Proponho-me a apresentar neste trabalho uma investigação analítica sobre a influência do cinema, em do romance, na formação da identidade cultural brasileira. No exposto acima possa parecer amplo o campo de pesquisa, mas o objetivo se restringe especialmente na relação: criação do romance baseado nos reflexos da realidade e comportamento social como influências de sua recepção. Nossa investigação se dará a partir dos ensaios “É possível pensar o mundo moderno sem o romance?” de Mario Vargas Llosa e “Cinema e romance” de Alberto Abruzzese. Consideramos que o cinema e o romance fazem parte no processo educacional da população.

De acordo com Llosa, a literatura é insubstituível para a formação do cidadão numa sociedade moderna e democrática, de indivíduos livres. A qual deveria fazer parte na família, desde a infância e nas disciplinas básicas. Ela é considerada um entretenimento, para os desocupados, sendo facilmente desconsiderada diante de outras prioridades cotidianas. É também considerada uma atividade predominante feminina.

 Ao considerar o romace como um passatempo de luxo nos processos educacionais porque passam as diferentes camadas populacionais, Llosa afirma que :

A literatura, em especial o romance, seja um passatempo de luxo, ao contrario, proporei considerá-la, além de uma das ocupações mais estimulantes e fecundas da alma humana, uma atividade insubstituível para a formação do cidadão numa sociedade moderna e democrática, de indivíduos livres, e que por isso, deveria ser inculcada nas famílias desde a infância e deveria fazer parte de todos os programas de educação como uma das disciplinas básicas.(LLOSA, 2009, p.20)

Para o autor, é preocupante uma sociedade que podendo ler, renuncia a literatura, a qual está  condenada a se barbarizar no plano espiritual e pôr em risco sua própria liberdade. A sua falta pode levar a uma incomunicabilidade social, ou seja, ela possibilita o diálogo entre os seres humanos, independente das diferenças existentes.

Llosa afirma que o bom romance, ensina a ver nas diferenças étnicas e culturais a riqueza do patrimônio humano e valorizá-las como uma manifestação de sua múltipla     criatividade. Permite um falar bem, falar com precisão, profundidade, rigor e agudeza, dispondo de uma linguagem rica e variada, encontrar a expressão adequada para cada ideia ou emoção que se queira comunicar. Vejamos:

“... a ficção não existe para investigar uma área determinada da experiência, mas para enriquecer de maneira imaginária a vida, a de todos, a vida que não pode ser desmembrada, desarticulada, reduzida a esquemas ou fórmulas, sem que desapareça.( LLOSA, 2009, p. 22)

O romance é o único ramo que não trabalha com  a fragmentação do conhecimento, e nem pode ser uma ciência pois a ficção não existe para investigar uma área determinada da experiência, mas sim para enriquecer de maneira imaginária a vida de todos. Através do romance estamos mais preparados para pensar, ensinar, aprender, dialogar e, também, fantasiar, sonhar, sentir e emocionar-se. Sem ele não existiria erotismo. O amor e o prazer seriam mais pobres, privados de delicadeza e distinção.

 Graças à literatura, a vida se compreende e vive melhor. Viver e partilhar ideias e experiências. Gera sentimento de pertencimento à coletividade humana através do tempo e do espaço. Nada contribui tanto para renovar esta coletividade, uma geração após a outra, quanto a literatura.

O que propomos a analisar não são apenas os reflexos que o romance traz a sociedade, mas o que a produção cinematográfica traz para a sociedade também. Nesse sentido o romance não é o único responsável pela transformação social. A sociedade constituiu-se a novos costumes. Sendo assim, o cinema é um estimulante e sedativo no espaço de formação e desenvolvimento cultural.

Consideramos as colocações de Abruzzese sobre o cinema:

“Assim, o cinema se apresenta às massas como estimulante e sedativo: por isso a cultura oficial o trata, no início, com o mesmo tom moralista utilizado para populacho, de apetites apenas carnais, que corre a se embriagar nos feriados. O cinema aqui é um recurso que se equilibra entre virtudes pedagógicas e os riscos de evasão e de revolta, quando não de crime”. (ABRUZZESE, 2009, p. 921)

Ao tomarmos o gênero cinema para investigação podemos verificar que os anseios da vida cotidiana estão claramente representados, assim como os problemas vivenciados na presente era. Isso nos leva a pensar radicalmente sobre o mundo em que vivemos nos faz ter consciência sobre situações da sociedade. E a revolta contra a mediocridade e a sordidez da vida, que possibilita que não continuemos como primitivos. O cinema forma cidadãos críticos e independentes, difíceis de manipular, em permanente mobilização espiritual e com uma imaginação inquieta.

Considerando que o romance e o cinema são fontes formadoras do desenvolvimento cultural, a literatura cumpre seu papel como alimento dos espíritos indóceis e propagadora da inconformidade, um refúgio para quem tem muito ou muito pouco na vida, onde é possível não ser feliz, não se sentir incompleto, não ser frustrado nas próprias aspirações.

Fuga da realidade. No romance perpassa o tempo e podemos ser outro, diferentes do que na rotina forçada da vida real. Confirmando que a vida sonhada do romance é melhor – mais bela e variada, mais compreensível e perfeita do que a que vivemos quando estamos despertos, uma vida tolhida nos limites e na servidão a nossa condição.

Tanto o romance quanto o cinema, nas suas características específicas, ajudam a compreender situações históricas vividas pelas sociedades. Eles são veículos preciosos para o conhecimento de verdades ocultas da realidade humana. Essas verdades não são sempre atraentes. O mundo sem romances e sem cinemas seria um mundo animal.

Vejamos a relação entre estes generos, segundo Abruzzese:

“Tentemos especificar os pontos históricos em que as semelhanças e as diferenças entre o cinema e o romançe se expressaram num processo gradual e estratificado de conexões e desconexões quanto ao poder da escrita e aos temas de reflexão e relato que operam automaticamente dentro dela”. (ABRUZZESE, 2009, p. 921)

O autor ainda afirma que, já de saída, o cinema apresentou um traço inédito – a qualidade destinada à narração do tema coletivo da sociedade industrial, que substituía os heróis do individualismo burguês. Outra relação entre eles foram às estratégias de encenação que estabeleceram um contraste com os valores do texto escrito.

Não queremos aqui estabelecer uma relação com o propósito de igualar ou desigualar segundo os gêneros segundo suas características. O que estamos propondo é a função que cada um exerce no processo formativo do ser humano. Reconhecendo que eles são meios de apresentar a Literatura a sociedade.

A trama, a escrita e as técnicas de produção, simultaneamente, asseguram a acolhida pelo povo comum. Sendo assim, o campo da recepção é definido por manobras e, nessa condição tanto a trama expositiva quanto a enunciativa tem suas estratégias, entre elas encontra-se o método que é responsável pela relação do real com o faccioso. Na medida em que o real passa a fazer parte do faccioso a familiarização da Literatura com o receptor amplia-se.

O desenvolvimento cultural e escolar ao longo dos anos capacitou a sociedade para receber as representações simbólicas que nos são passadas a cada dia através do romance e do cinema. Essas representações refletem um estilo de vida que nos é passado através da Literatura, responsável pela formação e não pela veracidade da trama.

 A sociedade composta por indivíduos oprimidos pela realidade criminosa, especialmente no meio urbano e oprimida pelas forças dominantes querem ver tais reflexos representados no cinema. No processo de distribuição dos elementos exigidos pelo púbico, a esfera de produção, assim como o autor do romance, ”responsabiliza-se” para representar tais desejos.

Assim podemos referenciar que:

“A Literatura nos permite viver em um mundo cujas leis trangridem as leis inflexíveis em meio às quais transcorre a nossa vida real, emancipados da prisão do espaço e do tempo, na impunidade para o excesso e donos de uma soberania que não conhece limites”. ( LLOSA, 2009, p. 27)

Llosa (2009) acrescenta, ainda, que uma boa literatura desenvolve uma sensibilidade inconformista em relação à vida, torna os seres humanos mais aptos para a infelicidade.

Podemos dizer que a literatura cria, imagina e critica de forma ficcional a sociedade. Não há regras, não há leis. Quase tudo é possível.

Com as colocações expostas no corpo deste trabalho esperamos ter realizado a comparação a que propusemos investigar no campo de recepção do romance e do cinema na sociedade brasileira, reconhecendo como recursos que nos habilitam a criticar, refletir e argumentar sobre a sociedade.

Referências Bibliográficas:

LLOSA, Mario Vargas. É possível pensar o mundo moderno sem o romance? In. MORETTI, Franco (org). O Romance, 1: A cultura do romance. São Paulo, Cosac Naify, 2009. p. 17 - 32.

ABRUZZESE, Alberto. Cinema e romance: do visível ao sensívelInA cultura do romance. Organização Franco Moretti. Tradução Denise Bottmann. São Paulo: Cosac Naify, 2009.