Sumário: Introdução; 1- Paternalismo: Breve histórico, conceito; 2- Lei de Drogas (Lei n° 11.343/06): especificamente o art. 28.; 3- O artigo 28 da nova Lei de Drogas à luz do Superior Tribunal Federal; 4- Após a nova Lei de Drogas, houve realmente a descriminalização da posse para o seu próprio consumo?; Conclusão; Referências.

Resumo

 

O objetivo deste trabalho acadêmico é analisar as alterações introduzidas pelo artigo 28 da Lei de Drogas, Lei nº. 11.343, de 23 de agosto de 2006. Trazer um breve comentário do que a ser Paternalismo no ordenamento jurídico. Assim, irei discorrer também com base em precedentes do Tribunal Superior Tribunal em relação a esse artigo em estudo. E por fim, tentarei expor de uma forma explicativa a questão se houve realmente a descriminalização para quem ter em posse drogas para o seu próprio consumo.

Palavras-chaves:

 

Paternalismo; Drogas; Usuário; Descriminalização

 

INTRODUÇÃO

 

Primeiramente, de uma forma geral, irei descrever a historicidade e o conceito do que venha a ser o Paternalismo. Em seguida, discorrer sobre a Lei de Drogas, especificamente somente o artigo 28 da mesma. Assim, discorrer, analisando de forma crítica o paternalismo no Direito Penal e dar uma resposta eficaz se realmente ocorreu à descriminalização, com base no artigo 28 da Lei de Drogas com quem realizar o porte de drogas para o seu próprio consumo.

Portanto, com a publicação da Lei n.º 11.343/06 surgiram muitas discussões, mas a principal delas é a que diz respeito ao tratamento dispensado ao usuário de drogas. Desse modo, será se houve realmente a descriminalização, a despenalização da posse de drogas o próprio consumo, ou a conduta continua sendo considerada crime.

 

1. PATERNALISMO: BREVE HISTÓRICO; CONCEITO

Diante da intensidade e o grande número dado pelo instituto de paternalismo, não é tão simples dar-se o conceito para o que venha a ser o paternalismo. Conforme Gisele Mendes de Carvalho (2009, p. 09),

ensina que desde o ponto de vista da Filosofia moral, o termo paternalismo é empregado com o fim de aludir a uma atuação que opera qualquer restrição na autonomia dos indivíduos. Tal limitação da liberdade individual não ocorre de maneira injustificada, mas fundamenta-se na promoção do bem do próprio sujeito cuja autonomia é restringida[1].

  

Assim, cito o exemplo que no caso do Estado querer atribuir ao um dependente de drogas o tratamento obrigatório, ou seja, contra a vontade do dependente. Portanto, o paternalismo aplica-se diminuindo a autonomia do indivíduo contra a sua própria vontade, ou até mesmo sem a sua aceitação, mas sempre com o fim de está causando ao dependente algum bem ou de impedir que suporte por algum mal.

Outro conceito importante, conforme Macario Alemany,

é definido como uma prática de uma administração paternal ou, do ponto de vista jurídico, como a intenção de suprir as necessidades ou regular a vida de uma nação da mesma forma como um pai faz com sua família[2].

Já conforme, Gerald Dworkin em se tratando do comportamento paternalista, em um grande significado, diz que, 

é a interferência na liberdade de ação de uma pessoa, justificada por razões que se referem exclusivamente ao bem estar, à felicidade, às necessidades, aos interesses ou aos valores da pessoa coagida[3].

Desta forma, com base nesses conceitos ditos acima, se tem algumas classificações, mas irei citar apenas duas mais importantes conforme o texto de Martinelli. Inicialmente, foi sugerida por Dworkin, que classifica como paternalismo puro e impuro. E depois se tem a classificação de Feinberg.

Em se tratando do paternalismo puro, Dworkin define a restrição da liberdade de um grupo de pessoas que coincide com o mesmo grupo de beneficiados. Já o paternalismo impuro, trata-se da falta de coincidência entre os grupos de pessoas atingidas pela restrição e de pessoas para quem se busca um bem[4]. E conforme Feinberg se tem o paternalismo rígido, que é aquele que permite a atuação do direito penal sobre as escolhas e as reflexões de adultos competentes. Já o paternalismo moderado, só seria justificado quando as escolhas são feitas por pessoas incompetentes, permitindo-se, assim, que os competentes possam desenvolver sua liberdade e provocar autolesões[5].                   

           

2. LEI DE DROGAS (LEI N° 11.343/06): ESPECIFICAMENTE O ART. 28

 

O grande problema presente neste artigo 28 desta lei especificada, se encontra no acontecimento em que o legislador não consegue fazer totalmente com clareza o que quer para compreender no exposto artigo. Após uma breve lida no artigo, nos passa a entender que de forma alguma conforme o que está escrito no artigo citado acima, não será submetido a alguma pena de prisão, e sim, somente, as penas alternativas ou medidas sócio-educativas.

Portanto, de acordo com a nova Lei de Drogas, causou um relaxamento para os usuários. Pois muitos perderam aquele medo de fazer o uso, seja a hora que for. Onde, acham que se forem pegos não terão consequências mais graves, assim, desse ponto de vista, a lei ficou paternalista. Portanto, o que mudou com o texto descrito na nova lei, é que a aplicação não se relaciona mais com a prisão do usuário, e sim que o mesmo será considerado doente.  

Logo, alguns mestres tiveram o entendimento que houve a idéia de uma violação sui generis, ou seja, de seu próprio gênero. Um dos principais mestres foi o Luiz Flávio Gomes, expôs que,

não se trata de "crime" nem de "contravenção penal" porque somente foram cominadas penas alternativas, abandonando-se a pena de prisão. Adotava-se no Brasil o sistema bipartido, que significava o seguinte: infração penal é um gênero que comporta duas espécies, que são o crime ou o delito e as contravenções penais. Agora temos um sistema tripartido: crime ou delito, contravenções penais e infração sui generis[6].

Deste modo, como esta sendo visto, é que a nova lei não pune mais o usuário com a pena de prisão, ou seja, aquele que atém a droga somente para o seu uso.

Assim sendo, de acordo com a nova lei, ao meu entender, prender um usuário de drogas não vai trazer nenhum tipo de benefício à sociedade, pois o mesmo ficará impedido de receber uma atenção necessária. E sem destacarmos, que se forem presos realmente, a tendência de se tornarem criminosos é bem maior.      

2.1. O ARTIGO 28 DA NOVA LEI DE DROGAS À LUZ DO SUPERIOR TRIBUNAL FEDERAL

Na visão do STF em relação ao artigo 28 da nova lei de drogas, a 1ª turma tratou do assunto em fevereiro de 2007, quando apreciou o RE 430105/QO/RJ, do qual fora o Ministro Sepúlveda Pertecente, diz o seguinte:

 “A Turma, resolvendo questão de ordem no sentido de que o art. 28 da Lei 11.343/2006 (Nova Lei de Tóxicos) não implicou abolitio criminis do delito de posse de drogas para consumo pessoal, então previsto no art. 16 da Lei 6.368/76, julgou prejudicado recurso extraordinário em que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro alegava a incompetência dos juizados especiais para processar e julgar conduta capitulada no art. 16 da Lei 6.368/76. Considerou-se que a conduta antes descrita neste artigo continua sendo crime sob a égide da lei nova, tendo ocorrido, isto sim, uma despenalização, cuja característica marcante seria a exclusão de penas privativas de liberdade como sanção principal ou substitutiva da infração penal. Afastou-se, também, o entendimento de parte da doutrina de que o fato, agora, constituir-se-ia infração penal sui generis, pois esta posição acarretaria sérias conseqüências, tais como a impossibilidade de a conduta ser enquadrada como ato infracional, já que não seria crime nem contravenção penal, e a dificuldade na definição de seu regime jurídico. (...) Aduziu-se, ainda, que, embora os termos da Nova Lei de Tóxicos não sejam inequívocos, não se poderia partir da premissa de mero equívoco na colocação das infrações relativas ao usuário em capítulo chamado ‘Dos Crimes e das Penas’. Por outro lado, salientou-se a previsão, como regra geral, do rito processual estabelecido pela Lei 9.099/95. Por fim, tendo em conta que o art. 30 da Lei 11.343/2006 fixou em 2 anos o prazo de prescrição da pretensão punitiva e que já transcorrera tempo superior a esse período, sem qualquer causa interruptiva da prescrição, reconheceu-se a extinção da punibilidade do fato e, em conseqüência, concluiu-se pela perda de objeto do recurso extraordinário[7].

Portanto, conforme o Supremo Tribunal Federal é inconstitucional o dispositivo que diz a respeito à proibição da conversão de pena para penas alternativas em condenações para tráfico e para usuários. 

4- APÓS A NOVA LEI DE DROGAS, HOUVE REALMENTE A DESCRIMINALIZAÇÃO DA POSSE PARA O SEU PRÓPRIO CONSUMO?

De acordo com a Lei n° 11.343/06 houve alterações em relação a lei passada. As condutas que sofreram alterações foram do caput e §1° do artigo 28, que passou a ter as penas de advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade, e a medida educativa de comparecimento de programa ou curso educativo.  

Deste modo, conforme a nova lei, não há de maneira alguma nenhuma possibilidade de determinação de pena privativa de liberdade para o indivíduo que adquirir, guardar, trazer consigo, transportar ou tem em depósito, droga para o seu próprio consumo.

Portanto, conforme os estudos de Luiz Flávio Gomes, se dá o entendimento que

não seria norma administrativa nem penal. Isso porque de acordo com a Lei de Introdução ao Código Penal, art. 1°, só é crime se for prevista a pena privativa de liberdade, alternativa ou cumulativamente, o que não ocorreria na hipótese do art. 28 da Lei n° 11.343/06[8].

Assim, há o entendimento que não existiu a descriminalização do comportamento. Contudo, o acontecimento ainda continua sendo considerado como crime. Sendo que, as penas só devem ser aplicadas por um juiz criminal.

Destarte, com base no artigo 5°, inciso XLVI da Constituição Federal, que se tem um rol simplesmente restritivo. Portanto, como o artigo 28 da nova lei não mais presumiu a pena privativa de liberdade em caso de posse para o seu próprio consumo, como fazia a lei anterior, mesmo assim, o seu modo criminoso e a gravidade do fato permanecem.

Conforme tudo o que já foi descrito no trabalho acima, digo que não houve de maneira alguma a descriminalização de quem possuir drogas para o seu próprio consumo,

continuando as condutas previstas no art. 28 da Lei 11.343/06, não obstante a não aplicação de pena privativa de liberdade, serem consideradas crimes e, como tal, penalizadas[9].

        

  

CONCLUSÃO

À guisa de conclusão, com a chegada da Lei nº 11.343/06, que como visto, possui um caráter mais de inclusão social, então ficou constatado que a função legislativa do Brasil, assim como as executivas e judiciárias, vem cada vez mais se desdobrando em trabalhos no intuito de combater as drogas. Contudo, diante das sérias dificuldades sociais, econômicas e educativas que devastam nosso país, fica certo que esta função ainda não seguiu um caminho tão eficaz.

Por fim, de acordo com a posição do STF acerca desse assunto, conclui-se que a conduta de posse de drogas para o uso próprio, disposto no artigo 28 da Lei nº 11.343/06, continua sendo considerado como crime. 

Enfim, agora cabe somente ao Estado exercer o seu papel conforme a nova Lei de Drogas, e disponibilizar locais suficientes para que haja o tratamento para os usuários e também criar algumas políticas educacionais para cada população que está por vir. Que cada vez a nova sociedade quer ao menos experimentar algum tipo de droga.   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

CARVALHO, Gisele Mendes. Suicidio, eutanásia y Derecho Penal: estúdio Del art. 143 del Código penal español y propuesta de lege ferenda. Granada: Editorial Comares, 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/19673/uso-de-drogas-paternalismo-juridico-e-direitos-fundamentais/3> Acesso em: 20/09/11.

ALEMANY, Macario. El paternalismo jurídico. Madri: lustel. 2006. p. 38. Revista Liberdades nº 2-setembro-dezembro de 2009. MARTINELLI, João Paulo Orsini.  

DWORKIN, Gerald. Paternalism. in Philosophy of Law. Jow Feinberg (coord.). Beltmont: Wadsworth. 1986. p. 230. Revista Liberdades nº 2-setembro-dezembro de 2009. MARTINELLI, João Paulo Orsini.

FEINBERG, Joel. Harm to self. Nova Iorque/Cambridge. Cambridge University Press. 1986. p. 12. Revista Liberdades nº 2-setembro-dezembro de 2009. MARTINELLI, João Paulo Orsini.

GOMES, Luiz Flávio. Nova Lei de Drogas Comentada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 110.

(STF, 1º Turma, RE 430105 QO/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 13.2.2007. Informativo n. 456. Brasília, 12 a 23 de fevereiro de 2007)

(Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo465.htm#transcricao1)>. Acesso em: 23/10/11.

SANTOS, Cida da Silva. Disponível em: << http://jus.com.br/revista/texto/12825/artigo-28-da-lei-no-11-343-06>>. Acesso em: 20/09/11.



[1] CARVALHO, Gisele Mendes. Suicidio, eutanásia y Derecho Penal: estúdio Del art. 143 del Código penal español y propuesta de lege ferenda. Granada: Editorial Comares, 2009.

[2] ALEMANY, Macario. El paternalismo jurídico. Madri: lustel. 2006. p. 38.

[3] DWORKIN, Gerald. Paternalism. in Philosophy of Law. Jow Feinberg (coord.). Beltmont: Wadsworth. 1986. p. 230.

[4] DWORKIN, Gerald. op. cit. p. 232

[5] FEINBERG, Joel. Harm to self. Nova Iorque/Cambridge. Cambridge University Press. 1986. p. 12.

[6] GOMES, Luiz Flávio. Nova Lei de Drogas Comentada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 110.

[7] (STF, 1º Turma, RE 430105 QO/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 13.2.2007. Informativo n. 456. Brasília, 12 a 23 de fevereiro de 2007).

[8] Luiz Flávio Gomes, Alice Bianchini, Rogério Sanches da Cunha, William Terra de Oliveira, Nova Lei de Drogas comentada, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006, p. 108-113).

[9] SANTOS, Cida da Silva. Disponível em: << http://jus.com.br/revista/texto/12825/artigo-28-da-lei-no-11-343-06>>. Acesso em: 20/09/11.