OS CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: Uma análise referente à ausência e limitação de cobertura na perspectiva do Superior Tribunal de Justiça entre o ano de 2009 e 2010

Camila Coelho
Flaviana Noronha

Sumario: Introdução; 1 Breve consideração sobre os contratos e o Código de Defesa do Consumidor; 2 O contrato de plano de saúde caracterizado como contrato de adesão; 3 Ausência e limitação de cobertura nos planos de saúde; 4 O atual entendimento do STJ referente a ausência e limitação de cobertura nos planos de saúde; 4.1 O efeito das decisões do STJ com relação a defesa do consumidor; Conclusão. Referência.


RESUMO
Descreve-se, em princípio, sucintas noções referente aos contratos e o Código de Defesa do Consumidor, relacionando-os às contemporâneas contratações em massa, em específico, os contratos de plano de saúde. Verifica-se, ainda, que um dos direitos básicos do consumidor diz respeito à saúde e segurança, desta forma, o presente trabalho se propõe a analisar os contratos de plano de saúde no que diz respeito à ausência e limitação de cobertura de tratamentos que alguns planos de saúde atribuem em seus contratos, havendo a possibilidade de gerar um fornecimento de serviço defeituoso, comprometendo os direitos do consumidor antes citado. Analisar-se-á, por fim, o atual entendimento do STJ referente a esta ausência e limitação de cobertura, uma vez que a saúde do consumidor deve ser entendida como um direito básico que necessita ser obedecido e não um acordo que traz lucros e benefícios às empresas contratantes, buscando-se assim demonstrar a real efetividade desses direitos, em prol do consumidor hipossuficiente, mediante as jurisprudências deste tribunal no que concerne ao ano de 2009 e 2010.

PALAVRAS-CHAVE
CDC; Contratos de adesão; Planos de saúde; STJ

INTRODUÇÃO
Observa-se que a relação com os fornecedores de planos de saúde é indiscutivelmente uma relação de consumo, havendo a necessidade, portanto de ser resguardada pelo Código de Defesa do Consumidor. Deste modo, diante da manifesta hipossuficiência por parte dos usuários de tais planos tem-se a obrigatoriedade de estar presente expressamente no contrato, de forma clara, legível e com limitações em destaque, qualquer exclusão ou ausência da totalidade da cobertura de tratamentos, com a finalidade de cientificar o consumidor das limitações que seu plano apresenta.
Destarte, este trabalho apresenta como principal problema entendermos de que forma o STJ vem fornecendo efetividade aos direitos básicos do consumidor no que concerne aos planos de saúde, referente às suas decisões entre o ano de 2009 e 2010, constituindo como objetivo geral resguardar esses direitos, principalmente com relação à saúde e segurança e verificar se as decisões do STJ propiciaram a diminuição de contratos abusivos por parte dos fornecedores de planos de saúde, propiciando nos casos de omissão ou limitação de cobertura, uma interpretação benéfica ao consumidor.

1 BREVE CONSIDERAÇÃO SOBRE OS CONTRATOS E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Primeiramente, faz-se importante mencionar que o CDC é aplicado tanto no que concerne a relações de compra e venda quanto à prestação de serviços, aplicando-se assim, nas relações entre os fornecedores de planos de saúde e os usuários, uma vez que se mostra evidente a hipossuficiência destes em relação aos fornecedores, havendo, portanto, a necessidade de tal relação ser pautada na boa fé, na clareza de informações, na coibição e proteção dos abusos e na garantia da segurança e saúde dos consumidores.
Desta forma, verifica-se que a ANS (Agência Nacional de Saúde) elaborou uma listagem, um rol de procedimentos que obrigatoriamente deverão ser cobertos pelas operadoras de planos de saúde. Contudo, existe o argumento que tal obrigatoriedade só se importa aos contratos existentes após a vigência da Lei de Planos de Saúde, havendo assim, a aplicação do CDC somente aos contratos vigentes após a lei. Entretanto, observa-se que tal limitação ou exclusão de cobertura é uma prática ilegal, porque contraria a própria natureza do contrato de plano de saúde, que tem a finalidade de garantir a saúde integral e não parte dela. E é nesse sentido que existem posicionamentos jurisprudenciais exigindo que o plano de saúde se responsabilize pelo atendimento ou tratamento completo. (IDEC, 2010, pag.01). Entretanto, o STJ expõe que os contratos anteriores à Lei Especial de 1998 não são em princípio afetados pela nova lei e continuam a ser regidos pelo CDC, assim, a aplicação do CDC a esses contratos anteriores recebe agora uma nova luz com a definição de abuso e cláusulas abusivas trazidas pela nova lei, a qual servirá de orientação para a interpretação desses contratos. (MARQUES; 2002, p. 410-411)
Com esta nova lei, a obrigação conjunta de qualidade-adequação e de qualidade-segurança - na terminologia de Herman Benjamin- vem sendo verdadeiros deveres imperativos de qualidade que expandem para alcançar todos os que estão na cadeia de fornecedores. E assim, pode-se observar que os contratos de planos de saúde são contratos de cooperação regulados pela Lei 9.656/98 e pelo CDC, em que a solidariedade deve estar presente não só enquanto mutualidade, mas enquanto cooperação com os consumidores, observando sua hipossuficiência e vulnerabilidade. (MARQUES; 2002, p. 416-417)

2 O CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE CARACTERIZADOS COMO CONTRATOS DE ADESÃO
Como acima mencionado, verifica-se que o Código de Defesa do Consumidor aborda a proteção contratual, como previsto no Capitulo VI, tendo como seções as disposições gerais, as cláusulas abusivas e os contratos de adesão, buscando regular a proteção ao consumidor frente à vulnerabilidade do mesmo em relação a seus fornecedores de produtos e serviços.
Nesta perspectiva, antes de adentrar na concepção e regulamentação dos contratos de adesão, faz-se necessário discorrer que o CDC é a lei especial que regula as relações de consumo, no entanto, quando houver lacunas deve-se utilizar a lei geral como forma de complementar, como demonstrado claramente pelo art.7, do CDC. Destarte, nota-se a fundamental relação entre o CC/2002, que é a lei geral do sistema de direito privado, e a lei especial do CDC.
A correlação acima referida é denominada, por Claudia Lima Marques, como o "dialogo das fontes", pela qual o CC/2002 deve servir como base conceitual ao microssistema específico do CDC, naquilo que couber. Deste modo, observa-se que o CC/2002, em seu artigo 424, traz uma norma sobre cláusula abusiva, que em nada colide ou conflita com os art.51,53 e 54 do CDC, já que este apenas reforça a norma específica, afirmando que "nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio". Assim sendo, verificando a ausência de definição na lei especial, poderá ser utilizada a definição legal do sistema geral. (MARQUES; BEJAMIM; MIRAGEM, 2006, p. 50-53)
Após essa análise, pode-se aludir que o fenômeno dos contratos de adesão é cada vez mais comum na sociedade contemporânea, sendo este observado em inúmeros contratos como de seguro, operações bancárias, venda e aluguel de bens, assim como nos planos de saúde. É um contrato em que as cláusulas são estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produto ou serviços, ou seja, não havendo possibilidade ao consumidor alterar substancialmente seu conteúdo, como assim dispõe o art.54, do CDC.
Fundamental, então, descrever que os contratos de adesão têm como características o fato de sua pré-elaboração ser unilateral, sua oferta é uniforme e de caráter geral para um número indeterminado de futuras relações contratuais, e sua aceitação dar-se pelo consentimento do consumidor. No entanto, é necessário frisar que apesar de serem, em regra, elaborados pelo próprio fornecedor, o conteúdo de um determinado contrato pode ser ditado também por lei ou regulamento, sendo estes denominados "contratos dirigidos", estando os planos de saúde inseridos nesta espécie, pela qual algumas cláusulas são ditadas por Medidas Provisórias . (MARQUES, 2002, p.60)
Sendo, portanto, os contratos de plano de saúde contratos cativos de longa duração, em que se utiliza métodos de contratação em massa para fornecer serviços ao consumidor, sua família ou beneficiários, verifica-se que esses modelos de contratos foram impulsionados, principalmente, pela sua rapidez e facilidade, não havendo diferenciação entre os consumidores desta ou de outra classe social, e possibilitando a previsão de riscos por parte dos fornecedores (MARQUES, 2002, p.64) . No entanto, como será visto adiante, é essa rapidez e facilidade de contratação que propicia a inclusão de cláusulas abusivas pelo fornecedor, limitando ou tornando ausente a cobertura necessária ao consumidor dos serviços prestados pelas empresas de planos de saúde.
Deve-se, por fim, relatar que os contratos de adesão devem ser interpretados, como dispõe o art.47, do CDC, de maneira mais favorável ao consumidor, ou seja, os consumidores têm direito a interpretação mais ampla e irrestrita de seus contratos a fim de beneficiá-los por ser a parte mais fraca da relação consumeirista. E ainda, mais uma vez efetuando um diálogo sistemático com a norma geral, nota-se que o CC/2002 traz expressamente em seu art.423 que "quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas e contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente".

3 AUSÊNCIA E LIMITAÇÃO DE COBERTURA NOS PLANOS DE SAÚDE

Verifica-se que inúmeros planos de saúde estão adotando práticas abusivas que limitam seus usuários a números de internações, de consultas, proibição de alguns procedimentos, entre outros. Assim, percebe-se que tal prática de limitar o fornecimento de serviços pelos planos de saúde é considerada abusiva pelo Código de Defesa do Consumidor, que proíbe o fornecedor de "condicionar o fornecimento de serviço, sem justa causa, a limites quantitativos" e "exigir do consumidor vantagem manifestadamente excessiva" (artigo 39, I e V).
O Idec considera, porém, que a própria existência do rol de coberturas obrigatórias é questionável. Isso porque a Lei de Planos de Saúde (Lei 9.656/98) garante, em seu artigo 10, aos consumidores a cobertura dos tratamentos para todas as doenças listadas pela OMS (Organização Mundial da Saúde). Portanto, todos e quaisquer tratamentos, salvo aqueles excluídos expressamente pela Lei de Planos de Saúde como os tratamentos clínicos ou cirúrgicos experimentais e/ou para fins exclusivamente estéticos (descritos nos incisos do artigo 10 da Lei 9.656/98), que se fizerem necessários para o tratamento de doenças reconhecidas pela OMS devem ser cobertos pelos planos de saúde, independentemente de estarem ou não previstos no rol da ANS. (FERREIRA, 2010, pág.1)
Além disso, estabelece o Código de Defesa do Consumidor que são nulas as cláusulas contratuais que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, sendo presumidas exageradas aquelas que restringem direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual (artigo 51, IV e parágrafo 1º, II). Deste modo, qualquer cláusula contratual prevista em contratos de planos de saúde que exclua a cobertura de tratamentos que se fizerem necessários ao restabelecimento da saúde do consumidor evidentemente mostra-se contrária à própria natureza do contrato, sendo, portanto, nulas. Assim, as limitações impostas pelo rol elaborado pela ANS que porventura impedirem que o consumidor tenha acesso ao tratamento adequado para a doença que o acomete e acabarem, na prática, por excluir a cobertura da própria doença pelo plano de saúde podem ser questionadas, com base na Lei de Planos de Saúde e no Código de Defesa do Consumidor. (FERREIRA, 2010, pág.1)
Observa-se ainda que o inciso IV, do artigo 16 da lei 9.656/98, imputa a obrigatoriedade de constar claramente nos contratos de Planos Privados de Assistência à Saúde os eventos de cobertura e exclusão. Por se tratar este de um contrato de adesão, deveria o fornecedor assegurar a previsão contratual que se omitiu de fazer. Portanto, é extremamente necessário que as empresas fornecedoras de planos de saúde passem a inserir cláusulas que versem sobre a cobertura ou exclusão de tratamentos que venham a sobrevir à assinatura deste, sob pena de que seja tal omissão interpretada em favor do consumidor. Mas não apenas neste caso. Faz-se necessário imputar ao fornecedor dos serviços o ônus de prever contratualmente as possibilidades de cobertura, deste modo, qualquer omissão, desde que observado o princípio da razoabilidade, será interpretada em favor do consumidor de seus serviços. Releva-se a observância detalhada das hipóteses de exclusão de cobertura a serem elencadas expressamente no contrato de adesão pelo fornecedor de serviços, sob pena de recair sobre o princípio in dubio pro consumidor. (GIORDANO E RODRIGUES, 2010, p.2).
Assim, nota-se que tal limitação vem se tornando uma prática cada vez mais freqüente por parte das empresas que visam apenas à obtenção de lucros e benefícios, limitando ao máximo os direitos dos consumidores que pagam seus planos objetivando tratamentos completos e não fracionados. No entanto, verifica-se que os contratos negociados ou os de adesão devem sempre ser pautados no princípio da boa fé, com a finalidade de propiciar um contrato equilibrado e harmonioso entre as partes contratantes. Desta forma, veremos algumas jurisprudências do STJ referentes a tais limitações, uma vez que na hipótese de se caracterizando como cláusulas abusivas devem ser nulas de pleno direito.

4 O ATUAL ENTENDIMENTO DO STJ REFERENTE A AUSÊNCIA E LIMITAÇÃO DE COBERTURA NOS PLANOS DE SAUDE
Pode-se verificar, atualmente, um crescimento enorme de fornecedores de plano de saúde que se aproveitam da vulnerabilidade do consumidor para expor no contrato cláusulas limitativas de seu direito, ou ainda, a ausência da mesma. Esta realidade deve-se ao fato da natureza dos contratos de plano de saúde ser de adesão, como mencionado nos tópicos supracitados, pela qual possuem a grande vantagem de rapidez e facilidade, quando na verdade sua elaboração prévia e unilateral facilita a inserção de cláusulas abusivas que favoreçam o fornecedor.
Diante desta perspectiva que o Superior Tribunal de Justiça tem buscado tomar as decisões mais justas e adequadas, observando o CDC, referente à ausência e limitação de cobertura verificável nos contratos dos planos de saúde. Destarte, será analisado a seguir decisões do STJ relativas ao ano de 2009 e 2010, buscando-se verificar o real e atual entendimento deste Tribunal para, em posterior, analisar a efetividade dos direitos básicos do consumidor mediante as mesmas.
Faz-se mister analisar que o STJ tem entendido pela aplicação do CDC quando se verificar no contrato de plano de saúde cláusula abusiva por limitar a cobertura de determinado tratamento, havendo nestes casos restrição de direito do consumidor. Deste modo, o STJ decide pela ineficácia da cláusula limitativa de direito do consumidor quando esta não vier em destaque, como assim está disposto na seguinte decisão julgada em agosto do corrente ano:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. LIMITAÇÃO DE COBERTURA. RESTRIÇÃO DE DIREITOS. AUSÊNCIA DE DESTAQUE. CLÁUSULA INEFICAZ. 1. A jurisprudência deste Tribunal Superior prega que nos contratos de adesão, consoante o art. 54, § 4º, do CDC, a cláusula restritiva a direito do consumidor, para ser exigível, deverá ser redigida com destaque, a fim de permitir sua imediata e fácil compreensão. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 714138 / SC
, Relator(a) Ministro VASCO DELLA GIUSTINA, Terceira Turma, julgado em 24/08/2010. )

No que tange ao destaque, faz-se necessário mencionar que, ganha maior importância o dever de o fornecedor informar o consumidor sobre o conteúdo do contrato (art.46, CDC), ou seja, deverá chamar a atenção do consumidor para as estipulações desvantajosas para ele, em nome da boa-fé que deve presidir as relações de consumo. (NERY JR, 2007, p. 637)
Ainda quanto à limitação, percebe-se que é abusiva a cláusula que limita o tempo de cobertura para internação, tornando-se esta nula de pleno direito na medida em que não faz sentido estipular contratualmente um prazo de recuperação do paciente, quando, por exemplo, o segurado é internado sem ao menos saber o que tem, fugindo assim do propósito do contrato que é assegurar os meios de cura do paciente. Esta matéria é pacifica no STJ, possuindo sua concepção reforçada pela súmula 302, deste Tribunal, que proíbe a fixação de limites para o período de internação. Pode-se, ainda, inserir nesta análise o posicionamento do STJ de considerar abusiva a cláusula que limite a quantidade de sessões de quimioterapia. Ambas os casos de limitações de cobertura possuem decisões favoráveis ao consumidor, como a seguir expostos:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. LIMITE DE INTERNAÇÃO. ABUSIVIDADE DA CLÁUSULA. NULIDADE DE PLENO DIREITO. ART. 51, INC. IV, DO CDC. PRECEDENTES. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. É nula de pleno direito a cláusula, inserida em contratos de plano ou de seguro-saúde, que limita o tempo de cobertura para internação. Matéria pacificada na Corte. 2. Da leitura das razões expendidas na petição de agravo regimental não se extrai argumentação relevante apta a afastar os fundamentos do julgado ora recorrido. Destarte, deve a decisão ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 535447 / RS, Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 09/02/2010)

DIREITO CIVIL. PLANOS DE SAÚDE. COBERTURA. LIMITAÇÃO CONTRATUAL/ESTATUTÁRIA AO NÚMERO DE SESSÕES DE QUIMIOTERAPIA. IRRETROATIVIDADE DA LEI Nº 9.656/98. RELAÇÃO DE CONSUMO. NATUREZA JURÍDICA DA ENTIDADE. DESINFLUÊNCIA. ABUSIVIDADE DA RESTRIÇÃO. I - "A relação de consumo caracteriza-se pelo objeto contratado, no caso a cobertura médico-hospitalar, sendo desinfluente a natureza jurídica da entidade que presta os serviços, ainda que se diga sem caráter lucrativo, mas que mantém plano de saúde remunerado" (Resp 469.911/SP, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJe 10/03/2008). II - Reconhecida a incidência do Código de Defesa do Consumidor, impende reconhecer, também, a abusividade da cláusula contratual/estatutária que limita a quantidade de sessões anuais de rádio e de quimioterapia cobertas pelo plano. Aplicação, por analogia, da Súmula 302/STJ. Recurso Especial a que se nega provimento. (REsp 1115588/SP, Ministro SIDNEI BENETI (1137), TERCEIRA TURMA, julgado em 25/08/2009)

No que se refere à ausência ou exclusão de cobertura, nota-se que a jurisprudência do STJ tem aplicado o art.47 com muita tranqüilidade, quando é possível verificar que a cláusula de exclusão de cobertura para doenças epidêmicas, como a AIDS, constitutiva de contrato de adesão, unilateralmente imposta pelo fornecedor, deve ser interpretada de maneira mais favorável ao consumidor. Isso ocorre pela vigência do principio da interpretatio contra stipulatorem, pela qual, havendo cláusulas ambíguas, vagas ou contraditórias, a interpretação se faz contra o estipulante (NUNES, 2010, P.691-693). Necessário, ainda, frisar que o plano de saúde pode estabelecer quais doenças estão sendo cobertas, mas não que tipo de tratamento está ao alcance para a respectiva cura. Logo, a seguradora não esta habilitada a limitar as alternativas possíveis para restabelecer a saúde do segurado, cabendo apenas ao médico determinar qual o tipo de tratamento adequado para melhorar a saúde do consumidor. Veja-se abaixo, ambos os casos em questão:
CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO. PLANO DE SAÚDE. AIDS. EXCLUSÃO DE COBERTURA. CLÁUSULA POTESTATIVA. PRECEDENTES. PROVIMENTO. I. É abusiva a cláusula contratual inserta em plano de assistência à saúde que afasta a cobertura de tratamento da síndrome de imonudeficiência adquirida (AIDS/SIDA). II. As limitações às empresas de prestação de serviços de planos e seguros privados de saúde em benefício do consumidor advindas com a Lei 9.656/98 se aplicam, em princípio, aos fatos ocorridos a partir de sua vigência, embora o contrato tenha sido celebrado anteriormente, porquanto cuida-se de ajuste de trato sucessivo . Precedente.
III. Recurso especial provido. (REsp 650400 / SP, Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 22/06/2010 ).

DIREITO CIVIL. CONTRATO DE SEGURO EM GRUPO DE ASSISTENCIA MEDIDO-HOSPITALAR, INDIVIDUAL E FAMILIAR. TRANSPLANTE DE ORGÃOS. REJEIÇAO DO PRIMEIRO ORGÃO. NOVO TRANSPLANTE. CLÁUSULA EXCLUDENTE. INVALIDADE.
- O objetivo do contrato de seguro de assistência médico-hospitalar é o de garantir a saúde do segurado contra evento futuro e incerto, desde que esteja prevista contratualmente a cobertura referente à determinada patologia; a seguradora se obriga a indenizar o segurado pelos custos com o tratamento adequado desde que sobrevenha a doença, sendo esta a finalidade fundamental do seguro-saúde. - Somente ao médico que acompanha o caso é dado estabelecer qual o tratamento adequado para alcançar a cura ou amenizar os efeitos da enfermidade que acometeu o paciente; a seguradora não está habilitada, tampouco autorizada a limitar as alternativas possíveis para o restabelecimento da saúde do segurado, sob pena de colocar em risco a vida do consumidor. (REsp 1053810 / SP, Relator(a) Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/12/2009)

Matéria relevante a mencionar diz respeito às cláusulas previstas nos contratos de plano de saúde que excluem a cobertura para tratamento mais moderno. Neste caso, apesar do contrato ter sido firmado em data anterior a lei 9656/98 (que prever expressamente a cobertura para a cirurgia de redução de estômago), a jurisprudência do STJ se orienta no sentido de proporcionar ao consumidor o tratamento mais moderno e adequado, em substituição ao procedimento obsoleto previsto no contrato. Assim dispõe a seguinte decisão:
CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COMINATÓRIA CUMULADA COM PEDIDO DE COMPENSACAO POR DANOS MOARIS. PLANO DE SAÚDE FIRMADO EM 1992. RECUSA DE COBERTURA DE GASTROPLASTIA REDUTORA, CONHECIDA COMO "CIRURGIA DE REDUCAO DE ESTOMAGO", SOB ALEGACAO DE AUSENCIA DE COBERTURA. Operação recomendada como tratamento médico para gravíssimo estado de saúde e não com intuito estético. Técnica operatória que passou a ser reconhecida nos meios médicos brasileiros em data posterior à realização do contrato. Acórdão que julgou improcedentes os pedidos com base na necessidade de manutenção da equivalência das prestações contratuais. Extensão da cláusula genérica relativa à cobertura de 'cirurgias gastroenterológicas' para a presente hipótese. (REsp 1106789 / RJ, Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2009)

Portanto, pode-se observar que o STJ tem se posicionado no sentido de aplicar o CDC quando se verificar a ausência ou limitação de cobertura nos planos de saúde, sempre interpretando as cláusulas ambíguas ou contraditórias em favor do consumidor hipossuficiente.

4.1 O efeito das decisões do STJ com relação à defesa do consumidor
Em princípio, é possível verificar que, para uma melhor compreensão do assunto abordado, referente ao posicionamento do STJ sobre a ausência e limitação de cobertura nos planos de saúde, precisou-se descrever a natureza do contrato de plano de saúde, sendo esta um contrato de adesão pela qual tem sido utilizado abundantemente pela sociedade contemporânea, e sua correlação com o CDC. Neste momento faz-se indispensável discorrer sobre a efetividade das decisões do STJ diante dos direitos básicos do consumidor.
Diante das decisões acima referenciadas, além dos inúmeros outros julgados do STJ, pode-se relatar que os direitos básicos do consumidor estão sendo efetivados, buscando-se tutelar o consumidor como parte mais frágil da relação de consumo, e considerando este um sujeito leigo, que quase sempre desconhece o significado das cláusulas previstas nos contratos de plano de saúde a que se aderem.
Observa-se, desde então, que as decisões do STJ têm gerado efeitos quanto aos direitos básicos do consumidor previstos no CDC, em seu art.6, sendo eles a efetivação do direito a informação clara e adequada, quando os contratos de plano de saúde inserem cláusulas limitativas do direito do consumidor que não se encontram em destaque e o STJ decide a favor do consumidor concretizando esse direito; a busca pela proteção do consumidor contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento dos serviços prestados pelo fornecedor, fato este que vem sendo rechaçado pelo referido Tribunal em favor do consumidor; a real prevenção e reparação dos danos patrimoniais e morais mediante as decisões que obrigam os fornecedores dos planos de saúde a cumprirem as normas relativas ao consumidor sob pena de serem condenados ao pagamento dos danos causados, entre outros direitos que se tornam efetivos.
Mediante as decisões do STJ, percebe-se a real proteção a defesa do consumidor sob a alegação de ausência ou limitação de cobertura nos planos de saúde, buscando sempre resguardar seus direitos essenciais para que não haja violação a saúde e segurança do mesmo. Assim sendo, nada mais coerente o fato de que as decisões do STJ têm influenciado de forma fervorosa a efetivação dos direitos do consumidor, pela qual se tem verificado o cumprimento do CDC sempre em benefício do consumidor, vindo este a se tornar um sujeito de direitos e almejando o recuo das cláusulas abusivas nos contratos de adesão. Deste modo, verifica-se que as decisões benéficas ao consumidor por parte do STJ vêm diminuindo cada vez mais a incidência de contratos abusivos, uma vez que os fornecedores evitando a instauração de processos judiciais tentam ao máximo encontrar um meio termo que o beneficiem e não acarretem prejuízo algum para os consumidores de seus produtos ou serviços.
Portanto, através de toda essa análise referente aos contratos de plano de saúde, que se caracterizam como contratos de adesão, associado às noções previstas no CDC, e as decisões referentes aos anos de 2009 e 2010, pode-se concluir que o STJ tem entendido pela defesa do consumidor quando verificável que a ausência ou limitação de cobertura refere-se a cláusula abusiva limitativa do direito do consumidor. Logo, suas decisões tem tornado cada vez mais efetivo os direitos básicos do consumidor objetivando resguardá-los para fazer valer o direito.

CONCLUSÃO
Diante do exposto atinge-se a conclusão que, apesar da natureza dos contratos de planos de saúde ser de adesão, aderindo os consumidores pela sua rapidez e facilidade, tais contratos por serem de elaboração prévia e unilateral constituem fáceis meios de inserção de cláusulas abusivas, limitando ou excluindo cobertura de tratamento a que o consumidor possui o direito. Diante desta realidade que o Superior Tribunal Federal tem atuado, nos últimos dois anos, de modo a efetivar os direitos do consumidor dos serviços dos planos de saúde, decidindo a favor dos mesmos sempre que se verifica a presença de cláusulas abusivas ao consumidor leigo, e ainda, atuando, através de suas decisões, de modo a demonstrar aos fornecedores de plano de saúde que suas condutas são violadoras do direito básico do consumidor e buscando reduzir esse incidente, aplicando-se o CDC para fazer valer os direitos dos segurados.

REFERENCIA

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ROGRIGO, Giordano e ROGRIGUES Bruno. Planos de saúde, coberturas e novos tratamentos. Disponível em: http://www.rhcentral.com.br/artigos/artigo.asp?interesse=4&cod_tema=2524. Acesso em: 19 de out. de 2010