O texto apresenta de forma breve a origem da palavra "pirataria", apresenta os períodos em que a pirataria foi utilizada pelas diferentes civilizações, e o ponto em que o trabalho mais se detém é nos "anos de ouro" da pirataria. Abordando as dificuldades da "vida no mar". Por fim são apresentadas formas em que a pirataria ainda hoje é praticada.

PIRATARIA, ONTEM E HOJE.

 

Hoje entende-se por pirataria como reprodução e distribuição não autorizada de bens, sejam esses materiais ou não-materiais. Porém na sua origem a palavra pirata vem do grego peiratès, que tem o significado de “aquele que procura fortuna no mar1.

A prática da pirataria tem suas origens desde que o comércio passou a se realizar pelo mar, o desenvolvimento do comércio marítimo trás a tona os “bandoleiros do mar2. Já nos tempos dos fenícios, piratas atacavam em busca de butim ou faziam reféns para exigir um resgate. No século VIII, os sarracenos atacando navios genoveses e venezianos. No século IX os Vikings, com seus Drakkars, atacam navios da liga Hanseática3. Na Idade Média a pirataria bérbere, sobre as ordens do Sultão de Constantinopla. Onde surge a figura do corsário – aquele que outorga uma licença, a patente do corso. Os turcos açoitaram navios cristãos e capturaram reféns.

 

Entre los cativos hay que recordar al proprio Cervantes, que fue redimido em Argel por frailes trinitarios. El genial Cervantes reflejará su propria experiencia em su obra “ Los baños de Argel” y los piratas están también presentes em algunos capítulos del Quijote”. 4

 

Se a pirataria existe desde que o comercio marítimo se desenvolveu, seu auge pode ser apresentado como “Era de Glória da pirataria” o período entre os séculos XVI e XVIII. Esse fato se dá pelo desenvolvimento do comércio em escala mundial, ou seja, a chegada dos europeus na América, com a extração de metais preciosos, em um primeiro momento, nas colonias espanholas, e o processo de colonização instaurado seguidamente, fazem com que o eixo comercial, até então no Mediterrâneo, passe a se dar em maior escala no Atlântico.

Como motivações para o auge da pirataria na idade moderna, temos o desenvolvimento das tecnologias de navegação, que proporcionaram a possibilidade de viagens mais longas e posteriormente a “descoberta” do Novo Mundo. A expansão da economia européia devido ao processo de colonização, e a mudança nas estruturas econômicas. A dificuldade da organização de um controle sobre o fluxo de mercadorias transportadas via oceano. Exemplifique-se aqui o caso espanhol, com 2,7 milhões de Km2 e com mais de mil ilhas era praticamente impossível, com os meios de navegação e comunicação existentes até então, de controlar o contrabando e o saque de mercadorias no mar.5 Entre uma das causas apontadas sobre o corso e a pirataria, está o Tratado de Tordesillas6, onde as demais nações européias discordam da decisão. Reis europeus enviam então suas expedições a descobrir novas terras para enriquecer, a exemplo do que estava acontecendo com as monarquias ibéricas. Porém “existe uma forma mais rápida e fácil de enriquecer: o roubo”.7

A justificativa de que os monarcas e membros influentes das diversas nações européias tenham ficado descontentes com a decisão imposta pelo Tratado de Tordesilhas e isso seja o estopim para a prática da pirataria parece válida. Muito aceita pelos livros didáticos, como exemplo temos a explicação de Gilberto Cotrim:

 

Interessados também em descobrir novos caminhos para a Índia, franceses, ingleses e holandeses lançaram-se às navegações marítimas,(...) os navegadores passaram a explorar e a ocupar parte da América do Norte, além de praticar a pirataria.

Na Inglaterra, a pirataria foi oficializada. A monarquia inglesa autorizava ataques e pilhagens contra navios de nações inimigas, desde que os piratas(chamados de corsários) dividissem lucros dos saques com o governo inglês.”8

 

Com a mesma explicação temos o livro “Historia das Sociedades: das sociedades modernas às sociedades atuais” de Rubim Aquino:

 

... franceses e ingleses procuraram novas rotas para o Extremo Oriente, buscando passagens a nordeste (norte da Eurásia) e a noroeste (norte da América)...

A ineficácia dessas rotas levou-os a renunciar a novas empresas exploradoras, concentrando-se em empreendimentos mais lucrativos, como atividades corsárias e de pirataria, incluindo-se o contrabando.”9

 

Podemos perceber então que vários fatores contribuíram para a “Era de Glória” da pirataria. Incluí-se as medidas de proteção tomadas pelas potências Ibéricas para regular o comércio entre as suas colonias, onde as viagens de ida e volta estavam concentradas nas mãos de mercadores e instituições a serviço da coroa. O tão conhecido Pacto Colonial. Onde os estrangeiros ficavam à margem do comércio.

Fazem parte das motivações que levaram muitos homens a se aventurar “por mares nunca antes navegados” , causas religiosas. Como em alguns casos ingleses em que as perseguições da inquisição espanhola serviram de justificativa para se empreender contra a coroa espanhola. A busca por terra e riqueza eram aspirações de homens, tanto ricos quanto pobres.

Quem eram os piratas naquela época? Ex-soldados, mercadores, “e uma malta de escorraçados de suas moradias nos campos, pela fome ou pela peste”10. As aspirações por ascensão profissional e experiência faziam com que pilotos se candidatassem a tripulação de um navio pirata. Fidalgos dispostos a servir o rei, à igreja, e às suas próprias necessidades financeiras se incluíam aos marujos piratas, e estrangeiros das mais variadas origens.

Esse recrutamento poderia se dar de modo voluntário, em tempos em que sobreviver mesmo em terra poderia ser difícil, esperança de riqueza eram incentivos àqueles que pretendiam se aventurar. Porém o recrutamento forçado por parte da Marinha, como o exemplo inglês de “press gang”, era também utilizado11.

Como expõe Pérez em seu artigo, “... no siempre pueden los lobos o ladrones del mar ser asimilados a simples bandidos, pues muchos de ellos hacían parte de las elites de sus países de origem”.12

Apesar da imagem romantizada que temos dos piratas, com tapa-olho, perna-de-pau, com uma garrafa de rum na mão, e o capitão com um papagaio nos ombros, têm seus pontos de realidade, porém a vida no mar não era nada fácil.

“Uma história geral dos roubos e crimes de piratas famosos” é uma obra publicada por volta do ano de 1724, pelo inglês Charles Rivington, de autoria de Charles Johnson que é alvo de divergências sobre sua identidade, porém, é a primeira fonte de referência sobre hábitos e comportamentos dos piratas.

Entre as mazelas enfrentadas por marujos em alto-mar estavam as doenças, tifo, escorbuto, hérnias. Uma possível amputação ou uma queda poderia ocasionar a morte. Tempestades, naufrágios e batalhas em alto-mar estavam entre os perigos. O alcoolismo, incitador de brigas, acidentes ou casos de insolação estavam na lista. E em terra firme, além das bebidas, as prostitutas eram o destino de muito do dinheiro dos marujos, o que contribuía para a disseminação de doenças sexualmente transmissíveis13.

Como já foi explicado no início, o termo pirata significa “aquele que busca fortunano mar”. Durante a idade moderna esse termo designou “marinheiros que viviam de pilhagens de navios ou de saques a cidades litorâneas”.14 Outros termos também foram corsário, bucaneiros e flibusteiros. Cabe aqui uma pequena explanação acerca de cada um desses.

Corsário também conhecido como “Gentleman pirate seriam “piratas que recebiam de seus soberanos cartas de corso, tendo liberdade para assaltar e aprisionar embarcações e povoações inimigas do estado pelo qual disponibilizavam seu serviços”.15

Bucaneiros ou “boucaniers”, era designação para os primeiros colonizadores da ilha de Hispaniola, atual Haiti. “Homens que se dedicavam à caça de porcos e gado selvagem. Exportavam couro e a carne moqueada no “bouc” ,uma espécie de grelha usada para preservar a carne para a venda e consumo”.16

Flibusteiros do inglês free-booters ou fly-boats, barcos voadores, barcos rápidos, navegadores livres.

Bucaneiros “formaram um mundo à parte na ilha de Hispaniola, logo depois transferido para Tortuga”17. Além de Tortuga, ilha no mar do Caribe, Port Royal, na atual Jamaica, foram pontos de encontro e a base de muitos navios piratas. Port Royal recebeu o “título” de “Sodoma do Novo Mundo” em 1660, por serem a maioria de seus habitantes piratas, promotores de jogos de azar e prostitutas.18

As práticas de corso apesar de “legais” em termos jurídicos eram utilizadas em momentos de conflito entre nações européias. Em momentos de paz, a prática era considerada “ilegal”, o que ocasionou posteriormente a dificuldade, por parte dos governos, em conter saques e pilhagens dos “piratas”, outrora corsários.

 

Com o fim das guerras, os corsários e os piratas, para os governantes, não tinham mais serventia alguma, devido ao elevado custo de manter suas frotas, acabou levando os soberanos a anularem as antigas comissões e autorizações das práticas das apreensões marítimas.”19

 

Medidas de contenção para as práticas de banditismo foram sendo tomadas. O perdão dos crimes de pirataria para aqueles que se entregassem, e também a transformação de “perturbadores da paz em preservadores da ordem”20, são exemplos dessas medidas. Como exemplo temos as palavras de Jonhson:

 

(...) quando a multidão de desocupados ameaça a segurança pública. Os governantes costumam convocar “patrulhas de bando”, empregando bandidos e desordeiros aposentados e arrependidos para percorrer as ruas da “city” e controlar seus semelhantes e ex-parceiros de bagunça. As quadrilhas de delinqüentes, então perde seus homens mais destacados para cargos oficiais nas patrulhas e se dissolvem.”21

 

Piratas e corsários que construíram”, ou ajudaram a construir, as fortunas de seus soberanos “foram sendo excluídos gradualmente”. E durante o século XVIII a perseguição se generalizou.22

Para coibir a prática da pirataria, foram criados aparatos jurídicos – leis, como por exemplo o perdão para crimes de pirataria – como já foi citado – àqueles que se entregassem às autoridades, porém para homens acostumados a vida no mar, mesmo essas se mostraram ineficazes. Como pode ser observada no trecho seguinte:

 

O modo de vida que tantos marinheiros estavam habituados, logo, estava repentinamente interditada por lei. Grande parte destes marinheiros estava composta por soldados, os quais incorporaram seus conhecimentos e disciplina militar ao modo de vida marítimo, que, para garantir seu sustento, facilmente prosseguiram operando por conta própria.”23

 

A “Era de Glória” da pirataria se estendeu até o século XVIII, porém isso não marca o fim do ato da pirataria. Como podemos observar a pirataria de hoje, a “falsificação” de produtos ocorre lado a lado com a pirataria marítima, como casos que ocorrem atualmente no Golfo do Áden, na costa da Somália, na costa da Nigéria(Oceano Atlântico), Estreito de Malacca (Oceano Índico), no mar da China Meridional e Indonésia.

Portanto percebe-se a dificuldade em estabelecer um início e um fim para a pirataria, porém, deve-se levar em consideração cada contexto, para não cairmos nos males do anacronismo, cada época teve seu modo de comerciar pelo mar, e conseqüentemente teve os seus “piratas”, então, ao se tratar de um tema como esse deve-se precaver para que não seja uma mera narrativa sem fundamento.

 

 

 

 

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

LIVROS:

 

AQUINO, Rubim Santos Leão de. História das Sociedades: Das Sociedades Modernas às Sociedades Atuais. 36ª ed. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1997.

 

BERUTTI, F.C. FARIA, R. M. MARQUES, A. M. História Moderna através de textos. 11 ed. São Paulo: Contexto, 2008.

 

COTRIM, Gilberto. História Global – Brasil e Geral – volume único. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

 

REZENDE FILHO, Cyro de Barros. História econômica geral. 7 ed. São Paulo: Contexto, 2003.

 

PERIÓDICOS:

 

ADKINS, Roy. ADKINS, Lesley. Marujos vida à deriva. BBC História, ANO 1, nº 06, São Paulo, 2009.(p.44 – 49)

 

PÉREZ, Milton Zambrano. Piratas, Piratería y Comercio Ilícito em el Caribe: La Visión del Otro (1550 – 1650). História Caribe. Universidad del Atlántico. Barranquilla, Colombia. Nº12, 2007. (p.23 – 56)

 

SOALHEIRO, Bárbara. O terror nos mares. Aventuras na História. Ed. 07, março, São Paulo: Abril, 2004.(p.22 – 29)

 

MONOGRAFIA:

 

NETO, Nelson Rocha. Piratas e Corsários na Idade Moderna. Universidade Tuiuti do Paraná. História. 2009.

 

SITES:

 

Piratas,corsários, bucaneiros e flibusteiros: os terrores dos sete mares. Disponível em :

http://www.gurpzine.com.br/2010/07/pirata-corsarios-bucaneiros-flibusteiros-e.html acesso em 15/11/2010.

 

1(NETO, 2009, p. 14)

2(op. cit. , 2009, p. 01)

3Associação formada pelas cidades comerciais do norte europeu destinada a proteger os interesses mercantis e marítimos em comum, também denominada Hansa.(REZENDE, 2003, p. 62)

4(JOSA, p.05)

5(PÉREZ, 2007, p. )

6Tratado que tem sua origem no estabelecimento, através da Bula Inter Coetera, pelo Papa, de que as terras da América seriam divididas entre a Coroa Portuguesa e a Espanhola, sendo estabelecida a divisão em que as terras a leste pertenceriam a Portugal e as terras a Oeste a Espanha. Sendo a divisão uma linha imaginária que cortava o novo continente verticalmente na medida de 100 léguas a partir de Cabo Verde. Porém um novo acordo foi feito e a linha passou a ser na distancia de 370 léguas de Cabo Verde, no Tratado de Tordesilhas. Ver COTRIM, 2005, p. 174)

7(JOSA, p.)

8(COTRIM, 2005, p.174)

9(AQUINO, 1997, p.24)

10(NETO, 2009, p.16-7)

11(ADKINS, 2009, p. 46)

12(PÉREZ, 2007, p. 24)

13(ADKINS, 2009, p. 48-9)

14(NETO, 2009, p.14)

15(op. cit. p. 14)

16(op. cit. p. 14)

17(op. cit. p. 15)

18Ver Piratas, corsários,bucaneiros e flibusteiros: os terrores dos sete mares.(SITE)

19(NETO, 2009, p.25)

20(op. cit. p.26)

21(JONHSON apud NETO, 2009, p.26)

22(op. cit. p. 26)

23(op. cit. p. 25)