Organizações visionárias sustentáveis


Enquanto suspiramos por uma vida sem dificuldades, devemos nos lembrar que o carvalho cresce forte através de ventos contrários e que os diamantes são formados sob pressão.

Peter Marshall


O desejo de perpetuação repousa no imaginário do ser humano. A vida eterna e a imortalidade da alma constituem-se um mistério e, ao mesmo tempo, uma hipótese que muitos vêm tentando de algum modo comprovar. A fé religiosa não revela como surgiu o Universo, simplesmente crê que por trás do Big Bang há um Deus criador. A ciência conhece o fenômeno da morte, mas não consegue revelar o que há depois do fim da vida.

A ciência e a religião têm buscado respostas para o impasse, mas aparentemente não há demonstrações definitivas do que ocorre depois que as funções vitais do corpo humano cessam de vez. Há inúmeras teorias sobre vida e morte de organizações, mas a verdade absoluta parece estar sempre por ser descoberta.

Quando uma pessoa nasce, diz-se que possui uma expectativa de vida entre 70 e 80 anos em muitas regiões do mundo. Para as organizações, a previsão de sobrevida é menor que para as pessoas e chega a 40 ou 50 anos em países desenvolvidos. Nem todos os empreendedores têm a sorte da vida longa para o seu empreendimento, mas muitas companhias através dos séculos ratificam o princípio econômico que assegura que toda empresa tem seu surgimento, ascensão e morte.

De qualquer modo, na maioria dos casos, as empresas passam por várias crises, provocadas algumas vezes pela conjuntura econômica interna e externa do país, outras vezes por crises de identidade e de gestão interna, morte de fundadores e crises de sucessão.

As crises evidenciam a fragilidade a que a empresa está sujeita. Usuária e beneficiária de tecnologias cada vez mais potentes, a corporação insere-se em complexos sistemas. Qualquer falha nesses sistemas pode alcançar proporções de catástrofe e expor os limites do homem em controlar e entender suas próprias criações.

As organizações atuais, decorrentes da globalização e das estruturas matriciais criadas, em que as pessoas são controladas por vários líderes, oferecem serviços e produtos mais integrados, porém exigem o desenvolvimento de habilidades comportamentais como poder de influência sobre pessoas, gerenciamento de conflitos e muita negociação, para que sejam agentes de mudança. No século XXI o líder deve atuar como um visionário, a fim de criar um contexto no qual as pessoas possam criar e inovar continuamente, para atender às demandas da economia global.

As organizações visionárias são guiadas por seus princípios e valores centrais e, portanto, são mais capazes de lidar e superar crises. Paradoxalmente, as empresas visionárias ganham mais dinheiro do que as que são movidas preferencialmente em busca do lucro. Isso remete às organizações religiosas, que focalizam suas ações em princípios, valores e crenças presentes nas escrituras. Importantes organizações dessa categoria têm sobrevivido através dos tempos, fundamentadas em uma base ideológica bastante rígida e forte e em processos constantes e cíclicos de aprendizagem.

Empresas visionárias, denominadas "feitas para durar", são instituições líderes, a nata em seus setores, admiradas por outras empresas da área e com longo registro de impactos significativos sobre o mundo ao redor. São mais que bem-sucedidas e mais do que duradouras, são as melhores das melhores no setor. Não significa que ao longo da história essas empresas não tenham tido sérios problemas, contratempos e erros, mas a capacidade de recuperação permitiu que dessem a volta por cima, proporcionassem extraordinário desempenho de longo prazo e se transformassem em material ímpar, diferenciado, perene e flexível.

O grande líder não é a variável distintiva que forma uma empresa visionária. Uma grande ideia também não. A maioria das ações de liderança não ocorre no topo, mas sim nos escalões médios das organizações. O maior patrimônio de uma organização de sucesso duradouro é seu capital humano e um dos pilares de sua sustentação é possuir instrumentos eficazes para capacitar esse recurso, sem imposição de soluções, mas atendendo às suas principais características e pontos fortes .

Os líderes criadores de empresas visionárias têm como objetivo principal erguer a organização, definir seus traços, sua ideologia, seus valores centrais, o motivo fundamental para a existência da empresa ou de seu alvo. A partir daí, sua âncora é buscar o progresso através da inovação e da renovação e preservar seu núcleo, seu objetivo, ao alinhar qualquer mudança com a ideologia central.

Uma empresa visionária fica à distância do mito da mudança, preserva sua ideologia básica, seus valores essenciais e objetivos fundamentais de forma radical e ética, mudando-os raramente. Os valores essenciais da empresa visionária formam uma base sólida como rocha e não flutuam de acordo com tendências e modismos da época.

Já as práticas culturais e operacionais, metas e estratégias específicas se adaptam e mudam ininterruptamente em consonância com o mundo em transformação. É a combinação mágica entre preservar o núcleo, estimular o progresso e obter a excelência, com a gestão entregue a líderes denominados "nível 5".

Líder nível 5 refere-se a uma hierarquia de competências dos executivos em cinco níveis, dos quais o último representa o topo, o ápice de sucesso profissional. Todas as empresas de sucesso duradouro denominadas "feitas para vencer" tiveram uma liderança de nível 5 no comando e nos cargos-chave durante os anos críticos de sua transição de empresas boas para excelentes.

Os líderes nível 5 são os que possuem características paradoxais de humildade e firme vontade profissional. São ambiciosos não para proveito próprio, mas pela construção de uma empresa que prima pela aprendizagem e por resultados contínuos. Exibem modéstia e retração, dividem o sucesso com a equipe, formada por pessoas que sabem por que estão naquele barco e qual sua direção. Atribuem o sucesso à sorte e não à sua grandeza pessoal, assumem total responsabilidade pelos erros, preparam os sucessores para o sucesso e defendem com fé e fervor o que fazem.

A fé é uma luz que permite à sensitividade ocular humana compreender a dimensão transcendental de tudo que a ciência apura. A ciência evolui por meio de dados empíricos, experimentais, mensuráveis, enquanto a fé é um dom da inteligência, a crença em verdades reveladas.

A organização visionária sustentável está repleta de lideranças voltadas à batalha diária do aprendizado contínuo. Crê e utiliza amiúde os principais avanços científicos e tecnológicos. Organizações que desenvolvem a cultura do crer e praticar preceitos éticos e inovadores, têm ciclos de vida mais sustentáveis e longevos.