O exercer da leitura traz um esgotamento e um cansaço – prazeroso- sem igual. A atividade de ler não deve ser meramente o transcorrer de letras e palavras, pela sua mente, até porque estamos lidando com ideias vivas, dinâmicas, muito embora já pensadas. Todo escrito tem uma pulsação da vontade pelo seu autor. Nós, leitores, somos o alvo certeiro disso. Se não, vejamos... Para a reflexão do homem, Schoppenhauer o tira do centro do mundo e o faz o que é, “o bicho predador que tenta mascarar essa realidade que se esconde ativamente em seu cérebro”. O velho mestre deu seu primeiro passo no combate das estruturas fictícias que o próprio “animal periclitado”, no dizer de Nietszche, ergueu em seu favor. Mas, este buraco do qual o homem se utiliza é o buraco de sua própria estigmatização, de seus ferimentos pútridos tão disseminados na era moderna. Para o próximo passo desta compreensão, Zaratustra, o alter ego de Nietzsche, propõe a reflexão das reflexões : o espelho, a autoimagem fragmentada num devir constante, cheio de possibilidades. Nietzsche, ao contrário do velho mestre de Izang , não era pessimista, porém, trágico. No seu bom livro, A sabedoria trágica, Michel Onfray faz uma referência lúcida a este contexto, o do devir fragmento . Nos diz o filósofo francês : “ Dançarino e alegre, lúcido e cruel, acompanhado de sua águia e de sua serpente, Zaratustra propõe aos homens um espelho. Não leva em conta violência ou maldade: apenas a lição do reflexo. Portador de uma onda capaz de refletir, ele brande seus espelhos no focinho dos bípedes ( expressão Schoppenhaureana-grifo meu) sem plumas. Se ele não gosta dos homens, é porque prefere suas potencialidades. Aquilo que ainda não veio, as possibilidades de germinação.” Onde estaria todo o esgotamento, o cansaço, exceto na detecção, de toda obra viva do transcorrer do tempo, do desenvolvimento do pensamento humano. Um inicia, outro continua com seu arsenal próprio, eis o que é prazeroso.