O TRABALHO ESCRAVO E A DIGNIDADE HUMANA: DESAFIOS DO DIREITO PENAL NA PROTEÇÃO À PESSOA

 

   Eduardo Gomes Rosa

Gleissa Mendonça Faria Cardoso

   Katiuscia de Paula Ribeiro

   Nubia Maria Silva Mendonça

   Tony Costa Brandão¹  

 

 

 

 

¹ Alunos do 5º Período do Curso de Direito do Instituto Luterano de Ensino Superior de Itumbiara (GO), orientados pelos professores especialistas: Auriluce Pereira Castilho, Cristiane Martins Cotrim, Jaquiel Robimsom Hammes da Fonseca, Mario Lúcio Tavares Fonseca, Rui Denizard Alves Novaes.

 

 

Resumo.

 

Nesta pesquisa foram estudados e analisados vários autores, e responde o seguinte problema: As punições existentes no Direito Penal Brasileiro são eficazes para coibir o trabalho escravo no Brasil? O objetivo geral da pesquisa teve como foco analisar a eficácia das punições brasileiras aplicadas ao infrator, quando este impõe ao trabalhador situação humilhante. Para alcançar o objetivo proposto, foram cumpridas as metas: apontou-se as doutrinas referentes às punições existentes, mostrou em que ocasiões ocorrem à exploração do trabalhador e evidenciou o benefício que a dignidade no trabalho proporciona.  Foram realizadas as pesquisas: teórica, através de revisão bibliográfica; empírica, ao analisar a normas contidas na Legislação Penal brasileira e qualitativa, buscando explorar autores de extrema importância. Utilizou-se dos métodos: histórico e hipotético-dedutivo, para auxiliarem na compreensão do tema na atualidade.  A pesquisa teve como hipótese de solução a conscientização do empregador, evitando, assim, que o mesmo venha a sofrer sanções. Mostrou como o respeito à dignidade do trabalhador influência positivamente na produção final de qualquer atividade. Demonstrou o quanto a dignidade contribui na formação da humanidade e do Brasil e a melhor forma de concretizar o valor do trabalho humano. O trabalho escravo é uma realidade brasileira e se verifica sua existência na prostituição, na agricultura, nas carvoarias, bem como nas indústrias de vestuários de pequeno porte. Foram valorizadas às medidas adotadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, na tentativa de coibir a ação dos empregadores que exploram o trabalho escravo no Brasil e os direitos humanos no ordenamento jurídico mundial.

 

Palavras-chave: Direito Penal Brasileiro. Trabalhador. Constituição.

 

1. Introdução.

 

A pesquisa desenvolvida procurou responder o problema: As punições existentes no Direito Penal Brasileiro são eficazes para coibir o trabalho escravo no Brasil?

Esta pesquisa se justificou em razão de se observar, através dos meios de comunicação, a presença de trabalhadores em atividades ilegais, vivendo em condições degradantes de escravidão, e também que os institutos jurídicos adotam a prática constante de se permitir à maioria dos acusados, a condição de liberdade para responderem aos processos delitivos por eles provocados.

O objetivo geral da pesquisa teve como foco principal analisar a eficácia e a importância social das punições existentes e aplicáveis ao infrator no Brasil, quando aquele impõe ao trabalhador uma situação humilhante no desenvolver de sua atividade.

Para alcançar o objetivo proposto, foram cumpridas as seguintes metas: apontamento das doutrinas referentes às punições existentes; indicar em quais ocasiões ocorre à exploração do trabalhador, demonstrando o benefício que proporciona a aplicação da dignidade no trabalho.

A pesquisa tem como hipótese de solução a conscientização do empregador, esclarecendo este, o quanto é conveniente respeitar a legislação vigente, evitando sofrer sanções quando em desrespeito, e como o respeito à dignidade do trabalhador influencia positivamente na produção final de qualquer atividade.

 

2. A dignidade humana no trabalho.

 

A Constituição Federal de 1988 nos traz um robusto conjunto normativo que visa à proteção e a implementação dos direitos fundamentais, caracterizando-se pela preocupação com a dignidade da pessoa humana e com a construção de uma sociedade verdadeiramente livre, democrática e igualitária. O art. 1º da constituição federal de 1988 afirma que:

 

Art. 1.º a república federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos;(...)

III- a dignidade da pessoa humana;(...)

IV- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; (CRFB, 1988).

 A dignidade no trabalho do homem é um direito fundamental de segunda dimensão estabelecido em 1988 na Constituição Federal Brasileira e representa uma conquista histórica de todos nos brasileiros, servindo como parâmetro para toda a humanidade.

É importante destacar o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, estabelecido nas relações jurídico – laborais, posto que enseje o tratamento digno para o homem produtor e, negar a aplicação desse princípio nas relações de trabalho, é o mesmo que eliminar a maior conquista da sociedade em todos os tempos.

O artigo 3.º da Constituição Federal de 1988 traz objetivos fundamentais de proteção à dignidade do ser humano, dando importância à construção de uma sociedade digna e eficaz, comprovando assim os direitos fundamentais de nossa população trabalhadora:

 

Art. 3.º Constituem objetivos fundamentais da Republica Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação; (CRFB, 1988).

 

São vários os autores que abordam a questão do trabalho escravo como sendo uma violação dos direitos fundamentais da pessoa, desrespeito a dignidade da pessoa humana, ferindo os Princípios da Constituição Federal de 1988.

Neste estudo foram utilizadas várias pesquisas de autores consagrados e especialistas no assunto para a composição do quadro teórico. Dentre eles, pode-se destacar: (Flávia Piovesan e Luciana Paula Vaz de Carvalho, 2010), (Vitor Palo Neto, 2008), (Luciana Aparecida Lotto, 2008), (Comissão Pastoral da Terra - CPT, 1999).

Na concepção desses autores, o direito moral e o direito natural buscam visões restritas que não englobam todas as dimensões tuteladas por esses direitos. Assim, aqueles estabelecem o reconhecimento daqueles direitos pela Constituição, ou seja, para que os direitos direcionados ao homem como: o direito à vida, à liberdade, à expressão, à moradia, à dignidade, e a um meio ambiente equilibrado e saudável, etc., sejam tuteláveis, é necessário a sua positivação pelo Estado, sem descuidar de seu caráter moral e ético.

Dentre as inúmeras influências que a Constituição brasileira de 1988 sofreu, as mais importantes foram em relação aos princípios fundamentais, notadamente no que se refere ao Princípio da Dignidade Humana como fundamento e base principal dos direitos e garantias coletivas e individuais.

A Constituição da República Federativa Brasileira de 1988 garante, com base no seu artigo 5.°, vários direitos e garantias individuais e coletivas, destacando:

 

Art. 5.° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes;(...)

III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante;(...)

XIII - É livre o exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;(...)

XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; (CRFB, 1988).

 

Também podemos destacar no artigo 7.° da Constituição Federal brasileira de 1988, os direitos sociais:

 

Art. 7.° São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:(...)

III - fundo de garantia do tempo de serviço;

IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho;

VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;

VIII- décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria;

IX- remuneração do trabalho noturno superior a do diurno;

X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;

XII- salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei;

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais,

XV - repouso semanal remunerado;

XVI – remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento a do normal;

XVII - gozo de férias anuais remuneradas; (CRFB, 1988).

 Na definição de Marcelo Silva (2010), a dignidade é um atributo

inerente ao ser humano, algo que lhe é inato, e que lhe torna merecedor de respeito e consideração tanto pelo Estado como pela sociedade, acarretando direitos e deveres fundamentais que, não só garantem a proteção do indivíduo contra quaisquer atos degradantes e desumanos, como também garantem as condições mínimas necessárias para uma vida saudável.

Conclui-se que todo ser humano nasce merecedor de dignidade e, estando esta ligada à noção de autonomia de vontade e liberdade pessoal do indivíduo, não pode ser relacionada à capacidade intelectual, raça, cor, crença ou sexo, pois ela é inerente ao ser humano e não pode ser violada ou renunciada.

O homem pode decidir seu próprio destino quando guiado pelas leis que foram estabelecidas, não podendo ser equiparado a coisa, objeto ou algo de valor calculado, pois o ser humano tem dignidade e não preço.

 

2.1. O trabalho escravo no Brasil.

 Para a maioria dos doutrinadores, um dos fatores desencadeadores do trabalho escravo na atualidade é a globalização, pois com ela o mercado tornou-se mais competitivo, havendo uma grande valorização do trabalho humano qualificado, forçando a queda do preço da mão-de-obra desqualificada, pressionando o ser humano despreparado a vender sua força de trabalho a preços ínfimos, passando este a trabalhar em condições degradantes e desumanas.

No Brasil, especificamente no Estado de Mato Grosso, encontravam-se trabalhadores em condições análogas de escravo, conforme bem esclarece Dom Pedro Casaldáliga, bispo de São Felix do Araguaia, cidade daquele Estado em 1971.

 O lucro, em todos os tempos e em todos os povos, quando se constitui em critério e justificativa, se alimenta sempre de sangue humano. A escravidão é uma decorrência da insaciável e inescrupulosa hegemonia do lucro. Ontem e hoje. Na escravidão clássica, na escravidão africana, nesta atual diluída escravidão, que pode ser o trabalho infantil degradante, ou as maquiladoras nos porões da cidade ou a peonagem flutuante nas fazendas latifundiárias. Comprar, vender, roubar vidas humanas é comércio natural para quem faz da ganância razão da própria vida desumana (CASALDÁLIGA, 1971).

 Em nosso país, verifica-se a exploração da mão de obra desqualificada, impondo condições análogas a de escravo. Observam-se situações de exercício da prostituição por todo o país; encontram-se a exploração de trabalhadores da atividade manufatureira de vestuário na cidade de São Paulo, verificando-se a presença de bolivianos em condições subumanas, trabalhando até 16 horas diariamente e recebendo salários ínfimos; detectam-se trabalhadores rurais em regime de escravidão ocasionados por dívida decorrentes de vendas ilegais de gêneros alimentícios, transporte e moradia inadequada, abrangendo adultos e crianças, principalmente em carvoarias.

Na visão da Comissão Pastoral da Terra – CPT (1999), o novo modelo econômico mundial que resulta da chamada globalização, tem levado, em muitos países, à intensificação da exploração do trabalho feita de maneira análoga a condição de escravatura, com anulação de conquistas trabalhistas de maior importância. É nessa realidade econômica que a super exploração do homem pelo homem tende, em circunstâncias específicas, a se tonar trabalho escravo. É seguramente esse um dos poderosos fatores que levaram a OIT – Organização Internacional do Trabalho, em 1993, a constatar a existência, no mundo, de um número significativo de trabalhadores escravizados.

Assim, o respeito à realização da dignidade da pessoa humana na prática, é de fundamental importância para o contexto social e para o ordenamento jurídico, sendo que a sua recusa, pelo Estado ou pelo empregador, constitui grave violação ao projeto constitucional brasileiro.

O trabalho escravo, ainda existente no Brasil, permanece sendo assunto de grandes questionamentos na Justiça Trabalhista. Ao se falar em trabalho escravo, verifica-se uma ofensa aos princípios e garantias fundamentais previstas na Constituição Federal e na Declaração Universal dos Direitos Humanos proferida pela ONU em 1.948.

Dentro da atual e triste realidade, que entendemos ser de retrocesso social, cabe a todos nós pensadores e pesquisadores do Direito, concentrarmos nossas energias no combate a esta prática, optando pela produção de propostas legislativas que assegurem a efetividade dos direitos fundamentais, a prevalência da vida com dignidade, exigindo do Estado o cumprimento de seu principal objetivo, que é a promoção do bem estar comum a todos os seres humanos trabalhadores.

Embora tenha assumido traços peculiares em cada momento da história, a escravidão ainda persiste no mundo, ferindo assim a dignidade da pessoa humana, como bem explica Piovesan e Carvalho, (2010).

 Os direitos humanos refletem um construído axiológico a partir de um episódio simbólico de luta e ação social. Enquanto reivindicações morais, os direitos humanos nascem quando devem e podem nascer, os direitos humanos não nascem todos de uma vez e nem de uma vez por todas. (PIOVESAN e CARVALHO, 2010, p. 4).

 

Trabalhadores são freqüentemente aliciados e atraídos para trabalhar em localidades distantes, exercendo funções, na maioria das vezes, em outros Estados brasileiros, ficando bem longe de suas cidades de origem. Tudo isso porque são iludidos com falsas promessas de ótimos salários e acomodações dignas.

Esses trabalhadores são submetidos a perfazer jornadas de trabalho além do estabelecido em lei, em condições ambientais precárias de trabalho, muitas das vezes chegando a contrair doenças devido à falta de estrutura sanitária, além da ocorrência de sérios acidentes de trabalho em decorrência da falta de equipamentos de proteção individual que não são fornecidos pelo empregador.

As irregularidades praticadas pelos empregadores são inúmeras, como o pagamento de ínfimos salários, retenção da Carteira de Trabalho – CTPS, descontos de verbas salariais indevidas e não previstas em lei, além de cobrar dos trabalhadores elevados preços pela alimentação fornecida, moradia e transporte proporcionados, tudo isso tendo em vista apenas o lucro financeiro às custa do suor do trabalho forçado.

Em conseqüência disso, os trabalhadores não conseguem pagar suas dívidas e, adicionado ao isolamento geográfico a que são submetidos, ficam impossibilitados de retornar às suas cidades de origem, ficando a mercê da vontade do empregador, terminando por se sujeitarem ao trabalho forçado. Impedidos de deixar os locais de trabalho, às vezes por “jagunços armados”, ficam tolhidos de suas liberdades de ir e vir, restando à esperança de um dia poder voltar para seus familiares.

 

2.2. As medidas brasileiras de coibição.

 A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada na Assembléia Geral das Nações Unidas em dezembro de 1.948 estabelece, de forma geral, que a dignidade é fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo e que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos, sendo dotadas de razão e consciência, devendo agir, umas em relação às outras, com espírito de fraternidade. Essa mesma Declaração estabeleceu uma estreita relação entre a dignidade e o trabalho humano ao declarar, em seu artigo XXIII, que toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e a uma remuneração justa e satisfatória, assegurando uma existência com dignidade. (PIOVESAN e CARVALHO, 2010).

Um dos fatores que contribuem para o exercício do trabalho escravo é a impunidade, uma vez que a justiça brasileira é lenta e não consegue jurisdicionar todos os casos que ocorrem, o que acaba resultando numa falta de justiça.

Outro fator que contribui e muito, para esta prática, é o confinamento desses trabalhadores em lugares ermos e afastados dos grandes centros, onde não se encontram os fiscais do trabalho. Assim, os empregadores, na maioria latifundiários, se aproveitam da falta de órgãos fiscalizadores e praticam seus delitos sem a menor preocupação. Utilizam, para angariar seus ”escravos”, de aliciadores terceirizados chamados de “gatos”.

Não são raras as denúncias efetuadas em que a atuação dos fiscais do Ministério do Trabalho é tardia, quando ocorrem efetivamente. O Ministério do Trabalho e Emprego não efetua fiscalização preventiva e nem de acompanhamento, de forma que, não havendo um retorno às empresas e aos empregadores que já foram encontrados praticando o trabalho escravo, esses, inevitavelmente, repetirão o mesmo delito.

Na tentativa de tentar bloquear o uso de mão-de-obra escrava, o governo vem tentando várias ações, como a criação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, conhecido como Grupo Móvel, especialmente destinado ao combate do trabalho escravo, com ações para a promoção da cidadania e combate à impunidade, e ações para conscientização, capacitação e sensibilização. Também foi criado um cadastro nacional, onde figuram todos os empregadores encontrados praticando trabalho escravo no Brasil, e, ao serem inseridos nesse cadastro, esses infratores ficam proibidos de adquirir empréstimos junto a bancos oficiais, entre outras proibições.

O Governo Federal lançou o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, com ações gerais e voltadas para o enfrentamento, repressão e prevenção dessa prática. Elaborou iniciativas para garantir a capacitação dos trabalhadores libertados e suas reinserções no mercado de trabalho, bem como ações específicas de repressão econômica, com o compromisso de que os empresários signatários não poderão adquirir produtos que tenham, em sua cadeia produtiva, a utilização de trabalho escravo. (PIOVESAN e CARVALHO, 2010).

O Código Penal Brasileiro estabelece:

 Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, que sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

§ 1. o Nas mesmas penas incorre quem:

I - cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;

11 - mantêm vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.

§ 2.º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido:

I – contra criança ou adolescente;

II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.

 

Existem diversas convenções e acordos internacionais a cerca da escravidão atualmente existente no mundo. A OIT – Organização Internacional do Trabalho – explora o assunto em suas convenções, sendo estas devidamente ratificadas pelo nosso país.

O Ministério Público do Trabalho brasileiro tem buscado se integrar ativamente em diversos fóruns, conselho e comissões voltados para a defesa dos interesses da pessoa humana, em especial a dos trabalhadores. A sua atuação efetiva e direta no combate ao trabalho escravo, ocorre principalmente em incursões nos próprios locais de exploração, através da participação conjunta com os fiscais do trabalho nos grupos móveis, ocasião que são solucionados muitos casos.

Apesar das instituições internacionais, governamentais e privadas, crescentemente envidarem esforços na busca da erradicação do trabalho escravo, estes esforços ainda não produziram os resultados desejados, pois malgrado o crescente número de libertações de trabalhadores, ainda se registra a proliferação dessa nefasta modalidade de exploração do labor humano, havendo estimativa da Comissão Pastoral da Terra – CPT, (1999), de que existem no Brasil, cerca de 25 mil pessoas ainda submetidas a essa condição.

A sanção penal estabelecida pelo art. 149 do Código Penal Brasileiro tem sido insuficiente para coibir essas atrocidades. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra – CPT, (1999), menos de dez por cento dos envolvidos em trabalho escravo no sul-sudeste do Pará, entre os anos de 1996 a 2003, foram denunciados por esse crime, e desses, poucos receberam alguma punição. A irrisória pena mínima prevista no art. 149 do Código Penal – dois anos – não intimida qualquer infrator de submeter-se a uma ação penal efetiva. Mesmo quando julgado, existem vários recursos na Lei Brasileira, que permitem atenuar e protelar a eventual execução da pena, podendo mesmo ser transformada em prestação de serviços à comunidade ou mesmo em distribuição de cestas básicas.

Estão sendo tomadas medidas concretas, na tentativa de atingir economicamente quem usa desse tipo de procedimento, como as ações promovidas pelo Ministério Público do Trabalho. Por outro lado, as Ações Civis por danos morais têm sido julgadas na justiça do Trabalho com aplicações de indenizações cada vez mais vultosas.

 

2.3. A evolução dos Direitos Humanos.

 Na antiguidade, os pensadores do Direito, Thomas Hobbes, John Locke, e outros, inauguraram uma nova era, implantando a idéia de um “contrato” que a sociedade fazia com o Estado, no sentido deste proteger aquela.

Já no século XVIII surgia o conceito de direitos humanos e dentre esses, o mais importante, pela sua abrangência universal, foi a “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”, promulgada pela Assembléia Nacional da França em 26 de agosto de 1789. São os direitos humanos ditos atualmente de: Direitos de 1.ª geração: a liberdade de ir e vir, de pensar, de expressar o pensamento, a liberdade religiosa, etc.

Com a colocação de Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria: “Não há liberdade onde as leis permitem que em determinadas circunstâncias o homem deixa de ser pessoa e se converte em coisa” (1764), houve inovação no direito penal, e a pena de morte e a tortura passaram a serem questionadas.

Já os Direitos de 2.ª geração que visam corrigir as distorções desigualitárias, são os direitos sociais, culturais e econômicos, os direitos naturais da igualdade, que vieram para exigir do Estado uma série de práticas materiais para efetivá-los.

Com os Direitos de 3.ª geração, Direitos Humanos, vieram a proteção de bens sociais de relevância para todos os seres humanos. Direitos como o de um sadio ambiente natural, ao desenvolvimento equilibrado, à comunicação, à preservação do patrimônio comum da humanidade. São os direitos da solidariedade, tendo como destinatário o próprio gênero humano, como valor supremo em termos de existencialidade concreta. 

 

2.4. Metodologia.

 Com o intuito de solucionar o problema proposto, a pesquisa empregou um procedimento reflexivo, sistemático, controlado e crítico, e tem como principais estratégias as pesquisas: teórica, através de revisão bibliográfica rigorosa quando analisa a normas contidas na Constituição Brasileira; qualitativa, onde buscou explorar autores de extrema qualidade bibliográfica, através de consultas em livros, utilizando ainda, os métodos científicos: histórico e hipotético-dedutivo, para auxiliarem na compreensão do tema na atualidade.

Foram investigados os acontecimentos passados e significativos através de revisão bibliográfica rigorosa para sua sustentação, e foram feitas, após a identificação das obras consultadas, compilações e fichamentos dos trechos interessantes, análise e interpretação desses itens com posterior redação do trabalho. Uma vez que o tema: "O trabalho como dignidade humana e o trabalho escravo: desafios do direito penal na proteção à pessoa" gira em torno de concepções convergentes de diversos autores, estes são os tipos de pesquisas e métodos mais apropriados para a realização deste trabalho.

A pesquisa utilizou como fonte primária a Constituição Federal Brasileira de 1988 e como fontes secundárias livros, artigos de periódicos e estudos já realizados por pesquisadores.

Este trabalho possui caráter interdisciplinar, uma vez que utilizou as disciplinas: Introdução ao Estudo do Direito, Direito Penal, Direito do Trabalho e Constitucional, Metodologia Científica, Sociologia Jurídica, Ciências Políticas e Português.

O intuito principal com a coleta de dados bibliográficos foi o de mostrar as opiniões de diversos autores, assim como as pesquisas e análises que foram feitas por alguns pesquisadores, que também ajudaram a enriquecer o trabalho e a formar uma conclusão final mais precisa do assunto pesquisado.

 

3. Conclusão. 

 Com esta pesquisa demonstrou-se que o Trabalho Escravo ainda é uma realidade brasileira. Podemos verificar vários modos de existência do trabalho escravo no Brasil, forçado ou obrigatório, principalmente em nível das atividades rurais, carvoeira, na indústria de confecções e também na prostituição.

Concluiu-se através desta pesquisa, que a Legislação Penal brasileira é, por demais, insuficiente no tocante a coibir esta prática, permitindo que os infratores respondam em liberdade por seus delitos, e, por meio de recursos, conseguem fazer com que os processos se protraem através do tempo, ocorrendo até mesmo à prescrição.

Por outro lado, a fiscalização estatal é insuficiente para proporcionar uma barreira à prática deste ilícito.

 

4. Resultados.

 Através da pesquisa bibliográfica realizada, verificou-se que até o presente momento, e mesmo após mais de cem anos de abolição da escravatura, ainda existem inúmeros focos de trabalho escravo em nosso país, seja em regiões longínquas como nas fazendas dos Estados do Pará e de Mato Grosso ou mesmo em grandes centros já bem desenvolvidos como na cidade de São Paulo no Estado de mesmo nome.

Concluiu-se que menores de idade também são atingidos por pessoas inescrupulosas, quando exercem atividades em carvoarias, promovendo o enriquecimento dos seus exploradores. Se maiores de idade, são explorados por latifundiários que os mantêm endividados em função do fornecimento de transporte, alimentação e moradia, muitas das vezes, inadequadas e  sujeitas a todo tipo de intempéries.

Os trabalhadores em confecções, nos grandes centros, são explorados substancialmente no quantum recebem por seus serviços diários, e na carga horária diária de trabalho, chegando ao cúmulo de dezesseis horas/dia, embora em seus países de origem recebessem menos e por mais trabalho despendido.

Os infratores, quando são atingidos pelos braços da Lei, através da morosidade do judiciário, da esperteza de seus procuradores e da fragilidade da legislação penal, são, muitas vezes, levados a impunidade ou irrisoriamente punidos. 

Na prostituição as mulheres acabam por serem alvos fáceis dos chamados “cafetões” que as mantêm em estado de escravidão forçada, obrigando-as a dividir o ganho financeiro obtido com a venda do corpo, ou ainda pagando, às donas dos bordéis, pelo uso e moradia nos prostíbulos.

Assim, percebe-se que as regras jurídicas frágeis de nada resolvem a problemática, perpetuando a exploração do homem pelo homem.

 

5. Referências.

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Secretaria de Inspeção do Trabalho - SIT

Departamento de Fiscalização do Trabalho - DEFIT

Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo – DETRAE

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 NUNES, Rizzato. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002.

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