A questão dos Direitos Humanos, antes discutido apenas por juristas, historiadores, cientistas políticos e cientistas sociais como um aspecto particular das suas pesquisas, surgiu nos últimos quinze anos como um tema amplo e abrangente, ao redor do qual se construiu um eixo articulador para pesquisas em vários centros de estudo e universidades  em todo o mundo. Atento às discussões, o governo do Brasil,  buscando identificar  como o povo brasileiro concebe os direitos humanos (civis, políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais), promoveu, através da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República,  uma pesquisa em 2008, pesquisa essa que envolveu  2.011 pessoas em 150 cidades de 25 Estados  nas cinco regiões do país.

Do sumário conclusivo da pesquisa destaco os seguintes pontos :

1 - O conceito de direitos humanos está associado, na ótica dos brasileiros,  primeiramente a direitos civis e, secundariamente, a direitos sociais.  Foi inexpressivo o número de entrevistados que os relacionaram com os direitos políticos;

 

2-Um elevado contingente (dois em cada cinco entrevistados) não soube sequer mencionar um direito humano assegurado pela Constituição;

3 - O endurecimento das condições nos presídios, a diminuição da maioridade penal e a prisão perpétua também encontraram apoio considerável entre os pesquisados. Já  a  adoção da pena de morte dividiu a opinião das pessoas entrevistadas;

4 – Observou-se, tambem, que apenas 1/3 é favorável ao pleno respeito aos direitos de “presos e bandidos”, ressalvando-se que o direito de ir e vir é naturalmente suprimido na condição prisional.

A pesquisa revela que a população brasileira  associa a cidadania aos direitos humanos e, embora ainda mostre um baixo grau de conhecimento desses direitos em sua amplitude, a maioria  tende a reconhecer o caráter universalista dos direitos humanos e sua relevância para o bem comum. Revela, ainda, que apesar de as políticas preventivas possuírem maior apoio do que as repressivas, paradoxalmente há apoio significativo ao endurecimento das penas.

Recentemente, a discussão sobre os Direitos Humanos entrou na pauta de debates públicos, reverberando na sociedade brasileira devido a alguns aspectos polêmicos do Plano Nacional de Direitos Humanos  (PNDH), lançado em dezembro do ano passado pelo Governo Federal. Dentre as questões  polêmicas, destaca-se a criação da Comissão da Verdade para examinar violações de direitos humanos praticadas no período da repressão política, de 1964 a 1985. Precisamente devido a esse ponto, que desagradou a setores militares, o Presidente Lula foi praticamente obrigado a assinar um novo texto do decreto que institui o PNDH, com alterações semânticas quanto ao objetivo da Comissão da Verdade.

Apesar do visivel mal estar em altos escalões militares, ficou claro que o objetivo da Comissão da Verdade será a  recuperação das informações, ainda sonegadas, sobre as execuções e a tortura, o que  não significa nenhum desejo revanchista. Essa busca da verdade, portanto, como assegurou o próprio Presidente da República, tem que ser tranquila e pacífica, sem qualquer gesto ou ação que possa provocar a  reabertura de feridas. Na realidade, a esta altura do processo de desenvolvimento politico e social do nosso país, imagina-se que ninguem, muito menos o governo,  tenha interesse em meter o dedo em velhas feridas. Mas a verdade precisa ser restaurada, até para que a História seja escrita em sua versão verdadeira. Como bem acentuou a senadora  Marina Silva, ao manifestar-se sobre a questão,  a verdade é libertadora. É preciso ter explicação para o que aconteceu nos dois lados, sem revanchismo. Todos os países fizeram isso. Não concordo que o decreto vá afetar a Lei da Anistia. A questão da punição aos torturadores está no Supremo. Não será resolvida por decreto ou pelo Congresso”.

Assim, tranquilizados os militares, com a assinatura de um novo decreto, e mantida a criação da Comissão da Verdade, agradando parcialmente aos militantes, o Plano Nacional de Direitos Humanos -  PNDH oferece ao povo brasileiro um enorme contributo, na medida em que coloca no centro da  discussão a questão dos Direitos Humanos. Como afirma Flávia Piovesan, em recente artigo,   o PNDH-3 desde já presta especial contribuição ao ampliar e intensificar o debate público sobre direitos humanos, acenando com a ideia de que não há democracia, tampouco Estado de Direito, sem que os direitos humanos sejam respeitados”.

No mesmo diapasão, entendo que além do respeito, os Direitos Humanos precisam ser efetivamente praticados no Brasil,  para que a grande população brasileira, que ainda nem sabe com clareza o que é Direitos Humanos – conforme revelou a pesquisa - mas é reconhecida em todo o mundo por sua generosidade, possa perceber no seu dia-a-dia, ,  independente de raça, cor, sexo, etnia e religião, esses direitos  fundamentais à vida.