Roberto Ramalho é Advogado, Relações Públicas e Jornalista.

O ato da Mesa Diretora da Câmara anunciado pelo seu Presidente Michel Temer, - ele mesmo tendo cometido irregularidades ao admitir que repassou passagens aéreas para seus familiares viajarem à Bahia, como anunciou o site Congresso em Foco que revelou que ele havia viajado com a esposa e o irmão para Porto Seguro (BA) no final de janeiro de 2008.-, alterando as normas para o transporte aéreo dos parlamentares deixa brechas para os deputados federais continuarem viajando para onde bem quiserem e entenderem. O pior de tudo é que a medida ainda legaliza as viagens de parentes dos deputados com dinheiro público, pago com o suor do rosto do trabalhador brasileiro e dos empresários e comerciantes que pagam tributos exorbitantes nesse País, para que os mesmos gastem de forma irregular e incontrolável.

A nova regra diz explicitamente que o benefício pode ser utilizado em viagem pelo próprio parlamentar, a mulher ou marido, seus dependentes legais e assessores em situações relacionadas à atividade parlamentar. Nesse contexto, a Mesa Diretora se omite na definição dos trechos que podem ser usados pelos dependentes e assessores. Nesse sentido, o parlamentar pode levar a família inteira para qualquer lugar do Brasil, inclusive ao exterior, desde que faça uma justificativa em relação a necessidade no exercício do seu mandato.

Vistas pela Mesa da Câmara como uma medida moralizadora, elas terminam abrindo brechas para a continuidade de viagens a passeio e não proíbem a emissão de passagens para o exterior. Além do mais, as novas regras determinam, ainda, a possibilidade de o parlamentar “poupar”, ou seja, dele acumular créditos para usar em viagens para onde e quando quiser. Tem-se na prática, a legalização da farra do uso das passagens.

Pouco tempo depois, a Câmara dos Deputados e o Senado anunciaram cortes nas passagens, mas permitiram que bilhetes sejam dados a seus parentes. Os Senadores foram liberados para usar cota de passagem para fretar jatinhos e barcos. Enquanto isso, o limite de bilhetes na Câmara terá valor 20% menor.

Segundo a imprensa nacional, diversos integrantes da Mesa Diretora da Câmara usaram as cotas de passagens aéreas para viagens de turismo com familiares no exterior. Ao todo foram 49 viagens internacionais entre 2007 e 2008, de deputados federais, suas famílias e amigos, segundo revelou o site Congresso em Foco. Até o ministro Augusto Nardes, do Tribunal de Contas da União, usou cota de passagem aérea de José Otávio Germano (PP-RS) para ir de Brasília a Porto Alegre, em dezembro de 2007. Já no Senado da República, em entrevista ao Jornal Correio Brasiliense, o senador Almeida Lima (PMDB-SE), presidente da Comissão de Orçamento, admitiu que usou a milhagem acumulada com a cota de bilhetes da Casa para passear no exterior. De acordo com ele, foram viagens para os Estados Unidos, Canadá e França, nos últimos anos. “Eu uso o meu cartão fidelidade para mim ou minha mulher, da cota de passagens, pronto e acabou. Não tem problema nenhum, vou de primeira classe, em voo internacional”, concluiu. Para quem não sabe os integrantes da Mesa Diretora de ambas as Casas Legislativas têm cota extra de passagens aéreas.

Uma das maiores aberrações cometidas dentro do parlamento brasileiro foi a do deputado federal Inocêncio Oliveira (PR-PE), que como 2º secretário da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, usou seus créditos para custear viagens da mulher, das filhas e da neta para os Estados Unidos e a Europa. Ao todo foram 16 trechos incluindo as cidades de Nova York, Frankfurt e Milão. Sobre o assunto, Inocêncio, irritado, declarou a imprensa que não tinha cometido nenhuma ilegalidade. E afirmou: “Sou cumpridor das regras, não vejo ilegalidade. A partir do momento em que ficar proibido, vou cumprir. Eu fazia economia, viajava nos voos mais em conta”. E emendou:“ Nas férias, acho que tinha direito de usar a cota. Família é sagrada, não tem nada demais”

Sem dúvida é muita ousadia e cara de pau a declaração desse deputado federal do PR de Pernambuco, um Estado que tem um dos maiores índices de desemprego e de mortes por arma de fogo em todo o Brasil. Infelizmente o povo pernambucano ainda vota em elementos como esse, que só quer gozar a vida à custa da miséria humana.

Em entrevista ao Jornal Correio Brasiliense, o deputado federal do PT, Cândido Vaccarezza afirmou: “Todo excesso e erro devem ser julgados, e as pessoas punidas”, “Mas não há excesso nas emissões de passagens, e os deputados não devem pagar passagem do próprio bolso”, defendeu o petista. Ainda segundo o Jornal diversos parlamentares consideram que exagero é usar o dinheiro para bancar viagens de atores a camarotes carnavalescos, como ocorreu com o deputado Fábio Faria (PMN-RN). “O caso dele deve ser julgado pelo Conselho de Ética”, afirmou novamente o deputado petista Vaccarezza.

Segundo o Jornal O Globo, de segunda-feira, dia 20 de abril, apesar dos maiores beneficiados terem sido os líderes partidários – do governo e da oposição -, estrelas como o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) e o presidente do DEM, Rodrigo Maia, também levaram familiares para fazer turismo no exterior às custas da Câmara. Até o delegado Protógenes Queiroz entrou na lista dos agraciados com bilhetes aéreos pagos pela Casa: ganhou passagem do PSOL. Mas precisamente da deputada federal do mesmo partido, Luciana Genro, filha do atual ministro da Justiça, Tasso Genro, um homem probo e correto, não que sua filha não o seja também, mas praticou uma irregularidade que tanto o seu partido contesta.

Sobre as medidas tomadas pelo Senado e pela Câmara dos Deputados assim se manifestou a colunista da Folha de São Paulo, Dora Kramer: “Desde quando reduzir em 20% e 25% cotas que variam de R$ 4.700 a R$ 18.700 mensais, na Câmara, e de R$ 13 mil a R$ 25 mil, no Senado, podendo trocar por aluguel de jatinhos e ainda distribuir as passagens para mulher, marido e filhos, é moralizar?

Se era para corrigir, que se começasse por acabar com a farra das tarifas "cheias" e se restringissem as passagens ao parlamentar. Ao que se saiba, o eleitor não vota na família do deputado ou do senador, aos quais cabe sustentar os seus”, finalizou.

Também, em artigo publicado no O Estado de São Paulo, de segunda-feira, dia 20 de abril, Carlos Alberto Di Franco afirma textualmente: “Multiplicam-se diretorias. Servidores - alguns fantasmas, outros de discutível competência - crescem como cogumelos e promovem sangria no dinheiro público. Farra com passagens aéreas. Gastos mirabolantes com combustível. O nepotismo rola solto. Despesas milionárias com alimentação. Contas exorbitantes de telefone celular. A gráfica do Senado foi transformada num instrumento de autopromoção. Houve quem reunisse em livro os elogios recebidos por e-mail à sua própria atuação parlamentar. O quadro é constrangedor”.

Assim também a respeito do assunto o editorial do Jornal do Brasil de 22 de abril afirmou: “O mais recente desses casos revelou ao país como os parlamentares utilizam as passagens aéreas a que têm direito de acordo com o regulamento da Casa – a chamada "cota pessoal". Em verdade, centenas de bilhetes aéreos (pagos com o dinheiro do contribuinte) foram usados por parentes e amigos dos nobres representantes do povo para viagens de lazer e turismo. A prática, generalizada, estende-se do baixo clero e alcança a cúpula do Congresso, como o próprio presidente da Câmara, Michel Temer – sem esquecer o envolvimento de conhecidos vestais da moralidade, como o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ)”.

O presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), diante da enorme visão do fato, está convencido de que as mudanças anunciadas semana passada tiveram péssima repercussão junto à opinião pública, causando uma péssima imagem da instituição. Por conta disso, ele já estuda medidas mais radicais, como adotar a proposta de criação de uma verba única para custeio da atividade parlamentar, cuja administração seria de inteira responsabilidade de cada deputado federal.

“Vamos reequacionar os pagamentos (de passagens aéreas), as cotas de cada deputado e as das agências. É preciso uma readequação de custos. Do jeito que estão as coisas, não dá”, comentou Michel Temer, depois de um evento empresarial em Comandatuba, litoral Sul da Bahia, onde estavam reunidos outros deputados federais, ministros de Estado, governadores e empresários de todo o Brasil, para discutir sobre a crise mundial.

E através de nota da sua assessoria de imprensa, comandada por Marcio de Freitas, ele divulgou o que pretende fazer nos próximos dias:

Veja a íntegra da nota:

“Em razão da ampla utilização de passagens aéreas nos gabinetes parlamentares, o presidente da Câmara reconhece que deputados, inclusive ele próprio, destinaram parte dessa cota a familiares e terceiros não envolvidos diretamente com a atividade do Parlamento. Tudo porque o crédito era do parlamentar, inexistindo regras claras definindo os limites da sua utilização. Por outro lado, surgem às vezes equívocos na utilização da verba indenizatória, na de postagem, na de impressos e no auxílio-moradia. Daí porque o presidente da Câmara dos Deputados determinou estudos para a readequação e reestruturação geral e definitiva de todos pagamentos feitos pela Casa. As diretrizes dessa readequação serão a transparência absoluta (já definida nas verbas indenizatórias), a redução dos gastos e a sua publicidade para que todos a elas tenham acesso. Marcos legais claros e definitivos serão colocados à disposição de parlamentares e de todos interessados ainda nos próximos dias.”

E nessa terça-feira, dia 21 de abril, feriado de Tiradentes, o Portal da Globo, G1, afirmou que “o procurador Marinus Marsico defendeu nesta segunda-feira (20) a devolução dos recursos gastos pelo Congresso para custear passagens de parentes de parlamentares. Representantes do Ministério Público que atuam junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) reuniram-se nesta segunda-feira com os diretores da Câmara e do Senado”.

Além disso, o G1 afirmou que o Ministério Público defende que as passagens cedidas pelo Congresso possam ser usadas apenas pelos parlamentares e exclusivamente para trabalho. “Aqui no tribunal, por exemplo, nós atuamos representando ao tribunal para apurar as irregularidades e pedir devolução de recursos”, afirmou Marsico.

E engrossando o coro dos descontentes, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, Wadih Damous, informou que solicitará ao presidente do Conselho Federal da OAB, Cezar Britto, a provocação da atuação do Ministério Público Federal (MPF) na responsabilização dos parlamentares que forneceram passagens aéreas de suas cotas para amigos, mas diante da decisão da Mesa da Câmara e do Senado em restringir o uso das passagens aéreas somente para o uso dos parlamentares e aos assessores, depois de autorizadas pela mesma, o presidente da OAB Cezar Brito deu por encerrado o problema.

Posteriormente, a Procuradoria da República já havia encaminhado ao presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), uma série de recomendações visando disciplinar o uso das cotas de passagens aéreas para os parlamentares. Entre as medidas recomendadas, estava a que proibia que parentes ou outras pessoas usassem os bilhetes do parlamentar. “Muitos dos deslocamentos custeados com recursos públicos foram em benefício de parentes de deputados e/ou pessoas estranhas ao exercício do mandato eletivo, o que constitui grave ofensa ao princípio da legalidade, indisponibilidade do interesse público, da moralidade e da proporcionalidade”, afirmaram os cinco procuradores da República que assinaram documento do MPF.

A solução do problema das passagens aéreas, ficou de ser resolvida dia 28 de abril (e você leitor saberá a conclusão desSa matéria no próximo artigo) por meio de uma votação aberta de uma resolução a ser encaminhada ao plenário da Câmara dos Deputados, pela sua Mesa Diretora, em que os deputados federais decidirão se haverá a continuidade da farra das viagens com o dinheiro público, sem nenhum controle, ou haverá controle e ressalvas no uso delas.