O entendimento da lei nº 8.971/94, foi "posto em cheque", pela ação movida por companheiro de funcionário do Banco do Brasil participante do sistema Previdênciário - Previ. O autor da ação comprovou o vínculo que mantinha com o beneficiário do serviço e que, para tanto, gozava de legitimidade para receber o beneplácito. Em sua defesa, a Previ arguiu que a lei não especifica, claramente, a possibilidade do recebimento do benefício para um companheiro, homem. Foi nessa linha que se baseou a defesa do Previ, que, aliás, em primeira instância, fora derrubada; vale dizer, ainda, s que tal decisão foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, sendo, entretanto, novamente reformada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, por intermédio da eminente relatora Nacy Andrighi. Sumariamente, a decisão dessa que resultou em 14 laudas;

"Comprovada a existência de união afetiva entre pessoas do mesmo sexo, é de se reconhecer o direito do companheiro supérstite de receber benefícios previdenciários decorrentes do plano de previdência privada no qual o falecido era participante, com os idênticos efeitos operados pela união estável."

A decisão inédita foi proferida pela 3ª Turma ? até então tal benefício só era concedido dentro do Regime Geral da Previdência Social.

No entendimento da relatora, enquanto a lei civil permanecer inerte, as novas estruturas de convívio, que "batem às portas do Poder Judiciário, devem ter sua tutela jurisdicional prestada à luz da legislação existente e, ainda, dos parâmetros humanitários que norteiam não somente o direito constitucional (in casu, verbi gratia, o princípio da dignidade da pessoa humama ? artigo 1º, inciso III, da Constituição da República), mas, outrossim, a maioria dos ordenamentos jurídicos existentes no globo.

Neste trilho, diante de lacuna de lei que envolva o caso sub examine, a aplicação da analogia é perfeitamente aceitável para alavancar como entidade familiar as uniões de afeto entre pessoas do mesmo sexo. "Se por força do artigo 16 da Lei nº 8.213/91, a necessária dependência econômica para a concessão da pensão por morte entre os companheiros de união estável é presumida, também é no caso de companheiros do mesmo sexo, diante do emprego da analogia que se estabeleceru entre essas duas entidades familiares", lecionou a relatora.

No mesmo giro, aqueles que vivem em uniões de afeto com pessoas do mesmo sexo estão enquadradas no rol de dependentes preferenciais dos segurados, no regime geral, bem como dos participantes, no regime complementar de previdência, em igualdade de condições com todos os demais beneficiários em situações análogas. Destacou, todavia, a eminente ministra que o presente julgado tem aplicação somente quanto à previdência privada complementar, considerando as competências das turmas que compõe a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça.

A ministra prelecionou que mister se faz, ainda, que o reconhecimento da relação homoafetiva, como entidade familiar, deve ser comprovada cabalmente, sendo inequívoca a presença dos elementos essenciais à caracterização da união estável, conforme trecho retirado de seu voto:

"Demonstrada a convivencia, entre duas pessoas do mesmo sexo, pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituição familiar, com a respectiva atribuição dos efeitos jurídicos dela advindos".

Finalizando o voto, a ministra ainda ressaltou que o Poder Judiciário não deve abster-se de fraternidade e solidariedade, pois valendo-se desses mesmos preceitos, emprestou normatividade para o relacionamento de pessoas não casadas, ensejando o instituto da união Estável.

Com essa nova perspectiva, pode-se ver que a sociedade brasileira tem se tornado mais aliada com o posicionamento de outras nações do globo, que tem adotado a linha mais favorável ao homoafetivismo, à exemplo da Inglaterra, Espanha e Argentina, que já legalizaram o casamento entre homoafetos.

Se isso é bom ou ruim, não é o papel do presente estudo demonstrar, mas sim de constatar que o engessamento do Judiciário (e da sociedade por sua vez) esta mudando seu paradigma.

Para arrematar, vale trazer à colação alguns julgados recentes prolatados pelo egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que, aliás, possui competência (em razão da matéria) para julgamento de recursos que versem sobre matéria previdenciária. Vejamos:

"PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ART. 74 DA LEI 8.213/91. UNIÃO HOMOAFETIVA . REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. 1. Cabível o reexame necessário, nos termos do § 2.º do artigo 475 do Código de Processo Civil, se a sentença condenatória não estabelece o valor do bebefício concedido, faltando parâmetro seguro para se verificar se a condenação não ultrapassará o limite de 60 (sessenta) salários mínimos. 2. A união afetiva estabelecida entre homossexuais merece tratamento isonômico aos dispensado às uniões heterossexuais em respeito ao princípio da igualdade, da dignidade da pessoa humana e o da promoção do bem de todos sem preconceito ou discriminação. 3. É totalmente compatível com o sistema previdenciário o reconhecimento do direito à pensão por morte à companheira homossexual nos termos do artigo 74 da Lei 8.213/91. 4. Não há motivos técnicos, jurídicos ou quaisquer outros para se exigir, no caso da união homoafetiva, a dependência econômica exclusiva da companheira sobrevivente, eis que a situação se subsume na regra do §4º do artigo 16 da Lei nº 8.213/91. O tratamento da questão, portanto, deve ser idêntico ao do concubinato heterossexual: a dependência não necessita ser exclusiva, sendo, portanto, presumida. 5. Comprovada a união homoafetiva, presume-se a dependência econômica da autora em relação ao "de cujus", nos termos do § 4º do artigo 16 da Lei nº 8.213/91, bem como presentes os demais requisitos previstos no artigo 74, "caput", da mesma lei, é devido o benefício de pensão por morte. 6. Reexame necessário, tido por interposto, parcialmente provido. Apelação do INSS improvida. Tutela antecipada concedida".
(Tribunal Regional Federal da 3ª Região - AC - APELAÇÃO CÍVEL ? 971499 ? Rel. Des. Leonel Ferreira ? Nona Turma ? julgado em 30 de março de 2009 ? publicado em 13 de maio de 2009 em DJF3 CJ1, página 563).


DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RELAÇÃO HOMOAFETIVA. SERVIDORA PÚBLICA FEDERAL. INSCRIÇÃO DE COMPANHEIRA COMO DEPENDENTE. POSSIBILIDADE. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 226, § 3º. ARTS. 3º, IV E 5º, I. ART. 4º LICC. LEI 8.112/90 E IN 25/2000. 1. A norma contida no artigo 226, § 3º, da Constituição Federal, que trata da proteção do Estado à união estável entre homem e mulher, como entidade familiar, certamente não deve ser interpretada de forma isolada, conquanto a regra fundante, quanto à vedação de qualquer forma de discriminação, encontra-se inscrita no artigo 3º, inciso IV, que estabelece constituir um dos objetivos fundamentais da República brasileira a promoção do bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, compreendendo, esta última expressão, espectro lato o bastante para abarcar a proibição de se discriminar com base na orientação sexual da pessoa. 2. Consagra, ainda, a Lei Fundamental, o princípio da igualdade, traduzido na primeira parte da norma contida no caput do artigo 5º, ao asseverar que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos: I - homens e mulheres são iguais em direito e obrigações, nos termos desta Constituição". 3. Sendo vedada qualquer forma de discriminação, proibida a distinção de qualquer natureza, claro está que as pessoas não podem ser alvo de tratamento desigual, em decorrência da orientação sexual que adotarem.4. Aliás, o direito como produto cultural e fenômeno social é dinâmico e deve acompanhar as mudanças verificadas no seio da sociedade, preenchendo as lacunas do ordenamento jurídico, por meio da analogia, dos costumes e dos princípios gerais de direito, e aplicando a lei segundo os fins sociais colimados. 5. Assim sendo, caracterizado o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo, resultando na chamada união homoafetiva, cabe a adequação da situação fática perante o ordenamento jurídico, devendo ser estendido às relações homossexuais o mesmo tratamento dispensado nos casos de relações heterossexuais, pois a opção sexual não pode ser usada como fator de discriminação. 6. Ademais, o artigo 217 da Lei 8.112/90 não faz distinção entre o relacionamento heterossexual ou homoafetivo, não restringindo os benefícios previdenciários a homem e mulher. Referido dispositivo limita-se, apenas, a prever como beneficiários das pensões o companheiro ou companheira designada que comprove união estável como entidade familiar, sem qualquer vedação expressa que estes sejam do mesmo sexo. 7. Por analogia, é possível invocar e aplicar a Instrução Normativa 25/2000, expedida, pelo Sistema Geral da Previdência Social, que estabelece procedimentos a serem adotados para deferimento de benefício previdenciário ao companheiro ou à companheira homossexuais, sendo certo que, em obediência ao princípio da isonomia, aplica-se, da mesma forma, aos servidores públicos federais. 8. É jurídica a pretensão de indicar companheira como dependente para fins de recebimento de benefício previdenciário, pois, ninguém pode ser discriminado em razão de sua opção sexual, gerando a relação homoafetiva de direitos análogos ao da união estável. 9. Agravo a que se nega provimento.

(Tribunal Regional Federal da 3ª Região - AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO 244126 ? Rel. Des. Valdeci dos Santos ? Segunda Turma ? julgado em 03 de março de 2009 ? publicado em 12 de março de 2009 em DJF3 CJ2, página 206).


CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. NÃO CONHECIMENTO. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRO. HOMOSSEXUAIS. TRABALHADOR URBANO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. CONCESSÃO. ARTS. 74 A 79 DA LEI Nº. 8.213/91. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA. QUALIDADE DE SEGURADO. 1 - Remessa oficial não conhecida, em razão do valor da condenação não exceder a 60 (sessenta) salários-mínimos, de acordo com o disposto na Lei nº 10.352, de 26 de dezembro de 2001. 2 - O interesse de agir da parte autora exsurge, conquanto não tenha postulado o benefício na esfera administrativa, no momento em que a Autarquia Previdenciária oferece contestação, resistindo à pretensão e caracterizando o conflito de interesses. 3 - Companheiro do segurado, que teve por comprovada a vida em comum, tem a sua dependência econômica presumida em relação a ele, por lhe serem assegurados, face ao princípio da igualdade, os mesmos direitos previdenciários atribuídos aos heterossexuais e a mesma prerrogativa de concorrência em relação aos demais dependentes elencados no inciso I do art. 16 da Lei de Benefícios. 4 - O direito de acesso dos homossexuais aos benefícios previdenciários em face de seus companheiros segurados é questão já decidida em sede da Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0/RS, de abrangência nacional, conforme decisão proferida pelo mesmo TRF4 (Ag nº 2000.04.01.044144-0). 5 - Diversas correspondências particulares, postadas e enviadas ao mesmo endereço, não deixam dúvidas de que ali coabitavam o autor e o de cujus. Além disso, as provas carreadas aos autos demonstram que ambos freqüentavam os mesmos clubes sociais, com relação de dependência. 6 - Comprovada a existência de relação homoafetiva por mais de 25 anos, da qual decorre a união estável entre o autor e o de cujus até a data do óbito, através do conjunto probatório acostado aos autos, a dependência econômica é presumida, nos termos do art. 16, I, § 4º, da Lei de Benefícios. 7 - Comprovada a qualidade de segurado e demonstrada a condição de dependência, é de se conceder o benefício, nos termos do art. 201, V, da Constituição Federal e da Lei n.º 8.213/91. 7 ? O beenfício de pensão por morte independe de carência, nos termos do art. 26, I, da Lei Previdenciária. 9- Insurgência quanto ao pagamento das custas e despesas processuais afastada, tendo em vista a ausência de condenação neste sentido. 10 - Honorários advocatícios reduzidos para 10% (dez por cento) sobre a soma das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, de acordo com o entendimento desta Turma. 11 - Matéria preliminar rejeitada. Remessa oficial não conhecida. Apelação parcialmente provida. Tutela antecipada confirmada


(Tribunal Regional Federal da 3ª Região - AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1263988 ? Rel. Des. Nelson Bernardes ? Nona Turma ? julgado em 14 de agosto de 2008 ? publicado em 28 de maio de 2008 em DJF3).




PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. INTIMAÇÃO PESSOAL DO INSS. TUTELA ANTECIPADA. EFEITO SUSPENSIVO. UNIÃO ESTÁVEL. RELAÇÃO HOMOAFETIVA. COMPANHEIRO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. QUALIDADE DE SEGURADO. GOZO DE BENEFÍCIO . TUTELA ANTECIPADA. 1- Desnecessidade da intimação pessoal do INSS para comparecer à audiência de instrução e julgamento, uma vez que à época em que realizada, o artigo 6º da Lei nº 9.028/95, que disciplinava a obrigatoriedade, encontrava-se suspenso por força da ADIN 2.251-2/2001. 2- Não houve cerceamento de defesa, pois devidamente intimada, por meio de publicação no Diário Oficial, acerca da audiência, a Autarquia deixou de comparecer.3- Convencido o Juízo a quo do direito da parte, e presentes os requisitos do artigo 273 c.c. 461 do Código de Processo Civil, viável antecipar os efeitos da tutela jurisdicional na prolação da sentença.4- Ausentes as circunstâncias dispostas no artigo 558 do CPC, não é possível o deferimento do efeito suspensivo pelo Relator. 5- A Constituição, em seu artigo 226, regulamentado pela Lei n.º 9.278/96, reconhece e protege a união estável, igualando-a, inclusive, em efeitos, ao casamento, e garantindo, com isso, todos os direitos inerentes, no qual se inclui a pensão por morte (artigo 16, I, da lei n.º 8.213/91). 6- Não obstante o artigo 226, §3º, da Carta Magna, conceituar a união estável como a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, o mesmo tratamento dispensado às relações heterossexuais deve ser estendido às relações homossexuais, pois a opção ou condição sexual não pode ser usada como fator de discriminação, em face do disposto no inciso IV, do artigo 3º, da Constituição Federal, que proclama, como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 7- Com base no princípio da isonomia, o companheiro ou companheira homossexual, desde maio/2001, por força de decisão judicial proferida na ação civil pública nº 2000.71.00.009347-0, da 3ª Vara Federal Previdenciária de Porto Alegre, da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul, teve reconhecido o direito de obter pensão por morte do companheiro participante do regime de previdência do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. 8- União estável comprovada por início de prova material corroborada por prova testemunhal. 9- O companheiro é dependente por presunção legal, a teor do disposto no artigo 16, inciso I e § 4º da Lei n.º 8.213/91. 10- O falecido gozava de benefício previdenciário (auxílio-doença), mantendo, assim, sua qualidade de segurado, nos termos do artigo 15, I, da Lei n.º 8.213/91. 11- Tutela antecipada concedida de ofício, para que o INSS proceda à imediata implantação do benefício, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária, tendo em vista a doença do Autor (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) e o caráter alimentar do benefício. 12- Preliminares rejeitadas. Apelação do INSS e remessa oficial não providas. Sentença mantida

(Tribunal Regional Federal da 3ª Região - AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1091320 ? Rel. Des. Santos Neves ? Nona Turma ? julgado em 15 de outubro de 2007 ? publicado em 08 de novembro de 2007 no DJU, página 1033).

















REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DIAS, Maria Berenice. União Homossexual: O preconceito e a Justiça. Porto Alegre: Ed. Livraria do Advogado, 2000.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. São Paulo. Ed. Malheiros, 3º ed. 1993.
RIO GRANDE DO SUL ? Tribunal de Justiça. Sétima Câmara Cível. Provimento parcial ao apelo. Espólio de Hélio de Oliveira, representado por sua inventariante Eliana de Oliveira X Nelson Gomes. Rel. Des. José Carlos Texeira Giorgis j. 14/03/2000.
RIOS, Roger Raupp. Direitos fundamentais e orientação sexual. O direito brasileiro e a homossexualidade.

RIOS, Raupp Roger. Entrevista. Jornal da NUANCES, Porto Alegre, 23 de maio 2003. Caderno Legislação p.10.
RIOS, Roger Raupp. A homossexualidade no direito. Porto Alegre: Ed. Livraria do Advogado; Esmafe, 2001.
RIOS, Roger Raupp. O Princípio da igualdade e a discriminação por orientação social: a homossexualidade no direito brasileiro e norte-americano. São Paulo: Ed. RT, 2002.