A Ordem dos Musicos do Brasil é uma Autarquia Federal, criada pela Lei Federal 3.857, de 22/12/1960. (íntegra, no site www.planalto.gov.br, no link "legislação" - "leis" - "Leis Ordinárias"). Diversos dispositivos dessa lei contrariam o Artigo 5º, incisos IX e XIII da Constituição Federal de 1988, que garante a todos o livre exercício de sua profissão. Entre as inconstitucionalidades mais claras, temos a ameaça de confiscação de instrumentos musicais, e a aplicação de multas a casas de shows ou aos próprios músicos. Essa lei antiga se amoldava ao regime militar opressor que imperava no Brasil na década de 60, mas a Constituição Federal hoje é outra, tem um espírito absolutamente democrático.

Assim, nenhuma dessas sanções podem ser aplicadas, pode-se buscar auxílio do Judiciário para se proteger dessas sanções, previstas em dispositivos que não têm mais validade. Hoje temos o mandado de segurança e a própria ação ordnária, que devem ser ajuizadas perante a Justiça Federal, pelo fato de a OMB ser, como já disse, uma Autarquia Federal. A liminar expedida pelo juiz no inicio do processo ja apta ao exercicio da profissão de músico.

Em suma, penso que a OMB deve realmente existir, pois a profissão de músico tem o seu valor e merece ser melhor regulamentada. Todavia, antes de atuar, deve a OMB buscar uma modernização urgente de seus conceitos, lutando pela aprovação de um projeto de lei no Congresso Nacional que re-estipule suas atribuições de forma compatível com o estado democrático de direito. Antes disso, sua atuação estará fadada ao insucesso.

Vejamos:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

"XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;"

Trata-se de norma de eficácia contida, que garante aos brasileiros estrangeiros residentes não se submeterem à vontade do Estado na escolha e no exercício de sua profissão. Tal liberdade, no entanto e nos termos do inciso em epígrafe, não é absoluta, cabendo ao legislador restringir a esfera de liberdade dos cidadãos, exercendo poder de polícia, em benefício da coletividade.

Conforme entendimento do professor José Afonso da Silva:

"É, enfim, a lei suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estrutura deste e a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas fundamentais de Estado, e só nisso se notará sua superioridade em relação às demais normas jurídicas."(SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19ª edição. São Paulo: Malheiros Editores,2001. p. 45. g.n.)

Tem-se, portanto que somente quando haja necessidade de resguardar o interesse coletivo poderá o estado exigir a qualificação prévia dos trabalhadores, sendo inconstitucional tal restrição quando inexista necessidade de coatar-se a liberdade de trabalho, por não haver risco à sociedade. não há razoabilidade para a existência desse conselho profissional.

O caso em tela consubstancia um claro exemplo de absoluta desnecessidade de atuação do poder de polícia estatal.

O artista, o músico, não oferece, no exercício de sua profissão, quaisquer riscos ao meio social, sendo descipiendo aferir-se previamente sua formação profissional ou competência musical. a garantia de liberdade profissional, bem como de expressão artística, fulmina a pretensão do estado de "exercer, em todo país, a seleção, a disciplina, a defesa da classe e a fiscalização do exercício da profissão do músico" (art. 1º da lei nº 3.857/60), em face da natureza predominante artística da profissão, para a qual basta o talento, não se exigindo cabal conhecimento técnico. no caso de artistas como músicos, atores e dançarinos, por exemplo, não se tem como razoável a limitação de sua atividade artística nessas condições. Apenas se for detectada potencialidade lesiva na atuação do profissional é que se justifica a exigência de registro para exercício da profissão.

É o caso, por exemplo, da atuação como docente em curso superior, mas não da apresentação pública de sua arte, ainda que remunerada. nesse sentido, a constituição foi zelosa em proteger o direito dos profissionais em exercerem livremente suas atividades profissionais, quando atendidas as exigências da lei. com efeito, para ser músico, o requisito essencial é o talento e a dedicação, sendo facultativo para tanto uma formação profissional qualificada. inegável a existência de ilegalidade na obrigatoriedade dos músicos inscreverem-se junto ao orgão para realizarem apresentações musicais.

Por fim, cremos que o fortalecimento e valorização da classe artística profissional não serão obtidos por meio da inobservância dos direitos constitucionais dos indivíduos ou tampouco através da imposição desarrazoada de taxas, anuidades, licenças ou registros por quem quer que seja. na verdade, esse tipo de atitude unilateral e desmedida consegue apenas afastar das entidades que praticam tais condutas aqueles que deveriam ser a razão de sua existência: os próprios artistas.