O planejamento no Estado Novo (1930 a 1945): uma análise crítica deste período
Resumo:
Este texto realiza uma análise crítica do planejamento no Governo Vargas durante o Estado Novo (1930-45), época de profundas transformações no Brasil. Para tanto é preciso fazer a devida apreensão do contexto social, econômico, político e cultural deste período. Neste sentido, cabe ressaltar que este trabalho não visa esgotar as considerações a respeito do tema, mas propõe-se traçar considerações elucidativas, permitindo desvendar as peculiaridades marcantes na formatação do planejamento, compreendendo sua intrínseca conexão com os conceitos de Estado e desenvolvimento, histo ricamente situados e ideologicamente orientados.
1.Contexto histórico
A revolução de 1930 que marca a derrocada do regime oligárquico brasileiro, bem como a decadência da elite agrária dominante do país, faz emergir uma nova classe hegemônica: a burguesia urbana. Este processo tem origem na crescente industrialização, que tardiamente chega ao Brasil, acompanhada da queda nas taxas de venda do café, até então nosso principal produto para exportação. O mundo passava pelas consequências da queda da bolsa de valores de Nova York, cuja solução encontrada foi a adoção do padrão Keynesiano de regulação social, notadamente marcado pela defesa da intervenção estatal na economia ofegante, com vistas a criar o pleno emprego, fomentar o consumo e assim movimentar o mercado. Essa tendência seguiu vieses diferentes nos diversos países. No caso brasileiro o intervencionismo foi trouxe consigo o lastro tenebroso de nossa cultura política, caracterizada pelos "ismos": coronelismo, mandonismo, patriarcalismo, autoritarismo, clientelismo, trabalhismo, populismo entre outros.1 Combinando-se esse fatores endógenos e exógemos, o resultado foi a caracterizada miscigenação de tendências no país, numa convivência nem sempre harmoniosa entre o novo e o velho, ou melhor o nem tão novo nem tão velho. Sim, porque a história não é feita de rupturas bruscas, mas de continuidades e interrupções, onde o passado pode reaparecer atualizado sob uma nova roupagem.
Sob o comando de Getúlio Vargas, o período 1930-45 representa modificação político- econômica estrutural no padrão organizacional de sociabilidade, transitando do campo como âmbito central ,para a indústria de base a qual irá respaldar o desenvolvimento nacional.
Com o processo de industrialização e urbanização brasileira, nasce também outra classe social, que aos poucos vai tomando proporções cada vez maiores- o proletariado- o qual passa a ser alvo das políticas populistas do governo Vargas.
2.Planejamento, Estado e desenvolvimento
Para fins meramente didáticos esses três conceitos estão aqui expostos separadamente, porém como já foi dito anteriormente os mesmos encontram-se objetivamente correlacionados.
2.1. Planejamento
O planejamento estatal surge nesta época como uma importante estratégia para otimizar as ações governamentais, no sentido de fomentar o desenvolvimento o qual é
[...] Concebido como um processo, enquanto o planejamento é considerado como um instrumento desse processo e parte da concepção de que pode haver uma deliberação nas ações para o desenvolvimento, ou que este pode ocorrer de outra forma que não a espontânea. (SPOSATTI: 1980).
A ação de planejar passa a ser cada vez mais recorrente dentro do aparelho estatal e das empresas privadas, sendo assim um meio de resguardar continuidade entre intenção e execução, de acordo com os pressupostos filosóficos, econômicos, políticos e sociais incutidos em toda e qualquer atividade previamente refletida. Neste período, planejamento era considerado importante e inovadora entratégia de desenvolvemento, o que aumentaria o grau de confiabilidade, diminuindo os riscos do acaso.
2.2 Estado
O Estado da época era altamente intervencionista, estabelecendo regulamentação das transações econômicas, organização dos mercados e relações de trabalho. No intuito de fortalecer a economia nacional, Vargas tentava colocar o país a salvo dos interesses estrangeiros, fomentando o ideário nacionalista soberano de defesa do patrimônio e dos interesses nacionais. Outro aspecto importante de seu governo durante o Estado Novo foi a proteção a indústria nacional, com vistas ao crescimento do mercado interno de produção e consumo. Para tanto, foram construídos novas instalações burocráticas, bem como a ampliação da logística informacional, servindo como subsídios ao desenvolvimento, uma vez que alcançavam toda a sociedade, protegiam e disciplinavam as atividades produtivas e estabeleciam padrões e valores capitalistas na esfera da produção e da reprodução. A criação de ministérios, departamentos, setores, comissões funcionavam como órgãos planejadores de políticas públicas no âmbito federal, muitos dos quais recém criadaos, tais como Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio(1930); Ministério da Educação e Saúde Pública(1932); Conselho Federal de Comércio Exterior( 1934). Este último é considerado como o primeiro órgão de planificação, o qual representou a saída do Estado de uma posição reativa, para outra ofensiva/ proativa, base da tecnoestrutura estatal.
As legislações trabalhistas da época, a citar Consolidação das Leis do Trabalho(CLT) de 1943, funcionavam como uma estratégia para apaziguar os ânimos da classe trabalhandora e auferir adesão desta ao projeto societário capitalista. O famigerado "Sistema S", composto pelo SESI, SESC,SENAI respalda o desenvolvimento em todas as suas áreas produtivas, bem como contribui para atenuar as expressões da questão social emergentes neste cenário, assim também as possíveis reinvidicações por parte dos trabalhadores,a qual viria "estabelecer a harmonia e tranquilidade entre empregados e empregadores no Brasil."2 Acompanhado a isso estão as ações de cooptação dos sindicatos, os quais necessariamente deveriam estar cadastrados e vinculados ao governo. Podemos perceber a clara intencionalidade de Vargas em manter-se no poder, usando de artifícios populistas e clientelistas, ao passo que estabelecia com o apóio "coletivo" suas bases de sustentação política.
2.3. Desenvolvimento
O desenvolvimento do país situava-se na evolução do processo de industrialização, no crescimento da economia, aumento do consumo, incremento das forças produtivas, inclusão da tecnologia na produção, revelando a forte prevalência do critério economicista. A emancipação econômica seria promovida com a modernização e consolidação do capitalismo nacional, integrando campo e cidade, contudo com a prevalência de expansão desta última. O desenvolvimento social era funcional ao econômico, vindo como elemento coadjuvante, um braço, uma consequência deste último. O âmbito social era nesse sentido, tratado como uma forma de se fazer chegar a algo, geralmente no aumento dos índices de industrialização e emprego, o que na verdade não representa necessariamente vinculação com o bem- estar da população, real critério de confirmação do desenvolvimento social.
3. Considerações finais
O desenvolvimento nacional tão almejado, subsidiado pelo Estado intervencionista, refere-se a expansão da classe burguesa, sobretudo a industrial e comercial, confirmando a forte tendência de classe, numa instância legítima que deveria expressar os empenhos efetivamente coletivos. Desenvolver o país significava expandir a industrialização, fomentar os números da economia, ampliar os investimentos em capital fixo. Os ditos interesses nacionais representam a ânsia por lucros exorbitantes em cima da exploração da força de trabalho. Nessa perspectiva, a planificação fora pioneiramente usada como um instrumento de consecução dos esforços de desenvolvimento do país, porém longe de representar o incremento de condições favoráveis à população, denotava iniciativas de burocratização tecnicista do Estado, recorte classista de demandas, numa clara intencionalidade exploratória e anti-democrática.