O REGIME JURÍDICO DO ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL[1]

                                                                                                                         Darla de Medeiros Gonçalves Gaspar[2]

                                                                                                                                                   Laysa Ribeiro Soares[3]

                                                                                                                                                      Humberto Oliveira[4]

 

Sumário: Introdução; 1 O processo histórico das relações comerciais; 2 Natureza jurídica do estabelecimento empresarial; 3 Os elementos que compõem o estabelecimento empresarial; 4 O estabelecimento empresarial atual e sua legislação; Considerações Finais e Referências.

                                                RESUMO

O presente trabalho busca compreender a natureza jurídica do estabelecimento empresarial, suas relações e o conjunto de fatores socioeconômicos que envolvem a produção e a circulação de bens e serviços dentro da atividade econômica escolhida pelo empresário, ou seja, os elementos que compõem o estabelecimento empresarial. Tais elementos podem ser previstos numa legislação específica que prevê e estabelece normas de controle para esse tipo de atividade. Também discorre sobre o processo histórico das relações e seu desenvolvimento até os dias atuais, mostrando sua evolução a partir de correntes teóricas fundamentais para seu entendimento no contexto socioeconômico atual. Por fim, discorre sobre a mudança do âmbito da legislação do antigo Código Comercial para o Novo Código Civil e como essas mudanças afetam juridicamente o empreendimento comercial.

Palavras-chave: Estabelecimento empresarial. Relações comerciais. Legislação.

Introdução

            O presente trabalho tem por pretensão abordar sobre a natureza do estabelecimento empresarial, no qual é constituído por um conjunto de bens fundamentais para o desenvolvimento da atividade econômica chefiada por um empresário. No decorrer do trabalho ficam evidentes algumas características relevantes do estabelecimento comercial que influem na natureza do mesmo, como por exemplo, o fato de o estabelecimento empresarial não ser um sujeito de direito, de não ser pessoa jurídica e de ser parte integrante da sociedade empresarial, embora se distingue da mesma.

No curso do trabalho dá-se ênfase para as questões históricas das relações comercias e as suas fases, a princípio uma das primeiras formas de “fazer comércio” era por meio das trocas diretas, conhecida como escambo, passada essa fase, surgem às moedas, com a insatisfação das pessoas mediante as trocas, esse elemento de intermediação ganha grandes proporções, e com a escassez do metal precioso necessário para fazer as moedas surge uma nova fase, e com ela surge a figura do crédito, pautado na confiança e no pagamento a prazo.

            Posteriormente, surgem os elementos que compõem o estabelecimento empresarial, elementos indispensáveis para o bom funcionamento de uma empresa e para o exercício da atividade econômica, como o trabalho, a clientela, o ponto comercial e o trabalho. E por fim, o enfoque será dado ao estabelecimento empresarial atual e a sua legislação, que verificará o tipo de estabelecimento empresarial e regulará as relações comerciais presentes no mesmo.  

1 O processo histórico das relações comerciais

            As primeiras relações comerciais eram bastante primitivas e ainda não eram caracterizadas como uma atividade econômica, e sim simples trocas diretas, conhecidas como escambo, realizadas por grupos de nômades primitivos. Como os nômades produziam produtos apenas pra o próprio sustento, eles acabavam permutando por outras mercadorias, essas permutas nem sempre eram proporcionais, geralmente não.

            Com a permanência de alguns desses grupos em lugares fixos, como por exemplo, o delta do rio Nilo e Eufrates, algumas atividades necessárias para o desenvolvimento da vida nômade, deram espaço para o exercício de funções específicas. Com essa evolução, surgiram relações mais complexas e pessoas mais sedentárias, afinal não precisam mais sair em busca de condições de vida adequadas. Surgiram desta forma a determinação de funções, os mais fortes recebiam a função de guerreiro, deveria proteger o grupo, as mulheres e crianças normalmente ficavam responsáveis pela agricultura e pelo artesanato e os idosos cuidavam do pasto.

 Antes essas pessoas viviam em um grupo independente e autônomo, porém com as novas transformações, todos se tornaram dependentes uns dos outros. Quando anteriormente as trocas eram desiguais e todos estavam satisfeitos, nessa nova configuração de sociedade, para satisfazer as necessidades e ambições era necessário mais, elevou o número de bens e de serviços e consequentemente eles perceberam que para não se extinguir o grupo deveria existir uma relação de interdependência entre os membros.

Com o passar do tempo, as pessoas já demonstravam insatisfação com as trocas diretas, e é a partir desse momento que surge a moeda, como um meio de intermediação das relações comercias e como um meio de trocas indiretas. As moedas ganharam inúmeras funções, como a de medida de valor, pagamento posterior e também serviam para demonstrar quem eram os mais ricos, ou seja, aqueles que detinham posse de um número considerado de moedas eram considerados com enormes riquezas.

O sistema monetário ganhou grande importância nesse período e resiste até os dias atuais, porém com uma considerada diminuição na quantidade e no material da moeda. Antigamente as moedas deveriam ser duráveis e resistentes ao tempo por isso eram constituídas de um material metálico, com ouro e prata, porém com o acumulo de moedas por parte da população com o intuito de adquirir e guardar riquezas, as moedas entraram em escassez. Atualmente com a tecnologia e avanços constantes, as moedas que já passaram por fases, como a metálica, a de papel e hoje surge uma mais moderna, a moeda digital, na qual os clientes podem comprar e automaticamente efetuar o pagamento através do débito automático.

Com a escassez das moedas, surge a figura do crédito, que a princípio estava pautado na confiança e era apenas um crédito verbal, as pessoas conversavam, uma vendia o produto, enquanto a outra comprava e algum tempo depois a dívida era sanada. Porém, para evitar fraudes, surge o crédito escrito, um documento escrito era assinado por ambos, pelo vendedor e comprador para comprovar que a compra e a venda do produto tinha sido de fato realizada, ainda sim era uma relação pautada na confiança, contudo com algumas garantias. Os valores dos produtos eram consignados e a prazo, o que facilitava a venda e o pagamento posterior. São com essas figuras de pagamento que surgiram as relações comerciais e o desenvolvimento da economia atual.

2 Natureza jurídica do estabelecimento empresarial

            Verifica-se previamente a importância de buscar um conceito para estabelecimento empresarial, para posteriormente adentrar no tema de fato do tópico. Por estabelecimento empresarial caracteriza-se um conjunto de bens indispensáveis para o desenvolvimento da atividade econômica. O responsável por fazer progredir essa atividade econômica para a produção de bens de serviço é o empresário, habilitado profissionalmente para a função. De acordo com Fábio Ulhoa:

"Estabelecimento empresarial é o conjunto de bens reunidos pelo empresário para a exploração de sua atividade econômica. Compreende os bens indispensáveis ou úteis ao desenvolvimento da empresa, como as mercadorias em estoque, máquinas, veículos marca e outros sinais distintivos, tecnologias etc”.

Em relação à natureza do estabelecimento empresarial é necessário distinguir do sujeito de direito e da atividade econômica, ou seja, não se pode confundir estabelecimento com sociedade empresária (sujeito de direito) e nem com a própria empresa (possuidora de atividade econômica). (COELHO, 2008, p. 99). Embora o estabelecimento seja formado por bens materiais ou corpóreos ( mercadorias e máquinas) e incorpóreos ou imateriais ( nome do estabelecimento e o ponto comercial), ele não possui personalidade jurídica, bem como vem descrito no rol do artigo 44, CC, já que quem está ligado aos deveres e as responsabilidades da empresa é a sociedade empresária, a ela cabe à personalidade jurídica.

Art. 44,CC.  São pessoas jurídicas de direito privado:

I - as associações;

II - as sociedades;

III - as fundações.

IV - as organizações religiosas; (Incluído pela Lei no 10.825, de 22.12.2003 )  

V - os partidos políticos. (Incluído pela Lei no 10.825 de 22.12.2003)

VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada (Incluído pela Lei no 12.441, de 2011). 

 O estabelecimento empresarial é uma universalidade de fato, ou seja, de bens fundamentais para a atividade econômica, determinados pelo dono com uma destinação unitária, embora, existam doutrinas contrárias que afirmam que o estabelecimento empresarial é universalidade de direito, não é majoritária. Já a sociedade empresária é uma universalidade de direito, formada por um conjunto de relações jurídicas de uma única pessoa que possuem valor econômico, as duas estão previstas no Código Civil.

Art. 90 Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária.

Art. 91 Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico.

É importante compreender que o estabelecimento é um bem (coisa) móvel, que pode ser constituído por bens imóveis também, sem personalidade jurídica, sendo o mesmo agregado à propriedade da sociedade empresarial. Como vêm definidos no artigo 1143 do Código Civil Brasileiro, esses bens que constituem o estabelecimento se abdicados, podem ser transferidos solitariamente ou coletivamente (trespasse) e por fazerem parte de uma universalidade de fato, não estão amarrados a relações jurídicas unificadas, com isso esses bens poderão ser objetos de relações jurídicas independentes.

Não fazem parte do estabelecimento empresarial, o aviamento (lucro que o estabelecimento gera) e a clientela. O aviamento apenas integra o estabelecimento, embora não faça parte, já a clientela não pode ser considerada um bem do estabelecimento, pois, não pode ser tratada como coisa e de propriedade do dono do estabelecimento. Contudo, os contratos que anteriormente não eram considerados parte integrante do estabelecimento, atualmente como previsto no art. 1148 do Código Civil são considerados integrantes do estabelecimento.

 Art. 1.148 do Código Civil, aparentemente tentou resolver esse problema ao prever que “salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub-rogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal, podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias, a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante”.

              

Após o artigo 1148 estabelecer que os contratos poderão ser incorporados nos ajustes de tratados de transição do estabelecimento, isto faz com que o estabelecimento possa ser transferido isoladamente por meio da sub- rogação, há exceções, como os contratos pessoais.

Há ainda uma diferenciação entre estabelecimento jurídico e patrimônio, embora o estabelecimento seja parte integrante do patrimônio, eles não se misturam em uma só coisa. Existem componentes do estabelecimento, como os contratos em alguns casos, que não fazem parte do patrimônio do empresário, bem como existem alguns poucos componentes que não compõem o patrimônio. Como por exemplo: Uma transportadora de carga por meio de um contrato com uma empresa de veículos de grande porte adquire uma parcela de caminhões, a transportadora não possui o direito pleno sobre os caminhões, embora o contrato estabelecido faça parte do estabelecimento empresarial, já que os veículos são necessários para o desenvolvimento da atividade econômica da transportadora. Maria Helena Diniz conceitua patrimônio como:

Direito Civil. Complexo das relações jurídicas de uma pessoa que tenham valor econômico (Clóvis Bevilaqua). Incluem-se no patrimônio: a posse, os direitos reais, as obrigações e as ações correspondentes a tais direitos. O patrimônio abrange direitos e deveres redutíveis a dinheiro, consequentemente, nele não estão incluídos os direitos de personalidade, os pessoais entre cônjuges, os oriundos de poder familiar e políticos” (DINIZ, 2005, p. 615/616).

        Entretanto, essa distinção não deve ser levada em conta em casos que haja confusão entre a pessoa física e a pessoa jurídica, ou seja, entre o empresário e a empresa individual, em razão da convicção do princípio da unicidade patrimonial, no caso do empresário não optar por empresa de responsabilidade limitada (previsto no artigo 44, parágrafo único, Lei no 12.441, CC), nesses casos o patrimônio da empresa não se liga ao patrimônio do empresário.

3 Os elementos que compõem o estabelecimento empresarial

Pelo próprio conceito de estabelecimento empresarial pode-se conceituar os diversos elementos que o compõem. Por ser o empreendimento “a reunião dos bens necessários ao desenvolvimento da atividade econômica” (ULHOA, 2011, pág. 57), pode-se perceber que, a partir do ramo de atividade do empreendimento, esses elementos podem variar bastante. Entretanto, existem elementos presentes e obrigatórios a todo tipo de atividade empresarial.

A empresa prestadora de serviços não vai necessitar, obviamente, de máquinas e equipamentos físicos mais característicos de empreendimentos voltados para a transformação de matérias primas, por exemplo, ou seja, não se pode comparar a estrutura física de uma gráfica, que produz jornais ou revistas e que, por sua vez, necessita de uma grande quantidade de máquinas, com uma agência de viagens, que se estabelece com poucos elementos físicos estruturais para poder existir.

Dessa forma, serão definidos primeiramente os elementos físicos do empreendimento empresarial e, posteriormente, serão abordados os elementos presentes em todos os estabelecimentos, chamados de elementos jurídicos.

É importante destacar que o empreendimento empresarial não se confunde com os bens que o compõem, podendo-se até admitir que os seus elementos sejam desagregados sem que o estabelecimento tenha sequer seu valor diminuído (ULHOA, 2011, pág. 58).

É claro que no caso de desarticulação de todos os bens e de tudo aquilo que foi reunido pelo empresário com a finalidade por ele buscada, vai desaparecer. O que se quer mostrar aqui é que a essência do empreendimento continua existindo mesmo que o seu patrimônio físico seja destruído, por um incêndio, por exemplo. A empresa, enquanto elemento componente da estrutura socioeconômica de um determinado território vai continuar existindo. Até porque o estabelecimento empresarial é composto por bens corpóreos e incorpóreos, não se devendo confundi-lo com o local do exercício da atividade.

Assim, de acordo com Tomazette (2012, pág. 100), como elementos corpóreos, encontramos todos os bens físicos que fazem parte do estabelecimento, como: mercadorias, mobília, máquinas e equipamentos. Já como elementos incorpóreos têm-se as marcas registradas, o nome empresarial, as patentes de invenção, o título do estabelecimento e o ponto empresarial, entro outros. Alguns desses elementos merecem destaque especial, dentre eles:

  • Imóvel

Estabelecimento físico da empresa é o local da atividade empresarial. Mesmo que funcione como base filial, o imóvel é o bem utilizado pelo empresário para o desempenho ou desenvolvimento de sua atividade.

Segundo Tomazette (2012, pág. 100),

os imóveis sempre foram úteis para o desenvolvimento das atividades econômicas, servindo como base física estável para a realização dos negócios. Assim, como o imóvel é utilizado para a atividade empresarial, quando pertencente ao empresário, logo é elemento integrante do estabelecimento.

Entretanto, essa questão gera controvérsias. Para Requião (apud Tomazette, 2012, p. 100), nesse caso o imóvel seria elemento da empresa e não do estabelecimento, pois segundo sua tese, “o estabelecimento é uma coisa móvel e que por isso, não poderia ser constituído de coisas imóveis.” Não se pode negar a importância fundamental do imóvel como local de exercício da atividade empresarial. Dessa forma, se o imóvel for de propriedade do empresário, ele será entendido como elemento do estabelecimento. Se o imóvel não é próprio, mas alugando, por conseguinte, não poderá integrar o estabelecimento, sendo apenas seu o direito de uso.

Quando o imóvel é alugado, “o ponto empresarial é protegido como elemento integrante do estabelecimento, assegurando-se ao empresário o direito de renovação da locação, atendidas determinadas hipóteses legais, e a indenização no caso de não renovação.” (pág. 102).

  • O ponto empresarial

Embora possa se confundir como imóvel onde é exercida a atividade empresarial, o ponto comercial é um elemento incorpóreo do estabelecimento. Para Tomazette (2012, pág. 101), “o ponto empresarial é um bem diferente do imóvel, tanto que pode ser até objeto de locação, sem que isso desvirtue a sua natureza de elemento do estabelecimento.” Outro fator importante que caracteriza o papel do ponto empresarial é o local onde o mesmo está situado.

É certo que a localização do estabelecimento contribui em muito no seu sucesso ou fracasso. Assim, é perfeitamente viável a localização de uma papelaria perto de uma escola ou a localização de um posto de combustíveis perto de concessionárias, ou sorveterias em praias. A localização do empreendimento, acima de tudo deve facilitar o acesso aos clientes e não o contrário. Em contrapartida, seria inviável abrir um estabelecimento que vende sorvete em uma cidade de clima frio.  Portanto, pode-se perceber a importância da localização da empresa como fator coadjuvante na lucratividade do negócio escolhido pelo empresário.

  • O trabalho

Constitui-se o elemento fundamental para o exercício da atividade econômica. Não se pode imaginar um estabelecimento empresarial livre do fator trabalho. Para Tomazette, (2012, pág. 101),

De nada adianta um grande complexo de bens corpóreos e incorpóreos sem que haja um trabalho bem exercido que permita a organização e coordenação desses bens para o exercício da empresa. O trabalho é tão ou mais importante do que os bens corpóreos e incorpóreos que integram o estabelecimento.

O trabalho pode ser exercido tanto pelo empresário, quanto por qualquer funcionário. Uma vez que só se admitem empregados, quando estes desempenham atividades produtivas, ou seja, trabalho.

  • A clientela

“É o conjunto de pessoas que, de fato, mantém com a casa de comércio relações contínuas para a aquisição de bens ou serviços.” TOMAZETTE (2012, pág. 105). Assim, a clientela é o componente intermediário entre a atividade empresária e o lucro. Quanto maior a clientela, maior deve ser a produção de bens e serviços e, por conseguinte, o lucro obtido pelo empresário. A clientela constitui-se o elemento-chave para o sucesso do empreendimento. Sem clientela, o estabelecimento não tem porque produzir e acaba deixando de existir. O fator clientela é tão importante para a vida do empreendimento, que os legisladores preocupados com a questão da concorrência desleal, produziram uma legislação específica para proteger o empresário desse tipo de perigo.

4 O estabelecimento empresarial atual e sua legislação

Até a reforma do Código Civil de 2002, a legislação que regulava as relações empresariais, comerciais e industriais, era a do Código Comercial de 1850. Nota-se que por ser muito antigo, tal código já apresentava artigos superados e que necessitavam de um novo tratamento, este transcrito no Novo Código Civil (Lei nº 10.406/02).

A maior diferença entre o antigo Código Comercial e o Novo Código Civil é que o tratamento específico das leis de comércio ficou diluído no novo código, que por sua vez é bastante amplo, abrangendo a legislação anterior e suas modificações.

De acordo com Taddei (2010),

No Brasil, a legislação vigente era Código Comercial de 1850 e não disciplinaram especificamente a matéria, apenas a antiga e revogada Lei de Falências (art. 52, VIII, Dec.-lei nº 7.661/45) referia-se ao estabelecimento prevendo a sua venda e, a Lei do Inquilinato (Lei nº8. 245/1991), prevê proteção indireta ao estabelecimento, assegurando no art. 51 proteção ao ponto empresarial por meio da ação renovatória.

Dentre as modificações do Novo Código Civil em relação ao antigo Código Comercial, pode-se indicar o tratamento diferenciado que foi dispensado ao estabelecimento empresarial, o qual como elemento de empresa, pode ser visto como parte essencial para a execução da exploração econômica escolhida pelo empresário.

Apesar de o novo Código não utilizar a expressão estabelecimento empresarial, entende-se que o termo deva ser usado em decorrência do novo tratamento que é dado ao termo “comércio” presente no antigo código. Apesar de muitas discussões, ainda continuam existindo muitas divergências sobre a natureza do estabelecimento empresarial, como termo utilizado para definir o antigo termo “comércio”, do antigo código. Para Taddei (2010),

Atualmente, a doutrina moderna dominante entende que o estabelecimento empresarial apresenta a natureza de universalidade de fato, já que corresponde a um conjunto de bens que se mantém unidos, destinados a uma finalidade, por vontade e determinação do seu proprietário.

Isso pressupõe que o estabelecimento é entendido como os conjuntos de bens que, unidos, servem de meio utilizado pelo empresário para o exercício da atividade econômica. Entretanto, como afirma Taddei (2010), “estabelecimento empresarial não é uma pessoa jurídica, é uma universalidade de fato que integra o patrimônio do empresário individual ou da sociedade empresária, sendo objeto de direito, pode ser alienado, onerado, arrestado, penhorado ou objeto de sequestro”.

Portanto, o empresário e o estabelecimento não são o mesmo elemento. Assim como a empresa, cada elemento destes representa uma parte diferente dentro do estabelecimento, com características e objetivos diferentes entre si. Enquanto o empresário é entendido como a pessoa que exerce a atividade econômica, empresarial, a empresa pode ser entendida como a própria atividade econômica. Já o estabelecimento empresarial é o meio pelo qual é exercida tal atividade. Nota-se que são termos interligados, porém inteiramente diferentes, compostos de definições e legislações específicas.

Considerações Finais

O estabelecimento empresarial constitui-se um dos mais importantes assuntos discutidos e estudados pelo Direito Empresarial. Como base na legislação, o estabelecimento pode ser compreendido e analisado tanto a partir de seu caráter econômico quanto jurídico, uma vez que ambos os campos se conectam e consequentemente, se complementam. Por ter sido compreendido por diversas correntes ao longo do tempo, sua evolução histórica é fator importante para o entendimento que se tem hoje sobre o comércio. Entender sua evolução juntamente com outros setores da sociedade, ajuda a compreender as bases do empreendimento moderno. Diante do mundo atual, dos conflitos e da complexidade das relações comerciais, a legislação também procurou acompanhar essa evolução e criar normas cada vez mais específicas.

Portanto, para compreender a natureza jurídica do estabelecimento empresarial, é necessário acompanhar sua história, as correntes normativas que acompanharam sua evolução, assim como tentar aperfeiçoar sua interpretação com estudos doutrinários que facilitam seu entendimento. Dessa forma, pode-se perceber que a legislação busca melhorar e, por sua vez, facilitar o desempenho da atividade econômica do empresário. Por outro lado, estabelece normas para a solução de conflitos, uma vez que o exercício do comércio, embora milenar, evolui cada vez mais, acompanhando o desenvolvimento histórico, social e econômico das populações.

 

Referências

 

BRASIL. Código Civil. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

_______. Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:UEQadsuHousJ:www.ufrgs.br/decon/VIRTUAIS/ECO02002b/1%2520Moeda%255B1%255D.doc+&hl=pt-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjaselbv9d> Acesso em: 5 de novembro de 2012.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Volume 1: direito de empresa. 15. Ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 2ª ed. v. 3. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 615/616.

FILHO, Wilson Carlos de Campos; SADE, Carla Bacila. Alienação do estabelecimento empresarial. O contrato de trespasse. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11062&revista_caderno=8> Acesso em 5 de novembro de 2012.

RACHEL, Andre Russar. Qual é a natureza jurídica do estabelecimento comercial?

Disponível em: http://www.lfg.com.br/artigo/20080819130300820_direito-comercial_qual-e-a-natureza-juridica-do-estabelecimento-comercial-andrea-russar-rachel.html>

Acesso em: 5 de Nov de 2012.

TADDEI, Marcelo Gazzi. O estabelecimento empresarial e suas repercussões jurídicas. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2421, 16fev. 2010 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/14366>. Acesso em: 2 nov. 2012.

TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário, volume 1. - 4. ed. – São Paulo: Atlas, 2012.

O REGIME JURÍDICO DO ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL[1]

                                                                                                                         Darla de Medeiros Gonçalves Gaspar[2]

                                                                                                                                                   Laysa Ribeiro Soares[3]

                                                                                                                                                      Humberto Oliveira[4]

 

Sumário: Introdução; 1 O processo histórico das relações comerciais; 2 Natureza jurídica do estabelecimento empresarial; 3 Os elementos que compõem o estabelecimento empresarial; 4 O estabelecimento empresarial atual e sua legislação; Considerações Finais e Referências.

                                                RESUMO

O presente trabalho busca compreender a natureza jurídica do estabelecimento empresarial, suas relações e o conjunto de fatores socioeconômicos que envolvem a produção e a circulação de bens e serviços dentro da atividade econômica escolhida pelo empresário, ou seja, os elementos que compõem o estabelecimento empresarial. Tais elementos podem ser previstos numa legislação específica que prevê e estabelece normas de controle para esse tipo de atividade. Também discorre sobre o processo histórico das relações e seu desenvolvimento até os dias atuais, mostrando sua evolução a partir de correntes teóricas fundamentais para seu entendimento no contexto socioeconômico atual. Por fim, discorre sobre a mudança do âmbito da legislação do antigo Código Comercial para o Novo Código Civil e como essas mudanças afetam juridicamente o empreendimento comercial.

Palavras-chave: Estabelecimento empresarial. Relações comerciais. Legislação.

Introdução

            O presente trabalho tem por pretensão abordar sobre a natureza do estabelecimento empresarial, no qual é constituído por um conjunto de bens fundamentais para o desenvolvimento da atividade econômica chefiada por um empresário. No decorrer do trabalho ficam evidentes algumas características relevantes do estabelecimento comercial que influem na natureza do mesmo, como por exemplo, o fato de o estabelecimento empresarial não ser um sujeito de direito, de não ser pessoa jurídica e de ser parte integrante da sociedade empresarial, embora se distingue da mesma.

No curso do trabalho dá-se ênfase para as questões históricas das relações comercias e as suas fases, a princípio uma das primeiras formas de “fazer comércio” era por meio das trocas diretas, conhecida como escambo, passada essa fase, surgem às moedas, com a insatisfação das pessoas mediante as trocas, esse elemento de intermediação ganha grandes proporções, e com a escassez do metal precioso necessário para fazer as moedas surge uma nova fase, e com ela surge a figura do crédito, pautado na confiança e no pagamento a prazo.

            Posteriormente, surgem os elementos que compõem o estabelecimento empresarial, elementos indispensáveis para o bom funcionamento de uma empresa e para o exercício da atividade econômica, como o trabalho, a clientela, o ponto comercial e o trabalho. E por fim, o enfoque será dado ao estabelecimento empresarial atual e a sua legislação, que verificará o tipo de estabelecimento empresarial e regulará as relações comerciais presentes no mesmo.  

1 O processo histórico das relações comerciais

            As primeiras relações comerciais eram bastante primitivas e ainda não eram caracterizadas como uma atividade econômica, e sim simples trocas diretas, conhecidas como escambo, realizadas por grupos de nômades primitivos. Como os nômades produziam produtos apenas pra o próprio sustento, eles acabavam permutando por outras mercadorias, essas permutas nem sempre eram proporcionais, geralmente não.

            Com a permanência de alguns desses grupos em lugares fixos, como por exemplo, o delta do rio Nilo e Eufrates, algumas atividades necessárias para o desenvolvimento da vida nômade, deram espaço para o exercício de funções específicas. Com essa evolução, surgiram relações mais complexas e pessoas mais sedentárias, afinal não precisam mais sair em busca de condições de vida adequadas. Surgiram desta forma a determinação de funções, os mais fortes recebiam a função de guerreiro, deveria proteger o grupo, as mulheres e crianças normalmente ficavam responsáveis pela agricultura e pelo artesanato e os idosos cuidavam do pasto.

 Antes essas pessoas viviam em um grupo independente e autônomo, porém com as novas transformações, todos se tornaram dependentes uns dos outros. Quando anteriormente as trocas eram desiguais e todos estavam satisfeitos, nessa nova configuração de sociedade, para satisfazer as necessidades e ambições era necessário mais, elevou o número de bens e de serviços e consequentemente eles perceberam que para não se extinguir o grupo deveria existir uma relação de interdependência entre os membros.

Com o passar do tempo, as pessoas já demonstravam insatisfação com as trocas diretas, e é a partir desse momento que surge a moeda, como um meio de intermediação das relações comercias e como um meio de trocas indiretas. As moedas ganharam inúmeras funções, como a de medida de valor, pagamento posterior e também serviam para demonstrar quem eram os mais ricos, ou seja, aqueles que detinham posse de um número considerado de moedas eram considerados com enormes riquezas.

O sistema monetário ganhou grande importância nesse período e resiste até os dias atuais, porém com uma considerada diminuição na quantidade e no material da moeda. Antigamente as moedas deveriam ser duráveis e resistentes ao tempo por isso eram constituídas de um material metálico, com ouro e prata, porém com o acumulo de moedas por parte da população com o intuito de adquirir e guardar riquezas, as moedas entraram em escassez. Atualmente com a tecnologia e avanços constantes, as moedas que já passaram por fases, como a metálica, a de papel e hoje surge uma mais moderna, a moeda digital, na qual os clientes podem comprar e automaticamente efetuar o pagamento através do débito automático.

Com a escassez das moedas, surge a figura do crédito, que a princípio estava pautado na confiança e era apenas um crédito verbal, as pessoas conversavam, uma vendia o produto, enquanto a outra comprava e algum tempo depois a dívida era sanada. Porém, para evitar fraudes, surge o crédito escrito, um documento escrito era assinado por ambos, pelo vendedor e comprador para comprovar que a compra e a venda do produto tinha sido de fato realizada, ainda sim era uma relação pautada na confiança, contudo com algumas garantias. Os valores dos produtos eram consignados e a prazo, o que facilitava a venda e o pagamento posterior. São com essas figuras de pagamento que surgiram as relações comerciais e o desenvolvimento da economia atual.

2 Natureza jurídica do estabelecimento empresarial

            Verifica-se previamente a importância de buscar um conceito para estabelecimento empresarial, para posteriormente adentrar no tema de fato do tópico. Por estabelecimento empresarial caracteriza-se um conjunto de bens indispensáveis para o desenvolvimento da atividade econômica. O responsável por fazer progredir essa atividade econômica para a produção de bens de serviço é o empresário, habilitado profissionalmente para a função. De acordo com Fábio Ulhoa:

"Estabelecimento empresarial é o conjunto de bens reunidos pelo empresário para a exploração de sua atividade econômica. Compreende os bens indispensáveis ou úteis ao desenvolvimento da empresa, como as mercadorias em estoque, máquinas, veículos marca e outros sinais distintivos, tecnologias etc”.

Em relação à natureza do estabelecimento empresarial é necessário distinguir do sujeito de direito e da atividade econômica, ou seja, não se pode confundir estabelecimento com sociedade empresária (sujeito de direito) e nem com a própria empresa (possuidora de atividade econômica). (COELHO, 2008, p. 99). Embora o estabelecimento seja formado por bens materiais ou corpóreos ( mercadorias e máquinas) e incorpóreos ou imateriais ( nome do estabelecimento e o ponto comercial), ele não possui personalidade jurídica, bem como vem descrito no rol do artigo 44, CC, já que quem está ligado aos deveres e as responsabilidades da empresa é a sociedade empresária, a ela cabe à personalidade jurídica.

Art. 44,CC.  São pessoas jurídicas de direito privado:

I - as associações;

II - as sociedades;

III - as fundações.

IV - as organizações religiosas; (Incluído pela Lei no 10.825, de 22.12.2003 )  

V - os partidos políticos. (Incluído pela Lei no 10.825 de 22.12.2003)

VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada (Incluído pela Lei no 12.441, de 2011). 

 O estabelecimento empresarial é uma universalidade de fato, ou seja, de bens fundamentais para a atividade econômica, determinados pelo dono com uma destinação unitária, embora, existam doutrinas contrárias que afirmam que o estabelecimento empresarial é universalidade de direito, não é majoritária. Já a sociedade empresária é uma universalidade de direito, formada por um conjunto de relações jurídicas de uma única pessoa que possuem valor econômico, as duas estão previstas no Código Civil.

Art. 90 Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária.

Art. 91 Constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico.

É importante compreender que o estabelecimento é um bem (coisa) móvel, que pode ser constituído por bens imóveis também, sem personalidade jurídica, sendo o mesmo agregado à propriedade da sociedade empresarial. Como vêm definidos no artigo 1143 do Código Civil Brasileiro, esses bens que constituem o estabelecimento se abdicados, podem ser transferidos solitariamente ou coletivamente (trespasse) e por fazerem parte de uma universalidade de fato, não estão amarrados a relações jurídicas unificadas, com isso esses bens poderão ser objetos de relações jurídicas independentes.

Não fazem parte do estabelecimento empresarial, o aviamento (lucro que o estabelecimento gera) e a clientela. O aviamento apenas integra o estabelecimento, embora não faça parte, já a clientela não pode ser considerada um bem do estabelecimento, pois, não pode ser tratada como coisa e de propriedade do dono do estabelecimento. Contudo, os contratos que anteriormente não eram considerados parte integrante do estabelecimento, atualmente como previsto no art. 1148 do Código Civil são considerados integrantes do estabelecimento.

 Art. 1.148 do Código Civil, aparentemente tentou resolver esse problema ao prever que “salvo disposição em contrário, a transferência importa a sub-rogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal, podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias, a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante”.

              

Após o artigo 1148 estabelecer que os contratos poderão ser incorporados nos ajustes de tratados de transição do estabelecimento, isto faz com que o estabelecimento possa ser transferido isoladamente por meio da sub- rogação, há exceções, como os contratos pessoais.

Há ainda uma diferenciação entre estabelecimento jurídico e patrimônio, embora o estabelecimento seja parte integrante do patrimônio, eles não se misturam em uma só coisa. Existem componentes do estabelecimento, como os contratos em alguns casos, que não fazem parte do patrimônio do empresário, bem como existem alguns poucos componentes que não compõem o patrimônio. Como por exemplo: Uma transportadora de carga por meio de um contrato com uma empresa de veículos de grande porte adquire uma parcela de caminhões, a transportadora não possui o direito pleno sobre os caminhões, embora o contrato estabelecido faça parte do estabelecimento empresarial, já que os veículos são necessários para o desenvolvimento da atividade econômica da transportadora. Maria Helena Diniz conceitua patrimônio como:

Direito Civil. Complexo das relações jurídicas de uma pessoa que tenham valor econômico (Clóvis Bevilaqua). Incluem-se no patrimônio: a posse, os direitos reais, as obrigações e as ações correspondentes a tais direitos. O patrimônio abrange direitos e deveres redutíveis a dinheiro, consequentemente, nele não estão incluídos os direitos de personalidade, os pessoais entre cônjuges, os oriundos de poder familiar e políticos” (DINIZ, 2005, p. 615/616).

        Entretanto, essa distinção não deve ser levada em conta em casos que haja confusão entre a pessoa física e a pessoa jurídica, ou seja, entre o empresário e a empresa individual, em razão da convicção do princípio da unicidade patrimonial, no caso do empresário não optar por empresa de responsabilidade limitada (previsto no artigo 44, parágrafo único, Lei no 12.441, CC), nesses casos o patrimônio da empresa não se liga ao patrimônio do empresário.

3 Os elementos que compõem o estabelecimento empresarial

Pelo próprio conceito de estabelecimento empresarial pode-se conceituar os diversos elementos que o compõem. Por ser o empreendimento “a reunião dos bens necessários ao desenvolvimento da atividade econômica” (ULHOA, 2011, pág. 57), pode-se perceber que, a partir do ramo de atividade do empreendimento, esses elementos podem variar bastante. Entretanto, existem elementos presentes e obrigatórios a todo tipo de atividade empresarial.

A empresa prestadora de serviços não vai necessitar, obviamente, de máquinas e equipamentos físicos mais característicos de empreendimentos voltados para a transformação de matérias primas, por exemplo, ou seja, não se pode comparar a estrutura física de uma gráfica, que produz jornais ou revistas e que, por sua vez, necessita de uma grande quantidade de máquinas, com uma agência de viagens, que se estabelece com poucos elementos físicos estruturais para poder existir.

Dessa forma, serão definidos primeiramente os elementos físicos do empreendimento empresarial e, posteriormente, serão abordados os elementos presentes em todos os estabelecimentos, chamados de elementos jurídicos.

É importante destacar que o empreendimento empresarial não se confunde com os bens que o compõem, podendo-se até admitir que os seus elementos sejam desagregados sem que o estabelecimento tenha sequer seu valor diminuído (ULHOA, 2011, pág. 58).

É claro que no caso de desarticulação de todos os bens e de tudo aquilo que foi reunido pelo empresário com a finalidade por ele buscada, vai desaparecer. O que se quer mostrar aqui é que a essência do empreendimento continua existindo mesmo que o seu patrimônio físico seja destruído, por um incêndio, por exemplo. A empresa, enquanto elemento componente da estrutura socioeconômica de um determinado território vai continuar existindo. Até porque o estabelecimento empresarial é composto por bens corpóreos e incorpóreos, não se devendo confundi-lo com o local do exercício da atividade.

Assim, de acordo com Tomazette (2012, pág. 100), como elementos corpóreos, encontramos todos os bens físicos que fazem parte do estabelecimento, como: mercadorias, mobília, máquinas e equipamentos. Já como elementos incorpóreos têm-se as marcas registradas, o nome empresarial, as patentes de invenção, o título do estabelecimento e o ponto empresarial, entro outros. Alguns desses elementos merecem destaque especial, dentre eles:

  • Imóvel

Estabelecimento físico da empresa é o local da atividade empresarial. Mesmo que funcione como base filial, o imóvel é o bem utilizado pelo empresário para o desempenho ou desenvolvimento de sua atividade.

Segundo Tomazette (2012, pág. 100),

os imóveis sempre foram úteis para o desenvolvimento das atividades econômicas, servindo como base física estável para a realização dos negócios. Assim, como o imóvel é utilizado para a atividade empresarial, quando pertencente ao empresário, logo é elemento integrante do estabelecimento.

Entretanto, essa questão gera controvérsias. Para Requião (apud Tomazette, 2012, p. 100), nesse caso o imóvel seria elemento da empresa e não do estabelecimento, pois segundo sua tese, “o estabelecimento é uma coisa móvel e que por isso, não poderia ser constituído de coisas imóveis.” Não se pode negar a importância fundamental do imóvel como local de exercício da atividade empresarial. Dessa forma, se o imóvel for de propriedade do empresário, ele será entendido como elemento do estabelecimento. Se o imóvel não é próprio, mas alugando, por conseguinte, não poderá integrar o estabelecimento, sendo apenas seu o direito de uso.

Quando o imóvel é alugado, “o ponto empresarial é protegido como elemento integrante do estabelecimento, assegurando-se ao empresário o direito de renovação da locação, atendidas determinadas hipóteses legais, e a indenização no caso de não renovação.” (pág. 102).

  • O ponto empresarial

Embora possa se confundir como imóvel onde é exercida a atividade empresarial, o ponto comercial é um elemento incorpóreo do estabelecimento. Para Tomazette (2012, pág. 101), “o ponto empresarial é um bem diferente do imóvel, tanto que pode ser até objeto de locação, sem que isso desvirtue a sua natureza de elemento do estabelecimento.” Outro fator importante que caracteriza o papel do ponto empresarial é o local onde o mesmo está situado.

É certo que a localização do estabelecimento contribui em muito no seu sucesso ou fracasso. Assim, é perfeitamente viável a localização de uma papelaria perto de uma escola ou a localização de um posto de combustíveis perto de concessionárias, ou sorveterias em praias. A localização do empreendimento, acima de tudo deve facilitar o acesso aos clientes e não o contrário. Em contrapartida, seria inviável abrir um estabelecimento que vende sorvete em uma cidade de clima frio.  Portanto, pode-se perceber a importância da localização da empresa como fator coadjuvante na lucratividade do negócio escolhido pelo empresário.

  • O trabalho

Constitui-se o elemento fundamental para o exercício da atividade econômica. Não se pode imaginar um estabelecimento empresarial livre do fator trabalho. Para Tomazette, (2012, pág. 101),

De nada adianta um grande complexo de bens corpóreos e incorpóreos sem que haja um trabalho bem exercido que permita a organização e coordenação desses bens para o exercício da empresa. O trabalho é tão ou mais importante do que os bens corpóreos e incorpóreos que integram o estabelecimento.

O trabalho pode ser exercido tanto pelo empresário, quanto por qualquer funcionário. Uma vez que só se admitem empregados, quando estes desempenham atividades produtivas, ou seja, trabalho.

  • A clientela

“É o conjunto de pessoas que, de fato, mantém com a casa de comércio relações contínuas para a aquisição de bens ou serviços.” TOMAZETTE (2012, pág. 105). Assim, a clientela é o componente intermediário entre a atividade empresária e o lucro. Quanto maior a clientela, maior deve ser a produção de bens e serviços e, por conseguinte, o lucro obtido pelo empresário. A clientela constitui-se o elemento-chave para o sucesso do empreendimento. Sem clientela, o estabelecimento não tem porque produzir e acaba deixando de existir. O fator clientela é tão importante para a vida do empreendimento, que os legisladores preocupados com a questão da concorrência desleal, produziram uma legislação específica para proteger o empresário desse tipo de perigo.

4 O estabelecimento empresarial atual e sua legislação

Até a reforma do Código Civil de 2002, a legislação que regulava as relações empresariais, comerciais e industriais, era a do Código Comercial de 1850. Nota-se que por ser muito antigo, tal código já apresentava artigos superados e que necessitavam de um novo tratamento, este transcrito no Novo Código Civil (Lei nº 10.406/02).

A maior diferença entre o antigo Código Comercial e o Novo Código Civil é que o tratamento específico das leis de comércio ficou diluído no novo código, que por sua vez é bastante amplo, abrangendo a legislação anterior e suas modificações.

De acordo com Taddei (2010),

No Brasil, a legislação vigente era Código Comercial de 1850 e não disciplinaram especificamente a matéria, apenas a antiga e revogada Lei de Falências (art. 52, VIII, Dec.-lei nº 7.661/45) referia-se ao estabelecimento prevendo a sua venda e, a Lei do Inquilinato (Lei nº8. 245/1991), prevê proteção indireta ao estabelecimento, assegurando no art. 51 proteção ao ponto empresarial por meio da ação renovatória.

Dentre as modificações do Novo Código Civil em relação ao antigo Código Comercial, pode-se indicar o tratamento diferenciado que foi dispensado ao estabelecimento empresarial, o qual como elemento de empresa, pode ser visto como parte essencial para a execução da exploração econômica escolhida pelo empresário.

Apesar de o novo Código não utilizar a expressão estabelecimento empresarial, entende-se que o termo deva ser usado em decorrência do novo tratamento que é dado ao termo “comércio” presente no antigo código. Apesar de muitas discussões, ainda continuam existindo muitas divergências sobre a natureza do estabelecimento empresarial, como termo utilizado para definir o antigo termo “comércio”, do antigo código. Para Taddei (2010),

Atualmente, a doutrina moderna dominante entende que o estabelecimento empresarial apresenta a natureza de universalidade de fato, já que corresponde a um conjunto de bens que se mantém unidos, destinados a uma finalidade, por vontade e determinação do seu proprietário.

Isso pressupõe que o estabelecimento é entendido como os conjuntos de bens que, unidos, servem de meio utilizado pelo empresário para o exercício da atividade econômica. Entretanto, como afirma Taddei (2010), “estabelecimento empresarial não é uma pessoa jurídica, é uma universalidade de fato que integra o patrimônio do empresário individual ou da sociedade empresária, sendo objeto de direito, pode ser alienado, onerado, arrestado, penhorado ou objeto de sequestro”.

Portanto, o empresário e o estabelecimento não são o mesmo elemento. Assim como a empresa, cada elemento destes representa uma parte diferente dentro do estabelecimento, com características e objetivos diferentes entre si. Enquanto o empresário é entendido como a pessoa que exerce a atividade econômica, empresarial, a empresa pode ser entendida como a própria atividade econômica. Já o estabelecimento empresarial é o meio pelo qual é exercida tal atividade. Nota-se que são termos interligados, porém inteiramente diferentes, compostos de definições e legislações específicas.

Considerações Finais

O estabelecimento empresarial constitui-se um dos mais importantes assuntos discutidos e estudados pelo Direito Empresarial. Como base na legislação, o estabelecimento pode ser compreendido e analisado tanto a partir de seu caráter econômico quanto jurídico, uma vez que ambos os campos se conectam e consequentemente, se complementam. Por ter sido compreendido por diversas correntes ao longo do tempo, sua evolução histórica é fator importante para o entendimento que se tem hoje sobre o comércio. Entender sua evolução juntamente com outros setores da sociedade, ajuda a compreender as bases do empreendimento moderno. Diante do mundo atual, dos conflitos e da complexidade das relações comerciais, a legislação também procurou acompanhar essa evolução e criar normas cada vez mais específicas.

Portanto, para compreender a natureza jurídica do estabelecimento empresarial, é necessário acompanhar sua história, as correntes normativas que acompanharam sua evolução, assim como tentar aperfeiçoar sua interpretação com estudos doutrinários que facilitam seu entendimento. Dessa forma, pode-se perceber que a legislação busca melhorar e, por sua vez, facilitar o desempenho da atividade econômica do empresário. Por outro lado, estabelece normas para a solução de conflitos, uma vez que o exercício do comércio, embora milenar, evolui cada vez mais, acompanhando o desenvolvimento histórico, social e econômico das populações.

 

Referências

 

BRASIL. Código Civil. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

_______. Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Disponível em: https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:UEQadsuHousJ:www.ufrgs.br/decon/VIRTUAIS/ECO02002b/1%2520Moeda%255B1%255D.doc+&hl=pt-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjaselbv9d> Acesso em: 5 de novembro de 2012.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Volume 1: direito de empresa. 15. Ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 2ª ed. v. 3. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 615/616.

FILHO, Wilson Carlos de Campos; SADE, Carla Bacila. Alienação do estabelecimento empresarial. O contrato de trespasse. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11062&revista_caderno=8> Acesso em 5 de novembro de 2012.

RACHEL, Andre Russar. Qual é a natureza jurídica do estabelecimento comercial?

Disponível em: http://www.lfg.com.br/artigo/20080819130300820_direito-comercial_qual-e-a-natureza-juridica-do-estabelecimento-comercial-andrea-russar-rachel.html>

Acesso em: 5 de Nov de 2012.

TADDEI, Marcelo Gazzi. O estabelecimento empresarial e suas repercussões jurídicas. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2421, 16fev. 2010 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/14366>. Acesso em: 2 nov. 2012.

TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário, volume 1. - 4. ed. – São Paulo: Atlas, 2012.

 



[1] Paper da Disciplina Teoria do Direito Empresarial da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna do 3º Período (Vespertino) do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[3] Aluna do 3º Período (Vespertino) do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[4] Professor da Disciplina Teoria do Direito Empresarial da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

 



[1] Paper da Disciplina Teoria do Direito Empresarial da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna do 3º Período (Vespertino) do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[3] Aluna do 3º Período (Vespertino) do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[4] Professor da Disciplina Teoria do Direito Empresarial da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.