RESUMO


O presente estudo aborda a importância do enfermeiro na educação do paciente portador de trauma raquimedular e do familiar-cuidador para atuar na prevenção das complicações decorrentes da lesão medular, e na aplicação de práticas a serem realizadas pelo cuidador-familiar para prevenir as complicações. O objetivo principal deste trabalho é elaborar um roteiro (cartilha) com instruções que orientem a família na realização dos cuidados do paciente com TRM de modo a reduzir ao mínimo possível as principais complicações decorrentes do trauma raquimedular. Para isso, é apresentada uma visão geral sobre a fisiopatologia, as complicações do trauma raquimedular e a partir das principais complicações são colocados os cuidados que podem ser prestados pelo familiar-cuidador com objetivo de prevenção das mesmas. O procedimento utilizado está arrolado numa pesquisa bibliográfica de caráter exploratório do tipo descritivo, que através da captura e reunião de dados, tornou possível elaborar um roteiro com cuidados e práticas, a devida descrição de como realizá-las, para prevenir as principais complicações do portador de trauma raquimedular. Nesse contexto, fica evidente o papel fundamental que o enfermeiro tem nesse delicado momento de transição. Está nas mãos desse profissional transmitir de modo adequado a orientação ao paciente e ao familiar-cuidador na promoção do auto-cuidado com objetivo de prevenir as complicações inerentes a lesão medular e promover ao paciente melhor qualidade de vida.


PALAVRAS- CHAVE: Trauma raquimedular. Cuidados de enfermagem. Período pós-hospitalar.

ABSTRACT


This study refers to the importance of patient education nurse in with trauma spinal injury and family caregiver to aid in the prevention of complications arising from the spinal cord and ducts to be performed by the caregiver-familiar for prevention of complications. The general objective of this work is to draw up a roadmap of guidelines guided family in achievement of care for the patient with TRM for reduction of major trauma spinal injury complications. To this are covered the pathophysiology, complications of trauma spinal injury and from the main complications are placed the care may be provided by the family caregiver with the objective of prevention. The procedure used is arrolado a bibliographic search of exploratory descriptive character, that type through the capture of data, it might put together a roadmap of care for the major complications of the individual with trauma spinal injury, describing how to perform them. Thus, the nurse has key role in guiding the patient and family caregiver for promoting self-care with goal of preventing complications inherent in the spinal cord.


Keywords: Trauma spinal injury. Nursing care. Period after hospital.


1. INTRODUÇÃO


Frente à modernização e a grande urbanização que vem ocorrendo nos últimos tempos, temos os agravos à saúde decorrentes de causas externas, tais como os acidentes automobilísticos e agressões por arma de fogo como uma das principais causas de traumatismo raquimedular.
Com um espantoso avanço nas estatísticas, o trauma raquimedular por acidentes automobilísticos e arma de fogo tem maior incidência no sexo masculino predominando na faixa etária de 20 a 40 anos, tendo ainda incidência no segmento tóracico-lombar e o cervical por estarem mais expostos a riscos e violência. Já nos internamentos por quedas ocorre um aumento na proporção de idosos e da população feminina. (CAMPOS et al, 2008, p.88).
O Trauma raquimedular é uma agressão à medula espinhal que pode causar danos neurológicos tais como: alterações das funções motoras, sensitivas e autônomas psicossomáticas, ocasionando uma grave síndrome incapacitante com sérias limitações de algumas funções orgânicas, ocorridas porque a medula também se caracteriza como centro regulador de funções como a respiração, circulação, controle da bexiga, controle térmico e atividade sexual (FARO, 1996, p.175 apud BRUNI et al, 2004, p.72).
Por tudo acima descrito o trauma raquimedular é considerado uma das formas mais graves dentre as lesões incapacitantes que podem acometer o homem e que interferem diretamente na qualidade de vida desses pacientes, pois precisam encarar as dificuldades oriundas do trauma, não apenas físicas e retornar a sua vida social e ao convívio da família, estando assim preparados para uma nova realidade que implica em aceitação, perseverança e preparo tanto do paciente quanto de sua família para superar os momentos iniciais e readequar seus ritmos de vida no que diz respeito à promoção da saúde, evitando complicações posteriores (CAMPOS et al, 2008, p.90).
Devido a essas dificuldades de reintegração, surge a necessidade da readaptação a uma nova condição de vida, mediada pela reabilitação que para Vall (2008, p.2), é um meio de ajudar o paciente a conhecer seus limites e superá-los, atingindo seu nível máximo de independência, e promovendo uma melhora na qualidade de vida, e por ser multidisciplinar abrange conhecimentos e procedimentos que auxiliam os pacientes proporcionando melhorias funcionais, físicas, emocionais e sociais.
Nesse aspecto destacamos a função da enfermagem que tem como papel fundamental, a implementação de assistência especializada visando orientar indivíduo-família frente ao processo de reabilitação, na qualidade de educador, ressaltando a importância do cuidado tanto do próprio paciente quanto das pessoas que o rodeiam como família e amigos, um a vez que estas pessoas serão fundamentais na continuidade da reabilitação após a alta hospitalar.
A escolha do tema surgiu das experiências acadêmicas vivenciadas durante o curso de graduação em enfermagem, na prática hospitalar da disciplina de clínica médica, quando percebemos a importância da enfermagem na preparação do paciente e família para dar continuidade ao processo de reabilitação iniciado durante a internação hospitalar. Consideramos que essa pesquisa é importante, porque coloca em destaque como a família deve ser orientada pela enfermagem para dar continuidade aos cuidados iniciados no hospital, visando melhoria na qualidade de vida do paciente com seqüelas incapacitantes do TRM.
A complicada tarefa do cuidado a um paciente com lesão medular e o valor do estímulo da díade paciente-família/cuidador leva ao seguinte questionamento: Como o familiar pode ser orientado no cuidado a um paciente com TRM, visando redução das complicações inerentes ao trauma evitando infecções, úlceras por pressão, insuficiência respiratória, disfunção intestinal, bexiga neurogênica, Trombose Venosa Profunda e Hipotensão Ortostática.
A pesquisa tem como objetivo geral elaborar um roteiro contendo os principais cuidados e melhores práticas da assistência pós-hospitalar, para orientar a família e cuidadores do paciente com TRM. Como específico: Conhecer os agravos do traumatismo raquimedular; listar as intervenções assistenciais que podem ser realizadas pelo familiar/cuidador no período pós-hospitalar que podem auxiliar na melhoria da qualidade de vida desse indivíduo visando diminuição e prevenção das principais complicações pertinentes ao TRM; demonstrar através do roteiro quanto aos meios para realização dos cuidados constantes na cartilha apresentada.
Este trabalho está dividido em 5 capítulos, assim distribuídos: introdução, metodologia, a anatomopatologia da lesão medular, descrição das possíveis complicações inerentes, o enfermeiro como promotor dos cuidados e considerações finais.
O último capítulo faz um fechamento enfatizando a importância do enfermeiro na transmissão e promoção da continuidade dos cuidados, com o auxílio de uma ferramenta de apoio que é o roteiro, visando adesão dos envolvidos nas intervenções propostas.


2. LESÃO MEDULAR: ABORDAGEM ANATOMOPATOLÓGICA


"Apesar de nos últimos anos, em países desenvolvidos, a incidência de TRM estar estabilizada e a mortalidade diminuída, estudos revelam que ainda há grande amplitude nos dados de incidência[...]". Gebrin et al (1997, não paginado apud FURLAN, 2001, p.11).
Segundo dados do IBGE, a quantidade de indivíduos com lesão medular no Brasil até o ano 2000 era de 250 000. Numa proporção de 169 872 856 pessoas para 937 463 habitantes com deficiência física oriunda de uma lesão medular (IBGE, 2000, Não paginado apud RABEH, 2007, p.44).
Embora possua estrutura óssea rígida, a coluna vertebral é um segmento frágil e abstruso do corpo humano. A mesma é composta de diversos ossos titulados vértebras, esses por sua vez são articulados um ao outro, desempenhando um papel estrutural para o corpo, além de formar um canal encobrindo a medula espinhal e dessa forma protegendo-a. A medula é o local por onde transitam informações neurais como de sensação e movimento, além dos sistemas de controle das funções simpáticas e parassimpáticas, oriundas do cérebro para todo o corpo e vice-versa (MANHÃES, 2004, p.4).
Para Knobel (1994, p.612-613 ? grifo do autor):

A coluna vertebral e seu conteúdo formam uma estrutura relativamente rígida com áreas de maior flexibilidade, constituídas pela região cervical inferior, transição toracolombar e região lombar superior, sendo estas as mais susceptíveis aos traumas. [...] O seguimento espinhal não se relaciona diretamente com a vértebra homônima nas regiões dorsal, lombar e sacra, sendo a diferença progressivamente maior no sentido crânio-caudal. Esta segmentação nervosa particular determina uma não correspondência da vértebra comprometida com o respectivo dermátomo, exigindo pleno conhecimento anatômico para um diagnóstico neurológico preciso.

A lesão raquimedular geralmente decorre de um evento traumático, oriundo de acidentes automobilísticos, mergulho, agressão com arma de fogo ou queda resultando em lesão das estruturas medulares detendo o acesso de estímulos nervosos através da medula. Esta , por sua vez, pode ser completa quando não tem movimento voluntário abaixo do nível da lesão, ou incompleta, quando existe algum movimento voluntário ou sensação abaixo do nível da lesão (BRUNI, 2004, p.72).
A principal constituição do sistema nervoso central são a medula espinhal e o encéfalo, sendo a medula formada por células nervosas, neurônios e por longas fibras nervosas também conhecidas como axônio, sendo estes uma extensão dos neurônios que formam as vias espinhais. As vias espinhais por sua vez são classificadas em vias descendentes, conduzindo os estímulos oriundos do cérebro arrolados com o movimento e controle das vísceras, e em ascendentes, que conduzem os sinais relacionados com a sensibilidade, estes sinais por sua vez são gerados na periferia e levados para o cérebro. Os neurônios localizam-se na parte mais central da medula, conhecida como substância cinzenta medular, os neurônios que estão localizados nas porções posteriores são responsáveis pela sensibilidade e os situados nas porções anteriores, denominados neurônios motores inferiores, são relacionados com o movimento (DEFINO, 2000, p.388-393).
A medula espinhal organiza-se em segmentos no decorrer de sua extensão, de cada segmento emerge raízes nervosas que inervam regiões específicas do corpo, esses segmentos são subdivididos de acordo com a região que se encontram localizados (cervical, torácica, lombar e sacral), sendo assim a medula cervical contém oito segmentos que vão de C1 a C8, responsáveis pela sensibilidade e o movimento da região cervical bem como dos membros superiores, os segmentos torácicos (T1 a T12) tem controle sob o tórax, abdome e parte dos membros superiores, os segmentos lombares (L1 a L5) estão relacionados com movimentos e sensibilidade dos membros inferiores, os sacrais (S1 a S5) controlam parte dos membros inferiores, sensibilidade da região genital e funcionamento da bexiga e intestino (DEFINO, 2000, p.388-393).

Quando a lesão medular é a nível cervical, ocasionando paralisia, são perdidas todas as modalidades sensitivas como tátil, dolorosa, térmica, pressão e localização de partes do corpo no espaço abaixo da lesão bem como alteração do controle esfincteriano. Lesões cervicais altas (de C1 até C7) determinam tetraplegia, paralisia dos quatro membros, pois a inervação para os principais músculos são perdidas acarretando disfunções nos reflexos desencadeantes das funções vesical e intestinal, reflexos estes descrito por Bruni (2004, p.72-73) como "ileoparalítico, priapismo, retenção urinária, alterações digestórias (dilatação gástrica), alterações cardiocirculatórias (hipotensão, bradicardia) e oscilações térmicas".
Na fase inicial da lesão, são encontrados flacidez dos membros afetados, ausência dos reflexos tendinosos e retenção urinária, esta fase é classificada como choque medular, que pode se distender por vários meses, porém, posteriormente, pode haver recuperação dos movimentos além de ser observado um aumento dos reflexos tendinosos e do tônus muscular. Bruni (2004, p.72-73).

3. POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES PÓS ? TRAUMA


Por não haver ainda o conhecimento da reversão total e eficaz esperada como terapêutica, é necessário o convívio com alterações orgânicas, ficando então este paciente sujeito a complicações freqüentes relacionadas ao nível neurológico da sua lesão.
O sistema respiratório é o mais atingido quando em lesões altas, tendo a insuficiência ventilatória como tipo mais comum pela paralisia muscular, pois a respiração envolve quatro grupos musculares principais entre as regiões de pescoço, tórax e abdome. Essa possível insuficiência respiratória poderá ser detectada pela observação do padrão respiratório irregular, reflexo de tosse ausente o que dificulta a eliminação das secreções brônquicas (STAAS et al, 1992 apud FURLAN, 2001, p.19).
As alterações cardiovasculares são as que possuem maior morbi-mortalidade e está atribuída à perda das conexões simpáticas do tronco cerebral e o coração, causando uma diminuição do funcionamento da musculatura (FURLAN, 2001, p.19).
A alteração vasomotora mais freqüente é a hipotensão ortostática que ocorre devido a deficiência do reflexo vasomotor e é caracterizada por náuseas, tontura, síncope, intolerância a posição supina. A trombose venosa profunda (TVP) é outra complicação grave e comum que ocorre devido à imobilidade sob risco de embolia e suspeitada quando evidenciado edema, discreta alteração de cor e temperatura em um dos membros inferiores ou ambos (FURLAN, 2001, p.19).
Quando há lesão medular a retenção urinária é um resultado imediato, e como o lesado medular não sente a distensão vesical, ocorre um superestiramento da bexiga e do músculo detrusor, que se contrai para possibilitar o esvaziamento da bexiga, retardando o retorno da função vesical, logo qualquer lesão nervosa que intervenha nesta estrutura ocasiona uma bexiga neurogênica que é caracterizada pelo não esvaziamento correto da bexiga, quando hipoativa, proporcionando saldo de urina na bexiga e acúmulo do mesmo. Porém o indivíduo pode referir anseio para urinar quando não mais há esvaziamento vesical, nesse caso classifica-se como hiperativa, que ocorre quando há isolamento entre a bexiga e a medula, e para que não ocorra o descrito anteriormente e evitar infecções do trato urinário, deverá ser realizado o esvaziamento vesical (BRUNI et al, 2004, p.75).
Em decorrência da lesão medular há interrupção dos nervos da medula espinhal, ocasionando cessação das informações oriundas da porção retal que não conseguem chegar ao cérebro resultando em movimentação intestinal insuficiente, ocasionando constipação e impactação fecal, ou ainda quando o nível da lesão medular for S2 a S4, incapacitando o desenvolvimento da defecação espontânea (BRUNI et al, 2004, p.76).
As úlceras por pressão são feridas formadas em um local isquêmico originada pela fricção, pressão ou laceração (JACOBSON, 2007, p.713). Devido à imobilidade do indivíduo, a perda de sensibilidade, alterações no turgor e elasticidade da pele e circulatórias o paciente com TRM tende a desenvolver úlcera por pressão, principalmente em regiões cuja isquemia tecidual local está presente e que há contínua pressão, localizados mais comumente acima da tuberosidade isquiática, na região sacra, no trocânter, nos calcanhares e nos cotovelos (BRUNI et al, 2004, p.73).
A predisposição para infecções em pacientes com lesão medular é maior devido a múltiplas fontes, como por exemplo, o trato urinário, que por causa do funcionamento atípico da bexiga e a freqüente manipulação para execução do cateterismo, notam-se episódios de distensão vesical e mudança nas características da urina como o aspecto turvo devido à presença de sedimentos decorrentes da infecção; no trato respiratório, a deficiência do mecanismo da tosse, que pode estar ausente colaborando para o surgimento de uma pneumonia; áreas afetadas por úlceras oferecem riscos para tornar-se infectadas originando uma osteomielite e febre devido a integridade tissular prejudicada, exposição ambiental e déficits nutricionais (BRUNI et al, 2004, p.75).
As alterações sexuais estão relacionadas ao comprometimento físico da ereção, ejaculação, fertilidade masculina e na lubrificação feminina. Contudo os fatores psicossociais para uma nova condição também influencia muito.

4. O ENFERMEIRO COMO PROMOTOR DOS CUIDADOS FRENTE ÀS PRINCIPAIS COMPLICAÇÕES DO TRM


A enfermagem é responsável pela promoção da qualidade de vida dos indivíduos com lesão medular de modo que as orientações dos cuidados são fundamentais para evitar ou minimizar complicações inerentes à patologia, dando continuidade dessa forma ao pensamento de Hood; Dincher (1995, p. 233) que diz:

[...] as enfermeiras utilizam aquelas práticas e técnicas de atendimento aos pacientes que visam à restauração das funções e à prevenção de complicações. Esses métodos compõem alguns princípios básicos da atividade da enfermagem. Por exemplo, o atendimento de enfermagem para aquele paciente preso ao leito utiliza métodos para posicioná-lo e oferece movimentação e exercícios para evitar danos e complicações respiratórias[...].

Os cuidados de enfermagem para o paciente com TRM envolvem técnicas que conforme Hood; Dincher (1995, p. 239) incluem: "amplitude de movimento das juntas, posicionamento e transferência do paciente no leito e poltrona, encorajamento do paciente a participar do auto-cuidado, e prevenção de danos à pele", e a depender do estado do paciente, será necessário elaborar um plano de cuidados para a bexiga e intestinos.
Entretanto, é importante observar que todos os conhecimentos, técnicas ou métodos acima descritos de nada valerão se estes não forem transmitidos adequadamente a quem de direito.
Acima de tudo é fundamental conseguir a total cooperação do paciente, já que seu estado emocional provavelmente abalado pode levá-lo a "sabotar" o próprio tratamento .
Práticas simples como procurar ouvir e compreender o paciente, respeitar seu padrão de vida, sua visão de mundo, incentivar nele a auto-confiança e a auto-estima podem contribuir muito para o sucesso do plano . A orientação de forma não imposta, por exemplo, é também um meio para garantir adesão ao plano de cuidados elaborado pelo profissional de enfermagem.
É exatamente nesse momento que a atuação do profissional de enfermagem se torna crucial. Este deve considerar as características pessoais de cada paciente e de cada familiar-cuidador .
Além de elaborar e executar um plano de cuidados, a enfermagem precisa encontrar o modo mais apropriado de comunicar e instruir o paciente e cuidadores no que se refere à descrição da deficiência e hábitos benéficos que o indivíduo pode aliar para permanecer saudável, sobre os sintomas que indicam um problema de saúde onde necessite de cuidados médicos, enfatizando as habilidades ensinadas como as atividades de auto-cuidado, além de disponibilizar materiais informativos confiáveis. Essas técnicas são importantes para garantir que haja continuidade e qualidade nos cuidados pós-hospitalares, visando diminuição e/ou prevenção das complicações advindas da lesão medular, motivando e orientando o paciente a aprender as atividades que ele necessita saber ou ser capaz de realizar de forma a promover seu bem estar, como afirmam Atkinson; Murray (1989, p.97):

[...] quase todas as situações que envolvem a assistência a pacientes apresentam potenciais de ensino. Via de regra, a enfermeira está interessada em ajudar os pacientes e suas famílias a aprender como manter a saúde, como restaurá-la ou adaptar-se, com uma independência máxima, a níveis alterados de saúde [...].

A comunicação entre o enfermeiro e paciente tem por objetivo estreitar laços de compreensão, construir uma relação de confiança, primordial para entender as necessidades do paciente. A prática educativa faz parte do cuidado de enfermagem e está muito presente no cotidiano do enfermeiro.
A independência é um dos benefícios do ensino de saúde, pois conforme Atkinson; Murray (1989, p.97) "ajudam as pessoas a aprender as informações necessárias para manejarem sua própria assistência à saúde durante a enfermidade e a convalescença", dessa forma, proporciona também um plano de alta hospitalar precoce, pois o individuo poderá manusear com segurança questões de saúde em casa, quando instruído a viver com doenças crônicas e continuarem salubres e ativos quanto possível, além de detectar precocemente alterações oriundas de uma complicação e dessa forma procurarem tratamento enquanto o resultado é o mais positivo possível e o tratamento menos drástico.
Um maior conhecimento do indivíduo sobre sua patologia facilita a adaptação a sua nova condição de vida, aumentando sua colaboração com o regime terapêutico e facilitando sua independência, pois as ações educativas empreendidas junto aos clientes/pacientes, baseado em suas necessidades visam o auto-cuidado, que desenvolve o sentimento de independência, autocontrole, autodeterminação e consequentemente diminuição das complicações.
Por meio de ações libertadoras de educação para a vida e para saúde, o indivíduo e sua família são capazes de manter e/ou buscar o bem estar e qualidade de vida que desejam para si e quando, devidamente, informados, orientados e motivados acerca da sua saúde e de seus direitos como cidadão são capazes de ser reintegrados a sociedade, independente da sua condição.
A ausência do controle sobre alguns impulsos corporais, comuns a esse caso, como imprevisíveis contrações musculares involuntários, ereção reflexa, levam o acometido a sensação de perda de estabilidade, de controle de si mesmo além da sensação de culpa e vergonha diante do descontrole das funções excretoras surgindo dessa forma a ansiedade pela busca de um controle das mesmas principalmente em se tratando daqueles com menor tempo de lesão (MANHÃES, 2004, p.17). O enfermeiro tem peculiaridades que possibilitam seu papel de educador com o paciente, pois ele é o elemento da equipe que permanece mais tempo ao lado do paciente obtendo assim, capacidade de observá-lo e considerá-lo como todo e não apenas como um caso.
No ensinamento, a redução da ansiedade é obtida, como afirma Atkinson; Murray (1989, p.100):

[...] no mínimo, as pessoas podem começar a trabalhar através de seus medos, quando elas sabem o que está errado e não ignoram que opções têm para corrigir ou diminuir o problema. O conhecimento sobre o que se vai passar em qualquer tratamento escolhido é muito eficaz em reduzir a ansiedade [...].

Os ensinamentos em enfermagem para o paciente e familiar/futuro cuidador são muito importantes para a continuidade do plano de cuidados iniciado no hospital bem como para a prevenção de complicações e promoção de melhoria na qualidade de vida do indivíduo, pois conforme Figueiredo; Tonini (2009, p.130) "[...] em virtude de suas características próprias de proximidade e convivência, a família tem melhores condições de acompanhar os processos de saúde e doença de seus membros", devido a essa importância, o deixar de ensinar pode ser considerado uma negligência, assim como o ensinamento incorreto pode fazer com que a enfermeira seja responsabilizada legalmente pelas conseqüências que o paciente venha a experimentar, pois segundo Atkinson; Murray (1989, p.100) "[...] A falta de conhecimento ou o conhecimento incorreto por parte dos pacientes pode resultar em uma doença crítica e em morte", dessa forma o aprendizado inadequado, resultante de um ensinamento inadequado, pode levar o indivíduo a internamento desnecessário pelo mesmo problema ou por um problema relacionado mas, não só o paciente é atingido, passando por problemas, a enfermeira pode ser processada por má prática da profissão.
É de muita importância que o enfermeiro certifique-se das necessidades de aprendizado do paciente e do familiar, além de proporcionar um ambiente tranqüilo, possível à aprendizagem, sem nenhuma pressa durante o ensinamento.
O retorno à unidade hospitalar pelo mesmo problema pode decorrer também pela falta de execução dos cuidados ensinados, que geralmente ocorre devido ao não reconhecimento da necessidade dos mesmos pelo familiar, conforme Atkinson; Murray (1989, p.105) "É mais provável que ocorra a aprendizagem quando o aprendiz percebe a necessidade de aprender", quando o mesmo identifica o problema, caso contrário o paciente e ou familiar pode não comprometer-se com plano ensinado, como afirma Atkinson; Murray (1989, p.105) "É mais provável que a aprendizagem ocorra quando o aprendiz acredita que o teor do assunto é útil para satisfazer as necessidades individuais".
É possível afirmar que o profissional de enfermagem é, portanto, a "peça-chave" nesse delicado processo de transição. O seu preparo, atitude mental, conhecimento, método e postura são decisivos no sucesso da continuidade do tratamento mantendo o mesmo padrão de qualidade recebido no hospital.

5.1 Cuidados a Serem Prestados


De acordo com o exposto até aqui, é possível afirmar que a pessoa com lesão medular traz diversas incapacidades que requer cuidados relacionados às mesmas, sendo a assistência de enfermagem inserida e realizada a partir das implicações, portanto serão pontuadas a seguir as principais alterações advindas da lesão medular como insuficiência respiratória, úlcera por pressão, infecções, bexiga neurogênica, disfunção intestinal, trombose venosa profunda e hipotensão ortostática (RABEH, 2007, p.50).
Incumbe a enfermagem orientar no que se refere a condutas de prevenção das úlceras de pressão norteando e treinando o paciente/família/cuidador quanto às mudanças de decúbito a cada duas horas e, a cada modificação de decúbito deverá ser observada cuidadosamente a pele mantendo livres de sujidades das ondulações dos lençóis e colchões, o uso de sabonete neutro é indicado, bem como, há advertência no que se refere aos cuidados na hora do enxágüe e secagem da pele que deve ser realizada delicadamente. É sempre dado ênfase a hidratação local diária da pele principalmente nas áreas de pressão, além de propor posicionamento correto seja no leito ou cadeira de rodas distribuindo o peso do corpo e protegendo as proeminências ósseas (MORTON et al, 2007, p.892).
Para proteção das áreas de pressão poderá ser colocada espumas nas formas de cilindros, quadrados, retângulos e triângulos, almofadas d?água diminuindo assim a pressão sobre as regiões. O paciente é estimulado a utilizar espelhos ajudando na inspeção dessas áreas, identificando o eritema, edema ou escoriações (BRUNI et al 2004, p.74).
Quando adquirida a úlcera por pressão, um profissional de saúde deve ser consultado, pois o tratamento deverá ser realizado por meio de curativos especiais, alívio total da pressão sobre a área afetada além do mesmo ser qualificado para avaliar e cuidar corretamente o ferimento (BRUNI et al 2004, p.73).
No caso de bexiga neurogênica, o tratamento requer bom esvaziamento da bexiga, baixa pressão intra vesical, prevenir a infecção do trato urinário, que deverá ser realizado através do cateterismo intermitente, a cada 4 ou 6 horas, dependendo do balanço hídrico, portanto deve ser advertido da necessidade do registro da ingesta hídrica, ainda na tentativa de evitar infecção o familiar deverá ser instruído quanto a lavagem das mãos, com água abundante e sabão, quando for realizado o cateterismo, e o paciente quanto a técnica limpa do autocateterismo vesical intermitente que é considerado um procedimento de fácil execução e que mais imita os processos naturais da micção (BRUNI et al, 2004, p.75).
Vale ressaltar que o volume de urina retirado a cada esvaziamento não pode ultrapassar 500 ml, portanto, quando não for possível a realização do cateterismo intermitente poderá ser utilizada sondas de demora, fixando-a de modo a não originar fístulas, e realizando a troca semanalmente. A cada remoção de urina é importante a observação da quantidade e do aspecto da urina, bem como quaisquer sensações sistêmicas incomuns que estiverem ocorrendo, daí a importância da instrução para o familiar/paciente (BRUNI et al, 2004, p.75).
A urina ao invés de extraída ela poderá ser estimulada evitando procedimentos invasivos, usando manobras como a de Credé, que consiste em pôr as mãos uma sobreposta a outra na região inferior a área umbilical, pressionando para baixo e na direção do arco pélvico, este deverá ser refeito de seis a sete vezes ou até não seja eliminado mais urina. Posterior à alguns minutos o processo deverá ser repetido para garantia de esvaziamento completo. É fundamental que o familiar-cuidador antes de iniciar as manobras de estimulação da urina, verifique rigidez da região a ser massageada pois, neste caso é contra indicada uma vez que ao pressionar na tentativa de estimular a urina poderá forçar a mesma para os ureteres levando a infecção (MAGALHÃES et al, 2002, p.11).
Uma segunda opção de manobra é o desencadeamento cutâneo através de leves golpes suprapúbicos que estimula o reflexo da micção, para isto, devemos colocar o indivíduo numa posição de fowler (semi-sentado) e com os dedos de uma das mãos golpear a região da bexiga alternando o local dos golpes para achar o mais efetivo. Esta estimulação deve permanecer até que se obtenha início de um bom jato, e após a obtenção deste aguardar um minuto para iniciar nova manobra até o esvaziamento da bexiga (MAGALHÃES et al, 2002, p.12).
A estimulação da urina também é possível pela contração dos músculos abdominais, que por sua vez comprimem a bexiga e auxiliam na eliminação da urina, através da Manobra de Valsava, para iniciá-la devemos solicitar ao indivíduo que incline-se para frente sobre as coxas e contrair os músculos abdominais forçando para baixo e segurando o fôlego mantendo-se nessa posição até que o fluxo pare. Deverá ser repetida após esperar um minuto repetindo sempre até que não seja eliminado nenhuma urina (MAGALHÃES et al, 2002, p.12).
Na tentativa de uma reeducação, o hábito de ingerir 2 a 3 litros de líquido por dia além de aumentar o débito urinário contribui para a prevenção de infecções do trato urinário, portanto com essa ingesta hídrica antes de dormir e uma hora após cada refeição, o esvaziamento da bexiga pode ser estimulado com o auxílio das manobras descritas anteriormente (BRUNI et al, 2004, p.75-76).
Os cuidados para intervenção positiva dessas infecções são fundamentais na redução da morbi-mortalidade, mantendo a integridade da pele, reeducando a bexiga e o intestino para correção da incontinência urinária e fecal, é essencial a verificação da temperatura corporal bem como seu registro (BRUNI et al, 2004, p.75).
Para redução dos riscos de infecções do trato respiratório é importante assegurar a umidificação e a hidratação para prevenir que as secreções se tornem espessas e de difícil remoção mesmo com a tosse, além de executar alguns cuidados como: evitar o contato do indivíduo com pessoas que apresentem sintomas de infecção respiratória; estimulação da tosse através das técnicas chamadas tosse manual e tosse automanual. A tosse manual consiste em colocar a base da mão sobre o abdome entre o umbigo e 5 cm abaixo do processo xifóide do indivíduo que deve estar em posição supina. A segunda mão é colocada sobre a primeira que deverá estar com os dedos separados de modo que ambas possam se entrelaçar, o indivíduo é aconselhado a realizar uma respiração mais profunda possível, tentar tossir e então o familiar-cuidador comprime o abdome empurrando-o para baixo e para frente em direção à cabeça, evitando pressão contra o processo xifóide, compatibilizado com a tentativa do paciente de tossir. A tosse auto-manual poderá ser realizada em posição supina ou sentada. O indivíduo acometido, porém com função dos membros superiores, poderá realizar essa manobra colocando as mãos unidas sobre a região epigástrica empurrando para dentro no sentido diagonal também em direção a cabeça e enquanto tenta tossir. O alongamento torácico manual é outro exercício que auxilia na prevenção do acúmulo de secreções, e é feito um segmento a cada vez, região torácica inferior, média e superior. Ao realizá-la diariamente mantém a amplitude de movimento. Para realizar esta manobra deverá colocar o indivíduo em posição inicial para alongamento posicionando-o em posição supina enquanto a técnica é aplicada, é colocada uma mão em sob as costelas com as pontas dos dedos sobre os processos transversos e a outra sobre o tórax com a base da região palmar lateral em direção ao esterno; em seguida aproximamos as mãos em movimento de torção, sem forçar as extremidades das costelas ou externo, sempre distribuindo a pressão por toda a superfície das mãos e alternando-as; retornando a posição inicial, reiniciamos o movimento de alongamento para percorrer efetivamente o tórax superior, a mão de cima deve ser colocada abaixo da clavícula na última posição; retornamos mais uma vez a posição inicial e posteriormente ao movimento de alongamento. (IRWIN; TECKLIN, 2003, p. 596)
É importante nortear o familiar e/ou cuidador quanto a mudança de decúbito para melhoria do desconforto; deverá ser administrada, a cada campanha, as vacinas contra a influenza; quando fumante orientar quanto aos malefícios da tabaco, na tentativa de desestimular o tabagismo (BRUNI et al, 2004, p.76).
Quanto às infecções do trato urinário os riscos podem ser minimizados ou prevenidos com a inserção do cuidador e paciente num programa de treinamento vesical visando realização asséptica da técnica no manuseio do catéter; hidratação adequada via oral para que a urina não permaneça concentrada; prevenção de superdistensão vesical e estase venosa. Em relação a infecção pela interrupção da integridade da pele pode ser impedida através da mudança de decúbito periodicamente; posicionamento adequado e conforto, no leito e na cadeira de rodas evitando pontos de pressão; verificação de todas as áreas do corpo, e quando pelo paciente utilizar um espelho para melhor visualização da pele; cuidado com a limpeza e hidratação da pele com hidratante corporal; alívio da pressão sobre áreas fissuradas da pele, proeminências ósseas e calcanhares; evitar dobras ou rugas no lençol (BRUNI et al, 2004, p.75).
Deve-se atentar para os hábitos alimentares e o padrão de eliminação intestinal anterior à lesão medular, bem como a situação atual, considerando e avaliando-se a presença de ruídos hidroaéreos, e na tentativa de evitar a constipação recomendam-se três refeições por dia para que se tenha massa fecal satisfatória, uma alimentação balanceada e uma hidratação com ingesta hídrica em torno de 2 a 3 litros para facilitar a eliminação fecal. Quando instalada a constipação na tentativa de reverter o quadro é recomendado aumento de ingesta hídrica, não devendo restringir somente à água, como também suco de frutas, iogurtes, evitando sempre líquidos e alimentos constipantes como refrigerantes, queijos, compota de maçã, pão branco, suco de maçã e cenoura, banana prata, coca-cola, gelatina, massas em geral, arroz, batata, carnes magras, feijão e repolho, e incluindo fibras na alimentação que podem ser encontradas no quiabo, abóbora, laranja, mamão, pêra, melão, ameixa preta seca, figo, milho, frutas com casca, cereais integrais, pão preto, farelo de trigo, e iogurtes (BRUNI et al, 2004, p.76).
Além dessas indicações, as manobras anteriormente citadas no estímulo da micção são funcionais na disfunção intestinal, podendo acrescentar: a manobra de Rosing, que consiste numa massagem realizada no abdômen, no sentido da direita para a esquerda e de baixo para cima com leve compressão durante 20 a 30 minutos após as refeições, com o paciente sentado caso o equilíbrio permita; No caso de não obter êxito com as manobras uma segunda opção é o supositório de glicerina. É aconselhável procurar assistência médica se não houver episódios de eliminação fecal por mais de três dias e desaconselhável o uso de laxantes sem prescrição médica. A cada evacuação o cuidador deve observar o aspecto (cor, odor) e o volume aproximado das fezes, bem como o aspecto do abdomen (BRUNI et al, 2004, p.76).
No que se refere a trombose venosa profunda é indicado o uso de meias elásticas, realização de movimentos passivos, exercícios que promovam a amplitude do movimento, ligeira elevação do membro. Quando há suspeita de trombose venosa profunda deverá ser realizada a mensuração da panturrilha e caso seja notório um aumento significativo na circunferência deverá ser consultado por um profissional especialista (AZEVEDO; SANTOS, 2006, Não paginado).
Quanto a hipotensão ortostática, podem ser verificadas a pressão arterial a cada mudança de decúbito, elevação gradativa da cabeceira da cama, um dia antes de ser removido para a posição sentado, juntamente com uso de meias elásticas com alta compressão e faixas abdominais. Quando o ortostatismo está em curso, há possibilidade de melhoras colocando o individuo em decúbito dorsal deixando os quatro membros elevados. Vale ressaltar que é fundamental o planejamento de cada atividade e que a mudança de posição gradativa deverá ser realizada questionando sempre ao indivíduo quanto ao conforto e bem estar dele (AZEVEDO; SANTOS, 2006, Não paginado).