OS EFEITOS JURÍDICOS DA SUBORDINAÇÃO DO TRABALHADOR POR MEIOS TELEMÁTICOS COM O ADVENTO DA LEI 12. 551/11

 

 

Ana Flávia Abreu Bezerra

Camila Maria Mont’Alverne Frota

 

Sumário: Introdução; 1 A regulamentação do teletrabalho com a Lei 12.551/11; 1.1 Globalização, vantagens e desvantagens do Teletrabalho; 2 Autonomia e subordinação no Teletrabalho; 2.1 Parassubordinação 3 Os direitos do trabalhador aplicados no Teletrabalho; Conclusão; Referências.

 

 

 

INTRODUÇÃO

 O trabalho à distância, com melhor exemplo moderno traduzido no Teletrabalho gerou certa polêmica na comunidade jurídica, sobretudo pela dificuldade enfrentada em garantir certos direitos previstos na Constituição e na CLT a todos os trabalhadores e aplicá-los a essa nova concepção de trabalho. Entre eles, destaca-se o direito à desconexão, garantido em âmbito constitucional no artigo 7° e que nesse contexto e em face da nova realidade trabalhista, pode levar o empregado a sobrepor seu lazer para a realização de trabalhos profissionais.

Dos dois lados, é indubitável o fato de que a previsão normativa dessa nova categoria, trazida pela lei 12.551, que modifica o artigo 6° da CLT, traduz uma atualização das normas à nova realidade social, garantindo redução de custos aos empregadores, assim como um aumento de competitividade. E de outro, é notório que isso acaba por gerar uma disponibilidade excessiva do empregado, desrespeitando gravemente sua garantia ao repouso, já que sua vinculação à empresa é feita de forma virtual.

Portanto buscar-se-á identificar quais os pressupostos jurídicos dessa nova sistemática laboral e como se diferencia a subordinação de emprego exercida por meios diretos e pessoais para o feito por meios telemáticos.

Por fim, sob o âmbito de validade, conclui-se acerca de uma possível lesão na garantia individual de cada trabalhador no que tange ao lazer e ao descanso nesses casos em que não há uma efetiva desconexão do trabalho.

 

 

1 A regulamentação do teletrabalho com a Lei 12.551/11

A Lei 12.551 de 2011 veio pra alterar o artigo 6° da Consolidação das Leis do Trabalho e reconhecer um meio de trabalho já há muito existente e reconhecido pela doutrina brasileira. O objetivo da lei é conferir aos teletrabalhadores e trabalhadores à distância uma equiparação jurídica dos meios de controle de trabalhado por meios diretos e pessoais pelo telemático. Antes da lei, não havia menção ao teletrabalho na CLT. Esta so fazia menção ao trabalho à domicilio. A configuração atual permite, segundo Silva (2012), a existência do trabalho em domicilio e o teletrabalho como espécies, de onde trabalho à distancia é gênero. . apesar de apresentarem os dois tipo múltiplas semelhanças, não podem se confundir, sendo sempre mandatório que para a existência de uma teletrabalho, haja controle do trabalho e comnicação do empregado com o tomador dos serviços por meios informatizados e telemático, não importando nesse caso se é feito em casa ou não, mas que não presente do empregador.

Assim como exigível a todos, o teletrabalho se enquadra nos requisitos legais necessários para configurar o vínculo de emprego, quais sejam a pessoalidade onerosidade, subordinação e habitualidade. Portanto, será defendido que não importa o lugar em que e estabelecera a atividade, não impede a formação de vinculo empregatício. Sobre o teletrabalho, ainda há pontos controversos, como relativos à jornada de trabalho e a possibilidade de auferimento das horas extras nesse tipo de emprego, quando ate mesmo o controle do efetivo tempo trabalhado passa a ser um problema latente (SILVA, 2012).

O fato, portanto, da nova lei não alterar a legislação trabalhista no que tange a jornada de trabalho e outras regulamentações, a mesma reconheceu tal modalidade, assim como a existência de uma subordinação jurídica, deixando ainda amplo espaço para discussões e aprimoramento, até mesmo dos empregadores no que tange à novas formas de organização e controle desse novo tipo de emprego e relação jurídica.

 

1.1 Globalização, vantagens e desvantagens do Teletrabalho

Sob diversos aspectos, considera-se que, hoje, somos parte da Terceira Revolução Industrial. A primeira ocorreu por volta de dez mil anos atrás, foi a chamada Revolução Agrícola. A segunda veio a ocorrer há mais ou menos duzentos anos, iniciada logo após a criação da máquina a vapor, em 1776. A partir da Segunda Revolução, a relação trabalhista tomou rumos impactantes a toda a sociedade: foi possível se produzir mais, utilizando-se de custos mais baixos. Fundando-se na livre iniciativa, surgiu o modelo de produção capitalista. E, a partir da Revolução Industrial, foi possível a passagem da sociedade industrial, a ponto de consolidar-se o liberalismo. (BELMONTE, 2008)

Entretanto não só de benefícios era baseado o período industrial. Como conseqüência da Revolução Industrial, pudemos observar condições precárias de trabalho, que consistiam, também, no desmerecimento do trabalho braçal do homem, fato este que levou a eclodirem movimentos sociais como, por exemplo, o Manifesto Comunista. Daí, vieram as greves, acarretando em enormes prejuízos ao Estado que, porventura, decidiu não mais manter um Estado liberal, mas sim um Estado com interferências nas relações privadas, de modo que fossem aplicados limites à utilização da mão-de-obra assalariada. Com isso, surgem o Estado Social e o Direito do Trabalho.

Nos anos 70, com a crise petrolífera, houve uma intensificação em implementações alternativas para a diminuição dos custos de produção. Houve uma convergência das noções do trabalho em casa e de trabalho à distância, de modo que se fizesse surgir a telemática, conceituada como a fusão entre telecomunicações e informática. A questão baseava-se em como reduzir os custos decorrentes das deslocações de casa ao trabalho e vice-versa. Jack Nilles, então, adaptou o telecommuting como a substituição do trabalho físico dos trabalhadores pela telecomunicação das informações, ou seja, o trabalhador realizava suas atividades à distância, em casa, ou em local diverso da sede da empresa através de correio, telefone, telégrafo, uma vez que naquela época não havia ainda computadores pessoais ou acesso à Internet.

Foi em decorrência da globalização que tradicionais postos trabalhistas tronaram-se arcaicos e tiveram seus status reduzidos, tendo em vista o fato de que não souberam ou não puderam acompanhar o acelerado passo de algumas indústrias e empresas que tiveram sua mão-de-obra substituída por máquinas, ou até mesmo por outras fontes – humanas, inclusive – espalhadas por diversos lugares do mundo. A consequência disso foi a imensa concorrência mundial de mão-de-obra, cuja grande valorização girava em torno da qualificação dos profissionais em detrimento de suas especializações, precárias condições de trabalho, e grande mobilidade do capital no mercado, com focos em locais que gerassem menores custos.

O que se pode observar é que, inevitavelmente, a tecnologia atingiria o âmbito das relações trabalhistas, e tem como uma das suas principais razões a globalização - termo utilizado para designar a relação existente entre diversos países em variadas situações. Ou melhor, um ponto crucial para que o mundo se tornasse interligado e interdependente decorre da ideia de mudança ocorrida nos meios de produção. Do sistema taylorista/fordista passou-se ao sistema keynesianista/fordista.  Aquele se baseia na produção em massa, no consumo massivo e no bem estar social, entrando em crise por conta da crescente competição internacional provocada pelos avanços tecnológicos. Foi então que as empresas de grande porte passaram a buscar, internacionalmente, maior lucratividade, de modo que se fizessem presentes em regiões cujas taxas fossem menores e a força de trabalho exigisse salários menores.

Com isso, as novas tecnologias interligadas com o modo de produção globalizado e a acirrada livre concorrência regional e mundial trouxeram efeitos à sociedade como, por exemplo, a prioridade em relação à maior capacidade de produção por menores custos, o barateamento do produto ou serviço com maior circulação de capital, enfraquecimento  do Estado Nacional frente às empresas transnacionais e multinacionais ao ditar políticas sociais, a detenção setorial de tecnologia e capital, e dificuldades na implementação dos direitos sociais. No que diz respeito ao âmbito das relações trabalhistas, os impactos puderam ser exemplificados por BELMONTE (2008) com a queda das barreiras espaciais e temporais do trabalho, a automatização da mão-de-obra urbana e rural, a eliminação dos postos de trabalho convencionais, a diminuição da necessidade numérica de trabalhadores e a modificação sobremaneira do objeto e dos custos da produção. Entretanto vale ressaltar que a busca por profissionais mais qualificados e a substituição da mão-de-obra por máquinas aliados à deficiência no ensino e à má distribuição de renda fizeram com que o desemprego aumentasse consideravelmente, levando ao trabalho precário, ao trabalho informal, ao dumping social - aceitação de trabalho abaixo do preço real - , e até mesmo ao trabalho ilícito.

Um dos impactos da globalização aliada às novas tecnologias foi a possibilidade de desenvolvimento total ou parcial do trabalho à distância. Tal fato nos trouxe o que chamamos de Teletrabalho, caracterizado como um trabalho realizado à distância, ou seja, através de tecnologias de comunicação, permite que o trabalhador exerça suas funções distante do ambiente de trabalho, fora da sede, ou sem a fiscalização e controle diretos do empregador. O teletrabalho é um tema relativamente novo na esfera trabalhista, e foi assim denominado por Jack Nilles, entretanto ainda não possui regulamentação normativa específica no ordenamento jurídico brasileiro. Questiona-se, ainda, se a relação que contorna as duas partes é de prestação de serviços ou de emprego

O teletrabalho possui, entre outras vantagens, a flexibilização do tempo e do lugar da execução do trabalho designado ao empregado, de modo que, assim, sejam reduzidos os custos tanto para ele quanto para o seu empregador. Porém há discussões por todos os lados da doutrina referentes ao que predomina: as vantagens ou as desvantagens do teletrabalho.

Dentre as vantagens, pode-se destacar a redução de custos tanto pro empregado quanto ao empregador com vestuário, alimentação, deslocamentos entre a residência e o trabalho, projeto de um estabelecimento, manutenção do local, higiene, energia; redução dos conflitos trabalhistas, uma vez que não há contato direto com outros empregados; redução de interrupções e pausas durante uma atividade, oque gera aumento na produtividade; possibilidade a empresas de pequeno porte de competição com  empresas de maior dimensão; flexibilidade organizacional tanto temporal quanto espacial, ou seja, o teletrabalhador possui a capacidade de organizar seus horários como achar melhor, visando maior produtividade, bem como possui a capacidade de não apenas realizar seu trabalho em casa, mas onde achar que lhe convém, também visando a produtividade da empresa – nesses casos, vale-se ressaltar, muitas vezes são estabelecidas metas a serem cumpridas pelo empregado. Portanto o importante é que consigam atingi-las.- ; o teletrabalho também permite a possibilidade de empregos à donas de casa, a estudantes, a quem tem filhos, a quem possui dificuldades de deslocamento; aumento motivacional, haja vista o fato de que o empregado possui a chance de adaptar suas atividades profissionais à sua vida particular, adquirindo, portanto, autonomia.

Já as desvantagens são caracterizadas pelo isolamento do empregado, devido a falta de contato entre ele e os colegas de trabalho, fato que acaba afetando a capacidade de atuação em equipe e a visão de conjunto da empresa e de seus objetivos; ainda em decorrência do isolamento, é possível que haja conflitos trabalhistas quando houver uma reunião, por exemplo, uma vez que não houve contato direto anterior entre os membros da empresa; há possibilidade de haver exploração do trabalhador: o trabalho é levado para casa, portanto deve existir o cuidado de não se misturar o tempo reservado às atividades da empresa com o tempo reservado à família. Muitas vezes, a meta estabelecida pela empresa é alta, ou até mesmo o empregador se vê ligado 24 horas à empresa por aparelhos eletrônicos como pagers, celulares, e-mails, que podem ser acionados a qualquer hora do dia. Deste quesito, surge uma imensa discussão doutrinária acerca da desconexão trabalhista tratada no tópico referente aos direitos do teletrabalhador; entre as desvantagens ainda estão a supervisão remota, ou seja, o empregador não possui total controle das atividades do teletrabalhador, sentindo dificuldade, inclusive, em identificar a pessoalidade e a não-eventualidade na relação firmada entre as partes; uma desvantagem ao teletrabalhador também é a falta de auxilio na execução das tarefas; a dificuldade de atenção por estar em casa e, por conta disto, o aumento das tarifas de energia e a sensação de não estar vinculado à empresa. Um ponto interessante que também merece destaque é o medo e o risco de o teletrabalhador não ser reconhecido profissionalmente, tendo dificuldades de ascensão de cargo. Assim como há riscos de tratamentos diferenciados entre os empregados, refletidos em seus salários e direitos, também há riscos de haver, inclusive, subcontratações ilícitas. Mas um dos pontos cruciais gira em torno da falta de ordenamento específico regulando a relação trabalhista entre o empregador e o teletrabalhador, o que nos leva a concluir que estamos passando por um período de intensa flexibilização e transformação dos vínculos trabalhistas.

 

 

2 Autonomia e subordinação no Teletrabalho

Subordinação vem a ser uma condição gerada pela limitação contratual da autonomia da vontade, transferindo o poder de gerenciamento do empregador. (NASCIMENTO, 2002 apud SILVA). É perceptível que não há necessidade de efetiva atuação da vontade do empregador, bastando somente a possibilidade de tal intervenção, visto que não se trata de sujeição pessoal.

A ideia transportada ao teletrabalho é a de que as características dessa nova concepção levam à extinção da subordinação. Alguns tribunais se posicionam que o fato desse tipo de trabalho poder ser realizado offline, ou seja, limitando o controle do empregador sobre o trabalho no que tange sobretudo à carga horária, é o que retira tal característica importante na relação de trabalho. No entanto, Andressa Silva afirma que a comunicação entre as partes da relação diminui, o que conseqüente ocorre o mesmo com a subordinação, mas que tal não desaparece, haja vista a utilização de meios como fax, telefone, e-mail, etc., que suprem o contato necessário ao controle da atividade realizada, opinião que também comunga Alice Monteiro de Barros. Jair Teixeira dos Reis (2007 apud SILVA) não só discorda acerca da inexistência de subordinação como afirma que em tais casos as metas e controles são tão incisivas que o trabalhador acaba tendo uma afetação em sua vida privada.

Há a opinião de que aqui não existe autonomia, pois essa apenas se caracteriza em presença de um serviço tradicional e realizado de forma não habitual e que posteriormente se extingue com a prestação do serviço. Para Manrich (2007), a autonomia seria a principal característica do trabalhador por conta própria, que exerce atividade econômica em caráter de independência, com estrutura empresarial própria. Ele também afirma que uma forma de  dirimir dúvidas acerca da existência de um empregado ou autônomo, seria indagar como se realiza o trabalho, onde é feito e como é a remuneração. Por conta disso, e pelo fato de que o teletrabalhador está inserido na estrutura organizacional do beneficiário e é por este orientado, além de fazer uso de seus instrumentos de trabalho, não há consequentemente autonomia nessa relação. Sob outro ponto de vista, Massoni (2011), por acreditar que no teletrabalho a subordinação jurídica fica “mitigada”, isso leva à existência muito mais de autonomia do que subordinação, pelo fato de ter-se “diluídas” as ordens de serviço, já que não há contato ou trabalhos internos. Ainda em relação à autonomia, deixou claro que tal pode ou não existir no teletrabalho, a depender de várias analises, dentre elas saber o modo de exercício da atividade. No mais, pode-se inferir que não havendo subordinação, o trabalho é autônomo, e já quando houver vínculo de emprego e gerência do tomador, claro está que mesmo feito em domicilio, como acaba por se realizar grande parte desse tipo de emprego, não haverá ainda assim, autonomia.

Alice Monteiro de Barros (2007, p. 321) defende que não é o lugar da prestação do serviço que vai atribuir tratamento diferenciado para relações de emprego. A subordinação jurídica, portanto, continua existindo, mesmo em face das mudanças tecnológicas. A forma de realização de cada trabalho poderá variar grandemente, mas sempre haverá subordinação jurídica, desde que haja controle do serviço prestado pelo empregador. Alem disso, os requisitos que fundamentarão a subordinação, estando presentes, já a garantem, como a dependência econômica e a alteridade. A autora também defende que o empregador pode se valer de vários meios, desde que dele cientes o empregado, para fiscalizar o serviço prestado pelo empregador sob o objetivo de garantir a garantir a tão questionada subordinação jurídica no meios telemáticos. Tudo dependerá  do meio utilizado por esse empregador para amnter conexão com seu empregado, pois dependendo até mesmo do programa utilizado, o empregador poderá com isso, fornecer instruções e auferir a aquantidade de trabalho e a qualidade na realização do serviço. Tal controle nada mais se configura como subordinação jurídica. Para sintetizar, a autora traz o que a doutrina indicou como elementos caracterizadores da subordinação jurídica, e portanto, estando tais presentes na relação de emprego, estará consequentemente resguardados, que são:

A submissão do teletrabalhador a um programa informático confeccionado pela empresa, que lhe permite dirigir e controlar a atividade do empregado; o fato de o credor do trabalho ter a faculdade de escolher e substituir o programa operativo especifico, com assunção de riscos; disponibilidade de tempo em favor do empregado, com a obrigação de assistir a reuniões ou cursos em treinamento, sob pena de sanção disciplinar. Outro indício consiste em ser a empresa proprietária dos equipamentos de produção (computador, linha telefônica, fax, impressora, etc); percebimento de importância fixa pelos serviços prestados; assunção de gastos pelo credor do trabalho com água, luz, aluguel, estacionamento, manutenção de equipamentos e outros. A esses indícios acrescenta-se a integração do teletrabalhador na organização empresarial, a qual se manifesta pelo grau elevado de confiança, e participação na vida da empresa dispondo de crachá, de autorização para chamadas telefônicas externas, códigos para acesso informativo à empresa, figuração nas listas de distribuição interna de documentos aos diretórios da empresa [...] (BARROS, 2007, p. 324).

Portanto, há com isso inúmeras situações que podem servir de indicativo de uma subordinação jurídica na relação de teletrabalho. O existência de subordinação torna-se simples a partir do que ensina Winter (2005, p. 94), segundo o qual é entendimento dos tribunais de que basicamente quando os sistemas de informática e comunicação forem da organização, ai existe um vínculo.  

 

2.1 Parassubordinação

As novas tecnologias e as suas conseqüentes mudanças ocorridas no mercado de trabalho acabam por desafiar o Direito trabalhista, e também a relação de subordinação entre empregado e empregador, tendo em vista o fato de que, com a globalização, o trabalho autônomo tem sido uma das grandes ameaças a este elemento do contrato de emprego. A partir daí, tendo em vista a dificuldade na adequação da subordinação jurídica à nova realidade social, pode-se afirmar que ocorre uma crise no Direito do Trabalho, cujo produto gerado são novas formas de relação empregador x trabalhador. Neste tópico, daremos ênfase à parassubordinação.

A prestação de serviços tornou-se característica crucial do período pós-industrial, e, dentre suas conseqüências, a diferenciação entre subordinação e autonomia passou a ser mais difícil ainda de ser realizada, haja vista o fato de que, com a globalização, surgiu o teletrabalho.

Em nosso ordenamento, não existe o trabalhador parassubordinado. O que existe é o trabalhador autônomo, a quem não é destinada garantia trabalhista alguma, e o trabalhador subordinado, ao qual são garantidos todos os direitos trabalhistas. O trabalhador parassubordinado é caracterizado como aquele que presta serviços autônomos, porém não eventuais, de forma coordenada. Há também remuneração e, além disso, o uso de estrutura empresarial concedida pelo tomador de serviços, ou seja, a pessoa de quem depende o trabalhador parassubordinado cede seu espaço ao empregado autônomo que realiza atividade não eventual onerosa. Portanto, aplicam-se ao trabalhador parassubordinado as seguintes características: autonomia, não-eventualidade, pessoalidade, coordenação da empresa tomadora de serviços, onerosidade, dependência econômica e, inclusive, proteção especial. Sendo assim, percebe-se tratamento semelhante ao dado a um empregado de fato, vez que o trabalho parassubordinado é um tipo especial de trabalho autônomo, também denominado de colaboração coordenada e continuativa (PEDREIRA, 2007)

Sérgio Torres Teixeira (1996) comenta sobre este impasse entre a relação autônoma e a de subordinação o seguinte: “Na realidade, o controle do empregador sobre a atividade do tele-empregado limita-se à posterior avaliação da sua produção e, em certos casos, a uma conexão indireta, via sistema de telecomunicações”, entretanto Sérgio Pinto Martins (2000, pág. 9) já mantem um ponto de vista diferente ao afirmar que o empregador tem sim a possibilidade de monitorar seu empregado através, inclusive, do próprio computador, até mesmo pelo numero de toques no teclado, ou através de produção, de relatórios etc. O que não se pode negar é a autonomia dada ao tele-empregado, vez que este não fica diretamente ligado às ordens de seus superiores hierárquicos. Há autonomia, mas ao mesmo tempo há subordinação. Aquela não chega a ser absoluta, mas chega a existir e, por conta disso, não há como descartar seu caráter de atividade parassubordinada.

Em relação ao tema, Winter (2005, pág. 93) é bastante sucinta e objetiva, mas ao mesmo tempo consegue resumir a parassubordinação:

Dessa maneira, as tarefas que eram fragmentadas passaram a ser reagrupadas e realizadas por um empregado fora da sede da empresa e, consequentemente, com poder de decisão mais forte em alguns aspectos, como a jornada de trabalho que é cumprida como melhor convir ao telempregado, limitada apenas pelo prazo final estipulado pelo empregador. Assim, a tecnologia traz uma nova forma de subordinação, pois o empregado fica apenas indiretamente ligado ao empregador, passando a existir a chamada ‘parassubordinação’ ou ‘telesubordinação’, quando ocorre à distância, de maneira menos acentuada que a dos contratos de trabalho normais

Assim, cabe destacar que a parassubordinação pode ser considerada uma espécie de submissão do teletrabalhador tanto às necessidades da empresa quanto aos seus fins e objetivos, sem deixar de ser considerado pelo teletrabalhador seu espaço no sistema de produção e suas responsabilidades, respeitando o contrato de trabalho firmado em acordo com o empregador, ainda que, aparentemente, haja autonomia da sua parte.

 

3 Os direito do trabalhador aplicados ao Teletrabalho

As principais dificuldades que se encontra no que tange ao instituto do teletrabalho diz respeito ao controle da jornada de trabalho, já que via de regra, o trabalhador escolhe por quanto tempo deseja trabalhar, o que acaba por tornar-se tarefa difícil o auferimento das horas extras. No entanto, serão aplicadas as normas relativas à jornada de trabalho se esse trabalhador mantiver conexão permamente com seu empregador por meio de um programa informático, sem margem de liberdade ao próprio trabalhador. Portanto, e assim como nas relações de emprego regulares, é também possível fixar o salário por unidade de tempo, e conseqüentemente, fixação de jornada extraordinária (BARROS, 2007, p. 324-325). Alice Monteiro de Barros também defende que a eventual necessidade de trabalho que supere determinada jornada, seja por imposição do empregador ou cumprimento de certo prazo, podendo ser realizado à noite ou fins de semana, não impede pagamento correspondente, como adicional noturno e descanso em dobro.

Alice Monteiro de Barros (2007, p. 325) deixa claro também que o fato do trabalhador não estar, de forma concreta exercendo suas atividades no ambiente de trabalho, não o exime de cumprir com normas de higiene e segurança. Traz exemplos de como deve ser realizado o trabalho frente ao computador, em vista a existência de preocupações como problemas visuais. Há também a preocupação com a fadiga e estresse. O comprometimento da segurança e da saúde no trabalho pode também encontrar causas como a falta de interação e comunicação com colegas e o próprio chefe, além da formação de conhecimento. Há portanto, esse risco para o teletrabalhador, que pode facilmente confundir e sobrepor seu tempo de trabalho ao seu tempo livre (p. 327). A solução pra isto é também proposta de Alice Monteiro de Barros (2007), que prevê a criação de sistemas de comunicação e informação eficientes não apenas com foco no trabalho mediado, mas também às necessidades do trabalhador. Para não criar barreiras de contato, a relação de emprego deve sempre prevê a ocorrência de reuniões entre os membros, tendo em vista ao não isolamento social do empregado.

Portanto, a ideia aqui defendida é a de que é inquestionável que o avanço tecnológico trouxe inúmeras mudanças na sociedade, e conseqüentemente no direito. No dirieto do trabalho, por exemplo, esses avanços trouxeram mudanças de paradigma, e violação de direitos como liberdade e intimidade do trabalhador são cada vez mais desconsiderados com as novas configurações trabalhistas que surgem (BARROS, 2007, p. 325).

É preciso ponderar, no entanto, que o teletrabalhador comunga de inúmeros benefícios ao figurar como parte nessa relação jurídica. O maior de todos, explica Alice Monteiro de Barros (2007, P. 320) seria a flexibilidade de seus horários, já que segundo ela, o teletrabalhador teria maior tempo dividido às suas tarefas pessoais e profissionais. Conseqüentemente, isso traria uma maior qualidade de vida ao mesmo. Outra grande vantagem que o teletrabalhador traz ao trabalhador diz respeito a diminuição da desigualdade de oportunidades, já que, segundo Barros (p. 320) pessoas que em tese enfrentam dificuldades em obter empregos formais, sob esse ângulo poderia ser de fundamental ajuda pessoas com deficiência, por exemplo, ou em idade avançada.

Por outro lado, e de forma mais abstrata, há ainda a opinião daqueles que vem no trabalho a distancia, o que não necessariamente é feito apenas em âmbito domestico, uma certa deterioração das condições de trabalho, isso tudo em decorrência do isolamento e da falta de contato com outros colegas. Alice Monteiro de Barros (2007, p. 320) também expressa que exercendo esse tipo de trabalho, elimina-se a carreira, assim como promoções do trabalhador. Somado a isso, tem-se também tutela sindical e administrativa diminuídas.

Em relação à jornada extraordinária, Massoni (2011) aborda que o pagamento das mesmas dependerá do sistema que a empresa adota, pois via de regra, sendo um trabalho à distância, seu tempo de serviço é livremente fixado e se confunde com suas horas de lazer. Nesse caso, o teletrabalhador não teria o direito ao pagamento de eventuais horas extras. No entanto, havendo na empresa um sistema de controle de atividade e tempo de trabalho, gera ao empregado o direito ao cômputo de suas horas extras.

CONCLUSÃO

A busca por melhores condições de mercado aliada à busca por melhores custos geraram o avanço tecnológico, que, por sua vez, fez nascer a globalização. Tudo isso afetou, também, o âmbito trabalhista, uma vez que há relação direta entre o mercado e as relações entre empregador e empregado. Pode-se afirmar que os efeitos das novas tecnologias e da globalização foram tão intensos que geraram novas formas de trabalho e, dentre elas, o que, hoje, é denominado Teletrabalho.

Há de se destacar que o Teletrabalho exige atenção especial dos nossos juristas e dos representantes do Poder Legislativo, tendo em vista a carência de legislação especial que regule esta relação. Diante de tal constatação, é notória a ineficiência do Direito laboral do nosso país diante das modificações estruturais da sociedade, frutos, inclusive, de uma crise sua. Deve-se considerar, portanto, a criação de Lei Complementar que regule essa questão ou até mesmo uma possível reforma na Consolidação das Leis do Trabalho, visando o amparo aos teletrabalhadores, tendo em vista do crescimento acelerado dessa nova forma de trabalho.

O teletrabalho, inegavelmente, vem sendo cada vez mais implantado pelas empresas brasileiras, as quais buscam através dessa nova modalidade uma forma de obterem lucros com menores custos, ou seja, buscam prestação laboral advinda de qualquer parte do mundo, de forma que não apenas a própria empresa se beneficie, mas também o próprio empregado, que garantirá uma espécie de “autonomia parcial” e, inclusive, a sociedade, que também sofrerá as consequências positivas da nova relação. O que não se pode negar é que tantas inovações têm provocado alterações nas relações empregatícias e em suas efetivações, bem como têm modificado a forma de exteriorização de elementos estruturais seus (TEIXEIRA, 1996, pág. 1311).

Dessa forma, o que se conclui primordialmente é que o Direito do Trabalho é quem deve seguir a ordem da modernidade, das novas tecnologias, da globalização e do avanço social, haja vista o fato de ser ele o responsável por regular situações e relações empregatícias diretamente atingidas por esse tipo de mudança envolvendo a sociedade. Assim, o fato é que não é a realidade quem deve se adaptar o Direito, mas sim o contrário, o Direito e, especialmente nesse caso, a CLT devem se curvar em direção às mudanças sociais, de modo que consigam controlar e acompanhar os passos largos dados pela humanidade. Caso contrário, as analogias teriam de continuar a ser aplicadas a todo caso concreto e isso não faria sentido algum, tendo em vista a acelerada expansão do Teletrabalho no âmbito trabalhista.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

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