Flávio Rodrigues Andrade

RESUMO         

O artigo em pauta estuda e analisa o contexto socioeconômico que afeta diretamente a classe trabalhadora relacionada ao setor calçadista da cidade de Franca, situada no interior do estado de São Paulo, observando as características do ambiente de trabalho e como o Sindicato dos “Sapateiros” lida com a reestruturação produtiva nas fábricas concomitante com as novas tecnologias, e como reagem às oscilações do mercado calçadista perante a modernização global das décadas de 1970 - 1990 no séc. XX. A intenção é analisar se as formas de negociações e as intervenções do sindicato atenderam as necessidades dos operários, investigando e identificando pontos positivos e negativos aos trabalhadores da categoria, que dependem de boas negociações salariais para suas sobrevivências, até mesmo para se qualificarem melhor profissionalmente e viverem melhor em sociedade. O presente trabalho foi composto através de leituras de livros, Teses acadêmicas de conclusões de cursos e artigos, em uma abordagem social e econômica derivada do modo de produção capitalista tendo como principal foco as indústrias calçadistas de Franca e os seus reflexos na sociedade local.

 

INTRODUÇÂO

Na segunda metade do século XX com o surgimento de novos horizontes nas organizações produtivas, que por consequência estão relacionados com as formas de organização de trabalhadores e tecnologias. O modo produtivo tem despertado as atenções de pesquisadores com o propósito de compreensão das mudanças nas organizações produtivas, da ideologia patronal e sindical.                                                           

Novos desafios estariam incluídos: primeiro, as mudanças na estrutura do emprego ocasionados pela globalização do mercado produtivo e sua modernização avançam rumo aos sindicatos exigindo inovações ideológicas sindicais que atendam perspectivas atuais. Entre esses aspectos relevantes provocadas pelo avanço tecnológico e pela automação. (SANTANA, 2000, p. 187). 

O presente trabalho visa entender o contexto em que estão inseridos os trabalhadores das indústrias de calçados de Franca, indagando sobre a forma cotidiana dos diversos tipos de trabalho. Foi observado as estratégias dos patrões e seus comportamentos em relação aos funcionários que estão relacionados á organização produtiva.

Nota-se a reorganização do modo de produção capitalista, como um recurso utilizado pelos patrões para a redução dos custos. Os agravantes são as irregularidades e a precariedade do trabalho nas fábricas de calçados de Franca, asa má distribuição de renda que reflete na qualidade de vida do trabalhador.

A pesquisa observa e analisa a forma de atuação do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Calçados de Franca (STIC), e suas conquistas que beneficiaram a categoria. O apoio da igreja católica, em especial da Paróquia de São Benedito e o envolvimento na política dos membros do sindicato.

Buscamos compreender como sobrevivem os trabalhadores das indústrias de calçados de Franca, como é a distribuição de renda gerada pelo ramo calçadista, e o resultado disso na qualidade de vida do trabalhador. Foi observado como o Sindicato atuou entre as décadas de 1970 e 1980 e o que conquistou em benefício da categoria.

A intenção desse estudo é o conhecimento real do modo de produção das Indústrias de Calçados de Franca, as mediações e intervenções realizadas pelo sindicato que representa os trabalhadores. É analisado também como o trabalhador é atingido economicamente, o quanto sua vida social é prejudicada, ás dificuldades enfrentadas pelas empresas, e como isso é repassado para o operário sem uma intervenção eficiente do sindicato.

O esperado é que, esta pesquisa contribua de alguma forma para o aprimoramento da atividade sindical, e para o amortecimento dos impactos da reestruturação produtiva. Visando o bem-estar social dos trabalhadores e melhor adaptação ás exigências do mercado calçadista frente à globalização.

1. O SINDICATO DOS TRABALHADORES NA INDÚSTRIA DE CALÇADOS DE FRANCA (STIC)

O Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Calçados de Franca (STIC) segundo Canôas (2007) derivou da criação de dois sindicatos, primeiro o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil. Em seguida do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Artefatos de Couro fundado em 1937 e reconhecido pelo Ministério do Trabalho em 30/06/1939. De seu desmembramento foi que originou o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de calçados de Franca (STIC), fundado em 23/04/1941 e legitimado pelo governo em 10/02/1943.

Não só o Sindicato dos Sapateiros de Franca, mas os demais sindicatos surgidos em Franca eram dirigidos por pelegos, à vontade dos patronos é que imperava no interior do sindicato. No caso do Sindicato dos sapateiros, desde seu primeiro fundador e líder sindical Luiz Magrin, que o sindicato nasce não como um defensor da classe trabalhadora, e sim um conciliador que atendia mais os interesses patronais do que dos operários. 

Os sindicatos eram muito débeis, dirigidos pela classe patronal. Todos os presidentes de sindicatos eram “pelegos”, eram comprados, subvencionados. Ganhavam salários para lutar contra o interesse da classe operária. Estavam junto da classe operária, mas não levantavam nenhuma reivindicação!. (CANÔAS, 2007 p.133, grifo do autor). 

Os trabalhadores do ramo calçadista de Franca, não satisfeitos com seu sindicato se organizaram e se opuseram a ele. Através de uma organização que se iniciou de um grupo pequeno de sapateiros da Pastoral Operária (PO) da Paróquia de São Benedito, localizada no bairro, Boa Vista.

A Pastoral Operária (PO) surgiu de 1976 em diante, defendendo às propostas do Juventude Operária Católica (JOC) e também da Ação Católica Operária (ACO). ‘[...] no seu primeiro momento, foi constituída praticamente de operários sapateiros’. (CANÔAS, 2007, p. 141). Ela foi um espaço oferecido pela igreja que serviu para organização do movimento operário onde as idéias e propostas eram difundidas. 

O objetivo da P.O. é oferecer ao operariado cristão, condições para que, por seu testemunho evangélico, se inspire, como fermento na classe trabalhadora, na própria caminhada do movimento operário e sindical, sendo agente transformador da sociedade global. (CANÔAS, 2007, p. 140). 

Graças a PO os trabalhadores se organizaram, formaram a oposição sindical participaram das eleições e venceram em 1982, logo após fundaram o Partido dos Trabalhadores (PT). Em 1983 surgiu a Central Única dos Trabalhadores (CUT), e assumiu o papel que a PO desenvolvia até o momento, que continuou desenvolvendo suas funções só que com a CUT a frente da situação.

Quando perguntado sobre os movimentos operários Padre Jerônimo responde: 

Franca não havia se movido até 1981 a nível de movimento operário. É com a P.O. que se intensifica o movimento sindical combativo nessa cidade. Embora tenhamos tido o apoio do bispo para o nosso trabalho, encontramos muito obstáculos em função das dimensões de nossa luta. (CANÔAS, 2007, p. 141). 

Padre Jerônimo em 1981 se tornou coordenador da Pastoral Operária em Franca, devido a seu envolvimento intenso com o movimento operário que contrariava os interesses dos patrões e a ala conservadora da igreja. Padre Jerônimo passou por momentos de retaliação dos empresários e da própria igreja, esses acontecimentos forçaram - o a abandonar seu posto de clérigo.

Segundo disse o membro da pastoral na época, Fábio Cândido, a participação do grupo da Pastoral Operária foi impulsionada mais pela revolta de mudar a situação de opressão vinda dos patrões, vivida pelos trabalhadores do que por consciência daquela conjuntura. (apud Canôas) ‘[...] aí, tendo por espelho os movimentos do (ABC), que influíram enormemente para que a gente resolvesse participar da chapa de oposição na época’. (CANÔAS, 2007, p. 142).

O sindicalismo das regiões de Santo André, São Bernardo, São Caetano (ABC) despertou nos trabalhadores de Franca a necessidade da construção de uma identidade enquanto classe trabalhadora. De 1982 em diante, o sindicato ganha nova conotação, passa de um sindicato conciliador para um sindicato de combate, defensor dos interesses dos trabalhadores, segundo disse o presidente do sindicato Fábio Cândido. (apud Canôas)

Não só a igreja São Benedito apoiou a chapa 2 de oposição, mas outros sindicatos também, por acreditarem que as pessoas envolvidas estavam comprometidas com a categoria. Entre eles estavam: o Sindicato dos Vidraceiros de São Paulo, Sindicato dos Bancários de São Paulo, Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e o Sindicato dos Marceneiros de Ribeirão Preto.

As propostas da chapa 2 foram de grande importância para sua vitória nas eleições, algumas delas foram: ação contra o saturnismo (doença causada pelo chumbo presente nas tachinhas), material utilizado na fabricação do calçado, 40 horas semanais de trabalho, salário calculado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), aumento de 100% nas horas extras etc.

O novo sindicato teve problemas para tomar posse, os patrões e seus pelegos tentaram impedir através do Ministério do Trabalho. Não teve jeito, os novos integrantes do sindicato tomaram posse em outubro de 1982, e o mandato era de três anos. ‘A posse acontece num momento de grande expectativa da vida nacional: as eleições de novembro de 82, Marco fundamental no processo de redemocratização do País’. (CANÔAS, 2007, p.145-146). 

Em 1983 são dados os primeiros passos após a posse em defesa dos interesses dos trabalhadores, e mais de 6.000 sapateiros foram mobilizados, embora sofrendo represália militar e ocorrendo a prisão de alguns do sindicato e membros do PT que na ocasião recentemente fundado havendo elegido um vereador na cidade conseguindo 3.000 votos na legenda. Ficando como coordenador do movimento o Padre Jerônimo que com a greve a categoria conseguiu um piso salarial maior, e o primeiro debate sobre a redução da jornada de trabalho.

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