O RISCO DO ACEITE EM DUPLICATA MERCANTIL: como executar o juízo nesses casos¹
José Mauro dos Santos Carvalho Filho²
Humberto Oliveira³

RESUMO
O artigo em tela tem como objeto o estudo das duplicatas mercantis, espécie de título de crédito capaz de “fugir” de algumas características consideradas primordiais à natureza jurídica deles, visto que se trata de um título modal, que por vezes escapa à literalidade, ou mesmo a cartularidade, como será visto nesta pesquisa. Por trazer algumas destas características é necessário que se estude a possibilidade de ação cambial sobre o título em comento (ora, se ele foge das características que fundam a natureza jurídica dos títulos pode a duplicata ser executada sob o mesmo viés da letra de câmbio, por exemplo?). Para que se compreenda o assunto se fez necessária a análise de doutrina moderna, bem como a leitura da Lei nº 5.474/68, que dispõe sobre duplicatas mercantis.

Palavras-chave: Duplicata. Ação Cambial. Aceite
INTRODUÇÃO
Nos tempos hodiernos a existência dos títulos de crédito como a duplicata se vê em crescente extinção, entretanto, como se demonstrará na presente pesquisa o legislador se preocupa com a liquidez e com as formas de possibilitar ao credor a solvência do crédito inscrito no título em comento, tornando-o eficaz.
Deste modo, a presente pesquisa buscará não somente conceituar o título de crédito e suas principais características, mas também demonstrar a possibilidade de sua execução em sede de atividade jurisdicional, tornando o título além de líquido, exequível.

⦁    Um Breve Relato Histórico da Duplicata Mercantil

A duplicata, segundo remonta João Eunápio Borges (1977) é um título que, apesar de nascido com o Código Comercial, no seu artigo 219 e ter “permanecido letra morta  na prática do comércio, durante o século XIX”, é um título “genuinamente brasileiro”. Tratava-se meramente de um contrato de compra e venda com duas vias: uma ficava com o comerciante e a outra com o devedor. Qualquer uma das vias era suficiente para ser equiparada a título de crédito, sendo possível, por meio destas, haver a cobrança por meio judicial.
Em momento posterior, com advento da Lei nº 187/1936, Paulo Restiffe Neto (1974, p. 4) ensina que o presente título de crédito denominado duplicata assumiu uma natureza mais distante da de título crédito, mas mais ligada ao caráter fiscal, objetivando controlar o pagamento de tributos. Entretanto, com a vigência da Lei nº 5.474/68 a duplicata volta à sua finalidade primeira, qual seja a natureza creditícia ligada à atividade mercantil.
Como se verá na conceituação posterior do título de crédito, o presente instrumento serve “para representar o crédito decorrente de contratos de compra e venda mercantil e de prestação de serviços, negócios extremamente comuns na economia moderna” (TOMAZETTE, 2017). Deste modo, é correto afirmar que o título em questão “é um dos instrumentos mais úteis instrumentos de circulação de riquezas”, isso porque está umbilicalmente ligado ao consumo, seja de produtos ou de serviços, está, portanto, ligado à produção e sua comercialização no Estado.
Denomina-se duplicata mercantil aquela que tem “origem em compra e venda mercantil”, e duplicata de serviços “quando sua origem for o contrato de prestação de serviços”, sendo a primeira personagem principal da pesquisa em tela.

1.2 Considerações gerais

Marlon Tomazette (2017) cita Pontes de Miranda (2000) para conceituar a duplicata mercantil: “é o título cambiariforme, em que o criador do título assume por promessa indireta (isto é, de ato-fato alheio, que é pagar), vinculação indireta”. Destarte, a duplicata pode ser entendida deste modo: trazendo obrigações e direitos ao credor e ao devedor do título. Diz-se isso em razão da assunção de obrigação pelo credor (no caso da duplicata mercantil da obrigação da entrega de produto nos termos avençados). A obrigação do devedor é tão óbvia quanto seu direito: anuir e solver com o pagamento para o recebimento do produto.
Trata-se de “título de crédito formal, impróprio, causal, à ordem, extraído por vendedor [...] que visa documentar o saque fundado sobre o crédito decorrente de compra e venda mercantil [...], assimilada aos títulos cambiários por lei, e que tem como seu pressuposto a extração da fatura” (ROSA JÚNIOR, 2006).
No entendimento de Marlon Tomazette (2017) o presente título de crédito pode até mesmo ser criado pelo próprio credor, com a finalidade de representar seu crédito frente ao devedor em razão de contrato de compra e venda mercantil, é o que se vê da leitura do art. 2º, Lei nº 5.474/68:
“Art . 2º No ato da emissão da fatura, dela poderá ser extraída uma duplicata para circulação como efeito comercial, não sendo admitida qualquer outra espécie de título de crédito para documentar o saque do vendedor pela importância faturada ao comprador.”
Dessarte, é facultado ao credor “criar” o título crédito para representar a circulação de riquezas, sendo-lhe proibido somente a criação de outro título com a finalidade de memorar o saque do devedor pela importância constante na fatura do comprador.
Os personagens que compõem a cadeia deste título de crédito são, precipuamente, o Sacador e o Sacado. “Pensando em termos contratuais, o sacador será o vendedor [...] e o sacado será o comprador [...]. Em suma, nesse título, o vendedor dá uma ordem (grifo nosso) ao comprador para que ele pague ao próprio vendedor o preço estabelecido para o contrato em questão”.
⦁    O contrato mercantil, a fatura e o nascimento da duplicata
Há salutar discussão acerca da concepção da duplicata enquanto título de crédito, diz-se que se trata de título de crédito impróprio, isso porque “Ao contrário de outros títulos de crédito que podem se referir a qualquer crédito, a duplicata deve se referir necessariamente aos créditos decorrentes de contratos de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços.” (TOMAZETTE, 2017), deste modo, torna-se cristalina a relação do título com a causa que lhe dá origem (o contrato de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços), o que não acontece no restante dos títulos de crédito.
A duplicata, portanto, representa o crédito que nasceu em decorrência da relação comercial de compra e venda ou prestação de serviços. “Nenhum outro crédito poderá ser documentado na duplicata, nem mesmo os encargos como sobre o atraso no pagamento da obrigação contratual”. Acrescenta Marlon Tomazette (2017) que a duplicata, porquanto prever a influência de juros e mora sobre o crédito final dela, não pode somente prever isto, vez que perderia sua natureza de se referir a crédito decorrente dos contratos já citados supra.
A duplicata mercantil, entretanto não é caracterizada simplesmente pela aposição da compra e venda mercantil em folha em separado, mas pela emissão prévia de um documento denominado “fatura” (TOMAZETTE, 2017). Apesar dos contratos de compra e venda mercantil não serem solenes, isto é, são admitidos tanto em suas formas escrita quanto verbal, isso 
“não impede que haja uma descrição do produtos vendidos, ou dos serviços prestados em um documento que será entre ao comprador [...] como uma espécie de prova de finalização de um contrato de compra e venda[...]. Tal documento é o que se denomina fatura”.
Portanto, apesar da simplicidade característica do contrato que funda a duplicata comercial ainda deve haver a transcrição de um documento ligando o contrato de compra e venda ao crédito constante daquele (agora) título de crédito.
Luiz Emygdio da Rosa Júnior (2006) segue na mesma esteira quando conceitua a fatura como “o documento acessório da compra e venda com finalidade meramente probatória, sem valor autônomo, não sendo título representativo da mercadoria, mas da venda da mercadoria[...]”. Portanto, a análise do título de crédito em questão deve ser cuidadosa à percepção de que este não é capaz de servir como fator de descrição da mercadoria, mas de sua venda. Tomazette (2017) complementa:
“Em todo caso, ele deverá descrever o objeto do contrato, isto é, deverá descrever as mercadorias vendidas, ou, quando convier ao vendedor, indicará somente os números e valores das notas parciais expedidas por ocasião das vendas, despachos ou entregas das mercadorias”
É salutar a leitura da Lei nº 5.474/68, em seu art. 1º transcrita ipsi litteris:
  “Art . 1º Em todo o contrato de compra e venda mercantil entre partes domiciliadas no território brasileiro, com prazo não inferior a 30 (trinta) dias, contado da data da entrega ou despacho das mercadorias, o vendedor extrairá a respectiva fatura para apresentação ao comprador.”

É possível perceber que, apesar da faculdade ser a regra para emissão da duplicata pelo vendedor, a Lei estabelece que, quando o prazo não for inferior a 30 (trinta) dias, havendo o contrato de compra e venda mercantil, a fatura deverá ser emitida, para posterior extração da duplicata.
É, portanto, correto afirmar que a duplicata mercantil nasce da fatura (que é uma descrição da compra e venda mercantil), mas não é sua cópia simplesmente. “Esta é apenas um pressuposto de emissão da duplicata, mas não se confunde com ela que incorpora o próprio direito de crédito decorrente dos contratos de compra e venda mercantil” (TOMAZETTE, 2017).
Necessário que se diga que a duplicata decorre de uma fatura, apenas, eis que se decorrente de uma pluralidade de faturas, ou mesmo da duplicidade de faturas, a duplicata será considerada nula, visto que se trata de créditos e contratos distintos. Noutra via, necessário que se diga que “uma fatura poderá originar várias duplicatas, nos casos de o pagamento ser parcelado, sendo uma duplicata para cada parcela” (TOMAZETTE, 2017).
Independente da representação dela, como já visto alhures, a extração da duplicata é facultativa, sendo útil para que o vendedor (detentor primeiro do crédito) goze de suas características enquanto título de crédito, qual seja, precipuamente, a tradição rápida de imediata de um crédito em razão de outra obrigação, o que permite a antecipação do crédito constante no título (MARTINS, 1995). Fácil perceber que se não for pelas características descritas supra, praticamente não há porquê se criar o título em tela.
Gladston Mamede (2005) entende que o art. 2º da Lei nº 5.474/68 não deve ser interpretado em sua forma literal, isto porque se assim o fosse, condicionaria que a criação da duplicata somente se daria se simultânea a emissão da fatura, hermenêutica que não deve prevalecer, já que, segundo o autor, “a intenção do legislador foi estabelecer que para emitir uma duplicata é preciso emitir uma fatura. Assim, nada impede que a duplicata seja criada logo após a emissão da fatura ou mesmo posteriormente, mas nunca antes”.
O que reforça esse entendimento é a leitura do art. 6º, § 1º da já citada Lei nº 5.474/68:
“Art . 6º A remessa de duplicata poderá ser feita diretamente pelo vendedor ou por seus representantes, por intermédio de instituições financeiras, procuradores ou, correspondentes que se incumbam de apresentá-la ao comprador na praça ou no lugar de seu estabelecimento, podendo os intermediários devolvê-la, depois de assinada, ou conservá-la em seu poder até o momento do resgate, segundo as instruções de quem lhes cometeu o encargo.
§ 1º O prazo para remessa da duplicata será de 30 (trinta) dias, contado da data de sua emissão.”
O legislador faculta a remessa da duplicata em até 30 (trinta) dias, sendo o termo inicial a emissão da fatura. É possível que se diga, portanto, que o próprio legislador possibilita ao vendedor a extração da duplicata em tempo posterior ao da emissão da fatura. Óbvio que a possibilidade de extração da duplicata pelo vendedor está sempre condicionada aos princípios norteadores das relações contratuais, à exemplo da boa-fé.

2. O Aceite na duplicata mercantil

Na duplicata mercantil é necessário estar inscrito e bem delineado os nomes tanto do devedor quanto do credor para que não haja confusão com a posição dos atores na cadeia creditícia. Entretanto, é pacífico o entendimento de que pode constar apenas o nome do credor (vendedor) no título de crédito, o que evidencia a desnecessidade da assinatura do devedor (comprador)(TOMAZETTE, 2017).
Evidente que a falta da assinatura do devedor da obrigação contratual (contrato mercantil de compra e venda) acaba gerando efeitos nas relações obrigacionais decorrentes do título de crédito, isto porque, se “o comprador não assina o título, ele não assume nenhuma obrigação cambiária” (TOMAZETTE, 2017). Não é proporcional imaginar que a simples assinatura do credor constitui o devedor em mora daquele título de crédito. Cumpre ressaltar que a falta de assinatura não livra o devedor da obrigação relativa ao contrato, mas sim do título, não podendo responder por este.
“Embora não seja, a princípio, obrigado no título de crédito, o comprador (sacado) pode assumir a obrigação de pagar os valores ali constantes, por meio do aceite.” O aceite é conceituado por Fran Martins (1995) como o “ato formal segundo o qual o sacado se obriga a efetuar, no vencimento, o pagamento da ordem que lhe é dada”. Deste modo, quando o devedor acaba formalizando o aceite o principal efeito é de transformar uma obrigação que antes era contratual em uma obrigação cambial, transformando o contrato em título de crédito executivo extrajudicial, calhando em consequências judiciais relativas principalmente à celeridade processual, mas que não cabe destacar por ora.
“O aceite tornará o sacado o devedor principal do título. De outro lado, sem aceite ele é um mero nome indicado no título, podendo ter alguma obrigação contratual, mas não possuindo nenhuma obrigação cambial.” (TOMAZETTE, 2017). Como reportado alhures, o devedor somente se constituirá como pólo de obrigação cambial quando assinar a duplicata, de modo que quando não o faz pode ser cobrado somente sob o viés contratual.
Necessário que se diga que apesar de não ser obrigatória a assinatura há, na duplicata mercantil, uma operação própria, diz-se isto em razão do título constituir-se como causal, isto porque advém de contrato de compra e venda mercantil já externado pela fatura. Portanto, é fácil concluir que não há aqui qualquer acréscimo de obrigações àquele que assina o título de crédito, ou mesmo dá o aceite, mas uma mutação da espécie de obrigação, passando de contratual para cambial. 
Não há que se olvidar que sendo o contrato regularmente cumprido, “não há motivo para o devedor do contrato deixar de aceitar a duplicata, pois a obrigação já existe em função do contrato” (TOMAZETTE, 2017).
É salutar a leitura do artigo 8º, Lei nº 5.474/68:
Art . 8º O comprador só poderá deixar de aceitar a duplicata por motivo de:
I - avaria ou não recebimento das mercadorias, quando não expedidas ou não entregues por sua conta e risco;
II - vícios, defeitos e diferenças na qualidade ou na quantidade das mercadorias, devidamente comprovados;
 III - divergência nos prazos ou nos preços ajustados.
Da leitura do artigo supra é possível que se depreenda que o legislador estabelece critérios excepcionais em que o comprador poderá negar o aceite à duplicata mercantil. O dispositivo é bem claro ao estabelecer as hipóteses capazes de gerar a excepcionalidade: quando o produto vem danificado, mas o transporte não se dá pela conta e risco do comprador; quando há discrepância na qualidade ou quantidade de mercadorias efetivamente entregues àquelas avençadas; quando há diferença entre os prazos e preços acordados àqueles descritos na duplicata mercantil.
Ora, se o legislador se preocupa em dispor no ordenamento as hipóteses em que o comprador pode negar o aceite, é óbvio que o aceite é, precipuamente, obrigatório, podendo ser negado à duplicata mercantil somente nos casos supra. A obrigação cambial nasce da obrigação contratual, se esta última é falha, prestada de maneira diversa da pactuada, não há que se falar em mutação da obrigação contratual para cambial traduzida pelo aceite.
Nas palavras de Marlon Tomazette (2017) primeiramente 
“autoriza a recusa do aceite a exceção do contrato não cumprido, isto é, se o vendedor não cumpriu sua obrigação na forma ajustada, seja pela não entrega das mercadorias, seja pelas diferenças (quantidade e qualidade) entre as mercadorias compradas e aquelas entregues, seja pela existência de avarias nas mercadorias, o comprador não tem que paga o preço e, consequentemente, não tem a obrigação de dar o aceite. Se ele não precisa honrar a obrigação contratual, ele não precisa pagar o título e, se ele não precisa pagar o título, ele não precisa assumir a obrigação de pagá-lo”
A exceção do contrato não cumprido é princípio componente do direito contratual pátrio, capaz de gerar a nulidade do pactuado entre as partes. Se a obrigação é maculada, não é executada na forma avençada não há como se cogitar que o devedor se obrigue a pagar o título de crédito oriundo da obrigação.
O autor continua sua análise acerca das hipóteses em que o devedor pode negar o aceite à duplicata mercantil:
“Em segundo lugar, também autorizam a recusa do aceite as divergências entre os preços ou prazos estipulados, de modo que o teor da duplicata não se identifica com o crédito decorrente do contrato que a originou. Nesse caso, o que há é uma diferença entre o que foi ajustado no contrato e o que consta na duplicata. Ora, se o aceite é a confirmação da obrigação contratual, ele só deverá ser dado se o teor do título for o da obrigação contratual. Se o valor for diverso ou o prazo for diverso, não é a mesma obrigação contratual, e, por isso, o comprador não tem a obrigação de confirma-la”(TOMAZETTE, 2017)
Quando há divergência entre os termos pactuados e aqueles descritos na duplicata, o entendimento é de que o devedor não está obrigado ao aceite do mesmo, isto porque, divergindo as informações entre o contrato (pode ser na fatura também) e o título, estas ou se referem à obrigações diversas ou simplesmente destoam do acordado entre as partes, e, sendo assim, não há porque o devedor confirmar a operação aceitando a duplicata mercantil.
2.1 Tipos de Aceite

2.1.1 Aceite Ordinário

Como o próprio nome nos deixa supor, trata-se da assinatura da duplicata pelo devedor quando esta está em completa concordância com pactuado no contrato, 
“sem a ocorrência de qualquer das hipóteses legais autorizadoras da recusa do aceite [...] Nesse caso, pelo formalismo que rege os títulos de crédito, deve o sacado, de próprio punho ou por meio de procurador com poderes especiais, assinar o título no anverso (frente), em campo próprio destinado ao reconhecimento da exatidão da duplicata e a assunção da obrigação”(TOMAZETTE, 2017).
Trata-se da forma mais corriqueira de aceite, razão pela qual se denomina “ordinário” o aceite que acontece da forma inscrita alhures. Fran Martins (1995) aduz que “uma vez dado o aceite, não subsiste qualquer dúvida quanto à obrigação documentada na duplicata, a qual, torna-se líquida”, o que traduz uma influência processual (em caso da ocorrência de litígio entre as partes), vez que constituído o título de crédito, respeitado os prazos é superada a fase de conhecimento no processo civil.

2.1.2 A Duplicata Mercantil remetida, mas retida

Ainda que o aceite não seja essencial para a existência da duplicata, é comum que o credor busque a assinatura do devedor para que se dê maior liquidez ao título de crédito mercantil, entretanto é necessário que a duplicata mercantil seja apresentada ao sacado para que este possa assinar.
De acordo com a Lei nº 5.474/68, em seu art. 6º, § 1º, o sacador deve remeter ao sacado o título de crédito no prazo de 30 dias, constituindo a necessidade da remessa da duplicata após correta execução do contrato, extraída sua fatura e emitida a duplicata. (TOMAZETTE, 2017).
“Em todo o caso, tais prazos são impróprios, vale dizer, sua inobservância não gera maiores consequências” (ROSA JÚNIOR, 2006), obviamente, não sendo o aceite obrigatório, a apresentação do título também não é.
Após a apresentação da duplicata pelo sacador, o sacado deve devolvê-la no prazo de 10 (dez) dias já devidamente assinada ou com as explicações do porquê da falta do aceite, é o que dita o art. 7º, Lei nº 5.474/68. O parágrafo 1º dispõe sobre a única hipótese legal em que o sacado poderá reter a duplicata, havendo a concordância da instituição financeira (que pode ser meio utilizado pelo sacador para o bom andamento da relação jurídica), até a data de vencimento do título de crédito, entretanto é necessário que o sacado comunique da retenção e aceite da duplicata.

2.1.3 O Aceite Presumido

Noutra esteira, pode ocorrer do saco, por motivos alheios ao ordenamento deixa de apor seu aceite por meio da assinatura no anverso do título da duplicata mercantil, como já foi visto antes, mas salutar que se repise, a não assinatura do sacado o sujeita à obrigação contratual, o que deixa de haver simplesmente é a mutação da obrigação contratual para cambiária. Apesar de não haver a dissolução da obrigação, o caminho para se executar o contrato é deveras mais lento que o caminho para se executar um título de crédito.
Marlon Tomazette (2017) aduz que “os títulos de crédito surgiram justamente para se ter uma solução mais rápida de eventuais inadimplências”, ora, se somente a falta de assinatura do devedor (que, sabendo de sua provável insolvência, recusa) o livrasse da obrigação cambial, o ato se constituiria em evidente injustiça para o credor que de boa-fé adimpliu com sua parte da obrigação.
Luiz Emygdio da Rosa Júnior (2006) aduz que foi sob esta perspectiva que nasceu o aceite presumido, reconhecendo a existência do aceita, como ato de vinculação do sacado, ainda que não aponha sua assinatura no anverso do título, excepcionando os princípios gerais dos títulos de crédito, em especial o da literalidade.
É sob esse viés que está fundado o costume do vendedor expedir um comprovante de entrega quando da execução de sua parte na obrigação, qual seja, a entrega da coisa nos termos avençados. É necessário que se diga que não há necessidade da assinatura do sacado no comprovante de entrega, mas de alguém do endereço. Deste modo, “havendo aparência de regularidade, deverá ser aceito o comprovante de entrega das mercadorias, cabendo ao eventual sacado comprovar a irregularidade dessa entrega para afasta a validade do comprovante”(TOMAZETTE, 2017).
O comprovante tem, portanto, a finalidade de comprovar o bom cumprimento da obrigação, de modo que se assim o faz, tem em suas mãos título de crédito como se tivesse sido aceito pelo devedor. O efeito é importante em sede de discussão da execução da dívida entre sacador e sacado.
Tomazette (2017) repisa que ainda que o comprovante nada tenha a ver com o título de crédito, a lei de duplicatas acaba reconhecendo a obrigação por meio justamente do comprovante. Todavia, havendo a falta de aceite (ordinário), o credor deve protestar o título, seja pela falta do aceite, ou pela própria falta de pagamento, para que se publicize a situação e o devedor tenha (aos olhos da norma) a possibilidade de aduzir o porquê da falta de aceite (nos termos da lei nº 5.474/68) ou do pagamento é o que dita a lei nº 5.474/68 em seus arts. 8º e 21.
Cunha Peixoto (1971) é pontual quando afirma que “não prevalece aqui a forma do título, mas a verdade do ato, a realidade da vida dos negócios, ilação perigosa para os mal intencionados, mas altamente vantajosa para os comerciantes de boa-fé”. Destarte, apesar de não privilegiar a literalidade do título de crédito, o legislador acaba maximizando sua liquidez, de modo que torna a utilidade da duplicata mais confiável do que se o aceite presumido não existisse, calhando insegurança muito maior para o credor do título.
2.1.4 O Aceite por comunicação

Fabio Ulhoa Coelho (2004) ainda remonta ao aceite por comunicação, caracterizado pela comunicação do sacado que produzirá os mesmos efeitos do aceite. Tal hipótese só pode ocorrer no caso de retenção do título pelo sacado, que, como já foi citado antes, só pode ocorrer quando há a concordância da instituição financeira intermediária da relação jurídica (art. 7º, parágrafo 1º) Lei nº 5.474/68.
3. As Ações Cambiais
O protesto não é um meio próprio para buscar o recebimento da duplicata, sendo a ação cambial o meio mais eficaz para a cobrança dela. Trata-se de uma ação executiva baseada no título de crédito. Deste modo, à priori, a documentação necessária para o ajuizamento, além da identificação das partes, o título de crédito. Entretanto, é necessário que se faça algumas pontuações à situações diferenciadas (TOMAZETTE, 2017).
3.1 Execução do devedor principal
Para a execução do devedor principal, é necessário que haja a assunção da dívida deste por meio do aceite, podendo o aceite ser ordinário, presumido ou por comunicação (TOMAZETTE, 2017).
É necessário que se leia o art. 15, inciso I, da Lei nº 5.474/68 que trata sobre a execução de título de crédito na situação descrita supra:
“Art 15 - A cobrança judicial de duplicata ou triplicata será efetuada de conformidade com o processo aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, de que cogita o Livro II do Código de Processo Civil ,quando se tratar:
 I - de duplicata ou triplicata aceita, protestada ou não;”
O artigo em comento deixa claro acerca da necessidade de duplicata para a prossecução da demanda, mas como já afirmado alhures (mas necessário que se reedite), deixa de fora a necessidade de protesto, ou mesmo o comprovante de entrega de mercadorias, tema já visitados nesta pesquisa (o que, por óbvio se fez necessário, já que compõe a relação mercantil que dá origem à duplicata).
Deste modo, o aceite torna o título apto para ser executado em face do devedor insolvente, sendo suficiente para a formação probatória da demanda.
Entretanto, como citado supra, há a figura do aceite presumido, instituto que surge da percepção do legislador para não deixar o credor de boa-fé sofrer o prejuízo sem a ele ter dado causa. Razão pela qual o inciso II do citado artigo 15 da Lei 5.474/68 diz que a falta do aceite pode ser suprida pela demonstração da entrega de mercadoria, por meio, claro, do comprovante de entrega.
Entretanto, necessário que se junte ao documento o protesto (tornando pública a informação da falta do aceite para que, em tese, se dê ao devedor a chance de dizer o porquê da falta) e o comprovante de entrega, sendo esta a documentação hábil para demonstrar o crédito do sacado junto ao sacador, entende-se que por não haver aí a necessidade de assinatura, trata-se de clara quebra da literalidade presente nos títulos de crédito em geral (ALMEIDA, 2014).
Todavia, por ocorrer também da duplicata ficar em poder do sacado, no caso citado da instituição financeira ser um meio pelo qual o sacador poderá cobrar o devedor. Nesse caso, será necessário que o sacador faça um protesto por indicação, constante no art. 15, parágrafo 2º, Lei 5.474/68, afastando a necessidade da apresentação do título para demonstração do crédito, excepcionando-se o princípio da cartularidade (MAMEDE, 2015)
3.2 Execução dos devedores indiretos
Nesse caso, é essencial que se apresente o título e do protesto em prazo tempestivo, é o que se vê da leitura do art. 13, parágrafo 4º, Lei 5.474/68. O título é o documento pelo qual os devedores indiretos se submeteram à relação cambial. Noutra via, a comprovação de entrega de mercadorias não é necessária, eis que o endosso é capaz de fazer com que o título se abstraia da causa que dá relação à duplicata, criando relação entre endossantes e endossatários (TOMAZETTE, 2017).
3.3 Ações Ordinárias ou Monitórias?
A duplicata é, precipuamente, título de crédito, ou seja, é capaz de, por si só, demonstrar a relação cambial entre devedor e credor, havendo, portanto, uma benesse processual no que tange à celeridade processual para a resolução da insolvência (do credor ou do devedor). Sabendo disso, é necessário que se pontue que a duplicata quando estiver incompleta, ou mesmo se estiver prescrita poderá ser cobrada em sede de ação de cobrança, procedimento ordinário que submete o título ao processo de conhecimento (MAMEDE, 2015).
Noutra esteira a ação monitória pode existir ainda que a duplicata não esteja totalmente completa, mas que esteja suprida por protestos, ou por comprovantes de entrega de mercadorias, que são capazes de formar a liquidez o título em comento como já citado acima.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A duplicata mercantil é um título de crédito oriundo da compra e venda mercantil, deste modo, temos uma obrigação contratual que, por meio do aceite, transmuta-se em ação cambial. A duplicata, apesar de ser um título de crédito incomum, não foge à natureza jurídica dos títulos, sendo-lhe garantidas pelo legislador sua liquidez e exiquibilidade, de modo que a Lei 5.474/68 preocupa-se sempre com a possibilidade tanto do credor demonstrar o seu ato constitutivo de direito, quanto o devedor demonstrar o que impede, exclui o direito do credor.

    
5. REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 5.474/1968. Presidência da República, Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em: . Acesso Em: 01 jun. 2017.

João Eunápio, BORGES. Títulos de Crédito. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 204 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017, p. 280-300.

MARTINS, FRAN. Títulos de Crédito. 5. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, v.2, p.188 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.

MARTINS, Fran. Títulos de Crédito. 5.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, v.1, p.180, 198 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.

MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: Títulos de crédito. 2. Ed. São Paulo: Atlas, 2005, v.3, p. 316; ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio da. Títulos de Crédito. 4.ed. Rio de Janeiro: Renovar: 2006, p. 676 – STJ – 3ª Turma – Resp 292.355/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJ de 18/2/2002 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.

MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito cambiário. Campinas: Bookseller, 2000, v.3, p. 33 204 
ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio da. Títulos de Crédito. 4. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 673 204 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.

PEIXOTO, Carlos Fulgêncio da Cunha. Comentários à lei de duplicatas. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, p.90 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.

RESTIFFE NETO, Paulo. Novos rumos da duplicata. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974, p. 4 204 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.

ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio da. Títulos de Crédito. 4.ed. Rio de Janeiro, Renovar, 2006, p. 672, 700 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.

STJ – REsp 198.215/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Quarta Turma, julgado em 11/5/1999, DJ 14/6/1999, p.210 apud TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 8. Ed. São Paulo, Atlas, 2017.