SÍLVIA ANDRÉA SOARES BESERRA


O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE


FORTALEZA / CEARÁ / 2011

SÍLVIA ANDRÉA SOARES BESERRA


O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do título de bacharel em Direito, em formato de Artigo Científico sob orientação da professora Ms. Raquel Cavalcanti Ramos Machado, conforme a linha de pesquisa Direito Aplicado à Área da Ciência Política.

O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE


Sílvia Andréa Soares Beserra é Auditora-Fiscal da Receita Estadual da Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará, tendo se graduado em Ciências Contábeis pela Universidade de Fortaleza. E-mail para contato: [email protected].



RESUMO

O grande desafio da presente pesquisa consiste em apresentar os principais aspectos relativos ao Princípio da Legalidade Tributária no Direito brasileiro, de forma a estabelecer o papel que o mesmo exerce na instituição das obrigações acessórias, também conhecidas como deveres instrumentais para o melhor funcionamento da arrecadação e fiscalização dos tributos de nosso país e, também, a importância do aludido para a ordem jurídico-tributária, bem como para os contribuintes. O Princípio da Legalidade é proveniente desse Estado Democrático de Direito, onde há a defesa do império da lei. A regra da legalidade tem o sentido que todo ato do Estado que interfira na liberdade do indivíduo, aumentando suas obrigações ou deveres, deve estar apoiado em lei formal, emanada pelo Poder Legislativo, para a sua criação de tributo. O princípio da legalidade "geral" vem expresso na Constituição Federal, em seu art. 5º, II, que enuncia que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei." Esse princípio tem forte ligação com o próprio Estado de Direito. Por óbvio não estar-se a tratar de princípio exclusivamente tributário, mas é certo que ele tem certas particularidades nessa esfera. Tal princípio é uma forma de proteção da liberdade, visto que impede uma intervenção do Estado sobre o indivíduo que não suceda de lei.


Palavras-chave: Princípios; Obrigações acessórias; Arrecadação; Fiscalização.

INTRODUÇÃO

O grande desafio da presente pesquisa consiste em apresentar os principais aspectos relativos ao Princípio da Legalidade Tributária no Direito brasileiro, de forma a estabelecer o papel que o mesmo exerce na instituição das obrigações acessórias, também conhecidas como deveres instrumentais para o melhor funcionamento da arrecadação e fiscalização dos tributos de nosso país e, também, a importância do aludido para a ordem jurídico-tributária, bem como para os contribuintes.


1. O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

O Princípio da Legalidade tem origem histórica, surgido na Inglaterra através da Carta Magna , em 1215, quando o Rei João Sem Terra foi obrigado a assiná-la, por imposição dos barões e do papa, acerca das prerrogativas do soberano. A Carta Magna era um estatuto que reduziu o poder soberano dos reis, especialmente a do Rei João. E como bem disse Sabbag (2001, p.57): "Em outras palavras, objetivavam impor a necessidade de obtenção prévia de aprovação dos súditos para a cobrança dos tributos, do que irradiou a representação no taxation whithout representation."
E com isso, ficou caracterizado que apenas tributos autorizados poderiam ser cobrados. O tributo passou a constituir-se em uma categoria jurídica obedecida pelo Direito. Só pode ser exigido através de uma relação jurídica entre o Estado e o contribuinte, a qual resulta exclusivamente da lei.
A Constituição Federal (CF) no seu art. 5º, II : " Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei", exterioriza o princípio da legalidade, na sua forma strictu sensu , e o art. 150, I da CF exterioriza o princípio da legalidade tributária, que diz: "art.150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, aos Municípios a ao Distrito Federal: I ? Exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça."
Ora a Constituição Federal de 1988 foi clara ao requerer lei no seu sentido estrito e não no seu sentido amplo, e como preceitua Machado (2008, p.77):
Lei em sentido amplo é qualquer ato jurídico que se compreenda no conceito de lei em sentido formal ou em sentido material. Basta que seja formalmente, ou materialmente, para ser lei em sentido amplo. Já em sentido estrito só é lei aquela que o seja tanto em sentido formal como em sentido material.
Pois consiste numa forma de proteção ao patrimônio do indivíduo, que consente com esta intromissão do Estado no seu patrimônio.
A legalidade, para muitos significa o povo tributando a si mesmo. Maria de Fátima Ribeiro (apud Sabbag, 2010, p.59) em sua obra, ratifica: "O tributo é ato de soberania do Estado na medida em que sua cobrança é autorizada pelo povo, através da representação", fazendo valer o Estado Democrático de Direito.
Segundo Harada (2006, p.290):
No Estado de Direito, em que todos são obrigados a agir sob o império da lei formal, só há obrigação no momento em que haja uma lei determinando, tendo em vista o que dispõe o art. 5º, II , da CF, e com efeito, somente com base em uma lei, alguém, inclusive ou principalmente o Estado, poderá obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa.
Tais princípios expressos na Constituição Federal de 1988 preceituam:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
E com o art. 97 do CTN, de forma sintética, consagra também o Princípio da Estrita Legalidade Tributária no nosso ordenamento jurídico:
Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:
I ? a instituição de tributos, ou sua extinção;
II ? a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos arts. 21, 26, 39, 57 e 65;
III ? a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do art. 52, e do seu sujeito passivo.
IV ? a fixação da alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos arts. 21, 26, 39, 57 e 65;
V ? a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias os seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas;
VI ? as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção dos créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.
§ 1º - Equipara-se à majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.
§ 2º - Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.
Em relação ao artigo acima citado, ele corrobora a necessidade de uma lista taxativa (numerus clausus), pois o conteúdo é que interessa para com isso configurar a estrita legalidade. Conforme demonstra Sabbag (2010, p. 62):
Conforme notou no art. 97, I ao VI, do CTN, são prerrogativas legais em matéria tributária, ficando reservadas, exclusivamente, à lei estabelecer: instituição de tributos; suspensão, extinção e exclusão do crédito tributário; cominação de penalidade; fixação de alíquota e de base de cálculo; definição de fato gerador da obrigação principal e de sujeito passivo. Quanto à ?majoração de tributos?, há ressalvas descritas nos parágrafos 1º e 2º do próprio art.97, cujo detalhamento será feito em tópico ulterior. Tal composição exaustiva tem sido rotulada pelos teóricos, na forma de várias denominações, a saber: Estrita Legalidade, Tipicidade Fechada(Regrada ou Cerrada) e Reserva Legal.
O doutrinador Sacha Calmon, em sua obra Manual de direito tributário (2000, p.96), conceitua a tipicidade como "especificação do conteúdo da lei tributária." E diz mais: "A tipicidade tributária é cerrada para evitar que o administrador ou o juiz, mais aquele do que este, interfiram na sua modelação, pela via interpretativa ou integrativa." Concluindo o renomado autor enfatiza que "o princípio da tipicidade é uma extensão lógica do princípio da legalidade material."
Nesse sentido, assevera Sabbag (2010, p.63):
Pretende-se, sim, que a lei tributária proponha-se a definir in abstracto todos os aspectos relevantes da fisiologia do tributo, para que se possa, in concreto, identificar o quanto se pagará, a quem se pagará, por que se pagará, entre outras respostas às naturais indagações que se formam diante do fenômeno da incidência. (grifo nosso).
Uma fértil discussão acerca do tema tem sido travada na doutrina e nos tribunais: se o prazo para pagamento do tributo é ou não componente da reserva legal. Em outras palavras, tem-se questionado se é possível a alteração da data de pagamento do tributo por um ato normativo infralegal, por exemplo, Portaria.
Em relação ao tema, o nosso Pretório Excelso, vem entendendo que o Poder Executivo tem competência para emitir ato infralegal fixando o prazo para pagamento do tributo, com embasamento de que não seria matéria reservada à lei, por não encontrar-se na lista taxativa do art. 97 do CTN.
A extração do livro do renomado autor Sabbag (2010, p.64), sobre esta posição do Supremo Tribunal Federal:
[...] O Tribunal, por maioria, conheceu do recurso e lhe deu provimento, declarando a constitucionalidade do art.66 da Lei n. 7.450/85 que atribuiu ao Ministro da Fazenda competência para expedir portaria fixando o referido prazo, ao fundamento de que a fixação de prazo para recolhimento do tributo não é matéria reservada à lei. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence e Carlos Velloso, por entenderam que a disciplina sobre prazo de recolhimento de tributos se sujeita a competência legislativa do Congresso Nacional (RE 140.669/PE, rel. Ministro Ilmar Galvão,j. 02-12-1998);
[...] Alegação descabida. Prevista, no dispositivo legal sob enfoque, a atualização monetária dos débitos de ICMS, não há como se falar, no caso, em ofensa ao princípio da legalidade. De outra parte, não se compreendendo no campo reservado a lei, pelo Texto Fundamental, a definição do vencimento e do modo pelo qual se procederá a atualização monetária das obrigações tributárias. (RE 172.394/SP, rel.Min.Marco Aurélio, j.21-06-1995);
[...] Improcedência da alegação, tendo em vista não se encontrar sob o princípio da legalidade estrita e da anterioridade a fixação do vencimento da obrigação tributária; já se havendo assentado no STF, de outra parte, o entendimento de que a atualização monetária do débito de ICMS vencido não afronta o princípio da não cumulatividade (RE 172. 394). Recurso não conhecido. (RE 195. 218/MG, rel. Min. Ilmar Galvão, j. 28-05-2002).
E o nobre autor Sabbag (2010, p.64), comenta também os votos vencidos dos notáveis Ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence, no RE 140.669-PE/98, pois foram contra a opinião de que o prazo para pagamento possa ser disciplinado por ato infralegal, pelos seguintes motivos:
Voto do Ministro Marco Aurélio: [...] A segurança jurídica, a relação entre Estado e contribuinte reclama estabilidade somente possível de ser garantida via observância irrestrita ao mecanismo próprio que é revelado pela edição de lei em sentido formal e material, isto tendo em vista a competência abrangente do Congresso Nacional para disciplinar a arrecadação de tributos. E citando Geraldo Ataliba e José Artur Lima Gonçalves, prossegue: [...] tais autores ressaltam que o espaço de tempo para a satisfação do tributo muito tem a ver com o valor respectivo, sendo que a fixação de prazo para cumprimento de obrigação tributária não é matéria administrativa. Em última análise, segundo os citados tributaristas, o prazo para o recolhimento ? é tão juridicamente relevante quanto à base de cálculo e a alíquota, para a determinação do quantum?. [...] A cobrança do tributo é uma atividade vinculada à lei, razão pela qual se mostra descabida constitucionalmente delegação que implique a possibilidade de, conforme a situação do caixa, vir a ser fixado, por ato do Ministro da Fazenda, este ou aquele prazo [...].
Voto do Ministro Sepúlveda Pertence: [...] Certo, a arrecadação tributária é matéria essencialmente administrativa. Por isso ? como o dogma da indelegabilidade efetivamente não pode ser levado às últimas conseqüências-malgrado reservada à lei, a matéria comportará desenvolvimento regulamentares, no campo próprio do regulamento-independentemente de autorização legal expressa-que é o da ordenação de atividade administrativa, fundada no poder hierárquico que lhe é essencial. Não é disso, porém, que se cogita aqui, mas da disciplina de prima substantivo da relação entre os órgãos de arrecadação tributária e o contribuinte, qual o tempo de cumprimento de sua obrigação: dada a sua inegável relevância, não há como subtraí-lo da reserva constitucional à lei da regência da arrecadação de tributos [...].
Com isso, não basta dispor na lei que o tributo fique dessa maneira imposto, deixando-se, por exemplo, para um ato infralegal a indicação do sujeito passivo, que na nossa legislação é indicado somente por lei. Faz-se necessário uma lei clara, límpida dando menos margem de discricionariedade ao seu aplicador.
Em outras palavras bem resume a importância do princípio da tipicidade decorrente da legalidade estrita, em nosso Sistema Judiciário, o ilustre autor Sacha Calmon (2000, p. 100):
[...] tenha-se em mente que o princípio da tipicidade não torna o juiz mero autômato. Como vimos, a tipicidade da tributação decorreu da necessidade de tornar a lei fiscal clara contra o subjetivismo que antes penetrava em seu conteúdo, à vontade do rei, por seus ?ministros?. Ora, quando o legislador não faz norma clara, cabe ao juiz reduzir ao possível a sua abrangência: in dubio pro contribuinte. Quando não há modo de aplicar a lei, por faltar-lhe elemento essencial o juiz decreta a sua inaplicabilidade: nullum tributum sine legem. Quando a lei fere o princípio constitucional como o da igualdade ou da capacidade contributiva (que está no fundamento do princípio da isonomia tributária), ou o do não-confisco, o juiz anula a lei em argüição direta ou incidenter tantum. Quando a lei, apesar de tudo, é válida do ponto de vista formal e material, mas é injusta em relação a um contribuinte em particular, por faltar-lhe capacidade contributiva, o juiz pode decretar a prevalência do princípio constitucional sobre a lei e tira a tributação sobre aquele contribuinte em particular (isenção judicial). Estamos aqui indo ao extremo do afazer jurisdicional. Quando a Administração aplica a lei a La diable ou dilarga a sua compreensão, o juiz anula o ato administrativo ou o reduz à sua real dimensão secundum legem . Noutras palavras: o princípio da tipicidade contemporâneo da tripartição dos Poderes não controla mais o juiz. Controlados, em verdade, são o Legislativo e o Executivo. Os beneficiários são os cidadãos e a cidadania.
Voltando ao Princípio da Legalidade são dois os seus aspectos, de um lado, a legalidade formal e de outro, a legalidade material.
Registrando-se que a criação e majoração de tributos se dão apenas pela lei, seja ela ordinária ou como em alguns casos complementar, necessitando que seja aprovado pelo Poder Legislativo, ou por maioria qualificada (lei complementar) ou maioria simples (lei ordinária). Seja embasada a instituição ou majoração no art. 150, I da CF ou no art. 97, do CTN, pois o Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou o art. 97, do CTN, mera repetição do art.150, I da CF. Com a ementa:
EMENTA: [...] ACÓRDÃO QUE EXPÔS FUNDAMENTAÇÃO COM BASE NA OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. 1. É pacífica a jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que a análise da violação do art. 97 do CTN é inviável pela via do recurso especial, uma vez considerando que o citado artigo é mera repetição do art.150, I, da CF/88.2. Agravo regimental improvido .(AgRg no REsp 380.509/RS, 1ª Turma relatora Ministra Denise Arruda, j. 02-09-2004).
Com tudo acima explicitado sobre a lei em sentido estrito e em sentido amplo, faz-se necessária a distinção com a legislação tributária, de acordo com a terminologia entendida pelo Código Tributário Nacional, descrita no seu art. 96, a expressão "legislação tributária" compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes. Como demonstra o citado artigo, a lei tem o seu sentido mais abrangente. O Ministro do STJ Luiz Fux, proferido em 06-03-2003, no julgamento do REsp 460.986/PR, 1ª Turma, apenas um trecho:
Deveras, no campo tributário impõe-se distinguir a ?lei? da ?legislação tributária? cuja acepção é mais ampla do que a daquela. Consoante observar-se-á, no afã de explicitar os comandos legais, vale-se o legislador tributário não só da lei no sentido formal, mas também de outros atos materialmente legislativos, como os decretos, as circulares, as portarias etc., sem considerarmos, na atualidade, a profusão das ?medidas provisórias?, retratos atualizados dos antigos decretos-lei. [...] Mister destacar que por vezes, a própria lei não apresenta normatividade suficiente, reclamando regras outras que a explicitem.De toda sorte, o tributo em si com todos os seus elementos constitutivos vem definido na lei, cabendo à regra secundária; e que por isso também é fonte do direito tributário, especificar detalhes que escaparam à norma primária. As normas complementares do direito tributário são de grande valia porquanto empreendem exegese uniforme a ser obedecida pelos agentes administrativos fiscais, são assim consideradas pelo art. 100 do Código Tributário Nacional [...]. Em conseqüência, as normas complementares assim consideradas constituem fonte do direito tributário porquanto integrantes da categoria ?legislação tributária?. [...]
A expressão da vontade geral é a lei, elaborada pelos representantes do povo, que limita parcialmente a liberdade dos indivíduos, com o objetivo de buscar o bem comum. Por estarmos em um Estado de Direito, os Poderes Políticos (Executivo, Legislativo e Judiciário) ficam limitados e vinculados à Constituição, com o intuito de que sejam garantidos os direitos da pessoa e da sociedade.
O princípio da legalidade "geral" vem expresso na Constituição Federal, em seu art. 5º, II, que enuncia que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei."
Esse princípio tem forte ligação com o próprio Estado de Direito. Por óbvio não estar-se a tratar de princípio exclusivamente tributário, mas é certo que ele tem certas particularidades nessa esfera.
Tal princípio é uma forma de proteção da liberdade, visto que impede uma intervenção do Estado sobre o indivíduo que não suceda de lei. É oportuna a citação do art. 6º da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789:
A liberdade consiste no poder de fazer tudo o que não ofende outrem; assim o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem outros limites além daqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo destes mesmos direitos. Estes limites não podem ser estabelecidos senão pela lei (CARRAZZA, 2004, p.226).
No mesmo sentido de a lei ser criada pela a vontade do povo, comenta Machado (2008, p.34):
Sendo a lei manifestação legítima da vontade do povo, por seus representantes nos parlamentos, entende-se que o ser instituído em lei significa ser o tributo consentido. O povo consente que o Estado invada seu patrimônio para dele retirar os meios indispensáveis à satisfação das necessidades coletivas. Mas não é só isto. Mesmo não sendo a lei, em certos casos, uma expressão de consentimento popular, presta-se o princípio da legalidade para garantir a segurança nas relações ao particular(contribuinte) com o Estado(fisco), as quais devem ser inteiramente disciplinadas em lei, que obriga tanto o sujeito passivo como o sujeito ativo da relação obrigacional.
Como se viu ocorre é que o Sistema Jurídico Brasileiro é ainda mais rigoroso na matéria tributária, pois vige o princípio da "estrita legalidade tributária", pelo qual se entende lei em seu sentido estrito, que somente lei ordinária pode criar o tributo. Ou seja, não basta que, por exemplo, o Estado emita um decreto para que o tributo esteja sob a legalidade.
O Sistema Brasileiro prescreve que a lei que cria ou aumenta tributo deve ser editada somente pelo Poder Legislativo mediante lei ordinária. E ainda, este Poder Legislativo deve ser o competente para tanto. Como afirma Carrazza (2004, p.229): "O princípio da legalidade garante, decisivamente, a segurança das pessoas, diante da tributação."
Deve-se esclarecer precisamente o que esse princípio quer significar. O seu conteúdo exige que a norma tributária que exige (cria) ou aumenta tributo seja detalhadamente definida pela lei ordinária. Ou seja, devem ser descritos abstratamente:
Sua hipótese de incidência, seu sujeito passivo, seu sujeito ativo, sua base de cálculo e sua alíquota. [...] Portanto, as exigências do princípio da legalidade tributária são cumpridas quando a lei delimita, concreta e exaustivamente, o fato tributável. (CARRAZZA, 2004, p230-231). (grifo nosso).
Os arts. 150, I e 5º, II, da atual Constituição, referem-se à legalidade, como princípio necessário à instituição e majoração de tributos, tanto do ponto de vista formal ? ato próprio, emanado do Poder Legislativo ? como do ponto de vista material, determinação conceitual específica, dada pela lei aos aspectos substanciais dos tributos, como hipótese material, espacial e temporal, consequências obrigacionais, como sujeição passiva e quantificação do dever tributária, alíquotas e base de cálculo, além das sanções pecuniárias, dos deveres acessórios, da suspensão, extinção e exclusão do crédito tributário.
Aqui no Brasil, somente a lei pode obrigar as pessoas de fazer ou deixar de fazer algo, pois como comenta Carrazza (2004, p.225): "Detalhando, só a ela é dado definir delitos e penas, impor deveres administrativos, determinar tributos (ou seja, as importâncias em dinheiro que os contribuintes deverão desembolsar para fazerem frente às despesas da coletividade)."
O convívio com a sociedade faz com que precisemos de limitações, pois a Lei vem para regulamentar esta vida em sociedade, e a imposição da cobrança de tributos traz consigo uma contraprestação de uma obrigação a ser cumprida. E com isso, somente a Lei no seu sentido estrito é que deverá exigi-la, e deve ter um caráter geral e igualitário, devendo também ser elaborada por representantes do povo, que é a base do Estado Democrático do Direito, tendo que cumprir a vontade do povo.
É como sempre é dito, o Poder Público só pode fazer o que a lei lhe determina, fazendo com que se criem também limitações ao Poder Público, assim como ratifica Carrazza (2004, p227):
[...] é ponto bem investigado que o fim precípuo da Administração é agir debaixo da lei, cumprindo-a e fazendo com que seja bem cumprida, por seus servidores. De fato, o Poder Executivo, para a persecução dos fins públicos, deve procurar na lei(emanada do Poder Legislativo da pessoa política a que pertence) alguma determinação do que deve executar e de como vai executar. Podemos dizer, sem exagero, que a lei é o norte da função administrativa. Qualquer ligeiro desvio da rota legal e o Judiciário pode ser chamado a corrigi-lo.
Ao contrário dos particulares, para quem "tudo o que não está juridicamente facultado" (Kelsen), o Poder Público só pode fazer o que a lei lhe ordena, conforme a parêmia prohibita intelliguntur quod non permissum. Ou, como quer Jean Rivero, os particulares escolhem livremente seus fins, ao passo que a Administração está adstrita ao cumprimento do preciso fim assinalado pela lei (CARRAZA, 2004, p. 213).
Sendo a lei ?expressão da vontade geral?, é inimaginável que o povo possa oprimir a si próprio. Eis porque as matérias mais importantes são inteiramente reservadas à lei; é o caso das que dizem respeito à liberdade e à propriedade, v.g, penas, multas, tributos, etc.
O próprio Princípio da Legalidade é um freio à atuação do Poder Público, garantindo a segurança das pessoas, e garantindo também que só ocorra a criação dos tributos a partir da lei. Esse princípio alcança todos os tributos, abrangendo, as taxas, os impostos, as contribuições de melhoria. E isso acarreta o quão a lei no Direito Tributário é valiosa. O que pensa Carrazza (2004, p 236):
[...] o princípio da legalidade no Direito Tributário, não exige apenas, que a atuação do Fisco rime com uma lei material(simples preeminência da lei). Mais do que isto, determina que cada ato concreto do Fisco,que importe exigência de um tributo, seja rigorosamente autorizado por uma lei. É o que se convencionou chamar de reserva absoluta de lei formal (Albert Xavier) ou de estrita legalidade (Geraldo Ataliba).
Com efeito, a legalidade é um princípio basilar do Direito que se resume não só na vedação da tributação sem lei, mas, acima de tudo, constitui a segurança jurídica e social, metas essenciais na busca da realização de uma verdadeira república. A importância e a relevância do conhecimento do princípio republicano aparecem como alicerce e princípio norteador do próprio princípio da legalidade tributária.
Para concluir, basta afirmar que o princípio da legalidade tributária, ou de restrita legalidade, ainda que bastante forte por si só, máximo citado em vários dispositivos constitucionais, tem sua maior robustez no fato de ser um integrante do princípio republicano, pelo que ofendê-lo é ofender a todo o ordenamento jurídico.

CONCLUSÃO

Com efeito, a legalidade é um princípio basilar do Direito que se resume não só na vedação da tributação sem lei, mas, acima de tudo, constitui a segurança jurídica e social, metas essenciais na busca da realização de uma verdadeira república. A importância e a relevância do conhecimento do princípio republicano aparecem como alicerce e princípio norteador do próprio princípio da legalidade tributária.
Para concluir, basta afirmar que o princípio da legalidade tributária, ou de restrita legalidade, ainda que bastante forte por si só, máximo citado em vários dispositivos constitucionais, tem sua maior robustez no fato de ser um integrante do princípio republicano, pelo que ofendê-lo é ofender a todo o ordenamento jurídico.





REFERÊNCIAS


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