Universidade do Vale do Rio dos Sinos

Faculdade de Direito

O PROCESSO ADMINISTRATIVO E A TUTELA DOS INTERESSES TRANSINDIVIDUAIS: A AUDIÊNCIA PÚBLICA COMO INSTRUMENTO DO CONTRADITÓRIO NA ESFERA ADMINISTRATIVA

Monografia de Direito Administrativo

 Leonardo de Freitas Rostirolla




Introdução

O Poder, como observa MOREIRA NETO (Obra Citada, p. 55), por imperativos de organização interna, tende a concentrar-se nas instituições do Estado e divide-se em funções (legislativa, administrativa e judiciária). Entretanto, é legítimo, e cada vez mais necessário para que o Estado não se desvirtue de sua finalidade precípua (atender da melhor maneira possível às necessidades da sociedade), que o povo reserve para si, individual ou coletivamente, meios de exercício direto do poder do qual é o titular originário. Tais meios concretizam a participação popular que, sob esse enfoque, pode-se definir como as “modalidades de expressão da vontade individual e coletiva da sociedade aptas a interferir, formal ou informalmente, nos processos de poder do Estado, especificamente em suas expressões legislativa, administrativa e judicial”

A presente peça será, então, acompanhando o voto do ministro Joaquim Barbosa na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1.976-7, julgada em 28 mar. 2007, [1] que julgou inconstitucional a exigência de depósito prévio ou de arrolamento de bens e direitos para a interposição de recurso administrativo considerando que tornar o procedimento administrativo impossível ou inviável, por meios indiretos, constitui ofensa ao princípio da legalidade. Em seu voto o excelentíssimo ministro abordou o tema do processo administrativo sobre os seguintes aspectos: a) o princípio democrático no procedimento administrativo; b) o procedimento administrativo e o princípio da legalidade; e c) o procedimento administrativo e os direitos fundamentais.

Ocorre que a democracia representativa apresenta sinais de crise e está cada vez mais distante dos anseios populares. Diante desse panorama, os Estados que buscam manter o regime democrático estão prevendo, em suas legislações, mecanismos de participação popular como um complemento ao sistema de democracia representativa, o que permite aos cidadãos, em certas ocasiões, deliberar sobre assuntos políticos de forma direta. Temos, portanto, o procedimento administrativo com uma dupla finalidade. De um lado embasando e servindo como filtro de legalidade das decisões administrativas e de outro como instrumento de proteção das garantias fundamentais -principalmente o contraditório e o devido processo legal- dos administrados frente às ingerências da Administração Pública. Na Brilhante definição de NELSON NERY JÚNIOR, [2] “por contraditório deve-se entender, de um lado, a necessidade de dar-se conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes; e de outro, a possibilidade de as partes reagirem aos atos que lhe sejam favoráveis. Os contendores têm direito de deduzir suas pretensões e defesas, realizarem as provas que requereram para demonstrar a existência de seu direito, em suma, direito de serem ouvidos paritariamente no processo em todos os seus termos".

Traçando a evolução dos institutos legais pátrios que buscaram, ao longo do tempo, efetivar a participação cidadã na decisão dos rumos da Administração, e ainda comparando com a legislação de países com cultura semelhante à nossa, o presente trabalho tem por escopo a busca de uma maior participação popular nos procedimentos que formam as decisões das quais os próprios populares sofrerão os efeitos. Esta democracia participativa se consolida na medida em que os cidadãos utilizem todas as possibilidades participativas expressas na legislação e através delas ampliem ainda mais o dever dos governantes de ouvir a sociedade e prestar contas de suas gestões.

Para isso, foi feito todo um embasamento histórico desde o surgimento do conceito moderno de Estado e a teoria da tripartição dos poderes, passando pelos conceitos de democracia e função administrativa para justificar a importância da efetiva manifestação da opinião pública antes da tomada de decisão administrativa. Uma breve retrospectiva histórica destinada à melhor compreender sua função na organização política atual bem como sua inserção no modelo contemporâneo de Estado evidenciando o papel da participação popular no contexto político administrativo moderno.