1 - INTRODUÇÃO

A falência é um antigo instituto intimamente ligado à evolução do próprio conceito de obrigação.
Inicialmente, o devedor respondia por suas obrigações com a liberdade e, algumas vezes, com a própria vida.
Na fase mais primitiva do direito romano, antes da codificação da Lei das XII tábuas, o liame entre credor e devedor admitia a addicere, que era a adjudicação do devedor insolvente. Este permanecia em estado de servidão com o credor por um período de até sessenta dias. Caso o débito não fosse solvido nesse período, o credor podia vendê-lo como escravo, ou até mesmo matá-lo, repartindo seu corpo segundo o número de credores.
Esse sistema perdurou até a promulgação da Lex Poetelia Papiria. Esta introduziu a execução patrimonial no direito romano, restando abolido o desumano critério de responsabilidade pessoal.
Posteriormente, com a elaboração de novas leis, foram surgindo diversas formas de execução patrimonial dos bens do devedor. Estes poderiam ficar sob a guarda de um curador ou serem cessionados ao credor, que podia vendê-los separadamente.
Já na Idade Média, com a expansão comercial, o Estado passa a intervir, condicionando a atuação dos credores a uma rígida disciplina judiciária. Nessa fase, a falência é vista como um crime, um delito, cercando-se o falido de infâmia. As penas impostas a eles iam da prisão à mutilação.
Surge daí a expressão falência, derivada do latim fallere, significando enganar, fraudar.
Nesse período medieval, não existia diferença entre devedor comerciante e civil. Ambos eram tratados com a mesma rigidez.
As leis italianas espalharam-se pelo continente europeu. Na França, com o Código Napoleônico, apesar de serem impostas ao falido diversas restrições, ocorreu uma evolução do instituto falimentar, pois apenas o devedor-comerciante poderia ser considerado falido. Diferenciava-se o devedor civil do falido, que só poderia ser o devedor empresário.
Com o passar do tempo, abrandaram-se os rigores da legislação, ocorrendo uma distinção entre devedores honestos e desonestos, facultando-se àqueles os favores da moratória, com o aperfeiçoamento da concordata, e assumindo a falência um caráter econômico-social.
A empresa passou a ter sua importância normatizada em diversas leis. Reconheceu-se juridicamente sua função social geradora de emprego, renda e riqueza para o Estado. Assim, antes de declarar a falência do devedor, o Estado possibilitava um acordo entre este e seus credores, com o objetivo de manter a atividade comercial, tão benéfica a toda sociedade. Isso era a chamada concordata, que foi aperfeiçoada em nossa legislação, passando a se chamar recuperação judical.
Em nosso país, já surgiram diversas legislações que abordaram o instituto da falência, passando-se por várias fases: do Código Comercial de 1850 à novíssima Lei 11.101 do ano de 2005.
No quadro da atual legislação falimentar brasileira, nossa lei tem como princípio fundamental a recuperação econômica da empresa, permitindo a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores, dos interesses dos credores e dos tributos estatais, ao promover a preservação da empresam sua função social e o estímulo à atividade econômica.

2 - CONCEITOS E NATUREZA JURÍDICA DA FALÊNCIA

Primeiramente, na ideia de Amador Paes de Almeida (2009), podemos conceituar falência como "processo de execução coletiva contra devedor insolvente". Pode-se notar que, nesse conceito, encontra-se ressaltado o aspecto adjetivo ou procedimental da ideia de falência, uma vez que descreve a falência como um processo (aspecto adjetivo), um procedimento administrativo de execução coletiva.
Outro pensamento sobre falência, agora do autor Gladston Mamede, é aquele que a define como:
O procedimento pelo qual se declara a insolvência empresarial (insolvência do empresário ou sociedade empresária) e se dá solução à mesma, liquidando o patrimônio ativo e saldando, nos limites da força deste, o patrimônio do falido (2009).
Mais uma vez percebe-se a predominância do aspecto adjetivo do conceito de falência, visto que, mais do que compreender a falência como um estado, um fato, da existência das pessoas, deve-se compreendê-la igualmente como um processo judiciário e administrativo. Logo, percebe-se um caráter misto (material e adjetivo) do conceito de falência.
Outro juízo de falência diz que esta "é um processo judicial de execução concursal do patrimônio do devedor empresário". Vê-se que predomina o aspecto adjetivo, processual, do conceito falimentar, ao afirmar que ela é um instrumento da realização de um direito subjetivo do credor do devedor empresário. Essa noção advém dos ensinamentos de Fábio Ulhoa (1997).
De acordo com Rubens Requião (1993), a falência "é a solução judicial da situação jurídica do devedor-comerciante que não paga no vencimento obrigação líquida". Neste caso, percebe-se que está caracterizado o aspecto material do conceito de falência.
Trazendo em seu bojo um conceito de natureza adjetiva, administrativa, Maximilianus Führer (2005) leciona que "a falência (...) é um processo de execução coletiva, em que todos os bens do falido são arrecadados para uma venda judicial forçada, com a distribuição proporcional do ativo entre os credores".

3 - Conclusão

A partir de uma análise dos conceitos desenvolvidos ao longo deste trabalho, pode-se perceber a importância de se ressaltar aspectos materiais e processuais ou procedimentais dentro do conceito de falência.
No intuito de entender esse instituto, chegamos ao seguinte conceito: falência é uma sequência de atos processuais que, primeiramente, declaram a insolvência do devedor-empresário, o qual não pode adimplir as obrigações contraídas no âmbito das atividades comerciais, catalogando, a posteriori, os ativos e passivos do mesmo, impondo direitos e deveres a ele e promovendo sua execução coletiva, no intuito de resguardar os interesses dos credores, de sanear o meio empresarial, proteger a economia nacional e afastar o devedor se suas atividades para preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens. Assim, nota-se que a falência é um instituto de natureza híbrida, revelando ser um processo de execução, mas possuindo inúmeros preceitos de direito material.
Enfim, apesar de sua natureza sui generis, não se pode estabelecer que na falência existe a prevalência de normas processuais sobre as normas objetivas, tampouco destas sobre as administrativas.

4 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial, 18ª Edição. São Paulo: Saraiva, 1997.

FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Roteiro das Falências, Concordatas e Recuperações. 20ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

MAMEDE, Gladston. Falência e Recuperação de Empresas, 3ª Edição. São Paulo: Atlas S.A., 2009.

PAES DE ALMEIDA, Amador. Curso de Falência e Recuperação de Empresa, 25ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2009.

REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar. 15ª Edição. São Paulo: Saraiva, 1993.