza como uma área voltada à preservação, a qual merece atenção por parte do sistema jurídico brasileiro. Deste modo, muito embora saiba a sua importância para a vida humana, mostram-se notórias as negligências e as desconsiderações das pressões socioeconômicas e imobiliárias impostas a esse ambiente nos centros urbanos, o que muito contribui para o surgimento de situações paradoxais envolvendo este ecossistema, assim como ameaça à própria qualidade de vida humana.  Deste feita, busca-se elucidar os desafios da preservação dos manguezais em face da exploração de seus recursos naturais por parte da população e uma suposta política habitacional. Na zona costeira o ecossistema manguezal se constitui como um espaço ambientalmente protegido em virtude de sua importância, fragilidade, observância dos fatores e diversidades da realidade socioambiental.

 

                                          PALAVRAS-CHAVE

Ecossistema manguezal.  Política habitacional. Preservação. Sistema jurídico.

 

INTRODUÇÃO

 

Na zona costeira o ecossistema manguezal se mostra como um espaço ambientalmente protegido de forma criteriosa, em virtude de sua importância e fragilidade; o desafio da sustentabilidade está, principalmente, em como conciliar a expansão urbana com a conservação e o uso sustentável. A conservação das áreas de manguezais constitui ponto decisivo no que tange a preservação das cadeias da diversidade biológica, o problema se encontra no fato de praticamente todos os manguezais da área costeira do Brasil estar sob graves ameaças, seja por conta da expansão da zona urbana por meio de projetos turísticos inadequados ou até mesmo, pelo despejo de poluentes e lixo.

Neste sentido, a zona costeira tem se traduzido em uma região peculiar, sob o ponto de vista ecológico, isto, por que constitui área que abrange a transição entre o meio aquático, marinho, terrestre e aéreo que permite intensas trocas de nutrientes e energia entre os diversos ambientes. Os aspectos econômicos e sociais da zona costeira apresentam peculiaridades no que diz respeito ao modo de ocupação territorial, concentração populacional, instalação de complexos industriais portuários e abundância de recursos naturais (fauna e flora), o que culmina na necessidade de aplicação de instrumentos legais, bem como implantação de programas de Gestão Ambiental, objetivando a salvaguarda desses recursos naturais.

O sistema jurídico brasileiro dispõe de um conjunto de dispositivos legais, isto é, emendas, decretos, resoluções, portarias, com o intuito de assegurar a proteção do meio ambiente considerado em seu aspecto macro, englobando fauna e flora; O que se busca questionar é a efetividade desses dispositivos, quando do plano fático da preservação ambiental.

O ecossistema manguezal passa a ser tradicionalmente conhecido como uma comunidade de plantas tropicais que habitam os solos das zonas entre marés. Inúmeras pesquisas têm demonstrado os manguezais como um dos ecossistemas mais produtivos do mundo, sendo indispensável ao fluxo de energia e nutrientes nas costas tropicais. Desta forma, imensurável se torna sua importância para economia formal e informal dos municípios costeiros tendo em vista as comunidades que sobrevivem dos seus recursos, por exemplo, no que toca a fabricação de artesanatos, a pesca artesanal e coletas de mariscos com destaque para espécies de interesse econômico, tais como caranguejo, aratu, camarões e diversas espécies de peixes.

Neste particular imprescindível se torna o manejo racional dos recursos disponíveis nas zonas costeiras, com a intenção de alcançar um equilíbrio entre desenvolvimento econômico e conservação, no contexto dos ecossistemas nelas inseridos.

Desta feita, propõe-se de inicio, levantar as considerações iniciais no que tange aos aspectos ambientais e econômicos dos manguezais, bem com o que concerne ao sistema jurídico de proteção ambiental desse ecossistema, propondo em seguida, análise à política nacional de habitação no contexto dos manguezais, por fim, destacando valor da opção de preservação dos manguezais, buscando alcançar um equilíbrio entre desenvolvimento urbano e conservação dos manguezais, propondo neste particular, um manejo sustentado do ecossistema manguezal em meio urbano.

1.CONSIDERAÇÕES GERAIS: ASPECTOS AMBIENTAIS E ECONÔMICOS DOS MANGUEZAIS

 

Os manguezais constituem verdadeiras florestas intertidais, dotados de extrema relevância para zona costeira, dada sua capacidade de gerar bens e serviços a população local, o que é proporcionado por suas propriedades funcionais e estruturais as quais são determinadas por certas condições climáticas como: temperatura do ar, altura da maré, disponibilidade de água, nutrientes e de luz. Para Soffiati, manguezal é um “ecossistema costeiro da zona intertropical do planeta que costuma se desenvolver entre a terra e a água, entre a água doce e água salgada, mantendo sua integridade e coerência” (2007, p. 54).  Esse ecossistema é muito rico em espécies, portam comunidades vegetais típicas de ambientes alagados, resistentes à alta salinidade da água e do solo. Porém, destacam-se pela grande abundância das populações que neles vivem. Deste modo, podem ser considerados uns dos mais produtivos ambientes naturais do Brasil, que apresenta ampla distribuição geográfica cerca de 25.000 km² e estão distribuídos ao longo de uma costa continental com mais8.000 km, que vai do Oiapoque, extremo norte do país, até Laguna, no litoral de Santa Catarina (RAMOS, p. 24, 2008).

O órgão responsável pelo acompanhamento e monitoramento das áreas litorâneas, no que diz respeito conservação, preservação e manejo dos manguezais no território brasileiro é o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBMA); O que se dá em meio a importância desse ecossistema, como indispensável fonte de energia e nutrientes as costas tropicais contribuindo, deste modo, para a pesca, a aquicultura e a silvicultura costeira além de, como já exposto, ser um ambiente rico em espécies de interesse econômico, tais como caranguejos, ostras e diversas espécies de peixes.

 O estuário, onde se desenvolvem os manguezais, é a uma faixa de transição entre o ambiente terrestre e o marinho, isto é, onde a água salgada do mar se encontra com a água doce do rio; poucas plantas estão aptas a sobreviver neste local com pouco oxigênio, mas isso não impede que certas vegetações nele se desenvolvam.  É esse tipo de ecossistema que fornece rica alimentação proteica para a população litorânea: a pesca artesanal de peixes, camarões, caranguejos e moluscos, se tornando assim, uma das principais fontes de subsistência para os moradores do litoral.

Dada a extrema importância desse ecossistema ao meio ambiente e a própria comunidade humana, se mostra inquestionável o fato de que o mesmo é altamente produtivo, frágil e deve ser protegido, para que se alcance um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Nesse particular, diante da sua grande função econômica, salutar se faz que o Poder Público com a participação de toda a coletividade, se proponha a garantir a integridade da natureza, observando o desenvolvimento sustentável, propondo-se para isso, uma compatibilização entre o acesso ao desenvolvimento urbano, sem afrontar o direito fundamental de todos a um meio ambiente saudável, aqui, em principal no que toca a preservação dos manguezais. Isso porque, como será mais adiante discutido, a própria legislação ambiental muita das vezes não considera as pressões socioeconômicas existentes nos meios urbanos, frente à ocupação de uma área urbana crescente em ambientes de preservação ambiental.

  1. 2.  A UTILIZAÇÃO SUSTENTAVEL DOS MANGUEZAIS

 

A ideia de sustentabilidade demonstra a necessidade de se respeitar os limites da natureza estabelecidos pela biosfera, sem comprometer o atendimento às necessidades humanas; o desenvolvimento sustentável implica, então, no ideal de um desenvolvimento harmônico da economia e ecologia que devem ser ajustados numa correlação de valores onde o máximo econômico reflita igualmente um máximo ecológico. Na tentativa de conciliar a limitação dos recursos naturais com o ilimitado crescimento econômico, são condicionadas à consecução do desenvolvimento sustentável mudanças no estado da técnica e na organização social (DERANI, 2002).

Os principais debates e políticas gerais sobre o Meio Ambiente foram desenvolvidos na Conferência de Estocolmo em 1972 e aprimorados no ECO-92. Como resultado desses eventos o Brasil publicou em1981, aLei nº 6.938, que fala sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, com o intuito de preservar, melhorar e recuperar a qualidade ambiental necessária a vida. A Lei em destaque, no caput do artigo 2º, elenca as principais características da sustentabilidade:

Art. 2º.  A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana (...) ( POLITICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE, 1981)

A interpretação mais recente sobre este conceito insere preceitos e políticas de desenvolvimento baseadas no aumento da qualidade de vida das pessoas. Derani, por exemplo, acentua que o Desenvolvimento Sustentável aporta essencialmente normas capazes de instrumentalizar políticas de desenvolvimento com base no aumento das condições existenciais dos cidadãos.

O Brasil possui várias regiões, a exemplo do nordeste, com grandes contrastes socioeconômicos em que existem varias moradias encontradas nas costeiras de mangues, em especial as palafitas, construções acima d’água decorrentes de famílias com baixas condições econômicas, onde o principal meio para retirada do sustento destas pessoas vem da contribuição dos mangues, movimentando uma base econômica informal para estes municípios litorâneos e com isso a biodiversidade brasileira vem sendo ameaçada, tendo como consequência, graves problemas nas zonas costeiras, em virtude principalmente da destruição dos manguezais, da sobrepesca e da exploração de forma artesanal nessas regiões, representando um sistema econômico e social de suporte à vida.

O ecossistema de manguezais, como já dito, apresenta condições favoráveis à alimentação, proteção e reprodução de espécies, funcionando como instrumento regulador do equilíbrio da cadeia trópica, contribuindo dessa forma, para a transformação das matérias orgânicas em valor ecológico, social e econômico, o que não pode ser explorado de maneira árdua pelo ser humano, logo, o desenvolvimento sustentável, vem como um modelo que evidencia a preocupação com o padrão de consumo, a distribuição de renda e com a concentração da riqueza.

O instrumento utilizado pelo governo brasileiro para internalizar os princípios de sustentabilidade no país foi a criação da Comissão de Desenvolvimento Sustentável e aplicação dos preceitos da Agenda 21 nacional, com o objetivo principal de elaborar e implementar esses mecanismos visando avaliar a atual situação, registrar suas potencialidades e fragilidades de modo que levantassem as bases para uma construção sustentável.

3. ATUAÇÃO DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL NO ECOSSISTEMA MANGUEZAL

         Vale enfatizar os avanços e declínios na área de Direito Material e Processual, quando da proteção os mangues, a qual segundo a resolução do CONAMA n.º 10/93, no seu artigo 5º constitui:

(...) vegetação com influência flúvio-marinha, típica de solos limosos de regiões estuarinas e dispersão descontínua ao longo da costa brasileira, entre os estados do Amapá e Santa Catarina. Neste ambiente halófito, desenvolve-se uma flora especializada, ora dominada por gramíneas (Spartina) e amarilidáceas ( Crinum), que lhe conferem uma fisionomia herbácea, ora dominada por espécies arbóreas dos gêneros Rhizophora, Laguncularia e avicennia.

         O mangue quando preservado, colabora no equilíbrio ecológico, dada sua importância necessária para a proteção da diversidade de espécies. Em 1743, surgiram no Brasil, às primeiras documentações que preservavam o mangue e nas Ordenações Filipinas, data da mesma época, na Carta Régia tinha a proibição do corte de mangues vermelhos e em 1760 é assinado por El Rey Dom José um Alvará, com força de lei, o qual manda prender e multar quem degradasse o manguezal:

Segundo a medida não trazia no seu bojo a ideia conservacionista, embora conduzisse a isso. Na realidade, era a proteção de um produto econômico - o tanino - usado para curtir o couro e que era também vendido para outros países. (ALVES, 2004, p.37)

                                                                                                    

         Na época Republicana se registram a Lei n.º3.979/19 e o Decreto-Lei n.º14.596/20 ambos abordando o arrendamento de mangues; Explicitado de forma melhor no Decreto-Lei n.º 3.438/41, que obrigava o foreiro a cuidar na preservação dos manguezais, proibindo seu corte. Mas antes, no antigo Código Florestal de 1934, se previa esta obrigação, através do Decreto n.º 23.793, de 23 de janeiro de 1934 (CABRAL, 2006, p.45).

         Acrescenta a Resolução CONAMA n.º 303 de março de 2002, os parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente, consideradas instrumentos de relevante interesse ambiental, consolidando as responsabilidades assumidas pelo Brasil na Convenção da Biodiversidade, de 1992, a Convenção de Ramsar, de l971 e da Convenção de Washington, de l940, bem como os compromissos derivados da Declaração do Rio de Janeiro, de l992. Para efeito da presente Resolução, constituem Áreas de Preservação Permanente as áreas situadas em manguezal, em toda a sua extensão adotando as seguintes definições:

       “Art. 2º IX – manguezal: ecossistema litorâneo, que ocorre em terrenos baixos, sujeitos à ação das marés, formado por vasas lodosas recentes ou arenosas, às quais se associa, predominantemente, a vegetação natural conhecida como mangue, com influência flúvio-marinha, típica de solos limosos de regiões estuarinas e com dispersão descontinua ao longo da costa brasileira, entre os Estados do Amapá e Santa Catarina;”

         Os preceitos legais que embasam proteção de áreas de preservação permanente retomam o instituído na Política Nacional do Meio Ambiente através da Lei 6.938 de 1981, a qual propõe a preservação, melhoria e recuperação da qualidade de vida ambiental propícia vida, tomando por base, a proteção aos princípios do planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais; pautando-se na preservação dos ecossistemas, bem como controle e zoneamento de atividades potencialmente causadoras de degradação ou efetivamente poluidoras e ainda, proteção e recuperação de áreas ameaçadas de degradação. (art. 2º, incisos III, IV,V,VIII,IX).No art. 14, § 1° a lei ainda inova ao prevê responsabilidade civil objetiva agravada, isto é, independentemente de culpa por parte do poluidor, para os danos causados ao meio ambiente:

Art.14- Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

(....)§ 1° Sem obstar a aplicação das penalidades previst as neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

         A Constituição de 1988 dedicando um teor inteiro de um capítulo especial à proteção do meio ambiente no art. 225 informa que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações”. Desta feita considera-se a Zona Costeira como um patrimônio nacional e sua utilização observará as condições que assegurem a preservação do meio ambiente, em especial seus recursos naturais.

         O Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro-PNGC ( Lei 7.661/88) definiu em seu art. 2º, parágrafo único, a Zona costeira como “o espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre, que serão definidas pelo plano”, devendo prever o zoneamento de uso e atividades dando prioridade à conservação e proteção dos manguezais, em seu art. 3º, inciso I. Prevê, ainda, em seu art. 6º, que a falta ou descumprimento, mesmo parcial, das condições do licenciamento previsto neste artigo, serão sancionados com interdição, embargo ou demolição, sem prejuízo da cominação de outras penalidades previstas em lei.

         A Lei nº 3239/ 99 de 02 de agosto de 1999, que institui a política estadual de Recursos Hídricos, cria o sistema estadual de gerenciamento de recursos hídricos; regulamenta a Constituição Estadual, em seu artigo 261, parágrafo 1º, inciso VII; e dá outras providências, no seu art. 35, veda a instalação de aterros sanitários e depósitos de lixo às margens de rios, lagoas, lagunas, manguezais e mananciais, conforme determina o artigo 278 da Constituição Estadual.

         Com o advento da Lei 9.605/98 – Lei de Crimes Ambientais, toda a sociedade brasileira, bem como os órgãos ambientais e o Ministério Público passaram a contar com um instrumento ágil e eficaz na punição aos infratores do meio ambiente, vez que, antes da referida lei, tipos penais ambientais eram encontrados em leis esparsas, tornando difícil a sua aplicação. Com a referida lei e sua regulamentação pelo Decreto n.º 6.514/08, a legislação penal ambiental ficou consolidada, as penas têm uniformizações e gradações adequadas e as infrações são claramente definidas. Além das sanções penais, as condutas e atividades prejudiciais ao meio ambiente passam a ser punidas civil, administrativa e criminalmente, valendo dizer, que verificado o dano ambiental, a pessoa física ou jurídica, deverá ser obrigada a promover a sua recuperação, respondendo, ainda, com o pagamento de multas pecuniárias e com processos criminais.

4. O CONTEXTO HABITACIONAL ENVOLVENDO O ECOSSISTEMA MANGUEZAL.

 

   Nas décadas de 70 e 80 foram marcadas como palcos de intensas intervenções econômicas, que resultou na expansão grandiosa do sítio urbano em relação ao rural, e como consequência disso foi perceptível os impactos negativos nos processos geomoforlógicos se manifestaram de forma significativa, ocasionando deste modo, fatores negativos ao meio ambiente como cheias, desabamentos, voçorocas, além da ocupação desordenada dos mais diversificados ambientes levando ao estabelecimento de condições insalubres à saúde humana.

    A falta de controle do crescimento das cidades trouxe, sem dúvidas, uma grande margem de degradação ambiental e uma quebra na qualidade de vida das pessoas. Segundo Rocha o ordenamento racional do espaço urbano não pode dissociar-se da proteção ambiental, assim como as normas urbanísticas e ambientais devem manter entre si estreita ligação para garantir e proporcionar a qualidade de vida dos habitantes da cidade. Entender que “o ambiente urbano pertence ao conceito macro meio ambiente” é fundamental (ROCHA, 2007, p.1).

   Em meados da década de 90 a política habitacional passou a reconhecer os assentamentos informais, implementar projetos de reurbanização e promover sua regularização fundiária. Os municípios em geral são os principais responsáveis pelo uso e ocupação do solo urbano. Essa nova busca pela urbanização e regularização do interesse social em meio a preservação ambiental foi apoiada por financiadores nacionais e internacionais, e teve como base, a execução de obras de saneamento, estabilização geotécnica, reconstrução e reforma de residências, além das necessárias remoções de famílias em áreas de risco ou em locais de alta densidade.

Houve, neste particular, desenvolvimento de tecnologias em diversas áreas voltadas essa problemática específica das cidades brasileiras em conjunto com fortalecimento das normas ambientais, dada a necessidade do Brasil passar pelo fortalecimento de normas para planejamento e da gestão territorial: O Estatuto da Cidade - lei federal de 2001, os Planos de Bacia Hidrográfica, os Planos Diretores Municipais e, recentemente, a retomada de investimentos públicos em saneamento e habitação (o exemplo mais recente é o Plano de Aceleração de Crescimento – PAC do governo Federal).

Neste particular, conta-se ainda com o Estatuto da Cidade criou e referendou novos instrumentos administrativos e jurídicos para essa política;  Como isso, tensões entre os procedimentos do setor habitacional e os dos setores ligados ao meio ambiente começaram a surgir. O conflito se pauta na regularização desse processo dada a exigência de licenciamento urbanístico e ambiental e nesse sentido a solução se pautaria mais uma vez no conceito de desenvolvimento sustentável.

 Hodiernamente muitos dos ecossistemas manguezais vêm sido tratado com descaso, parcela da população passa ver os mangues como um ambiente insalubre e sem produtividade, o que leva muita das vezes, ao desmatamento, aterramento e drenagem dos manguezais, ocasionando a morte de milhares de espécies; estes fatores são gravosos e perigosos, podendo culminar na extinção desenfreada espécies com aumento do despejo de resíduos nesse ecossistema, o que resulta além da perda da biodiversidade, na redução da capacidade econômica proveniente dos mangues.

         O resultado desse descaso é a ocupação em áreas de preservação permanentes que estão inseridas no Código Florestal “Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural (...) f) nas restingas, como fixadores de dunas ou estabilizadoras de mangues;

         A constituição elenca em seu texto que todos têm direito a uma moradia digna, no entanto, devido as condições econômicas decorrentes do desenvolvimento do capitalismo, considerável parcela da população, por falta de opção de moradia acaba submetendo-se a construir casebres sem infraestrutura, como palafitas, que na maioria das vezes são encontradas nas margens de mangues, sem nenhum saneamento, conforto e segurança, sofrendo com as intempéries da região, e contribuindo de forma gravosa para degradação do ecossistema manguezal .

         A utilização de regiões próximas dos mangues gera um grande despejo de resíduos, o que contribui para um grande desequilíbrio neste ecossistema. Muitas cidades brasileiras construíram e constroem lixões e aterros sanitários em manguezais; além destes hábitos, a pressão exercida pelas pastagens, rizicultura, carcinicultura, pesca predatória, construção de marinas (ilegal em manguezais) são muito frequentes. As atividades mais destrutivas aos manguezais brasileiros são as industriais e portuárias, servindo para descartar os resíduos produzidos (principalmente tinturas e metais pesados), os portos necessitam de águas calmas para o atracamento dos navios, estes locais geralmente são baías, onde há manguezais. Os impactos causados pela presença de portos incluem a contaminação da água e dos animais (por resíduos, água do lastro e outros), além da possibilidade de doenças trazidas de outros locais e poluição do ar.

         Postula-se como essencial, tomando por base essa problemática tratar os interesses ambientais de forma difusa, buscando atuação não só do poder publico como da própria coletividade como meio de possibilitar efetivamente a sustentabilidade e preservação ambiental, conciliando deste modo, economia e ecologia, e neste particular se exige da população prudência, respeito e responsabilidade para com o trato ao meio ambiente.

 

5.  O VALOR DA OPÇÃO DE PRESERVAÇÃO DOS MANGUEZAIS NO MEIO URBANO.

 

         A obrigação do poder público, no que se diz respeito à proteção ao meio ambiente se expressa em meio a uma série de disposições de atos jurídicos, essa proteção está vinculada não somente ao poder estatal, mas a própria sociedade civil organizada, as indústrias locais, as fundações e ONGs, na busca da preservação ambiental. A Constituição Federal com o fim de integrar o tratamento jurídico dado ao meio ambiente, propôs além de competências privativas, competências comuns para o combate a poluição e concorrentes para legislar sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição, segundo a Constituição federal, artigos 24, VI e.23, VI, respectivamente.

         A legislação brasileira atribuiu proteção jurídica aos manguezais, em meio as grandes funções biológicas, socioeconômica propiciada por esse tipo de ecossistema, o que elevou o mesmo ao titulo de zona de preservação permanente considerando florestas, vegetação natural localizada ao longo dos rios, áreas fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangue, intitulando-as, conforme estabelece, o Código Florestal, Lei nº 4.771/65 e a, o Código Florestal, Lei nº 4.771/65, de reservas ou estações ecológicas.

         No que toca a responsabilidade sobre ações lesivas ao meio ambiente a Lei nº 9.605/98 estabeleceu medidas repressivas, penais e administrativas como punição ao poluidor, punindo todo aquele que causar poluição de qualquer natureza que possam provocar a mortalidade de animais, dano significativo a flora e inclusive, à saúde humana. As disposições jurídicas que visam punir o poluidor do meio ambiente estão previstas não só nesta lei, como exposto no tópico anterior, mas também em outras legislações criminais, na Lei de Contravenções Penais, no Código Florestal e no Código Penal.

         Na Constituição Federal, em seu artigo 225, parágrafo 3º, há a percepção de princípios que visam manter em harmonia a ordem econômica e a defesa do meio ambiente, neste sentido o princípio do poluidor pagador que segundo a perspectiva de Fiorillo, pode ser analisado de duas maneiras, em primeiro lugar busca evitar a ocorrência de danos ambientais (caráter preventivo), em posterior, após ocorrido o dano, buscar sua recuperação (caráter repressivo).

Desse modo, num primeiro momento, impõe-se ao poluidor o dever de arcar com  as despesas de prevenção dos danos ao meio ambiente que  a sua atividade possa ocasionar. Cabe a ele o ônus de utilizar instrumentos necessários à prevenção dos danos. Numa Segunda órbita de alcance, esclarece este princípio que, ocorrendo danos ao meio ambiente em razão da atividade desenvolvida, o poluidor será responsável pela sua reparação ( FIORILLO, 2007).

Neste particular, o que se busca é uma consciência coletiva a cerca do valor do bem ambiental. A racionalização do uso, com bases na melhoria da qualidade e redução da quantidade de efluentes, bem como à reparação dos danos ambientais eventualmente causados, de forma lícita, pelo lançamento de efluentes.

       O Texto Constitucional adota de forma clara, no caput do artigo 225, que cabe não só ao poder público como a coletividade a proteção e preservação do meio natural para a geração atual e vindoura (solidariedade transgeracional). Neste sentido, mostra-se a necessidade da atuação conjunta do Estado e da sociedade civil, bem como organizações ambientais, sindicatos, indústrias, comércio, agricultura e tantos outros organismos sociais comprometidos nessa defesa e preservação. Diante da fragilidade do sistema jurídico, que se mostra incapaz de se restabelecer uma situação idêntica a anterior, “adota-se o princípio da prevenção do dano ao meio ambiente como sustentáculo do direito ambiental, consubstanciando-se como seu objetivo fundamental” (FIORILLO, p. 47, 2007).

CONCLUSÃO

 

         Tendo por base que o desenvolvimento sustentável pressupõe a manutenção e conservação dos recursos naturais, bem como o equilíbrio entre ordem econômica, equidade social e proteção ambiental, desta feita implicaria a sustentabilidade, no reconhecimento de que a capacidade para manutenção de recursos naturais torna-se, fator determinante para o aumento da produção, tendo como foco os padrões de produção e consumo das sociedades humanas, assim como, busca-se a importância de inserir as questões ambientais no que diz respeito, a reposição de recursos naturais renováveis e não renováveis tendo em mente, o ritmo de exploração dos não renováveis, como forma de garantir a qualidade de vida da população humana.

Diante da grande função econômica do ecossistema manguezal, ponto bastante discutido neste trabalho, salutar se mostra a necessidade do poder público, em parceria com a coletividade, lutar em prol da integridade da natureza, observando sempre o desenvolvimento sustentável. Deve-se prezar pela atuação do judiciário junto a participação do Estado na estrutura e fiscalização das questões ambientais, criando mecanismo no âmbito de competência dos três poderes, com o intuito de refrear as lesões cometidas a flora, a fauna e aos ecossistemas nacionais, tendo em vista a salvaguarda da biodiversidade e dos recursos naturais em geral, como forma de preservar a própria economia nacional.

Por outro lado, muito embora haja uma organização governamental moderna no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, que se firmou a partir da Política Nacional do Meio Ambiente, que se funda em conceitos ambientais e ecológicos avançados, não se tem percebido atuações eficientes para refrear os diversos crimes ambientais, como: derramamento de esgotos, lançamento de efluentes industriais, agrotóxicos e resíduos sólidos e desmatamentos, o que se mostra em virtude da limitação em se dispor de recursos suficientes para combater os agentes poluidores, isto por que, a própria legislação ambiental se mostra negligente em não considerar as pressões socioeconômicas existentes nos meios urbanos, frente à ocupação de uma área urbana crescente em ambientes de preservação ambiental.

O meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado constitui um direito humano fundamental, que busca a proteção da vida em todas as suas formas, bem como a garantia de uma existência digna a atual e futura geração, é o que se chama de solidariedade transgeracional, que tem como foco a preservação do meio ambiente, não só a geração atual como as vindouras, tudo isso, visando compatibilizar dois sistemas aparentemente antagônicos desenvolvimento econômico e meio ambiente sustentado.

Desta feita, postula-se como essencial tratar os interesses ambientais de forma difusa, abarcando não só o poder público como toda a sociedade, e neste sentido, oferecendo legitimidade ativa à população para que atue judicialmente contra dos danos ambientais, buscando, desta forma se alcançar uma maturidade social e cultural, o que se torna imprescindível para possibilitar efetivamente a sustentabilidade e preservação ambiental a todas as gerações.

 

 

                                          REFERÊNCIAS

 

ALVES, Jorge Rogério. Manguezais: educar para proteger. Rio de Janeiro:
FEMAR/SEMADS, 2004.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Presidência da República. Visto em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm> Acesso em 11 mai. 2014.

Resolução nº 303, de 20 de março de 2002. Dispõe sobre parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente. Visto em <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res02/res30302.html> Acesso em 14 mai. 2014.

CABRAL, Gutemberg José da Costa Marques. O Direito Ambiental do Mangue.
João Pessoa: Sal da Terra, 2006.

DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. Max Limond, 2002.

 

 

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 8. ed. ampl. São Paulo: Saraiva, 2007.

QUEIROZ, Luana das Graças. Aspectos Legais e de Sustentabilidade nos Manguezais Baianos: O Caso de Canavieiras. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/26427-26429-1-PB.pdf

Acesso em: 26 mai.2014.

RAMOS, Sérgio. Manguezais da Bahia: breves considerações. Ilhéus: Editus, 2008.

 

ROCHA, J. C. S.. Função ambiental da cidade: direito ao meio ambiente urbano
ecologicamente equilibrado.
São Paulo: Juarez de Oliveira Editora, 2007.

 

SOFFIATI, Artur. Da Mão Que Captura O Caranguejo À Globalização Que Captura O Manguezal. Disponível em : <http:// www.anppas.org.br/encontro/segundo/Papers/Gto8.

Acesso em: 26 mai.2014.