O QUE É A INEXISTÊNCIA

Vai ser decepcionante se eu morrer e descobrir que nada há do lado de lá. Descobrir que não existem mais aqueles que eu conheci, que não há espíritos, que não há Deus. E será pior se o que consigo ver aqui, não conseguir mais ver lá.

Parece um contrasenso eu não mais existir após a morte e, ao mesmo tempo, existir para descobrir que nada há lá. É que, enquanto vivo, eu consigo me imaginar morto do lado de lá, nada vendo, como nada vejo aqui em relação ao lado de lá: Este silêncio que eu ouço, esse nada que eu vejo quando tento buscar seres iluminados, quando tento buscar Deus, quando tento buscar pessoas que já se foram. Não sei se o bloqueio está em mim ou realmente nada há fora de minha dimensão.

Não senti o início e não sentirei o fim. Descobri-me no meio e no meio serei encoberto. Nesse meio está o silêncio que ouço e o nada que vejo, o que faz o meio tão escuro quanto o início e o fim.

Meus pais sentiram o meu início, mas, não era o meu sentimento. Para mim era a escuridão. Meu filho sentirá o meu fim, mas, este não será o meu sentimento. Para mim será a escuridão. Saio dela sem ver e entro nela sem ver. O existir se torna um muito breve momento.

Existir é estar consciente, mas, isto implica que é possível existir sem se estar consciente: posso desaparecer e, então, reaparecer com outra consciência. Se não há como provar isso, também não há como negar.

O nosso maior desejo é o de manter a consciência atual, o EU atual, apesar de muito pouco sabermos o que esse EU é e que tamanho ele tem. Ficamos contentes com essa aparente limitação. É o que nos basta. Ela limita o que podemos ser e o que podemos ver e sentir. O que existe é aquilo que está dentro dos nossos limites.

Qual é a diferença entre algo que você não conhece e um bloqueio em você que evita que você conheça aquele algo? Nenhuma, pois, em qualquer caso, há um bloqueio. A questão é saber se este bloqueio pode sempre ser vencido.

Como saber que algo não existe? Primeiro, você tem que derrubar o bloqueio. Para derrubá-lo, você tem que conhecê-lo totalmente. Para saber que algo não existe atrás dele, você, antes, tem que conhecer esse algo e saber que, se ele existe, tem que estar atrás do bloqueio.

As coisas que não existem pertencem ao conjunto das coisas abstratas, mas, nem tudo que é abstrato é inexistente, isto é, algumas coisas abstratas existem.

Mas, como algo que não existe pode pertencer a um conjunto? Pode porque o que não existe não está “lá” e, sim, não está “aqui”, isto é, as coisas que não existem não existem é em nossa consciência, podendo existir, sim, fora dela.

É por isso que podemos “colocá-las” em um conjunto que pode ser desenhado em nossa consciência. Podemos ver o conjunto, mas, não somos capazes de enxergar o seu conteúdo.

À medida que passamos a enxergar uma coisa, podemos passá-la para um conjunto abstrato de coisas existentes ou para um conjunto de coisas concretas e, portanto, existentes.

Tudo o que está no conjunto das coisas concretas existem. O problema é que não conhecemos todo o conjunto concreto e nem seu tamanho. Também, não somos capazes de nomear tudo o que é abstrato, ou seja, não sabemos classificar tudo o que é abstrato e tudo o que é concreto.

Seja A o conjunto das coisas abstratas, C o conjunto das coisas concretas, E o conjunto das coisas existente, K o conjunto das coisas conhecidas por nós, V onde me localizo enquanto vivo. Onde eu estaria quando morto (M)? As figuras a seguir, tentarão explicar.

       
     
 
   

A questão não é onde eu estaria ou onde eu estou, pois, são duas coisas: o que eu sou e como eu me vejo (que é a mesma coisa de como os outros me veem e eu os vejo).

Considerando o como as coisas são vistas (como eu me vejo), enquanto vivo sou concreto. Depois de morto torno-me abstrato. Existo (estou em C) e depois, talvez, não mais existo (estou na intersecção de E com A ou totalmente em A). Também, continuo sendo conhecido depois de morto (na intersecção de K com A). Mas, eu me conheço ali? Tenho consciência? Se não tenho, ainda posso estar ali ou não. Estando ou não, é a mesma coisa, para quem ficou vivo.

Para mim, não há o que decidir, por estar inconsciente. Se tenho consciência, então sou concreto, então existo com certeza, estou vivo num mundo diferente. Sou abstrato apenas para quem ficou vivo.

O que eu sou é a minha consciência. Se eu não tive-la, nada poderei decidir. Se tive-la, sou concreto, existo, estou vivo.

Então, inexistência é uma coisa que não entra na consciência. É a consciência que define o que existe, mas, não há como ela definir o que não existe e nem concluir que se ela não conhece, então não existe. Inexistência é algo que não se pode definir. Inexistência, portanto, não existe.

O que temos é existência e o que é conhecido, sendo que o conhecimento é um pequeno subconjunto da existência. O que chamamos de inexistência é o que está no desconhecido. Se teimarmos em definir a inexistência, esse seria o sentido: o desconhecido.

Assim, nunca diga que tal ou qual coisa não existe. Admita que ela te é desconhecida. Você não pode tomar decisões sobre coisas que não estão em sua consciência. Você estará jogando e pode perder.

Brasilio – Junho/2012.